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Mundo

A esfera de Pascal

Os dez anos do 11 de setembro têm de ser vistos, antes de mais nada, sob o ângulo do esforço a ser feito para que a linguagem não seja corroída por um e por outro lado

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O ensaísta mexicano Octavio Paz notava que a primeira forma de corrupção se dá na linguagem. O psicanalista Jacques Lacan achava que o mal da humanidade está em uma nutrida manipulação para a criação de “significantes sem significado”. Wittgenstein referia que os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo. Pois está justamente na corrupção da linguagem e na redução do número de significados a prática que nivela os destinos da direita norte-americana e do talibanato. Talibãs tentam demonstrar que o mundo inteiro é igual à extrema direita americana. E a última, por sua vez, tenta demonstrar que todo islamismo é tal e qual os talibãs.

O problema da direita americana contra o islamismo vem de antes de todos os ataques promovidos por Bin Laden por um único motivo: a CIA, Central de Inteligência Americana, trabalha com previsões de 50 anos. O tecnocrata convertido em morubixaba utópico, George Friedman, comunga de algumas previsões da CIA: diz que em 2020 a China se fragmenta, em 2050 o mundo será varrido por uma guerra mundial entre as novas potências, a saber EUA, Turquia, Polônia e Japão, e que em 2100 o México desafiará militarmente os Estados Unidos (não é de graça que num dos filmes da série Men in Black os monstros de outro planeta invadem os Estados Unidos sob a forma de imigrantes mexicanos que se transformam em baratas gigantescas).

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Mas a grande verdade é que as minorias de todo o mundo estão se convertendo em massa ao islamismo, de resto a religião que mais cresce no planeta, com 1,5 bilhão de adeptos. Em 25 anos, ou seja, em uma geração, a cultura europeia, como a conhecemos, começará a ser varrida do planeta: tudo porque, a cada 25 anos em média, uma mulher europeia gera 1,3 filho e uma mulher muçulmana entre seis e oito filhos. É óbvio que a direita americana quer fazer crer ao mundo que essa nova cultura será do talibanato. Eis a nova farsa contra a qual a humanidade tem de lutar. Quando o arcanjo Gabriel começou a aparecer para o profeta Maomé, no ano de 610, diz a tradição islâmica, uma das prédicas reveladas dava conta de que o profeta deveria promover um grande jihad em prol de estabelecer no mundo uma grande UMA, comunidade pacífica em que todos são iguais independentemente de etnia, religião ou nacionalidade. Quando Cassius Clay ganhou o cinturão mundial de boxe em 1968 e o teve confiscado por se negar a ir ao Vietnã, ele se converteu justamente à UMA. E assim, já cidadão do mundo, pois a UMA se supõe supranacional, reconquistou o título mundial dois anos depois com o nome de Mohamed Ali – na tentativa que hoje empolga as fantasias de todas as minorias do mundo: o igualitarismo pelo sentimento de supranacionalidade.

A luta pela corrupção da linguagem segue célere. A direita norte-americana traduz jihad como “guerra santa aos infiéis” e não no seu significado original, que é algo parecido com “esforço”. Talibãs subscrevem que jihad é “guerra santa contra os infiéis”. Naquele distante ano de 610, o arcanjo Gabriel também notou ao profeta Maomé que “só há um deus que é Alá e Maomé é seu profeta”. Destruindo a linguagem original, destecendo significados em prol de loucuras, talibãs e xiitas dizem que os infiéis são os católicos, porque admitem a trindade (Pai, Filho e Espírito Santo), e que portanto estariam combatendo ferozmente o conceito de que “só há um deus que é Alá”. Talibãs e xiitas também referem que judeus merecem ser combatidos porque se auto-regulam como “o povo escolhido de Deus” – o que iria radicalmente contra o conceito igualitário da UMA.

