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George Torres Barbosa

Advogado concursado da Petrobrás de 1990 a 2021. Foi presidente do Conselho de Administração da Termomacaé Ltda., conselheiro da UEG ARAUCÁRIA e diretor financeiro da Baixada Santista Energia SA. É especialista em direito ambiental e LL.M. em direito corporativo

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Captura travestida de governança corporativa

"A PPI tem base em normas internas de governança da Petrobrás. Todas essas normas são passíveis de alteração", explica George Torres Barbosa

Sede da Petrobras no Rio (Foto: Sergio Moraes - Reuters)
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As regras de governança corporativa da Petrobrás, estabelecidas pelo seu Conselho de Administração na era FHC, impediam a assunção da presidência por José Eduardo Dutra, então senador da República Federativa do Brasil, mas que houvera iniciado sua vida profissional como geólogo concursado da Petromisa, subsidiária da Petrobrás criada pelo governo Geisel para extração de cloreto de potássio (vital para a agricultura), que seria extinta no início do governo Collor, juntamente com a Interbrás, a comercializadora internacional do Sistema Petrobrás, pioneira na abertura de mercados para exportação de uma variada gama de produtos nacionais e, também, sofisticados  serviços da engenharia brasileira, em sinergia com a atuação da Petrobrás no Oriente Médio. Um dos maiores êxitos exploratórios da história mundial do petróleo, foi protagonizado pelo geólogo Guilherme Estrella, liderando equipe da subsidiária Braspetro, na localidade iraquiana de Basra, em 1975, quando foi descoberto o campo gigante de Majnoon. Aquela foi a maior descoberta de petróleo por muitas décadas, até que o mesmo Guilherme Estrella pudesse confirmar a existência do pré-sal (óleo leve), uma antiga tese dos nossos geólogos, em setembro de 2007, já como diretor de Exploração e Produção-E&P da Petrobrás, apoiado em uma decisão política do governo Lula de buscar a autossuficiência brasileira em petróleo, investindo o que necessário fosse naquela nova fronteira, situada a 300 km da costa e 7.600 km de profundidade. Tal descoberta se deu em uma área que antes estivera concedida à Shell, na bacia de Santos, em consonância com a orientação vigente no governo FHC de que a Petrobrás ficasse confinada, apenas, à bacia de Campos produzindo e depletando os campos dos pós-sal (óleo pesado) já descobertos, sem buscar novas reservas em outras bacias promissoras para que as majors do petróleo corressem o risco exploratório. Porém, em 2001, a Shell desistiu sem lograr desenvolver as tecnologias necessárias àquela formidável descoberta, cujos riscos e incertezas depois viriam a ser assumidos, integralmente, pela Petrobrás, culminando na descoberta do pré-sal no ano de 2006. A relevância geopolítica do pré-sal levaria os Estados Unidos a reativar, por razões “humanitárias” a sua Quarta Frota Naval, em 24 de abril de 2008, dedicada ao Atlântico Sul, que  estava desativada desde 1945, quando do final da Segunda Guerra Mundial. 

Ainda em 2003, no início do governo Lula e da gestão Dutra instaurou-se uma política industrial de índole nacionalista, segundo a qual “O QUE PODE SER FEITO NO BRASIL, TEM QUE SER FEITO NO BRASIL”, revertendo a decisão de produzir as plataformas P-51 e P-52 em Singapura, tomada na era FHC, com o fito de economizar meros 5%, sacrificando a geração de empregos pela engenharia naval brasileira e a indução do desenvolvimento nacional. A opção brasileira devolveria muito mais à Petrobrás, do que os míseros 5% do preço daquelas plataformas pois dinamizaria diversos setores econômicos articulados com a engenharia naval e construção pesada nacionais, setores que são grandes consumidores de combustíveis e lubrificantes. Setores que foram precursores do soerguimento da economia nacional daquele coma induzido em que se encontrava desde a era FHC. Tal inflexão gerou milhões de empregos qualificados, fortalecendo o mercado interno que, também, demandaria derivados de petróleo refinados pela Petrobrás. Sem essa simbiose com a engenharia nacional, e com o nosso mercado interno, a Petrobrás seria um gigante com pés de barro, negando a razão mesma da sua criação por Getúlio Vargas, em 1953, para que o Brasil superasse severa restrição de energia impeditiva do projeto de desenvolvimento nacional. 

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Assim como a floresta amazônica tem a sua exuberância ímpar nutrindo-se, apenas, da manta de material orgânico em decomposição que dela própria e da fauna caem, formando a liteira serrapilheira sobre um solo arenoso e pobre, a Petrobrás cresceu provendo energia ao nosso mercado interno, em toda a extensão do território nacional, a preços adequados à população e à remuneração da Petrobrás. Quebrar esta ciclo virtuoso, impulsionado pelo monopólio constitucional do petróleo (o primeiro estágio do foguete), que deu horizontes para expansão contínua e sustentada da Petrobrás seria tão devastador para o Brasil quanto o são o desmonte do complexo IBAMA/ICMBIO/FUNAI e as queimadas que levam à savanização irreversível da Amazônia.  Almejando a perenidade,  a Petrobrás  investiu mais de 240 milhões de dólares norte-americanos para confirmar a existência do pré-sal, que foi alcançado em 30 de março de 2006,  a 7.600 metros de profundidade e a 300 km da costa, concretizando a maior descoberta mundial dos últimos 50 anos, graças aos esforços dos geólogos e engenheiros liderados, uma vez mais, pelo agora  diretor de Exploração & Produção, Guilherme Estrella, retirado por Lula da sua aposentadoria na idílica Nova Friburgo na qual se dedicava à militância na Articulação de Esquerda do PT e a torcer pelo seu Botafogo (paixão comum à Dutra). Este marco memorável, da descoberta do pré-sal, se daria já na gestão do presidente José Sérgio Gabrielli, responsável pelo maior aumento de capital da história do capitalismo, realizado em setembro de 2010, na bolsa de valores de São Paulo, não foi tocando sininho na bolsa de Nova York. Em virtude disso, o capital social da Petrobrás passou de R$ 85.108.544.378 para R$ 200.160.863.468,80, superando o, até então, maior aumento de capital feito em todo o mundo pela estatal japonesa NHK WORD JAPAN. Com essa operação, a Petrobrás lançou novas ações no mercado, amealhando recursos financeiros destinados à ampliação dos seus investimentos, sobretudo, aqueles necessários à exploração do pré-sal que hoje responde por 72% da produção total da Petrobrás. Mas, também, a transição energética (mirando o ponto de mutação para economia descarbonizada) tal como formulada pelo físico nuclear e engenheiro Ildo Sauer, quando esteve à frente da diretoria de Gás & Energia da Petrobrás, no primeiro mandato de Lula da Silva. 

