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Ribamar Fonseca

Jornalista e escritor

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A hora e a vez dos togados

Embora a toga não seja atestado de honestidade, o povo em sua maioria já está se convencendo, graças sobretudo à mídia, que os homens de preto são a solução para acabar com a roubalheira no país

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Todo mundo caiu de pau na Venezuela, inclusive o chanceler brasileiro, porque o Supremo Tribunal de lá decidiu assumir, abertamente, as funções do Legislativo. Difícil entender o espanto e a indignação de figuras ligadas ao governo do Brasil, onde o Judiciário já assumiu esse papel há muito tempo, muito antes dos venezuelanos. A diferença é que lá na Venezuela a usurpação de funções foi realizada através de ato formal, revogado depois das pressões, enquanto aqui acontece o mesmo mas de maneira sutil, aproveitando a cumplicidade da mídia. Aqui já virou rotina, por exemplo, um ministro do Supremo Tribunal Federal anular, com uma única canetada, decisões da Câmara dos Deputados, um colegiado de mais de 500 membros. E juízes e procuradores já fazem projetos de lei, que são encaminhados ao Congresso Nacional como se fossem da iniciativa popular, mas fazem uma confusão danada se o texto não for aprovado em sua forma original. Os parlamentares, que são os legisladores, não podem fazer emendas.

Foi o caso, entre outros, daquelas dez medidas anticorrupção, que a Câmara aprovou com emendas, porque o projeto continha absurdos, como a legalização da tortura para obtenção de provas "de boa fé". A proposta foi elaborada pelos procuradores da Lava-Jato, que fizeram uma campanha nacional em busca de assinaturas, e apresentada ao Congresso como se fosse de inciativa do povo. Conseguiram mais de um milhão de assinaturas e, por isso, imaginaram que ela deveria ter sido aprovada em seu texto original. Não é difícil perceber, no entanto, que a maioria esmagadora dos brasileiros que assinaram a proposta o fizeram sem ver o seu conteúdo, apenas atendendo ao apelo de que o seu objetivo era o "combate à corrupção". O povo aprova o combate à corrupção, mas não esse combate seletivo, cujos alvos são escolhidos por suas ligações partidárias.

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Interessante notar que, ao mesmo tempo em que exigem que o seu projeto seja aprovado em sua forma original, sem emendas, defendem seja emendado o projeto sobre abuso de autoridade em tramitação no Senado. O juiz Sergio Moro, hoje a estrela do Judiciário que se locomove com um aparato de segurança digno de um pop star, esteve no Congresso para um debate sobre a proposta. Na ocasião, criticou o projeto que, na sua opinião, abre a possibilidade de criminalizar juízes se divergirem na interpretação da lei. Moro defendeu a inclusão de uma ressalva deixando claro que a divergência na interpretação da lei não deve ser considerada crime, para que os juízes possam atuar com mais independência. "Se não for aprovada uma salvaguarda clara e inequívoca a respeito – ele disse – o grande receio é que os juízes passem a ter medo de tomar decisões que possam eventualmente ferir interesses". Acontece que reside precisamente aí o xis da questão, porque muitos abusos tem sido cometidos justamente por conta de interpretações ao sabor de interesses ou paixões políticas.

Está claro que para alguns juízes, inclusive para o magistrado de Curitiba, o que vale é a interpretação da Lei e não necessariamente o texto elaborado pelo legislador. Ora, quando o legislador elaborou a Lei foi para que ela fosse cumprida de acordo com o seu texto e não segundo a interpretação de cada um. Ocorre que hoje os magistrados estão tomando decisões de acordo com as suas convicções e não de conformidade com o texto legal. Daí os abusos, porque cada um dá a interpretação que atenda a seus interesses, simpatias ou antipatias políticas. Como estão conscientes de que é aí que cometem os abusos, sabem que poderão ser enquadrados na nova lei que penaliza o abuso de autoridade. Por isso estão fazendo tudo, inclusive usando as redes sociais, para impedir a sua aprovação. Afinal, se o texto da lei não vale e sim as interpretações e convicções de juízes e promotores, então para que existem leis? Se o Judiciário passar a fazer leis então será mais prático fechar o Congresso e deixar a legislação a cargo dos togados.

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Não faz muito tempo, durante um interrogatório, o juiz Sergio Moro irritou-se com os advogados de defesa e disse que se eles quisessem ser juízes que fizessem concurso. Hoje os políticos poderiam dizer que se o magistrado de Curitiba e os promotores pretendem fazer leis que se candidatem a uma cadeira no Congresso. Na verdade, tudo indica, diante do panorama atual do país, que nas próximas eleições teremos mesmo membros do Judiciário e do Ministério Público concorrendo ao Parlamento e até a cargos executivos. Com a criminalização sistemática e deliberada da classe política pela mídia, que criou no imaginário popular a ideia de que todo político é ladrão, magistrados e empresários passaram a ser a nova opção para o eleitor, o que vem animando muita gente a concorrer nas próximas eleições. João Doria, por exemplo, já é produto dessa situação. E a ex-ministra Marina Silva, presidente do Rede, percebendo a nova realidade, já começou a atrair para o seu partido, com vistas às eleições de 2018, juízes e promotores, entre eles Marlon e Dallagnol.

Com a divulgação das delações do pessoal da Odebrecht, que envolvem um expressivo contingente de políticos – incluindo o próprio presidente postiço Michel Temer e nove dos seus ministros – a população não mais esconde a sua decepção e indignação, alimentadas diariamente pela mídia, sobretudo pela TV Globo. Embora nem todos os políticos façam parte da lista da Odebrecht ou tenham qualquer histórico de corrupção, todos terão muita dificuldade para conquistar o voto do eleitorado nas eleições vindouras, pois a desconfiança já foi instalada. A não ser que seja aprovada a tal lista fechada, a única maneira de os políticos denunciados retornarem ao Parlamento, teremos em breve um legislativo formado por togados. Afinal, embora a toga não seja atestado de honestidade, o povo em sua maioria já está se convencendo, graças sobretudo à mídia, que os homens de preto são a solução para acabar com a roubalheira no país.

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