Coerência
Basta um só deputado ou senador, munido de prova irrefutável, num cenário de imprensa livre e MP ativo, para jogar por terra qualquer tropa de choque a serviço de rei ou rainha
Lamentei ver o ex-Presidente Lula ainda fragilizado pelo duro tratamento a que se submeteu na luta contra o câncer. De bengala, abatido, amparado por Fernando Pimentel, compareceu ao evento que marcou os 60 anos do BNDES. Que se recupere completamente, e logo, são os meus votos.
Em sua fala, ainda com a voz claudicante, deu sua costumeira “aula” aos países ricos, mais ou menos como aquele dia em que acordou invocado e telefonou para o Obama. Ou quando, em “histórico” comunicado conjunto com o sanguinário ditador da Síria, assumiu ares de líder de grande potência militar e sentenciou: “Israel deve abandonar Golan imediatamente”. O mundo tremeu naquele dia.
Chegou ao BNDES acompanhado de Fernando Pimentel, que já não deveria mais ser Ministro, porque foi tão incapaz de explicar suas “consultorias” quanto Antônio Palocci, que terminou excluído do governo Dilma. Acompanhado também do governador Sergio Cabral que, hoje, é talvez, a figura mais ridicularizada do país, dançando, felinianamente, na boca da garrafa, com Fernando Cavendish, dono da Delta Construções, alegre parceiro de aventuras pagas com o dinheiro público.
Na famosa viagem a Paris, o séquito cabralino incluía outros “empresários”, como George Sadala, proprietário da GelPar e da Agilize Rio, que tocam o “Rio Poupa Tempo” e fatura milhões e milhões na gestão do parceiro de “trabalho” e de “folguedos”. E como Marco Antônio de Luca, controlador da “Comercial Milano do Brasil S.A.”, que fornece alimentação para presídios e escolas do Rio de Janeiro, tendo recebido, do governo estadual, R$69 milhões, e da Prefeitura de Eduardo Paes, R$142 milhões.
Lula se conserva coerente com a velha disposição de se solidarizar com quem desrespeita a coisa pública. Desta vez, pelo menos, limitou-se a dar um “pito” nas nações desenvolvidas e a guardar barulhento silêncio sobre a CPI que o deixara tão eufórico faz pouco tempo.
A Presidente Dilma Rousseff, ao que consta, estaria deveras preocupada com os rumos que a investigação parlamentar possa tomar. Mandou passar pente fino nos contratos federais com a Delta, ela que, em 16 meses de gestão, assinou 31 contratos com a empreiteira “menina dos olhos” do PAC, programa que, desde a era Lula, a tinha como mãe e madrinha.
A Presidente nem precisa de “pente fino” para constatar a ilegitimidade do crescimento da Delta sob o consulado petista: de pequena empresa, virou a sexta maior empreiteira do Brasil e a principal do próprio PAC. Cheira ou não cheira a grosseiro tráfico de influência, sobretudo quando se lê que o festeiro Cavendish declara comprar Deputados e Senadores por um punhado de milhões de reais? Quanto ele pagaria por Ministro, se encontrasse um disposto a se vender?
Falemos sério: a CPI tem de investigar a Delta sim, doa a quem doer, porque ela é sócia informal, mas ativa, de Carlos Cachoeira. Tem de ouvir todos os governadores arrolados nas gravações. Tem de abandonar a ideia tola e impraticável de fazer investigação seletiva, poupando “amigos” e linchando “inimigos”. Não pode embarcar na canoa furada de supor que existe a mais pálida hipótese de criar uma confusão que salve os mensaleiros do julgamento pelo STF. Não deve insistir na insensatez de buscar vulgarizar o Procurador-Geral da República, ainda na ilusão de que o enfraqueceria na hora em que tivesse de fazer carga contra o mensalão.
Maioria parlamentar serve para muita coisa, mas não para tudo. Basta um só Deputado ou Senador, munido de prova irrefutável, num cenário de imprensa livre e Ministério Público ativo, para jogar por terra qualquer tropa de choque a serviço de rei ou rainha.
Quem viver, verá!
Arthur Virgílio é diplomata e foi líder do PSDB no Senado
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