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Flávio Barbosa

Cronista, psicanalista

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Cala a boca já morreu

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As palavras têm peso. Quando são emitidas produzem efeitos, para mais ou para menos, mas produzem. Podemos comparar o peso da palavra dita com a metáfora de uma pedra arremessada, que, em assim sendo, não tem volta. A depender da direção e do alvo desse arremesso ela, a pedra, pode ferir alguém com gravidade. Mas sabemos que o problema não é a pedra em si, mas quem a arremessou e com quais intenções. Já com as palavras ditas, não são diferentes.

Convenhamos, o arremesso da pedra pode ter sido involuntário, ou seja, não tinha a intenção de atingir alguém, porém, ao se arremessar a pedra assumiu-se o risco de que poderia atingir alguém, mesmo um animal, portanto uma vida, enfim.

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Claro, estou me valendo de uma metáfora, afinal, a palavra não é uma pedra como signo (coisa), mas pode ser como significante, pois ao se designar um objeto por pedra se está nomeando o objeto, logo, apreendendo-o na ordem significante, a saber, no campo da palavra.

A literatura é um prodígio nesses manejos porque ela subjetiva as coisas, ela indica às coisas que possam ser sujeitos no sentido de nossas vidas, por exemplo, num poema de Carlos Drummond de Andrade, ele dizia (...) “Havia uma pedra no caminho / No caminho havia uma pedra” ... A pedra aí indica os obstáculos da vida, que todos temos. A pedra, no caso deste poema, se encontra não simplesmente coisificada, mas subjetivada, ela é o sujeito da oração, e ela é uma maneira de dizer de acontecimentos em nossas vidas. Portanto, não é apenas um signo, mas um significante, que são palavras que se encontram com outras palavras a produzir sentidos. A produzir metáforas, metonímias, sinédoques, parábolas.

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Lembro, por outras razões, de uma Senhora altiva, dona de si, adoradora das frases de efeito que tanto agradavam a uma certa mídia que não perdia tempo quando alguma notícia de peso que se queria repercutir, recorria a essa Senhora, que, sempre solícita a essa mídia, não perdia o pejo.

Era um espetáculo ouvi-la. 

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E ela sabia disso muito bem, e no alto de sua posição dignitária não perdia o verso, dito, com ares graves para dar mais vitalidade à oração e, claro, produzir seus ecos e efeitos. Então, num certo dia tumultuado de nossa república, os microfones e câmeras lhe procuraram na ânsia de mais uma frase emblemática, e ela não decepcionou, e declarou aquela que seria quase uma tatuagem ao seu ser. Ela disse (...) “Cala a boca já morreu!”

Desde então ouvir essa frase era como reter na memória a imagem dessa Senhora a pronunciá-la. A expressão colou na imagem dela, uma e outra coisa pareciam a mesma coisa. E a intenção dessa frase era a de dizer sentenciosamente que o Mal não seria ignorado e tolerado pelas autoridades desse país. Era a expressão líquida e certa do triunfo do Bem contra o Mal, e ali com a precisão calibrada no timing certo de o que representava o Bem e o que representava o Mal neste país. Logo, era um recado de endereço certo.

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As frases dessa Senhora, e particularmente essa frase, sugeriam a ascendência moral dela e dos seus pares, da sua classe, da sua gente sobre o que ela e eles entendiam por marginal, por fora-da-lei. Enquanto isso o Brasil vibrava ao ouvir tais sentenças, lógico, sendo essas sentenças devidamente instrumentalizadas por essas mídias que propositadamente recorriam aos discursos cáusticos e certeiros, quase sempre, dessa Senhora, para os seus devidos fins.

Mas as palavras, elas são as massas produtoras das metáforas e de outras figuras de linguagem, e aí eu vou me valer de uma outra metáfora, a saber, a “palavra emitida possa seguir um voo de bumerangue”, ou seja, ela vai pro lado de lá, mas volta pro lado de cá. Volta precisamente para quem a emitiu. É uma metáfora, mas observem como as metáforas têm um grande valor explicativo das coisas e, ademais, como elas possam produzir grandes reviravoltas em seus efeitos e, desse modo, voltar-se contra o seu emissor.

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Não seria o caso, Dona Cármen?

Suponho que de agora em diante essa altiva Senhora vai se lembrar cada vez mais de cada frase que pronunciou em momentos que calculou estar levando grandes vantagens. Momentos em que se entusiasmou com as luzes da ribalta lançadas sobre ela, e se embriagou nas orações que proferiu sem perceber que pudesse estar a se exceder nelas. Não se deu conta do porre dos efeitos das palavras que poderiam vir nos dias seguintes, quando os tempos fossem outros. Agora, aquelas palavras ditas como pedras atiradas nos alvos certos, voltam contra si mesma, tal um bumerangue. E voltam contra aqueles, na mídia, que imaginavam estar dizendo grandes verdades apoiados nos juízos e nas orações sentenciosas daquela Senhora.

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Especialmente aquela oração, que repito pela estética dela: “Cala a boca já morreu!” A sua sonoridade tornar-se-á ruidosa a certos ouvidos sensíveis. Ouvi-la mais do que nunca faz-nos remeter a certos acontecimentos ignóbeis, ali já previstos por vozes sóbrias e desapaixonadas, mas que o orgulho, a vaidade que sabemos produzir cegueiras, não quiseram se atentar a tempo. 

É certo que não é do nosso propósito estigmatizar quem quer que seja, nem ela, Dona Cármen, mas se a evocamos foi para lembrar a todos nós o peso daquilo que a gente diz e o valor da hipocrisia que possa haver em nossas palavras enunciadas em tempos de furor errático. Em tempos de guerra suja.

E, sinceramente, aquela Senhora percebendo ou não os cenários em que fez sua figuração, se esmerou nisso. Ela foi a porta-voz do lugar e de um empreendimento discursivo que se autorizavam a dar sonoridade a uma das mais operosas maledicências já armadas nesse país. E digo-lhes: hipocrisia é apenas um termo suavizado para definir o que de fato foram esses acontecimentos.

Agora, pega em inconfidências, vê-se que essa Senhora, talvez, não fosse apenas uma entusiasta inocente, uma inocente útil, mas parte – consciente e/ou inconsciente -- de um grande arranjo; oneroso demais para este país. Uma situação tal que já é considerada por grandes juristas nacionais e internacionais como o maior crime da Justiça e do Sistema de Justiça mundial na contemporaneidade.

Evidente que não vamos cometer o erro do pré-julgamento; não vamos desconsiderar o direito de ampla defesa que operosamente foi defenestrado neste país pelos praticantes de um regime de horrores, velado ou não tanto assim, que se vem tentando naturalizar aqui no Brasil.

Portanto, nesse momento de mudança de ventos e de direções, é hora de cobrarmos os efeitos das palavras e dos atos, as responsabilidades de cada qual, a Verdade (por muito tempo soterrada nos escombros); tempo em que essa Senhora bailava como venturosa frasista em seu tablado armado pela mídia empresarial.

Pois é, Dona Cármen, é hora de evocar a frase dita com espírito pela Senhora, por razões outras, não as suas, àquelas ocasiões, que esperamos a Senhora possa doravante refletir melhor sobre elas; mas concordo que mais do que nunca a frase aludida ganhou de fato a sua ocasião e eu a pronuncio, quase aos gritos: 

“Cala a boca já morreu!!!!!”

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