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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

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Burguesia golpista

Não por acaso, são os setores econômicos que mais lucraram com as políticas e reformas do governo Bolsonaro que estão por trás das ameaças à democracia

Jair Bolsonaro (Foto: Reuters/Ueslei Marcelino)
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No dia 24 de agosto, dia que marca o aniversário do suicídio de Getúlio Vargas provocado pela burguesia neocolonial brasileira, o Estadão publicou um editorial contra a tentativa de golpe organizada por Bolsonaro et caterva para o dia 7 de setembro de 2021. O editorial chama a atenção para o fato de que os organizadores dos atos bolsonaristas propõem, abertamente, que os manifestantes devem ir dispostos a invadir o Congresso Nacional, bem como o Supremo Tribunal Federal (STF).

Vídeos e textos nas redes sociais propõem invadir ambas instituições para entregar seu controle às Forças Armadas. Os organizadores do ato ressaltam que querem invadir “pacificamente” o Congresso e o STF e não aceitarão que nada os impeça. “Pacificamente”, para “pacificamente” submeter dois Poderes da República às Forças Armadas, instituição que tem que submeter-se a esses Poderes, não controlá-los.

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O editorial do Estadão enfatiza que convocações e atos como esses não podem ser considerados como manifestação de pensamento ou expressão de opinião pública.

O editorial clama o Congresso e o Ministério Público Federal a agirem de maneira enérgica para conter e limitar as ações dos golpistas.

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O texto em questão mostra um racha na burguesia neocolonial golpista e explicita quais são os segmentos de classe que apoiam o governo e ameaçam a democracia brasileira.

Notícias amplamente divulgadas ao longo dos últimos dias dão conta de que grandes empresários ligados ao agronegócio, ao setor financeiro e a grandes redes de atacado e varejo estão financiando dois grandes atos no dia 7 de setembro. Um em Brasília, cujo objetivo é invadir o Congresso e o STF, e outro em São Paulo, cujo objetivo é apoiar um golpe de Estado. Não por acaso, são os setores econômicos que mais lucraram com as políticas e reformas do governo Bolsonaro que estão por trás das ameaças à democracia. Bolsonaro prometeu comparecer a ambos. Se o fizer é caso para sofrer pesadas sanções, se as instituições funcionarem.

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O agro recebeu licença para matar camponeses, envenenar a produção agrícola e se apropriar de terras devolutas ocupadas por incômodas florestas e outros biomas preservados, pronta e rapidamente incendiados com a complacência da Polícia Federal, das forças armadas e de todas agências públicas responsáveis por sua proteção. As agências de defesa do meio ambiente foram providencialmente desmontadas para que o agro possa movimentar-se à vontade. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), sob o controle do agro, expulsa camponeses de áreas reservadas para a Reforma Agrária, ao invés de nelas assentá-los. Lideranças indígenas, quilombolas e camponesas são assassinadas em suas casas, diante de todos os seus familiares. Milícias organizadas, armadas e mantidas pelo latifúndio agronegocista ou não, agem livremente, sendo formadas por grande contingente de membros do aparato policial que deveria reprimir este tipo de exército particular.

Verbas destinadas ao financiamento da agricultura familiar e ao pequeno produtor para a produção de alimentos são desviadas para financiar o agronegócio baseado no latifúndio e na produção mecanizada.

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O capital financeiro e rentista apropria-se dos juros pagos pelo governo que aumentam a dívida pública e resultam em mais transferência de dinheiro público para bancos e corretoras de investimento. Desta forma, dinheiro que deveria ser investido em políticas públicas de distribuição de renda e de apoio ao desenvolvimento da economia nacional enchem as burras de especuladores e rentistas.

A desindustrialização do país desviou capital do investimento produtivo para a especulação financeira comandada por bancos e corretoras vorazes. Não foi à toa que um dos sócios da XP Investimentos descontrolou-se diante da divulgação de mais uma pesquisa de intenção de votos para presidente da República que mostrou, mais uma vez, o ex-presidente Lula com folgada liderança. Como solução, tal personagem sugeriu que fosse alterada a metodologia da pesquisa. Ele prefere um relatório de pesquisa falso, que lhe assegure um sono tranquilo com a garantia de que continuará enriquecendo, do que um relatório que lhe cause pesadelos com a possível eleição de Lula que poderá acabar com a farra especulativa que lhe assegura enriquecimento rápido e ilimitado.

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Alguns setores do capital financeiro começam a manifestar descontentamento com o governo. Isso não significa que se a escolha recair sobre Lula ou Bolsonaro, estes setores não finjam tampar o nariz para neste votar novamente.

As grandes redes de atacado e varejo investem pesado no comércio digital e liberam mão de obra. Os poucos que restam trabalhando no chão de lojas e depósitos o fazem em troca de salários cada vez menores e jornadas de trabalho cada vez maiores, regulamentados pelas recentes reformas trabalhistas que, supostamente, deveriam gerar empregos.