Para que se iniciasse toda esta viragem histórica, a partir do ano de 2003, aproando a nau da Petrobrás no rumo da soberania nacional, com inclusão social, foi necessário revogar uma resolução do antigo CA da Petrobrás. Segundo aquela norma interna, o presidente da estatal deveria ter, dentre outros predicados, trânsito e reconhecimento perante o mercado financeiro e, também, junto às congêneres da Petrobrás, bem como às suas fornecedoras e demais públicos de interesse (stakeholders). Tais requisitos tangenciavam uma zona cinzenta entre a falta de decoro por mera promiscuidade e a exortação, ou apologia, ao crime tipificado como advocacia administrativa. Tudo isso remetia à prática definida na literatura norte-americana como revolving doors ou portas giratórias. Anos depois, com os investimentos advindos do aumento de capital da Petrobrás em 2010, abrir-se-iam os caminhos para uma trajetória venturosa de crescimento e verticalização (do poço ao posto e ao poste), com liderança na inovação tecnólogica (construção de poços no pré-sal e biodiesel por exemplo), reconhecida mundialmente. Essa rota de pujança e confiança nos destinos do Brasil, renderia frutos em várias frentes, inclusive  ao atingimento do recorde mensal de produção no pré-sal, em janeiro de 2022, com 2,06 milhões de barris de óleo equivalente por dia boed; e recorde trimestral, 2,03 milhões de boed. Esse volume representou 72% da produção total da Petrobras, no primeiro trimestre de 2022, originando lucros exponenciais de 44,561 bilhões de reais, que alçaram a Petrobrás ao patamar de empresa mais lucrativa do setor petrolífero em todo o mundo no ano de 2022, distribuindo dividendos exorbitantes em detrimento de reinvestimentos nela própria, por força da captura dos destinos da empresa pelos acionistas “minoritários” que, a partir do governo Temer, imprimem uma visão financeira de curto prazo sem compromisso com a perenidade da empresa e, nem tampouco, com os demais públicos de interesse (stakeholders) na disputa da renda petroleira. Sob a gestão do professor da UFBA, o economista José Sérgio Gabrielli, a Petrobrás havia estabelecido o objetivo de ser reconhecida como a favorita dentre todos os seus públicos de interesse: os consumidores; os seus fornecedores; os seus investidores; os seus empregados; os seus financiadores; os entes federados da República Federativa do Brasil (com a celebração de convênios com tais entes, além da percepção de royalties e impostos); as comunidades em que a Petrobrás tem seus estabelecimentos sediados, mediante ações de responsabilidade social (na forma do artigo 154, parágrafo 4 da lei das S/A); do mundo dos esportes e das artes nacionais vinculados historicamente à imagem da Petrobrás, tudo isso na perspectiva de se manter um relacionamento equilibrado e harmonioso com todos os stakeholders. As diretrizes governamentais emanadas dos governos Temer e Bolsonaro vão privilegiar, exclusivamente, os acionistas minoritários, sequestrando a empresa para a financeirização de curto prazo.  Après moi, deluge, como teria dito o rei Luís XV, ao perceber que a monarquia estava prestes a ruir. Tais governos que calvagaram uma espécie de XVIII de Brumário tupiniquim, iniciaram um profundo desmonte da Petrobrás enquanto empresa integrada que era do poço ao posto e, até mesmo, ao poste em virtude do seu parque de geração termoelétrico contando com várias usinas termelétricas UTEs; das suas 13 pequenas centrais hidroelétricas (Brasil PCH) em Minas Gerais; da usina fotovoltaica situada na UTE Jesus Soares Pereira; do parque eólico de Mangue Seco com as 4 usinas do parque eólico de Mangue Seco, todas no Rio Grande do Norte. A UTE Jesus Soares Pereira teve seu nome dado em homenagem ao chefe da equipe econômica de Getúlio Vargas, duranteo  governo democrático de 1950 a 1954, integrada por luminares da estatura de Ignácio Rangel e Rômulo Almeida, responsáveis pela formulação do Brasil moderno alicerçado na criação da Eletrobrás, da Petrobrás, do BNDES, e no trabalhismo, definido por Thomas Skidmore como uma mistura de bem estar social, atividade política da classe operária e nacionalismo econômico. Quando o presidente Getúlio Vargas acordava durante a madrugada, no Palácio do Catete, notava sempre uma luz acesa no primeiro andar. Em uma dessas madrugadas notívagas, movido pela curiosidade, desceu de seus aposentos para ver o que acontecia no andar de baixo. Surpreendeu-se ao se deparar com seus quatro assessores entregues ao trabalho, infatigáveis como se estivessem no horário de expediente e, então,  disse-lhes Getúlio Vargas: “Vocês são uns boêmios cívicos”, dirigindo-se a Cleantho de Paiva Leite, Ignácio Rangel, Jesus Soares Pereira e Rômulo Almeida, seus assessores devotados, diuturnamente, aos debates intelectuais e formulações jurídico-administrativas que moldariam o Brasil industrializado, senhor soberano de seus recursos naturais em prol da justiça social preconizada pelo trabalhismo.

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A desverticalização da Petrobrás, na contramão de todas as empresas de petróleo foi intensificada a partir de 2016, com o fatiamento e desmonte de suas participações na área de fertilizantes, gasodutos, campos de petróleo, com a venda da BR Distribuidora e da inovadora Petrobrás Biocombustíveis PBIO, além de 3 refinarias (das 8 que se quer vender), as quais darão origem à hediondos monopólios privados em cada região de atuação, sempre por valores questionáveis. Tais desinvestimentos deram lugar à transformação destes ativos em dividendos, de modo semelhante ao fenômeno biológico do catabolismo, sob o comando dos interesses de “acionistas minoritários”, porquanto de um lucro de 106 bilhões de reais, em 2021, a alta gestão da Petrobrás distribuiu mais de 101 bilhões de reais, o que não tem precedente em nenhuma gestão de quaisquer outras empresas, pública ou privadas, em tempo algum. A direção da Petrobrás reteve, apenas, 5 bilhões de reais, o que revela o intuito deliberado de encolher a empresa e, no limite, fazê-la desaparecer à míngua de reinvestimentos. A distribuição de dividendos mínimos legais é de 25%, conforme a lei das S/A, caso o Estatuto da sociedade não dispuser em menor percentual, a teor do artigo 202, parágrafo segundo, da lei 6.404/76, a Lei das Sociedades Anônimas. Neste dispositivo legal está a chave para coibir futuras distribuições de dividendos abusivas como aquela de 2021, em que foram destinados 101 bilhões sobre um lucro de 106 bilhões de reais, evidenciado a captura da empresa pelos acionistas minoritários e contratando, inexoravelmente, o encolhimento da Petrobrás, senão mesmo a sua morte no médio prazo. 

Segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), durante o governo Bolsonaro, entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2022, já foram vendidos 62 ativos da Petrobrás, no valor de US$ 33,9 bilhões de dólares norte-americanos, aproximadamente R$ 170 bilhões de reais. Remanescem 34 ativos da Petrobrás à venda. Em um recorte estatístico, que compreende períodos dos governos Dilma Rousseff (janeiro de 2013 a maio de 2016), Michel Temer (junho de 2016 a dezembro de 2018) e Jair Bolsonaro (janeiro de 2019 a fevereiro de 2022), a pesquisa do Dieese mostra que a Petrobrás chega em 2022 havendo concluído a venda de 93 ativos, sendo 79 deles no Brasil e 14 no exterior, como as refinarias de Pasadena e Okinawa, arrecadando US$ 59,8 bilhões, aproximadamente 307 bilhões de reais, considerando dólar comercial de 17 de junho de 2022, cotado a 5.144 reais. “Do total de ativos privatizados, 67%, o foram no governo Bolsonaro”, conforme relata o economista do DIEESE, Cloviomar Cararine. Obra prima da intrusão de quintas colunas na alta administração da Petrobrás, no melhor estilo do que se costuma chamar na literatura norte-americana revolving doors. 

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Um caso exemplar de revolving doors é o do ex-presidente da Petrobrás (janeiro de 2019 a março de 2021), Roberto Castello Branco, hoje na presidência do Conselho de Administração da 3R Petroleum, empresa privada do setor de petróleo e gás. A 3R vem comprando ativos da Petrobras desde 2019, quando Castello Branco presidia a companhia, em claro conflito de interesses pois aquele CEO da Petrobrás comandou a venda dos ativos da estatal para a 3R Petroleum, que saiu do zero em ativos para hoje deter 100% dos polos petrolíferos  de Areia Branca, Pescada Arabaiana, Macau e Potiguar (Rio Grande do Norte), além dos polos Fazenda Belém (Ceará), Rio Ventura e Recôncavo (Bahia). Na região Sudeste, também se apoderou de 70% do polo de Peroá, no Espírito Santo, e 62,5% do polo Papa-Terra, na bacia de Campos, no Rio de Janeiro. Essas negociações entre a Petrobrás e a 3R Petroleum movimentaram cerca de R$ 3 bilhões de reais, durante os dois primeiros anos do governo Bolsonaro, quando Castello Branco dirigia a Petrobrás. Tudo isso de acordo com matéria do Correio Braziliense, publicada em 04/04/2022, sob o título “Petroleiros dizem que indicação de Castello Branco é favorecimento”. Castello Branco não é o primeiro ex-dirigente da Petrobrás a ganhar um cargo na 3R Petroleum. Hugo Repsold Jr., ex-diretor executivo de Desenvolvimento da Produção e Tecnologia da Petrobrás, ocupa, desde março de 2021, o cargo de diretor corporativo e de Gás & Energia na mesma empresa. Além de Castello Branco e de Hugo Repsold Jr., na 3R Petroleum, outros ex-dirigentes da Petrobras e da Agência Nacional do Petróleo (ANP) também trocaram seus cargos públicos por cargos em companhias privadas do mesmo setor, como  o engenheiro egresso da Petrobrás, Décio Oddone, também ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP), entre dezembro de 2016 e março de 2020, e Anelise Lara, ex-diretora de Refino e Gás Natural da Petrobras (entre janeiro de 2019 e março de 2021). Décio Oddone foi presidente da subsidiária internacional da Petrobrás na Bolívia, durante a era FHC, depois se tornou diretor da ANP e hoje é diretor-presidente da Enauta, empresa de produção e exploração com atuação em quatro regiões do Brasil. Já Anelise Lara integra o conselho consultivo da Ipiranga. Ambas as empresas negociaram intensamente com a Petrobras no período em que Oddone e Lara ocupavam cargos na ANP e na estatal, respectivamente. Observo, por oportuno, que o decoro é a estética do comportamento ético conforme a lapidar definição do jusfilósofo Alysson Leandro Mascaro, professor emérito da Faculdade de Direito da USP, do venerável Largo de São Francisco.

Em 24 de março de 1999, às instâncias do presidente Fernando Henrique Cardoso, o estatuto da Petrobrás foi modificado para que o banqueiro Henri Philippe Reichstul, cidadão francês, chegasse à presidência. O estatuto vigente àquela época impedia a posse de estrangeiros na presidência da Petrobrás. Sem desdouro algum à cidadania francesa, o fato é que o estatuto da Petrobrás foi modificado para permitir a posse daquele banqueiro francês que, ao lado de João Sayad e Francisco Vidal Luna, houvera fundado o banco SRL Projetos S/C Ltda., instituição financeira de destacada atuação junto ao deus mercado, desempenhando atividades de tesouraria e operações junto à grandes empresas em associação com o Manufacture Hannover. 

