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Alex Saratt

Alex Saratt, professor de História nas redes públicas municipal e estadual em Taquara/RS e dirigente sindical do Cpers/Sindicato.

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A mentira virou verdade. Como vencer essa realidade?

Ao conseguir fazer das mentiras sucessivas, encadeadas e massificadas um todo coerente e orgânico, Bolsonaro criou um "novo anormal", anômalo, porém poderoso a ponto de disputar Democracia e Ditadura em condições de paridade

Jair Bolsonaro (Foto: Carolina Antunes - PR)
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A desilusão real ou imaginada quanto ao sistema de coisas produz reflexos poderosos. É certo que nossa Democracia ou o modelo econômico dominante sempre estiveram em descompasso e distantes daquilo que as pessoas desejavam e necessitavam. E no caudaloso curso de um rio chamado sociedade, acumularam-se em suas curvas, margens e leito um rol de insatisfações, frustrações e indignações gigantescas.

Ao povo simples, trabalhador e honesto, nada pode ser mais caro do que a verdade (ou sua oposição, a mentira). Diz um ditado que "à mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta". E, nesse quesito, mesmo quando não havia falta (ou falseamento) de verdade, a mera percepção de que algo não estava correto ou justo já era suficiente para desconfianças, especulações e intrigas.

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O Estado ineficaz no atendimento ao demandado pelo povo, a Política feita na base de promessas não-cumpridas, a carestia da vida, o desemprego e os baixos salários, a fila do hospital, a falta de médicos e remédios, a escola precária, o transporte caro e mal servido, a moradia sem infraestrutura básica, o lazer unicamente televisivo, a polícia que só prende ladrão de galinha e a justiça que só condena preto e pobre.

Enfim, não há Democracia que aguente quando ela não funciona para a maioria, não faz parte da vida das pessoas, vira uma mera formalidade limitada ao ato de votar a cada dois anos. Nenhum sistema econômico parece existir fora daquilo que se experimenta cotidianamente e nele o sujeito e a classe sempre saem perdedores.

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Assim, abre-se uma brecha para o discurso crítico e contestador. A Esquerda brasileira se apropriou disso com perfeição por décadas. Até que virou governo. E em condições determinadas, desfavoráveis e em meio a uma crise severa que se arrastava desde meados dos anos 1980 (isso sem falar na dívida histórica, muito maior e mais profunda).

De antissistema e revolucionária, os partidos, sindicatos e movimentos sociais passaram a ter que responder e resolver os problemas criados pelas classes dominantes dentro dos marcos e regras da própria classe dominante. Bravatas, verborragia e denúncia não bastavam, era preciso dar conta das questões conjunturais e estruturais "tudo ao mesmo tempo agora".

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Aos poucos os papéis foram se invertendo e a Direita, velhaca, porém ardilosa e matreira, soube arquitetar um discurso/narrativa consoante aos "novos tempos". Qualquer falha, deslize ou incoerência era alvo de pesada artilharia, tratadas como incompetência ou mentira. E no lugar das alegadas mentiras, nenhuma verdade, apenas mentiras e manipulações ao nível da desinformação, senso comum e preconceitos que mexiam com a subjetividade do indivíduo e criavam uma noção de realidade paralela e quase distópica.

Corrupção, atentado aos valores morais e cristãos, violência, planos ditatoriais, direitos humanos, ameaças às liberdades, doutrinação, crise, tudo, absolutamente tudo, era passível de estar em degeneração ou perigo por conta da maldita horda esquerdista que traria miséria, fome, caos, mesmo que as reais condições dissessem o contrário.

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Nesse aspecto, Bolsonaro e quem o alimenta e o sustenta entram e tem um mérito macabro: transformaram a realidade em uma grande trama conspiracionista, acusando os inimigos de mentirem e com base em mentiras que beiram o absurdo, o infantil e o esquizofrênico, constituíram uma "verdade" absoluta, inconteste, totalitário e militante.

Não é pouca coisa, é - usando linguagem empresarial - "um case de sucesso". A capacidade de revolver os fatos e dar-lhes novos conteúdos, significações e sentidos, não é obra de amadores, não custou barato e tem projeções de larga duração. Não é à toa que temos hoje praticamente 70 mil vítimas de COVID19 e uma imensa parcela da população ignora ou naturaliza o fato e dispende apoio ao Presidente.

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Ao conseguir fazer das mentiras sucessivas, encadeadas e massificadas um todo coerente e orgânico, Bolsonaro criou um "novo anormal", anômalo, porém poderoso a ponto de disputar Democracia e Ditadura em condições de paridade.

A indiferença entre um ou outro regime de funcionamento político é a expressão que o povo dá aquilo que pouco ou nada esteve presente e vivo na sua existência. A luta democrática passa por muitos meandros, desde aqueles arranjos mais institucionais ou tradicionais até aos que incidem nas questões dramáticas e corriqueiras do dia-a-dia.

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Enfrentar, barrar, superar tudo isso exigirá não só combate ideológico, renovação do discurso ou instrumentalização dos meios técnicos, também requisitará uma metodologia de trabalho duro, persistente e demorado com as bases sociais potenciais que estão afastadas e à mercê da demagogia vil, barata e inescrupulosa dos senhores da palavra.

Enquanto não nos resolvermos e formos incapazes de articular as lutas políticas em curso, a organização e ampliação das massas e o trabalho de conexão com a consciência primária da população, estaremos fadados a malhar ferro frio. A tarefa, diga-se de passagem, é para ontem.

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