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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Bolsonaro desata laços de confiança com o Chile estreitados pela política de Celso Amorim

Jornalista Denise Assis analisa a avaliação do ex-chanceler Celso Amorim sobre as relações entre Brasil e Chile

(Foto: Agencia Brasil | Reprodução)
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Por Denise Assis, para o 247 

Todos os “laços de confiança” construídos durante anos pelo Itamaraty e sua chancelaria, retratados com farta documentação, anotações pessoais e a memória prodigiosa do embaixador e ex-chanceler, Celso Amorim, em seu livro recém-lançado - em que fez uso da expressão para o título de sua obra -, foram desastrosamente desamarrados por Bolsonaro em alguns minutos.  

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 Usando de declarações, estapafúrdias e eivadas de desconhecimento do que sejam as relações internacionais, o candidato do PL – ignorando que é também presidente do país -, falou no debate da noite desse domingo (28/08), promovido por UOL, Folha de S. Paulo, Band e TV Cultura sobre os governos de esquerda na América Latina, causando desconforto no Chile e em seu presidente, Gabriel Boric. Imediatamente o governo chileno convocou o embaixador do Brasil em Santiago, “para consulta”.

Tido nacional e internacionalmente como o melhor chanceler do Brasil, Celso Amorim classifica a situação como aquilo que ela de fato é: “muito grave”. Pela tradição nas relações exteriores, esse é o gesto de maior simbolismo na convivência entre os países, explicou. “Basta dizer que em 9 anos e meio que exerci a chancelaria eu só fiz uso dele uma vez”.  

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 Na fala que agrediu os demais países vizinhos, durante o debate, Bolsonaro usou os clichês anticomunistas de sempre. Para o Chile, porém, e seu presidente, reservou acusação fantasiosa, sem fundamentos ou provas. Bolsonaro acusou Boric de ter ateado "fogo em metrôs".

Tendo como alvo o seu principal oponente nas eleições deste ano, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), disse ontem: "Lula apoiou o presidente do Chile também, o mesmo que praticava atos de tocar fogo em metrôs lá no Chile. Para onde está indo o nosso Chile?".

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 O governo chileno, como era de se esperar, emitiu nota citando o presidente brasileiro e repudiando suas falas: "são inaceitáveis e não estão de acordo com o tratamento respeitoso devido aos chefes de Estado ou com as relações fraternas entre dois países latino-americanos", protestou.

 Na avaliação do ex-chanceler, fazendo a ressalva de que está apenas especulando, é possível que “O embaixador não volte ao Chile antes do término das eleições”, avalia, tamanho o constrangimento causado pela fala de Bolsonaro.

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 Na abertura do capítulo reservado ao seu trabalho na relação com o Chile, em “Laços de Confiança”, Amorim resgata uma expressão atribuída ao Barão do Rio Branco, para definir a ligação entre os dois países: “uma amizade sem limites”. Em seu texto, escreveu: “O jogo de palavras nela contido exprime, de modo feliz, a combinação entre dois fatores: a distância física e a excelência das relações bilaterais”.  

 É do que estamos falando e que está sendo destruído pela inabilidade das declarações irresponsáveis do atual presidente. “É claro que o limite, que é a fronteira, sempre pode também ser fonte de problema. Então é uma amizade enorme e sem atritos. E ele consegue criar um atrito gratuito”.  

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 O chanceler destaca: “o Boric não fez nada. E o Brasil nunca teve nenhum problema com o Chile. Até na época das ditaduras, elas coincidiram. A do Pinochet (Augusto de 1973 a 1990) durou um pouco mais, a gente esfriou nesse período, mas não brigou... O Brasil nunca brigou, enfim, eu não me lembro de nenhum contencioso entre Brasil e Chile”, reexamina, complementando: “chamar para consulta é uma coisa séria e rara. Muito difícil. Você não faz toda hora. Então, realmente ele acusou o golpe no bom sentido. Eles se sentiram ofendidos e retiraram o embaixador por algum tempo, mas de qualquer forma é uma situação de desconforto”.  

 Para o chanceler, os ânimos só seriam amainados caso o governo brasileiro fosse lá, se desculpasse, “coisa que não me parece provável que ele faça. Trata-se de uma briga gratuita. Ele não se dá com ninguém. Ele foi nomeando todos da América Latina, praticamente. Absurdo”. E lembrou que Bolsonaro falou mal também do presidente da Argentina, Alberto Fernandez, por ter visitado Lula na prisão.

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“O único que ele não falou foi da Bolívia. Esqueceu. Ele pegou quatro países - Chile, Venezuela, Argentina e Colômbia -, de grande importância na região. Eu acho que é porque ele já tinha uma relação difícil com a Bolívia, até porque há sérias acusações suspeitas sobre a participação do Brasil naquele golpe (2019/2020). Golpe que durou um ano. Imagine. Da Venezuela ele fala dessa maneira, Colômbia também ele critica, fala que o presidente vai liberar as drogas... Ele é irresponsável para com o país. É uma total irresponsabilidade. Acusa gratuitamente, sem que o país nos tenha feito nada”, reagiu Amorim.  

“Seria diferente se o Chile tivesse feito alguma coisa com uma empresa brasileira, ou tivesse prendido um brasileiro, mas não houve nada disso. Ele ataca gratuitamente para falar para a sua bolha e atingir o Lula, seu adversário político. E com isso ele se indispõe e indispõe o Brasil com integrantes importantes da região”.  

 A resposta de Boric foi dura. Além de chamar o embaixador do Brasil para consulta, em seu comunicado, apontou: “O uso político da relação bilateral para fins eleitorais, baseado em mentiras, desinformações e deturpações, corrói não apenas os laços entre nossos países, mas também a democracia, prejudicando a confiança e afetando a irmandade entre os povos”.

 Boric, de 35 anos, é ex-líder estudantil e o presidente mais jovem da história de seu país. Sua vitória representa uma guinada à esquerda e rompeu com três décadas de alternância entre os partidos de centro desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet, em 1990. Por suas posições política, Bolsonaro se recusou ir à posse de Boric e enviou seu vice, Hamilton Mourão (Republicanos).

 Em “Laços de Confiança”, o livro que reúne notas sobre as suas atividades com os vizinhos da América do Sul, Amorim escreveu: “alguns temas são dominantes nas minhas anotações sobre o Chile. Ao longo de vários governos, sofreria dois tipos de atração: o modo liberal herdado de Pinochet impulsionaria Santiago a acordos de livre-comércio com países desenvolvidos, notadamente com os Estados Unidos. Isso, naturalmente, dificultava uma integração mais profunda, como a do Mercosul”. Ao mesmo tempo, prossegue, “os governos chilenos à época da Concertaciónbuscavam aproximar-se do Mercosul político”. E registrou também: “Em dois outros temas, que se desenvolveram em 2003/2004, o Chile revelou-se um parceiro valioso. Nas negociações da Rodada de Doha da OMC, o Chile integrou o G-20, liderado pelo Brasil”. Essa delicada tessitura foi urdida por Amorim, para manter a paz nas relações que Bolsonaro agora tenta destruir.

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