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A gestão Reicshtul se notabilizaria pela tentativa frustrada de mudar o nome da estatal para PetroBrax, ao custo, nada módico, de R$ 700.000,00 (valor nominal em reais da época) e, mais grave ainda, pela criação de um fosso abissal entre a remuneração do quadro técnico da Petrobrás e os detentores dos cargos de gestão. Esta cunha foi introduzida com êxito, escancarando as portas para a exacerbação do individualismo arrivista como nunca existira antes na cultura da companhia. Assim, pavimentou-se o caminho para a ascensão gerencial dos que, pressurosamente, aceitassem viabilizar as idiossincrasias dos poderosos de ocasião, mesmo em detrimento de um dos objetivos primaciais de todos organismos, qual seja a sobrevivência do órgão a longo prazo. Uma seleção natural às avessas na qual vicejam os menos comprometidos com a perenidade da empresa, catequisados na escola do curto prazo que lhes estimula a garantir o seu bônus, a qualquer preço, inclusive com a prática reiterada de assédio moral sobre seus subalternos e ataques urdidos permanentemente contra os planos de previdência complementar PETROS e de autogestão de saúde AMS, estes últimos desencadeados contra todas as estatais, indistintamente, pela Resolução CGPAR 23/2018, em boa hora derrubado por Decreto Legislativo 342/2021 de autoria da deputada Erika Kokay, ex-bancária da CEF. Todas essas agressões desestabilizariam o ambiente de trabalho cooperativo, e o saudável esprit de corps, motivo da Petrobrás haver se tornado um objeto de desejo dos jovens concursandos, outros stakeholders para os quais a Petrobrás pretendia ser a favorita durante os governos do PT, não apenas dos fundos gestores de ativos como a BlackRock que administra 10 trilhões de doláres norte-americanos. A BlackRock gere um montante superior ao PIB de muitos países juntos. Consequentemente, o seu poder de pressão é inimaginável. 

A financeirização se alastraria vertiginosamente devido à venda dos American Depositary Recipt ADR, por meros 5 bilhões de dólares, levada a cabo por FHC na bolsa de Nova York, implicando redução do capital Petrobrás, em mãos da União, de 80 % para 39,8 %. A partir dessa venda de aproximadamente 40 por cento do capital da Petrobrás, os detentores de ADRs nos EUA passam a influir decisivamente sobre os destinos da empresa mais estratégica do Brasil que hoje tem valor de mercado superior a 462 bilhões de reais. Outra consequência funesta foi submeter a Petrobrás aos ditames da legislação estadunidense, dando proeminência, também, aos órgãos governamentais dos EUA, não só a SEC mas o DOJ e, clandestinamente, a CIA.  Os minoritários detém a maior parte das preferenciais (PETR4) na composição societária da Petrobrás, o que lhes permite receber muito mais dividendos do que a própria União, embora esta permaneça com o controle acionário por ter mais do 50% mais uma acão do capital votante que se compõe das ações ordinárias nominativas (PETR3).

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A venda dos ADRs, por meros 5 bilhões de dólares, deu azo à intrusão de acionistas estrangeiros e dos famigerados fundos abutres, no âmago da governança corporativa da Petrobrás, mediante acordos de acionistas com cláusula de confidencialidade, o que a meu juízo não se coaduna com natureza jurídica de uma sociedade de economia mista. Hoje, dos 11 conselheiros de administração, a União tem apenas 7, o que não faz tanta diferença quando se tem um governo jungido à cartilha privatizante de Paulo Guedes. Isso evidencia a deletéria atuação da alta direção, juntamente com os gerentes de menor escalão, oriundos daquela reestruturação do plano de cargos e salários concebida por Reichstul, e outras subsequentes, privilegiando a visão de curto prazo e motivados pela expectativa de receber um polpudo PPP, que os empregados chamam jocosamente de subornus. O PPP, ou Programa de Prêmio por Performance, é nova técnica de captura que, aliás, está na alça de mira do Ministério Público do Trabalho pois fere frontalmente a isonomia inerente a tradicional Participação em Lucros e Resultados PLR, que é linear e isonômica por força de lei.  Reichstul protagonizaria, ainda, uma desastrosa troca de ativos entre a Petrobrás e a multinacional espanhola Repsol. Naquela troca de ativos, a estatal brasileira cedeu postos da BR distribuidora no Brasil, avaliados em 60 milhões de dólares; 30% da Refinaria Alberto Pasqualini, em Canoas RS; participação de 10 % no campo de petróleo de Albacora Leste, na bacia de Campos; transferências de 40.000 metros cúbicos de óleo por mês. Em troca, a Petrobás recebeu, apenas, 735 postos de gasolina argentinos, uma refinaria de 30.500 barris por dia, dois terminais com capacidade de 3000.000 metros cúbicos, uma fábrica de asfalto e uma de lubrificantes. Além do evidente desequilíbrio, verificou-se uma perda cambial de R$ 792 milhões (valor nominal de 2001), decorrente da desvalorização do peso argentino, que desabou logo após o fechamento do negócio. A permuta foi consumada, apenas, dois dias antes da queda do ex-presidente Fernando De La Rúa, quando o risco Argentina batia 5 mil pontos e todos os investidores externos abandonavam o país. 

Como aquele negócio envolveu uma troca de ativos avaliados em US$ 500 milhões de cada lado, quando o peso ainda valia um dólar (fruto das relações carnais de Menem com os EUA), houve um impacto devastador para a Petrobrás, o que era previsível para qualquer homem probo e ativo já que a Argentina chegou a ter 3 presidentes em uma só semana, culminando com a fuga rocambolesca do último dos 3 presidentes argentinos, saindo de helicóptero da Casa Rosada. Qualquer pessoa que estivesse em seu juízo perfeito poderia antever um desfecho nefasto para aquela negociação entabulada em circunstâncias nebulosas. Mais previsível ainda pelo fato de o negócio ter sido fechado quando Reichstul já estava demissionário da presidência e às vésperas da mega desvalorização cambial do peso argentino. Aquela gestão da Petrobrás, que tinha Pedro Parente na presidência do Conselho de Administração, tratou a perda dos R$ 792 milhões candidamente. A empresa afirmou que não houve prejuízo contábil no negócio. Isso porque os ativos que a Petrobrás cedeu à Repsol estariam registrados a R$ 147,5 milhões. Em contrapartida, os postos argentinos que a Petrobrás recebeu foram incorporados no balanço por R$ 1,4 bilhão. A diferença, de quase R$ 1,3 bilhão, absorveria, segundo a gestão Reichstul/Pedro Parente, os impactos gigantescos da maxidesvalorização do peso argentino. Tal explicação não é convincente pois o fato de inexistir prejuízo contábil não quer dizer não haja um prejuízo econômico no mundo real. 

