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Clarissa De Franco

Psicóloga, doutora em Ciências da Religião, com pós-doutorado em Estudos de Gênero. Profa. Titular da Universidade Metodista de São Paulo

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A vitória das pautas morais como guia para o caos

Urnas eletrônicas (Foto: REUTERS/Bruno Kelly)
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Cecília Meireles afirmou que “merecemos a morte, porque somos humanos e a guerra é feita pelas nossas mãos, pela nossa cabeça embrulhada em séculos de sombra, por nosso sangue estranho e instável, pelas ordens que trazemos por dentro e ficam sem explicação”.

Não sei dizer se merecemos a morte, a fome, a misoginia, as queimadas, os ataques à cultura, à imprensa, aos indígenas, ao povo preto, mesmo que a guerra tenha sido mesmo realizada com a participação de nossas mãos. As mesmas que apertaram o 22 nas urnas. Lamentavelmente, estas também são as mãos emprestadas aos donos do capital todos os dias como força de trabalho. 

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Culpabilizar a população por sua (nossa) própria desgraça não é suficiente para compreender o quadro estarrecedor das eleições. Precisamos acompanhar as estratégias que o povo brasileiro tem buscado diante da instabilidade e vulnerabilidade crescentes da situação social. A última década viu a fome e a dívida voltarem, as aposentadorias encolherem e a expectativa de tempo de trabalho aumentar, viu a faculdade deixar de ser uma opção, a pandemia levar milhares de pessoas por má gestão da saúde, viu as armas se tornarem instrumentos de mediação no lugar do diálogo, viu a uberização do trabalho, a perda de influência orientativa das instituições, a confusão cognitiva da pós-verdade e das Fake news e viu ainda pedidos inflamados pela volta da Ditadura militar.

A partir dessa perspectiva gostaria de refletir sobre o resultado das urnas. O caos em que estamos mergulhados/as tem conduzido a grande massa a se agarrar às pautas morais e conservadoras, como uma forma de guia. A mídia já não orienta sobre a verdade. O Direito já não é capaz de ser um guia sobre a justiça. A terceirização já não permite estabelecer mais vínculos duradouros com o trabalho. A pandemia mostrou que tudo pode acabar amanhã.

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E então, o que nos resta? Saber o que é certo, saber discernir o bem do mal, ser, apesar de tudo isso, um cidadão ou cidadã de valores. Nessa busca de uma madeira oca em meio ao mar bravo e turvo, surgem as pautas morais: defesa da família tradicional, direito à vida desde sua concepção (ou simplesmente, não ao aborto), proibição das drogas, redução da maioridade penal, direitos humanos para humanos direitos, estigmatização da população LGBTQIAP+ como desviada, anormal, pervertida ou pecaminosa, identificação do feminismo com uma esquerda assassina...

Boa parte do bolsonarismo se elegeu com base nesse discurso: Carla Zambelli, Damares Alves, Bia Kicis, apenas para citar algumas mulheres eleitas e apoiadas fortemente por Michelle Bolsonaro, um dos pilares da campanha do marido, com força entre o eleitorado evangélico.

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Se alguém saiu vitorioso/a nas urnas do dia 02 de outubro foram as pautas morais, pois elas trazem a aparente sensação de segurança para quem já perdeu tudo, inclusive o sentido. A moral conservadora traz um falacioso respaldo de que, mesmo sem nada material, ainda sou “um cidadão de bem”.

Não caiamos no pessimismo generalizado e irrefletido: nossos vizinhos e vizinhas não são como o Bolsonaro, não estavam todos/as enrustidos/as nos armários conservadores. São apenas pessoas que sofrem e precisam de tábuas (ou oxigênio!) para se manterem vivas. Infelizmente, a direita tem sabido oferecer o tipo de tábua de salvação que aparenta ser emergencialmente mais acessível e segura. O pacto atual da nação é moral.  

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