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Paulo Moreira Leite

Colunista e comentarista na TV 247

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Ação da ditadura na meningite explica Bolsonaro na covid-19

"Matriz ideológica do bolsonarismo, a linha dura do regime militar usou a censura para esconder uma das piores epidemias do século passado em São Paulo", escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Pandemia em Manaus (AM) (Foto: Reuters)
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No indispensável esforço para decifrar o comportamento inaceitável de Bolsonaro diante da covid-19, convém recuperar a história de uma situação equivalente, no início da década de 1970, quando São Paulo viveu uma gravíssima epidemia de meningite. 

Meio século depois, Bolsonaro segue a cartilha negacionista produzida pela linha dura do regime militar -- cuja derrota política, após quatro anos de tragédia na maior cidade do país, abriu caminho para o combate efetivo à epidemia. 

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A história pode ser resumida assim. Menos contagiosa do que a covid 19, mas muito mais letal, a meningite apareceu em 1971, no bairro de Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo.  Depois atingiu São Miguel Paulista, na Zona Leste. Em 1972 chegava a Santana e Tucuruvi, na Zona Norte, e depois a Lapa, na Oeste, antes de atingir o centro. 

Mesmo com hospitais lotados, com pacientes sendo atendidos no corredor e até em cima de pias, o governo fazia o possível para esconder a epidemia. 

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Preparadas pelas autoridades de saúde e enviadas aos jornais, as notícias eram censuradas por agentes da Polícia Federal. Era uma questão de coerência. O regime que escondia  a tortura nas prisões, manipulava os dados sobre economia e empobrecimento, não permitia que a população tivesse notícias de uma doença terrível. 

Mas o caso era tão grave que os Jogos Pan Americanos de 1974, inicialmente programados para São Paulo, na ultima hora tiveram de ser transferidos para a Cidade do México. A razão era a meningite mas na época ninguém entendeu por quê.  

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"O regime que falava em milagre econômico não queria admitir que o país enfrentava uma epidemia grave e mortal", afirma o professor e médico José Cassio de Moraes, especialista em Saúde Publica, que atuou na linha de frente do combate a meningite, em depoimento a TV 247, disponível em nosso site. 

A compreensão do momento político é importante para compreender o que se passava. Num país governado pela linha dura, que havia tomado o poder em dezembro de 1968 a partir do AI-5, impondo Emílio Médici na presidência e instalando seus aliados mais extremos em postos chave -- o coronel Ustra chefiava o  DOI CODI paulista -- as autoridades de meio século atrás definiram uma postura que seria imitada, em novas circunstâncias, pelo bolsonarismo de nosso dias.  

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Ajudando a esconder a epidemia, a censura contribuía para manter um ambiente de incertezas e desorientação. O temor da população era tamanho que, em 1972,  quando a Secretaria de Saúde recebeu uma doação de 200 000 vacinas para serem testadas em crianças, a experiencia que se revelou um fiasco. Ressabiadas, as mães impediam que seus filhos fossem vacinados, recorda o livro "Meningite -- uma doença sob a luz da cidade", de Cristina Fonseca, José Cassio de Moraes e Rita Barradas Barata. 

"Apenas 70 000 doses foram aplicadas e os resultados foram insatisfatórios", conta o livro.

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Derrotada na luta interna pela sucessão no governo federal, a linha dura deu lugar ao governo de Ernesto Geisel, empossado em 1974. Aquele foi um ano de inverno rigoroso, favorável e elevação das mortes e contaminações -- o índice chegou a 200 contágios por 100 000 pessoas, numero seis vezes maior do que em anos anteriores, patamar das piores regiões do mundo. 

Os contágios e mortes continuaram pelo meses seguintes até que, em 1975, foi possível construir uma iniciativa capaz de enfrentar uma tragédia que se tornara insustentável. 

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A partir de um gigantesco lote de vacinas importadas da França, colocou-se  em ação um plano de emergência para vacinar  10 milhões de pessoas em quatro dias. Numa campanha com auxílio do Exército, a meta esteve perto de alcançada: 9 milhões de pessoas foram vacinadas. A partir daí, lentamente, às vezes com idas e vindas, apareceram os primeiros resultados satisfatórios, que permitiram uma lenta inversão na curva dos casos.  

Em 2021, num país governado por herdeiros ideológicos da linha dura do regime militar, há uma constatação inegável. 

Foi preciso realizar  uma mudança no centro do poder político para  corrigir o rumo na saúde pública, vencer o negacionismo e implementar um programa sanitário com base no conhecimento científico da época. 

Alguma dúvida?

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