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Até hoje tramita uma ação popular (2001.71.12002583-5/RS) ajuizada pelo SINDIPETRO de Canoas-RS buscando reparação em face de Reichstul e os demais dirigentes, 17 réus ao todo, inclusive Pedro Pullen Parente que exercia a presidência do Conselho de Administração da Petrobrás, durante o governo FHC, quando era o poderoso czar do apagão de 2001 e mentor do funesto Plano Prioritário de Termoeletricidade PPT.  O malsinado PPT obrigava a Petrobrás a subsidiar gigantes da área de energia como a Enron, El Paso, EletroBolt, Repsol e inúmeras outras, com gás natural abaixo do valor de mercado para que elas construíssem termoelétricas e depois vendessem energia elétrica para a própria Petrobrás por preços estratosféricos decorrentes da severa estiagem que elevou brutalmente o preço da geração de energia pelas termoelétricas. 

Até mesmo quando as usinas termoelétricas não geravam eletricidade a Petrobrás era obrigada a pagar os preços exorbitantes pela energia inexistente, ao que se convencionou chamar rentabilidade garantida (Cláusula Marlim) como forma de incentivar aquelas transnacionais a construir usinas termoelétricas, segundo o fatídico PPT concebido pelo Czar do Apagão, resultando em uma transfusão de sangue às avessas em um claro subsídio da sociedade brasileira exangue para potentados estrangeiros aquinhoados com as benesses e magnânimos subsídios do Plano Prioritário de Termoeletricidade PPT. A herança maldita do PPT daria um trabalho hercúleo ao ex-diretor de Gás & Energia da Petrobrás, Ildo Sauer, no período de 2003 a 2007, para mitigar os prejuízos bilionários decorrentes da implementação do PPT, sob a égide do Czar do Apagão, como se pode deprender da leitura atenta dos balanços patrimoniais da Petrobrás impactados pelo PPT. Foram necessárias negociações exaustivas, arbitragens internacionais e, algumas aquisições das usinas termoelétricas que davam prejuízos bilionários à Petrobrás, para que tais subsídios não continuassem onerando excessivamente a Petrobrás devido ao regramento do PPT, sobremaneira a cláusula de rentabilidade garantida que produzia um claro desequilibrio económico-financeiro nos contratos, contra os quais o ex-diretor de Gás & Energia da Petrobrás, Ildo Sauer, se bateu obstinadamente como um Dom Quixote até estancar aquela sangria engendrada pelo Czar do Apagão.

 

Pedro Parente, o Czar do Apagão voltaria à Petrobras, com o governo Michael Temer, surfando os desdobramentos do golpe permanente inaugurado com as pedaladas imaginárias e o lawfare praticado contra Luís Inácio Lula da Silva. Então transmudado em feroz opositor de subsídios, o Czar do Apagão voltou a considerar subsídio como o anátema que é para os neoliberais e instaura a Política de Paridade Internacional PPI, como se a Petrobras não estivesse produzindo perto de 3 milhões de barris diários e não tivesse, ainda, 13 refinarias no Brasil aptas a processar mais de 80 % dos derivados demandados pelo nosso mercado interno. Essa crudelíssima PPI (custo do derivado nos EUA mais frete marítimo e incidência do adicional de frete marítimo, acrescido do seguro da carga e custo de internação da mercadoria) foi instaurada para massacrar o consumidor brasileiro e enriquecer indevidamente os “acionistas minoritários” e detentores de ADRs nos EUA em detrimento da segurança energética nacional. 

A PPI não decorre da legislação, como tem propalado alguns analistas de mercado e ilustres jornalistas. A PPI tem base, exclusivamente, em normas internas de governança corporativa da Petrobrás, insertas em seu Estatuto e nas Resoluções do Conselho de Administração. Portanto, todas essas normas são passíveis de alteração no âmbito da própria Petrobrás sem contrariar a legislação vigente. A única vedação legal clara e objetiva que existe em todo o nosso ordenamento jurídico é aquela constante do artigo 36, inciso XV, da lei 12.529/2011 (Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência), cujo teor é o seguinte “vender mercadoria ou prestar serviços INJUSTIFICADAMENTE abaixo do preço de custo”. Embora se tenha imputado responsabilidade à Guido Mantega e Graça Foster, durante o governo Dilma Roussef, por um suposto congelamento de preço dos derivados, além de outros membros do Conselho de Administração da Petrobrás e da Diretoria Executiva, àquela época, a verdade é que nunca houve venda injustificada abaixo do preço de custo, como veda o artigo 36, inciso XV, da lei 12.529/2011, acima transcrito . Eis que o preço dos 15% de derivados importados foi diluído no muito maior volume de derivados nacionais (85%) segundo uma média ponderada. Já a lei 9478/97 que regulamentou a quebra do monopólio constitucional do petróleo preconiza, apenas, em seu artigo primeiro, inciso XI, a ampliação da competitividade do País no mercado internacional e a pluralidade de agentes. 

 

Note-se que a Petrobrás informa periodicamente à Security Exchange Commission-SEC, mediante o famoso Form 20 F, a sua condição de empresa estatal e, consequentemente, alerta acerca da eventual necessidade de sopesar o interesse dos acionistas minoritários com o interesse público consubstanciado em políticas governamentais de proteção ao consumidor, bem como o desenvolvimento da indústria nacional, como foi o caso específico da política de conteúdo local adotada nas compras de bens e serviços nacionais para os campos explorados sob o regime de partilha. Neste mesmo diapasão, foi o entendimento firmado pela Comissão de Valores Mobiliários CVM, naquele caso concreto do suposto congelamento de preço dos combustíveis durante o governo Dilma Roussef, conforme matéria veiculada no jornal O Estado de São Paulo, em 02 de fevereiro de 2021, transcrita a seguir:

“Em decisão unânime, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) absolveu nesta terça-feira, 2, oito ex-conselheiros de administração da Petrobras em um processo administrativo sancionador que discutiu a condução da política de preços da estatal no governo Dilma Rousseff. O grupo foi acusado de induzir investidores a erro, ao anunciar certas metas de endividamento, mas adotar uma política de preços de combustíveis que tornava seu cumprimento improvável. Foram absolvidos pelo colegiado os ex-ministros Guido Mantega (Fazenda), Miriam Belchior (Planejamento) e Marcio Zimmermann (Minas e Energia), além de Sérgio Franklin Quintella, o empresário Jorge Gerdau, o ex-presidente do BNDES, Luciano Coutinho, Francisco de Albuquerque e José Maria Ferreira Rangel, então representante dos empregados no conselho da petroleira. Na acusação, a área técnica da CVM afirmava que o descasamento entre as metas de endividamento e alavancagem divulgadas ao mercado nos Planos de Negócios para os períodos 2013-2017 e 2014-2018 e a execução da política de preços deram mensagens trocadas aos acionistas e resultaram em prejuízos estimados em R$ 30 bilhões entre 2011 e o primeiro semestre de 2014. O desfecho do caso foi adiado por pouco mais de dois anos. O colegiado concluiu nesta terça o julgamento iniciado em 13 de dezembro de 2018, mas suspenso após um pedido de vista do então diretor da CVM, Henrique Machado. Na primeira sessão, o então diretor e relator do caso na CVM, Pablo Renteria, votou pela absolvição dos conselheiros, por considerar que não havia provas suficientes de que eles agiram com a intenção de inviabilizar o cumprimento das metas. Em seu voto, Renteria destacou que, ao mesmo tempo em que a Petrobras informou ao mercado sobre os riscos do não cumprimento de suas metas financeiras e da possibilidade de que a busca de seus objetivos públicos - como a proteção ao consumidor - pudessem afetar negativamente seus resultados, divulgou informações negativas sobre a política de preços aprovada em novembro de 2013. A política, divulgada em fato relevante, não contemplava reajustes automáticos dos combustíveis e não previa a paridade de preços no curto prazo, reconhecendo inclusive que os indicadores financeiros não retornariam aos limites estabelecidos no PNG 2013-2017. Além disso, a política de preços tinha como objetivos atingir os limites financeiros do plano de negócios em um prazo de 24 meses e, também, não repassar ao consumidor a volatilidade dos preços. Para ele, diante de "metas conflitantes", o quadro tinha discricionariedade para decidir o que fazer. "Ao que tudo indica, (os conselheiros) optaram por dar preferência à estabilidade dos preços no mercado doméstico, ainda que assumindo o risco de comprometer o atingimento da meta relativa à alavancagem financeira dentro do prazo estabelecido", disse Renteria em seu voto. O presidente da CVM, Marcelo Barbosa, e os diretores Gustavo Gonzalez e Alexandre Rangel acompanharam o posicionamento, absolvendo os acusados.”  

Devido à PPI, concebida por Pedro Parente, houve uma greve de caminhoneiros em maio de 2018 que paralisou o país, causando transtornos e sofrimentos inenarráveis à população, assim como prejuízos incomensuráveis de dezenas de bilhões de dólares à economia nacional, inclusive aos exportadores e produtores de perecíveis que não puderam escoar sua produção por longos dias. Outra consequência perversa da PPI é o preço do botijão de gás custando até R$ 120 reais, fazendo milhões de lares brasileiros retrocederem 200 anos na história e voltar a cozinhar à lenha, causando riscos à sua integridade física e danos ao meio ambiente. Verificou-se um incremento exponencial dos casos de queimados graves, onerando o SUS, por que outros tantos desvalidos se aventuraram a cozinhar com álcool e morreram, como foi o caso de Angélica Rodrigues, jovem de 26 anos que teve 85 % do corpo queimado, segundo matéria da jornalista Gabriela Marçal em 10/04/2022 no METROPOLES.  

Nos primeiros meses de adoção da PPI, houve uma simulação de importação do Gás Liquefeito de Petróleo GLP, para uso no botijão de gás, como se a importação, naquela simulação para fins de fixação do PPI, viesse de Roterdã na Holanda, e não do Golfo do México nos EUA, como de fato acontece quando há necessidade da importação de GLP. Essa diferença de origem da importação rendeu mais de 1 bilhão de reais à Petrobrás e, certamente, em uma generosa distribuição de um polpudo PPP aos tecnoburocratas que conceberaram aquela artimanha. O PPP é o Programa de Prêmio por Performance, nova técnica de captura que já está na alça de mira do Ministério Público do Trabalho, cujo manifestação transcreveremos da matéria publicada no Monitor Mercantil, em 19 de agosto de 2021, para melhor compreensão do tema:

“O Ministério Público do Trabalho (MPT) da 1ª Região se manifestou favoravelmente à extinção do Programa de Prêmio por Performance (PPP) da Petrobras, de distribuição de lucros e resultados para trabalhadores da empresa. A ação, que tramita na 53ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, foi movida pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) e Sindipetros filiados. A ação pede a suspensão dos pagamentos relativos ao PPP, com base, entre outros motivos, na falta de isonomia do programa, criado em 2019 pela gestão da Petrobras. No atual modelo de remuneração da estatal, quanto mais elevado é o cargo do funcionário, mais a sua remuneração está atrelada a metas financeiras. Bônus são acrescidos aos salários à medida que as metas são alcançadas. Em sua manifestação pela nulidade do PPP, a procuradora Junia Bonfante Raymundo, da Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região, apontou que “a filosofia do Plano é a ‘meritocracia’, segundo a qual os grupos de indicadores terão pesos definidos de acordo com o nível hierárquico de cada participante. Quanto maior o nível hierárquico, maior será o peso das métricas de topo. Assim, os ‘membros da Diretoria Executiva, os ocupantes de função gerencial, especialista e supervisão na Petrobras’, receberão valores mais altos que os ‘demais empregados’”. Para a procuradora, “considerando-se que, conforme informam os Autores (FUP e sindicatos), perto de 75% dos empregados da Ré (Petrobras) não exercem qualquer função gratificada, o programa irá destacar as diferenças salariais da categoria e criar enorme desestímulo aos trabalhadores da base da pirâmide remuneratória que nunca atingirão a ‘premiação’ diferenciada dos empregados de função gerencial”. Além da violação da isonomia, a FUP e seus sindicatos argumentam que, se atingidas as metas de desempenho, a remuneração do presidente da estatal pode chegar a R$ 1,5 milhão, violando o teto constitucional, “uma vez que a remuneração do alto escalão da empresa passou a perceber valores muito acima do teto constitucional contrariamente à Orientação Jurisprudencial 339 da SDI – 1 do TST”. Por fim, o MPT afirmou que o PPP é uma “verdadeira participação de lucros e resultados que pode incluir de modo indireto o critério de Taxa de Redução de Acidentes de Trabalho como métrica de cálculo.””