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Agronegócio, capital financeiro e grandes redes de atacado e varejo locupletam-se com a renda transferida dos trabalhadores e trabalhadoras para empresas desses setores econômicos, renda que concentra-se ainda mais devido às políticas públicas voltadas para a liberação de mão de obra, formação de um exército de desempregados e extração de mais-valor absoluto.

No campo da mídia industrial há uma divisão. As revistas, tradicionalmente golpistas, apoiam Bolsonaro porque boa parte delas é controlada pelo capital financeiro que, como vimos, está nadando de braçada na atual conjuntura e deseja que nada mude. Outros grupos tradicionalmente golpistas como as Organizações Globo, Folha, Estadão, Valor não apoiam a intentona bolsonaristas. Estes grupos passam por uma crise profunda, resultado das práticas de baixo jornalismo que utilizaram nas últimas décadas. Eles mentiram, desinformaram e manipularam tanto que tornaram-se desnecessários. Se é para mentir, desinformar e manipular, qualquer um pode fazê-lo. Estes grupos tradicionais agora têm que competir com uma mídia alternativa de esquerda que abocanhou aquelas pessoas que procuram uma informação mais crítica e mais bem apurada. Os grupos de direita criaram suas próprias mídias que mentem, manipulam e desinformam da mesma maneira que os grupos de mídia tradicionais, só que divulgam aquilo que o governo Bolsonaro deseja e são agraciados com polpudas verbas pela realização deste trabalho sujo, verbas antes destinadas à mídia industrial.

Além das verbas de publicidade, outro fator que levou a mídia industrial de rádio e televisão a posicionarem-se contra o ou a favor do governo Bolsonaro são as renovações das concessões públicas para explorar esses serviços. Jair Bolsonaro já ameaçou várias vezes não renovar a concessão da TV Globo, carro chefe das Organizações Globo. Isso acontecendo, este grupo sofrerá um baque financeiro que pode decretar sua falência definitiva. Os irmãos Marinho não querem pagar para ver e apostam suas fichas no fim do governo Bolsonaro ou, pelo menos, na submissão de Bolsonaro às instituições republicanas, sobre as quais eles ainda detém muito poder.

Bolsonaro ataca nominalmente os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, o atual e o futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e não é sem motivo. Sua estratégia é criar um fato consumado para não aceitar a derrota que vislumbra nas eleições presidenciais de 2022. Acusa ambos de serem seus inimigos e de controlarem de seus escritórios os resultados eleitorais. Eles não aceitariam o voto impresso porque o voto eletrônico seria mais fácil de ser manipulado e fraudado. Se Bolsonaro perder as eleições não aceitará o resultado porque “só Deus o tira da Presidência” e se ele perder é porque houve fraude comandada por seus inimigos. Argumento tão absurdo que poderia sair da boca de uma criança. 

Bolsonaro não apresenta nenhuma prova que sustente seus argumentos contra o voto eletrônico. Não importa. Ele está falando para mobilizar o grupo de celerados que lhe devota apoio irrestrito.

O Congresso entrou na alça de mira bolsonarista ao recusar o voto impresso. Ao fazê-lo, eliminou um instrumento tido como fundamental pelas hostes bolsonaristas, necessário para aumentar a manipulação dos votos que assegurariam a reeleição de Bolsonaro em 2022.

Como venho alertando há alguns meses, Bolsonaro tem condições de dar um golpe. Tem quem o financie e tem o apoio armado das polícias e do baixo clero das forças armadas. Se conseguirá seu intento dependerá de como as forças democráticas – e as forças interesseiramente e momentaneamente democráticas - se mobilizarão nas próximas duas semanas. Se der o golpe, o que é possível, talvez não tenha condições de sustentá-lo.

Enquanto isso, o chamado “centro democrático” não consegue esconder a sua verve golpista. A prefeitura de São Paulo, sob o controle de um político ligado a esta corrente política, liberou a avenida Paulista no dia 7 de setembro para que manifestantes contra a democracia possam manifestar-se em paz contra Poderes constituídos da República. Nenhuma crítica da democrática mídia industrial a esta autorização, muito menos dos políticos do “centro democrático” que acham que esse tipo de liberação ocorre segundo a normalidade democrática.

O jogo está sendo jogado e, até agora, a equipe golpista apresenta-se em campo jogando de maneira mais organizada e com mais intensidade, pressionando a equipe adversária em seu próprio campo. Esta, por sua vez, por enquanto, ainda não consegue contra-atacar de maneira efetiva. O final do jogo aproxima-se e teremos que ficar atentos aos próximos lances e participar ativamente das ações em defesa da democracia ou, se isso não for possível, de ações de contra-ataque às forças autoritárias. 

P.S.: Precisamos defender uma reforma constitucional que substitua o impeachment, instrumento utilizado pela burguesia neocolonial para retomar o controle do poder, pelo recall, instrumento que coloca nas mãos do povo a destituição daqueles que ele mesmo elegeu.

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