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Cultura

O manual do iconoclasta

Verbetes de múltiplo uso para um livro ainda a ser escrito

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Fim de semana: e as tevês a cabo disparam, sem piedade, reportagens assustadoras sobre seres de outros planetas, vampiros, videntes que trabalharam para a KGB na Guerra Fria, faquires que andam em rios de fogo, etc. O “Manual do Iconoclasta”, ainda a ser escrito, não pode dispensar a ciência. Seguem alguns verbetes de múltiplo uso.

Viajores do espaço e Ovnis

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Desde que, em 1865, Julio Verne, em seu “Da Terra para a Lua” escreveu que iria escavar um buraco de 900 pés, na Flórida, para mandar o homem à Lua, o imaginário popular começou a pensar nas viagens interestelares. Na semana passada, em Embu das Artes, foi visto um objeto e filmado, ao qual se atribuiu ser a dádiva de ETs. Por que esse tipo de viagem interplanetária é impossível? Vamos lá: se uma espaçonave A está se movendo numa certa direção a 0,75 da velocidade da luz e uma espaçonave B marcha na direção oposta também a 0,75 da velocidade da luz, a velocidade relativa das duas seria uma vez e meia a velocidade da luz, referia a física tradicional. Mas o velho Einstein disse que uma nave veria a luz da outra não a uma vez e meia a velocidade da luz, mas a 0,96 dela: donde ele tirou que, se a velocidade da luz é constante, tempo e espaço são relativos. Ou seja: se as naves A e B vêem a luz chegando na velocidade respectiva a cada uma, cada uma delas vai medir o tempo diferentemente (portanto, quanto mais rápido viajam, mais o tempo desacelera). Resumindo: se fosse possível viajar à velocidade da luz, experimentaríamos três coisas: o tempo iria diminuir a zero, o viajante iria encolher a nada e a massa se tornaria infinita. Portanto, ninguém vai viajar à velocidade da luz, jamais. E ninguém viaja à velocidade da luz para nos visitar. A não ser que você creia naquilo que Madame Blavatsky escreveu na “Doutrina Secreta”: os discos voadores, a que ela chama de Ahats de Fogo, brotam do centro da terra (mais especificamente das cidades internas de Agartha e Shamballah, para onde teria sido engolido o Coronel Fawcett, na nossa Serra do Roncador...)

Combustível interplanetário

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Em 1989, dois cientistas, Martin Fleischmann e Stanley Pons, batizaram a sua invenção de fusão a frio. Trata-se do mecanismo pelo qual o Sol e outras estrelas se mantêm vivas. No laboratório, tal processo consiste na fusão de pequenos núcleos, como por exemplo o deutério e o trítio, que são isótopos pesados de hidrogênio. É um processo sujo, que envolve elementos radioativos como o urânio 238 e o plutônio 239, empregados para alimentar reatores nucleares. Os incautos ainda insistem em dizer que esse processo poderia ser usado para alimentar as naves em viagens interestelares. Impossível: o combustível pesaria 15 vezes a massa da espaçonave. Digamos que se viaje a 100 mil km por hora, uma energia fácil de ser gerada que nos levaria à Marte em três semanas. Agora, a 100 mil km por hora, iríamos levar mil gerações para chegarmos à estrela mais próxima.

Em 1929, Paul Dirac previu que toda partícula subatômica dispõe de uma contraparte com propriedades opostas, a que se chama de anti-partícula ou anti-matéria. Há quem diga que se pode gerar propelentes de naves com a anti-matéria. Mas apenas 60 milionésimos de energia usados na produção da anti-matéria resultam numa partícula. Conclusão: gerar energia a partir de anti-matéria custa dez quatrilhões de dólares o grama de propelente. Seria necessária a volta do ex-presidente George W. Bush para propor tamanha verba ao senado.

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Telepatia

Vamos colocar em perspectiva: o cérebro humano contém aproximadamente dez bilhões de neurônios, cada um fazendo milhares de conexões. Cada neurônio age como o sistema binário de um computador, ligando e desligando. E dessa forma nossos pensamentos, emoções e decisões são transmitidos à vasta rede que somos nós. Neurônios são ligados por aqueles rabinhos, os axônios, que não se tocam. Os sinais passam de axônio para neurônio numa vala de sinapses, no espaço de um milésimo de segundo. Esse impulso tem carga elétrica de 120 milivolts. Se há telepatia, como passar uma informação à outra sem que haja esse complexo de toques, voltagens, axônios?

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O cérebro produz ondas, medidas em ciclos por segundo, ou hertz (Hz). Cérebro relaxado ou em descanso produz um ritmo alfa, entre 8 e 14 hertz. Ritmos beta, que predominam durante o trabalho ou o caminhar, por exemplo, se dão entre 13 e 30 hertz. Durante o sono, produzimos ondas delta, que oscilam entre 1 e 4 hertz. Os ritmos chamados theta, produzidos no transe ou sono profundo, estão entre 4 e 7 hertz. Mestres zen e iogues dizem que podem mudar voluntariamente as ondas de seus cérebros.