O acervo de infortúnios da gestão Reichstul tem o seu ápice imagético no infausto acontecimento que encerrou, precocemente, a saga da maior plataforma do mundo àquela época. A P-36 foi construída sem licitação no exterior, com base em pareceres da tecnoburocracia capturada, e causaria grave acidente ambiental, além da morte de 11 petroleiros ao explodir e afundar. Também interrompeu a produção de óleo do campo de Roncador quando o Brasil não tinha ainda autossuficiência de petróleo, implicando importação bilionária para suprir o petróleo que deixou de ser produzido pela P-36 no campo de Roncador. O prejuízo com a importação decorreu da indecisão do, então, Gerente Geral da bacia de Campos, Paulo Roberto Costa, de interromper a operação quando já havia sinais evidentes do acidente a partir de vários parâmetros operacionais. A vacilação se deu, provavelmente, pelo receio de ter que explicar aos seus superiores na Petrobrás, com repercussão imediata no governo federal, a necessidade momentânea de importar mais óleo, enquanto se manutenia a P-36, impactando fortemente a balança de pagamentos do Brasil. Foi pior a emenda do que o soneto, ampliando enormemente a necessidade de importação do petróleo que se deixaria de produzir durante a manutenção da P-36 se verá a seguir duas matérias da Folha de São Paulo:

Explosão na P-36 teve erros de projeto, manutenção e operação ANA PAULA GRABOIS da Folha Online, no Rio de Janeiro

O acidente com a plataforma P-36 da Petrobras foi causado por erros de projetos, manutenção e operação, segundo relatório da ANP (Agência Nacional do Petróleo) e da Marinha. O relatório é bem diferente do que foi apresentado pela Petrobras no mês passado. Segundo a ANP, a principal causa da explosão foi um problema no fechamento de uma válvula. Entre as deficiências do projeto, estão até a classificação da área onde se localizava o tanque que explodiu, que não era considerada como área de risco. De acordo com o relatório, deveriam ser utilizados dispositivos de detecção e contenção de gás e ainda equipamentos resistentes a explosões. Outra deficiência no projeto é a ligação do tanque de emergência a um equipamento chamado "manifold de produção", onde ficam armazenados óleo e gás. Segundo o superintendente de Desenvolvimento e Produção da ANP, Oswaldo Pedrosa, só havia uma válvula isolando o tanque desse equipamento. O correto seria a existência de mais válvulas, para garantir o isolamento entre o tanque e os combustíveis.

Funcionários apontam falhas na P-36 CRISTINA GRILLO Da sucursal da Folha: A Aepet (Associação dos Engenheiros da Petrobras) afirma que a plataforma P-36, que estava em operação desde o dia 16 de maio de 2000, tinha um erro fundamental em seu projeto. De acordo com Argemiro Pertence, diretor de comunicação da associação, o queimador de gás natural, que, pelas normas de segurança, tem que ficar longe do deck principal da plataforma, foi instalado muito próximo ao local. "Por causa do queimador, a temperatura no deck chegava, às vezes, a quase 80C, o que contraria todas as normas de segurança", disse Pertence, que é engenheiro de petróleo e trabalhou durante 25 anos em áreas de prospecção da Petrobras. As altas temperaturas, na avaliação do engenheiro, podem ter alterado o funcionamento de equipamentos sensíveis e prejudicado a detecção de irregularidades. Pertence diz que, se houve explosão, é porque havia vazamento de gás. "Sem vazamento de gás, não há explosão. Não houve vazamento de óleo, por exemplo, porque isso causaria um incêndio." Segundo o engenheiro, empregados que estavam na P-36 informaram a representantes da Aepet em Macaé que já haviam reclamado na quarta-feira de um vazamento de gás. "Eles disseram que nada foi feito naquele momento, para não paralisar a produção." O presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul, contestou as denúncias da Aepet. Ele disse que a empresa "jamais" colocaria seus funcionários em risco, se já tivesse detectado problemas.A possibilidade de um vazamento de gás na plataforma foi confirmada pelo engenheiro Tiago Lopes, da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), que estava na plataforma no momento da explosão. Muito abalado, Lopes disse ao diretor da Coppe, Segen Estefen, que a primeira explosão, de menor impacto, deve ter aumentado o vazamento de gás, levando a uma grande explosão à 0h45. "Ele disse que a plataforma toda tremeu, o que mostra a força da explosão", disse Estefen. A P-36 tem a altura de um prédio de 40 andares e pesa 60 mil toneladas. Lopes, que até o final da tarde ainda estava na plataforma P-47, para onde foram levadas as pessoas que estavam na plataforma acidentada, disse que a situação da P-36 é bastante grave. "A avaliação dele é que a inclinação seja de 30 graus, o que é muito para uma plataforma", disse Estefen. A P-36 foi construída em 1994 por encomenda da ENI (Ente Nazionale Idrocarburi, a estatal italiana de petróleo), para prospectar petróleo a uma profundidade de até 500 metros. No final de 1996, a plataforma foi arrendada pela Petrobras para ser utilizada na bacia de Campos.As obras de reconversão para que a plataforma pudesse operar em uma profundidade de até 1.360 metros foram feitas no Canadá. A P-36 chegou ao Brasil em novembro de 1999 e começou a operar em maio de 2000.

Alerta

A Comissão de Minas e Energia da Câmara já havia sido alertada sobre supostas irregularidades na construção da P-36 e na contratação da empresa Marítima, responsável pela obra.A denúncia foi apresentada pelo PT em novembro de 1999. "Houve dispensa de licitação em uma obra de US$ 500 milhões. Naquela época denunciamos outros problemas, como grau de segurança e viabilidade técnica da construção", disse o líder do partido na Câmara, Walter Pinheiro (BA).”

