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Milton Blay

Formado em Direito e Jornalismo, já passou por veículos como Jovem Pan, Jornal da Tarde, revista Visão, Folha de S.Paulo, rádios Capital, Excelsior (futura CBN), Eldorado, Bandeirantes e TV Democracia, além da Radio France Internationale

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A guerra que ressuscitou a Otan e uniu a UE

A adesão da Ucrânia à Otan sequer estava na pauta quando Putin levou 150 mil soldados fortemente armados à fronteira

(Foto: Reuters)
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E o tiro saiu pela culatra. Ao invadir a Ucrânia, Vladimir Putin apostou na desunião de uma Europa em crise, mal preparada para enfrentar seus desafios do dia a dia, incapaz de lidar com mais uma guerra em suas fronteiras. Os conselheiros diplomáticos e militares de Putin desprezaram a Europa ou, melhor dizendo, só enxergaram a questão do gasoduto Nord Stream 2. Apostaram que Berlim não teria a coragem de suspender a certificação do gasoduto que liga a Alemanha à Rússia. Perdeu. De resto, o próprio presidente russo tratou Macron e Sholz como simples pombos-correio de Washington, o que não são de maneira alguma, mesmo porque os EUA já deixaram claro que não mais pretendem socorrer militarmente o velho continente de forma incondicional.

Esse foi um dos aparentemente muitos erros de Vladimir Putin nesta operação, que deveria ser um mero passeio militar. Soldados russos capturados e filmados afirmaram que, segundo foram informados por seus oficiais, tratava-se de uma simples missão de treinamento. 

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Putin acreditou que se abria uma janela de oportunidade com a presidencial na França, a chegada ao poder de um novo e inexperiente chanceler alemão e Biden às voltas com as eleições de meio-mandato. Macron, presidente em exercício da União Europeia e Olof Sholz não passariam de fantoches. Ledo engano. Ambos mostram-se verdadeiros estadistas. Putin respeitava Angela Merkel, conhecedora do socialismo soviético, da mesma idade que ele, e com quem conversava com frequência. Desprezou o seu sucessor.

A invasão da Ucrânia teve como resultado o inverso do que Putin pretendia, a união da Europa, de toda a Europa, inclusive dos países como Hungria e Polônia, reticentes com relação às diretrizes de Bruxelas. 

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Ao contrário do que se imaginava, as respostas e sanções mais duras foram adotadas pela UE e não pelos Estados Unidos. Pela primeira vez, a Europa decidiu comprar armas para fornecer à Ucrânia, inclusive aviões de combate. A totalidade dos ativos do Banco Central russo foram bloqueados e todos os bens e investimentos dos oligarcas russos retidos. O comércio com a Rússia, suspenso. O que não é pouco, se considerarmos que juntos os 27 países do bloco são o principal parceiro comercial de Moscou e que quase toda a riqueza dos oligarcas russos encontra-se na Europa, em forma de mansões e castelos, iates, carros de luxo, vinhedos, obras de arte, clubes de futebol. A Rússia já sente os efeitos das sanções. Duplamente: 1) o Banco Central russo já anunciou que a situação é dramática e que tenta evitar a asfixia  e quebras financeiras, com os bancos sem dinheiro, o rublo derretendo e os juros disparando; 2) com medo de perder suas fortunas, os oligarcas, que são uma das  bases de sustentação do regime, voltam-se contra Putin e pedem que abandone a operação. Oleg Deripaska, milionário fundador do gigante do alumínio Rusal, exigiu o fim do “capitalismo de Estado” na Rússia, face à crise provocada pelas sanções ocidentais na sequência da invasão russa. O magnata da mídia Evgeny Lebedev usou as páginas de um dos seus jornais para pedir a Putin o fim da guerra. “Presidente Putin, por favor, pare esta guerra“, estampou a primeira página do Evening Standard, de Londres, destacando a imagem de médicos que lutam para salvar uma menina de seis anos vítima do bombardeio de Mariupol, a segunda maior cidade do Donbass. Numa carta aos funcionários do seu fundo ‘LetterOne’, o bilionário Mikhail Fridman denunciou a guerra na Ucrânia, uma “tragédia” que “devastaria” os dois países.

A agressão de Putin teve outra consequência extremamente benéfica para Bruxelas. Deixou escancarada a necessidade do bloco criar seu próprio sistema de defesa, independente dos Estados Unidos, em torno da arma nuclear francesa. Apesar das várias iniciativas neste sentido, a Europa sempre se mostrou desunida face a essa questão, que parece enfim entrar na ordem do dia. A defesa europeia poderá agora tornar-se uma realidade. A União Europeia volta a ser um interlocutor e um ator da cena política internacional. Não é apenas um apêndice dos Estados Unidos. Quem a vê assim comete um erro crasso. Analistas, especialistas em geopolítica, chegaram a comentar que a invasão da Ucrânia marca o início de uma nova ordem mundial, com dois polos: Estados Unidos e aliados ocidentais, China e Rússia. Era sem contar com o renascimento da Europa. 

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Certamente, Putin não esperava um pacote de sanções tão violentas, nem muito menos a reação quase unânime do resto do mundo, com exceção de um punhado de militantes da "extrema-extrema-extrema esquerda", de uma esquerda talvez mal informada, além da Síria de Bachar el-Assad, da Bielorrussia, do Tadjiquistão e outros satélites de Moscou.  Centenas de milhares de pessoas foram às ruas das grandes cidades, logo nos primeiros dias do conflito, para se manifestar contra a invasão da Ucrânia. Os protestos vieram de todo canto. E Putin foi mostrado nú, como o ditador sanguinário que é, um nazifascista que financia a extrema-direita mundial (ler o artigo Ignorância e má-fé, no Brasil 247), e que já se envolveu em 5 conflitos armados: A segunda guerra na Chechênia, o conflito na Ossétia do Sul e Abjasia, com a Ucrânia em 2014, com a Síria, a quem forneceu armas químicas que seriam utilizadas contra a população civil, e agora com a Ucrânia novamente.

