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Carlos Castelo

Jornalista, sócio-fundador do grupo Língua de Trapo, um estilo sem escritor

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Buarquiana privacidade

Chico Buarque (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
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Na agonia da ditadura, o general Newton Cruz promoveu um apagão em Brasília e, espada em riste, sentou petelecada em populares de todas as tendências e não-tendências que passavam à frente de sua cavalgadura.

Semanas depois, o jornalista Tarso de Castro lançava um suplemento jornalístico em São Paulo. Show do lançamento no “Avenida Danças”, em Pinheiros.

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Dando uma força para o valoroso homem de imprensa, Chico Buarque, Fagner, Dominguinhos e uma formação compacta do Língua de Trapo chamada “A outra banda da língua” (Paulo, Chico Caruso, o saudoso Lizoel, Laert e eu).

Dias antes, o cartunista Paulo Caruso me ligou encomendando uma letra sobre o apagão do general.

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Resolvi fazer logo cabelo, barba e bigode: compus a música também. O refrão era assim: “queremos luz! / queremos luz! / libera aí, seu Newton Cruz!”.

A ideia era cantá-la, fechando o evento, luz do teatro apagada e todos os artistas participantes segurando velas no palco. Uma irrefutável provocação ao regime militar.

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No dia do espetáculo, como eu sabia que ia cantar solo a música - e tenho pânico disso -, cheguei bem antes de todos no camarim.

Abro a porta e vejo um indivíduo de costas para mim. Ele estava indo à outra ponta da sala para se servir de uma garrafa que estava sobre uma mesinha.

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Encheu o copo com o vinho branco e se virou para mim. Era o Chico Buarque de Holanda. Sozinho no camarim do “Avenida”. Fiquei sem voz, é óbvio. E ele, pelo visto, também, surpreso por alguém estar invadindo sua buarquiana privacidade.

Levantamos as sobrancelhas um para o outro. E foi o máximo que deu para fazer.

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O autor de “Construção” começou a andar de um lado para o outro do comprido e estreito camarim. 

Parecia acuado. Entendi que era pela proximidade do show e fiquei na minha.

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O “Ardósia” andava, andava, colocava um pouco mais de vinho no copo e continuava no seu caminhar cabisbaixo.

Sentado, eu o olhava sem saber como agir. Ia falar o quê?

- Chicão, que letra aquela do malandro, hein?

- E o teu exílio na Itália, demais, cara!

- O Vinicíus bebia mesmo pra cacete?

Passaram-se 20 minutos.

Entra o outro Chico, o Caruso.

- E aí, Carlos? Taí com o Chico, é?

- …

Caruso, sentiu o drama de dois tímidos numa salinha, e disse:

- Esse é o cara do Língua de Trapo. O que fez a música do Newton Cruz.

O criador de “Com açúcar, com afeto” veio me apertar a mão, por fim. E falou:

- Ah, eu li! Muito boa, boa mesmo, sabia?

- Boa? Boas são as suas! – consegui dizer com a voz embargada, mas sem perder a piada.

Ficamos “nos elogiando” por uns momentos. Ele, com o papel amarrotado da minha letra na mão, dizendo que era muito difícil fazer rir em música. Depois Marieta entrou e tomou conta do assustado e ansioso Chico. Só fui vê-lo horas mais tarde. Quando eu cantava “Queremos Luz” no palco cheio de velas. O coral atrás de mim foi o mais VIP que tive na vida: Dominguinhos, Fagner, os irmãos Caruso e “os olhos verdes” cantando o refrão.

Moral da história: Chico de “backing-vocal” é para pouquíssimos.

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