Minha única explicação racional remonta a um livro que li no doutorado, “A New Science of Life”, escrito em 1981 pelo biólogo britânico Rupert Sheldrake, em que defendia o conceito de "ressonância mórfica". Vai por aqui: ele pediu a um poeta japonês que lhe mandasse três versos similares. Um era uma cadeia de palavras sem sentido. O segundo era um verso coerente, mas recém-composto. O terceiro era um verso famoso, muito conhecido entre crianças do curso primário no Japão. O doutor Sheldrake então leu os versos para três ocidentais, que não falavam uma palavra de japonês. Sabe qual eles mais gostaram? O verso popular. Ou seja: haveria em nós uma estética inata, baseada na afinidade. Ahan!

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Caminhando no fogo

Vamos falar dos faquires que andam no fogo. Em 1980, um grupo de pesquisadores na universidade de Tubinga, na Alemanha, começou a estudar aqueles que andam sobre o carvão, cuja temperatura média é de 495 ºC. Os pesquisadores notaram que a temperatura da sola dos pés dos faquires ia para 180 ºC. Geralmente, os caminhos de fogo têm entre 3 e 6 metros de comprimento e 15 cm de profundidade. As pesquisas do físico Carlo Fonseka mostraram que graças à grossura do casco do pé desses faquires, eles não sentem nenhum calor por 29 segundos e podem manter-se na mesma posição sem queimar os pés por 75 segundos. Segundo Fonseka, nenhum dos faquires foi criado usando sapatos.

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Haiti e Vudus

Desde que o Brasil se juntou à Força de Paz no Haiti, hordas e hordas de brazucas têm desembolsado algumas centenas de dólares para tentar ver zumbis. Estive por oito vezes no Haiti e nunca vi algum, embora tenham me oferecido em troca de algumas verdinhas. O mito do zumbi começa em 2 de maio de 1962, quando um jovem chamado Clairvius Narcisse “morreu” no hospital Albert Schweitzer, na pequena cidade de Deschapelles. Ele foi enterrado, desenterrado, e diz que foi mantido como escravo por dois anos, na condição de zumbi. O caso só foi desmascarado quando, em 1980, o etnobiólogo Wadi Davis, trabalhando então no Museu de Botânica de Harvard resolveu ir para o Haiti. Publicou a obra “A serpente e o arco-íris”. Ali, desmascara o segredo do zumbi: trata-se de uma poção que o bruxo do vodu, o bokor, inocula nas pessoas para envenená-las. A receita é: pó de ossos humanos, dois baiacus, um sapo haitiano chamado crapaud de mer, uma pequena cobra do Caribe, óleo vegetal, uma ervilha venenosa chamada em creole pois gratter, dois lagartos azuis, tarântulas e sobretudo um grande sapo do Caribe chamado bufo marinus – aliás, de onde nosso Rubem Fonseca tirou a inspiração do seu “Bufo e Spalanzani”.

Vampiros

Já que boa parte da adolescência passou a acreditar em vampiros, vamos lá. Os vampiros originais não surgem com Dracula, de Bram Stoker, lançado em 1897. “The Monk”, de Matthew Lewis, escrito em 1796, é uma das primeiras obras góticas a falar no sugador, e em 1840 textos coletivos publicados nos EUA e Inglaterra, sob o nome de “Varney the Vampire” se refestelaram no tema. Bram Stoker criou Drácula inspirado no rosto de Oscar Wilde, porque não gostava de gays. E Drácula nasce na Europa oriental porque é de lá que vinham as hordas de imigrantes famélicos, a que os londrinos atribuíam sugarem o sangue de suas cidadanias. A heroína do romance, Lucy Westerna, a noivinha sugada pelo monstro, tem o nome inspirado em “Lux Western”, ou a luz do ocidente sugada por um imigrante.

Mas levou até 1985 para que a ciência se debruçasse sobre o tema: o biólogo David Dolphin propôs a teoria da “porphyria” –uma doença originária de certos vilarejos da Europa oriental. A “porphyria” desabilita o corpo à produção da proteína que liga um componente químico, “porphyrina”, ao ferro encontrado na hemoglobina. O que sofre de porfiria tem aparência anêmica, dado que a hemoglobina não é usada com eficiência e o sangue fica raramente oxigenado. Outra: os anéis de “porphyrina” não utilizados pelo sangue são depositados na camada subcutânea. Tal química é fotossensível, e a luz do sol pode bombardear elétrons que danificam a pele do sofredor da doença. Eis o porquê de “vampiros” terem medo do sol. E tem mais: as vítimas da doença deveriam se curar comendo alho, que contém enzimas capazes de reaver a proteína perdida nesses casos. É por isso que vampiro morre com alho. A doença também faz as gengivas encolherem, o que projeta os caninos para fora.

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