A coragem do povo ucraniano, ao pegar em armas para defender um país que segundo Putin não existia, a determinação e liderança do presidente Zelenski, chamado por Bolsonaro às gargalhadas de humorista, sacudiram o mundo e os europeus em particular. As vozes dos ucranianos decididos a manipular pela primeira vez uma kalachnikov, as imagens dos jovens tentando parar a progressão dos tanques russos com as próprias mãos, das mulheres em fabricar coquetéis molotov, dos velhos mobilizados em transformar sótãos em bunkers, mostraram que a Ucrânia, ao contrário do que vociferam os invasores, é um verdadeiro país, uma Nação com mais de mil anos de história. 

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Kiev já era o centro do primeiro Estado eslavo, quatro séculos antes de Moscou existir. 

Putin não quer apenas reintegrar a Ucrânia à zona de influência russa, quer também exportar o combate ao "marxismo cultural" e à guerra de gênero.  

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Assim como Bolsonaro, Putin tem o seu Olavo de Carvalho. Chama-se Aleksander Dugin, que se reivindica filósofo, híbrido de neofascismo e stalinismo, teórico da chamada direita iliberal. Dugin viajou o mundo, da Europa aos Estados Unidos, passou pelo Brasil, para manter contato com personagens ligados ao antiglobalismo e à Alt Right. O chamado Duguismo chegou até nós influenciando os protestos de junho de 2013l, quando foi criada a Nova Resistência, anti-lulista, fruto de sua matriz estadunidense, o New Resistance, abertamente pró-Bolsonaro e pró-Trump.

Hoje a Nova Resistência, via twitter, afirma que a Rússia ama os ucranianos e que por isso os bombardeios estão sendo mínimos. Ao contrário, « o outro lado, o lado ucraniano, é o lado do lobby LGBT, do sionismo, do americanismo, da McDonalização do mundo, do desenraizamento cultural, da imigração irrestrita, do fim das fronteiras, da usura, da tirania oligárquica etc. »

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A Nova Resistência, no Brasil, é a voz do guru de Putin.

Tudo isso tem seu lado extremamente positivo, pois mostra quem somos, um a um. O mundo que muitos acreditavam totalmente insensível, incapaz de se comover e se mover ao assistir o horror, as violações dos direitos humanos e do Direito Internacional, acordou, chora , tem raiva e se manifesta. Vemos brasileiros que moram na Europa pegar seus carros e atravessar milhares de quilômetros para buscar conterrâneos desconhecidos que fogem da guerra, abandonados pelas autoridades brasileiras. 

Enquanto isso a extrema-esquerda, assim como uma parte da extrema-direita, na contramão do mundo, mentem ao afirmar que havia urgência em invadir a Ucrânia para impedir a entrada do país na Otan. Não só não havia negociações em curso como várias autoridades da Aliança Atlântica afirmaram que Kiev não ingressaria na Aliança a curto nem a médio prazo. 

É indiscutível que houve uma dinâmica expansionista irresponsável e portanto condenável da Aliança Atlântica, sobretudo a partir dos anos 90, quando Moscou estava de joelhos. A Otan, que havia se engajado a não avançar um centímetro em direção da Rússia, se aproveitou para integrar os países do leste europeu. O objetivo da administração Clinton era incorporar a Rússia à Otan. Isso mudou desde 2008. Com relação à Ucrânia, houve inicialmente uma tendência à neutralidade, a exemplo da Suécia e da Finlândia, que embora façam parte da UE não aderiram à Otan. Depois, com a guerra da Crimeia, a adesão à Aliança ocidental passou a ser debatida. Mas ao contrário do que afirmam os defensores cegos de Putin, em nome do anti-imperialismo americano, as discussões em torno da integração da Ucrânia não evoluíram desde então. Por diversas vezes a Otan barrou a candidatura de Kiev por considerar que os parâmetros para a adesão não haviam sido preenchidos. Nada levava a pensar que havia urgência. Dias antes da invasão, o chanceler alemão Sholz reafirmava que não havia perspectiva de entrada do país na Otan. Enquanto isso, a administração norte-americana voltava a aventar a hipótese da neutralidade. 

Logo, a adesão da Ucrânia à Otan nem sequer estava na pauta quando Putin levou 150 mil soldados fortemente armados à fronteira.

Ironicamente, o efeito da guerra foi o fortalecimento da Aliança Atlântica, que estava mal das pernas, desorganizada, fragilizada. Em 2019, o presidente francês Macron afirmava que a Aliança se encontrava em estado de morte cerebral; Trump ameaçou tirar os Estados Unidos da Otan e, mais recentemente, em setembro de 2020, o bloco militar foi incapaz de agir num conflito envolvendo dois de seus membros, a Grécia e a Turquia.  

Como dizíamos, o tiro saiu pela culatra. Como dizia Yuval Noah Harari, "Putin já perdeu a guerra".

Pelo coletivo Judias e Judeus Sionistas de Esquerda:

Tânia Maria Baibich
Milton Blay
Michel Gherman
Jean Goldenbaum
Mauro Nadvorny
Nelson Nisembaum
Pietro Nardella-Dellova

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