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Os dez anos do 11 de setembro têm de ser vistos, antes de mais nada, sob o ângulo do esforço a ser feito para que a linguagem não seja corroída por um e por outro lado. Óbvio que os dois lados entendem bem disso: Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irã, roubou de William Miller, americano pai do conceito de milenarismo, a ideia de que o mundo é dividido apenas entre o bem e o mal. Aliás, o psicopata William Miller previu o fim do mundo no século XIX um punhado de vezes. Fez fortuna vendendo roupas de algodão, a que ele chamava “túnicas de ascensão”, que levariam ao reino dos céus os bons e os justos a serem arrebatados. O babalaô místico-mágico a separar o joio do trigo nunca foi tão atual. O psicopata Ahmadinejah também gosta muito daquela lógica seguida pelos padrecos do Vaticano, e chamada de “tertio non datur”, ou seja, “princípio do terceiro excluído”, ou melhor dizendo, “eu não te dou a terceira via”. Eis o pai de todos os males: o cidadão bipolar não enxerga que há bondade que mata, por exemplo. É desse tipo de gente que veio se nutrindo, por oito anos, a dita “Polícia Federal republicana”, do governo Lula (a Folha de S.Paulo notou neste domingo que já soma R$ 1,6 milhão os pedidos de indenizações feitos contra a PF, que neste tempo todo se cevou de jornalistas, quase todos de formação marxo-católica, e que caíram na lorota de que o mundo é distintamente dividido entre “os heróis da Polícia Federal e do Ministério Público”, e do outro lado “os bandidos a serem combatidos”).

Veja você que todos os assessores de imprensa da Casa Branca nos últimos 25 anos têm uma profunda formação nos vagidos da dita neurolinguística: são os chamados “spin doctors”. Logo depois do ataque às torres gêmeas, o presidente George W. Bush começou a mostrar ao mundo as fotos de 19 terroristas que planejaram os ataques. O truque é simples: e é baseado no conceito de Martin Heidegger a diferenciar medo de angústia. O medo se constrói sobre um objeto palpável, seja o tubarão de Spielberg ou o terror de Jason. A angústia, refere o filósofo, se erige sobre o nada (por isso que os ventos e sussurros de “Bruxa de Blair” fizeram tanto sucesso em Hollywood. Eles eram a expressão do nada). A humanidade paga o que for para seguir o líder que lhe tire o sentimento de angústia e lhe coloque no sentimento de medo. Gostamos, de resto, de um medo para chamar de nosso e de um bode expiatório sobre o qual possamos lançar nossas adagazinhas. A Alemanha seguiu cegamente Hitler porque este, manipulando sobretudo a linguagem, veio com a lorota de que o objeto a ser temido era palpável: o judeu. A humanidade seguirá cegamente aquele que lhe apontar um objeto fóbico: esse conceito está em gente tão distinta quanto Le Bon, Freud, Wilhelm Reich, Ortega y Gasset e Elias Canetti.

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Veja você também, retomando, que num primeiro momento o George W. Bush do 11 de setembro nos mostrava as 19 potentes fotos dos terroristas: estava nos dando um objeto fóbico, algo palpável, a figura do “terrorista”. Num segundo momento, um mês depois do ataque, o discurso de George W. Bush, sob conselho dos “spin doctors”, retira o objeto fóbico: Bush deixa de falar o vocábulo “terrorista” e bota no lugar dele a palavra “terrorismo”. É quando entra em cena o vocábulo “terrorismo” que a situação fica feia. Porque era o sinal verde para que se invadisse qualquer país em busca do “terrorismo”: a farsa que foi a invasão do Iraque, em busca de armas nucleares, foi antes de tudo um golpe e linguagem ( “talvez a história universal seja a história da vária entonação de algumas metáforas”, notou Jorge Luis Borges).

A nova guerra é a da linguagem e suas nuances. O vocábulo “terrorismo” serve a todos, porque prescinde de um objeto palpável. Ou como notou Pascal “uma esfera terrível, cujo centro está em toda a parte e a circunferência em nenhuma”

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