A vertigem de ser livre

"A angústia é a vertigem da liberdade".

Imagine-se num lindo campo vasto e cheio de caminhos à sua frente. Você ali, cheio de opções igualmente atraentes e sem quaisquer amarras ou limitações externas. Esse momento pré-escolha dá vertigem: é a ansiedade, o medo de não escolher o melhor caminho para você. Pelo menos por alguns segundos, não seria mais confortável e seguro ter alguém pra lhe dizer por onde seguir? Sim, a liberdade absoluta dá tontura.

O filósofo dinamarquês Kierkgaard tinha razão.

A liberdade está entre os top 5 bens almejados pelo ser humano. É aquele "acessório" indispensável que ninguém quer deixar de ter.

Quer-se dinheiro? Poder? Relacionamento? Família? Mas junto me veja liberdade, por favor.

Podemos não saber bem o tamanho e nem o preço disso. Podemos errar feio em sua definição. Mas a liberdade tem a cara da Marilyn Monroe - linda, atraente e desejada por todos, seja por quererem tê-la ou imitá-la.

Ouso dizer que, quem chega mais próximo de ser livre, desperta mais inveja alheia do que se tivesse uma mansão luxuosa ou uma beleza esculpida com perfeição.

Falo da liberdade de ser ridículo, como já disse Luiz Fernando Veríssimo. Falo da liberdade de só dizer a verdade (e não se preocupar com a mentira que o prenderá pra sempre). Falo da liberdade pra escolher o que se quer por perto, liberdade pra cuidar da saúde ou não, liberdade de se vestir mais ou menos. Liberdade de acreditar sem as algemas do rótulo ou da pressão externa.
Falo da liberdade da cor, do espaço e do gozo.

Dia desses, num sábado à noite, alguém me convidou pra sair e eu neguei, dizendo que ficaria em casa, e ouvi: "Mas você é livre, vai ficar em casa num sábado à noite?".

Sim, disse a ele que tento viver o mais alto grau de liberdade: a liberdade de não sair, de não fazer o que não quero. Aliás, descobri que Rousseau disse a mesma coisa em outras palavras. Não estou sozinha.

Não alcancei a minha liberdade máxima. Faltam muitas fases nesse vídeo game, não sei nem se zero tudo. Como Che Guevara, quero ter a liberdade de me enganar e de lutar pelo que acredito. Como Fernando Pessoa, quero ter a liberdade do isolamento. Ando me esforçando pra completar o circuito do game. Quero não ter medo de amar, porque o amor de verdade deve ser livre, sem preconceitos, cobranças ou regulamentos internos: a única coisa que deve regulá-lo é a confiança no sentimento. Quero tirar o pé do freio e ficar zonza.

Fico com as palavras dos mineiros do Clube da Esquina, Beto Guedes e Fernando Brant, swingadas na voz da imortal Elis:

"O medo de amar é o medo de ser livre para o que der e vier
Livre para sempre estar onde o justo estiver.
O medo de amar é o medo de ter de a todo o momento escolher
Com acerto e precisão a melhor direção"

Sim, o medo é a vertigem da liberdade. Liberdade pra dentro da cabeça, pois sem vertigem a vida fica em preto e branco. Cor sempre, por favor.