Outra marca indelével da gestão Reichstul foram os graves acidentes ambientais, como o acontecido no dia 18 de Abril de 2000, quando vazaram 1,3 milhão de litros de óleo combustível na Baía de Guanabara, devido ao rompimento de um duto da Petrobrás que ligava a Refinaria Duque de Caxias (Reduc) ao terminal Ilha d'Água, na Ilha do Governador, cuja mancha se espalhou por 40km², causando comoção nacional e internacional. O episódio entrou para a história como um dos maiores acidentes ambientais ocorridos no Brasil. Imperioso registrar que antes mesmo do acidente, ou crime ambiental, se assim entenderem, o dirigente do SINDIPETRO Caxias RJ, Nilson Cesário, havia protocolado denúncias de sucateamento sistemático daquelas instalações perante ao Ministério Público Federal, noticiando negligência na manutenção dos dutos, cujas secções já apresentavam fissuras significativas, quando da ressonância magnética feita pelo pig instrumentado, o que exigia providências imediatas para evitar o rompimento dos dutos. Mais um vazamento de grande magnitude se deu, também, na gestão Reichstul, em 16 de julho de 2000, na Refinaria Getúlio Vargas em Araucária-PR, despejando 4 milhões de litros de petróleo nos rios Barigui e Iguaçu, ensejando condenação cível de 1,4 bilhão de reais. O derramamento de óleo atingiu vasta Área de Preservação Permanente (APP) do Bioma da Mata Atlântica, causando prejuízos à flora, à fauna, à qualidade da água e do ar, bem como à saúde dos trabalhadores que atuaram na contenção e ulterior remoção do óleo. Apesar de uma investigação técnica, conduzida pelo CREA-PR, comprovar cabalmente que erros de gestão foram as causas determinantes (redução do número de trabalhadores e de recursos para a manutenção industrial), a alta direção da Petrobrás, capitaneada por Henri Philippe Reichstul, preferiu usar os trabalhadores como bode expiatório, demitindo 4 empregados, cujas demissões foram revertidas em juízo, anos depois, pelos SINDIPETRO Paraná e Santa Catarina. Mais de 20 anos após essa tragédia, já sob a gestão Bolsonaro, a situação na Refinaria Getúlio Vargas REPAR, agora prometida à sanha privatista, é muito semelhante àquela dos tempos de FHC. Efetivo de trabalhadores cada vez mais reduzido e escassez de recursos para a adequada operação e manutenção, acarretando risco de novos vazamentos. Ademais disso, a REPAR vem operando a 60 por cento da sua capacidade de refino, abrindo espaço para o enriquecimento injustificável de importadores em detrimento do consumidor brasileiro, graças à Política de Paridade de Importação PPI, afetando severamente o market share da Petrobrás, cuja direção permanece indiferente à diminuição da sua fatia de mercado, por força de uma autodenúncia ao CADE feita pelo ex-presidente Roberto Castelo Branco. Tal autodenúncia ao CADE deu azo à celebração de um Termo de Compromisso de Cessação de Prática de suposta posição dominante de mercado, algo que nenhum dirigente de empresa faria em sã consciência. Ao contrário, se autuado fosse, deveria usar todos os argumentos técnicos e jurídicos para defender a empresa e não corroborar a esdrúxula tese dos 392 importadores de combustíveis que só se viabilizaram a partir da implantação da criminosa Política de Paridade Internacional PPI. Naquele compromisso celebrado com o CADE, o ex-presidente Roberto Castelo Branco obrigou a Petrobrás a vender 8 de suas 13 refinarias, quando qualquer dirigente de outra empresa buscaria demonstrar ao CADE suas razões no âmbito do processo administrativo, inclusive o fato de que quaisquer empresas privadas poderiam haver construído refinarias, terminais marítimos e terrestres, malhas de dutos e outros equipamentos, pois desde promulgação da lei federal 9478/97, pelo governo FHC, o mercado está aberto a quem quiser. Porém, nenhuma empresa privada investiu um centavo no Brasil, preferindo comprar os ativos construídos pela estatal, já totalmente amortizados, como acontece por força do famigerado Termo de Compromisso de Cessação de Prática, oriundo da autodenúncia do ex-presidente Roberto Castelo Branco que criou uma pechincha para os fundos abutres que sabem do constrangimento legal criado, artificialmente, pela autodenúncia do ex-presidente Roberto Castelo Branco. Desses desinvestimentos, não resultam algum investimento algum no país pois nenhuma obra ou planta nova foi edificada. Trata-se de mera inversão financeira como se classifica na contabilidade e, devido aos preços praticados na venda desses ativos, todos eles subavaliados, uma autêntica pilhagem. Atualmente, normas de governança corporativa garantem bônus opulentos distribuído pelos gestores da Petrobrás a si mesmos por haverem logrado vender ativos geradores de caixa da empresa como, por exemplo, a Refinaria Landulfo Alves, juntamente como os dutos e mais o Terminal Marítimo de Madre de Deus, na Bahia de Todos os Santos, pela metade do preço de mercado, tal como avaliado pela XP Investimentos e o BTG/Pactual, além do INEEP/UFRJ. Desta operação obscura, resultou um monopólio privado regional, em mãos do fundo árabe Mubadala, que já vende diesel e gasolina a preços superiores aos praticados pela Petrobrás e, sem o menor constrangimento, encerrou o fornecimento de óleo para navios, o bunker, em um dos mais importantes portos nacionais, o de Salvador, e para instalações navais da Marinha Brasileira.

Igualmente, a Refinaria LUBNOR, com capacidade de processamento de 8 mil barris, uma das líderes na produção de asfalto e única do país capaz de produzir lubrificantes naftênicos,  sediada em Fortaleza, foi vendida por irrisórios 34 milhões de dólares norte-americanos, em 26 de maio de 2022, cuja subavaliação se evidencia mais ainda ao confrontar o preço de 112 milhões de dólares norte-americanos pagos pela estatal boliviana Yacimentos Petrolíferos Fiscales Bolivianos-YFPB à Petrobrás pela sua subsidiária Petrobras Bolivia Refinacion SA PBR, no longínquo ano de 2007, como se infere do Relatório de Sustentabilidade de 2007, página 11, emitido pela área de Relação com Investidores da Petrobrás. Ironicamente, a nossa mídia comercial criou o mito de que esse ativo da Petrobrás na Bolívia haveria sido expropriado sem contrapartida alguma pelo governo de Evo Morales com suposta aquiescência do governo Lula, o que até hoje é reverberado pelo atual governo Bolsonaro.

A refinaria de Manaus-REMAN também foi vendida, em 13 de maio de 2021, originando outro monopólio privado regional, denunciado ao CADE e à ANP, bem como discutida em juízo por outros agentes do mercado de óleo e gás (Raizen, Ypiranga, Equador e Fogás) que alegam práticas discriminatórias e preços abusivos, tal como aconteceu na Bahia, sem contudo demover o CADE de aprovar a venda feita à socapa e à sorrelfa para o grupo Atem que se notabilizou por diversas denúncias de sonegação de impostos supostamente superiores ao valor de aquisição de U$ 189.000.000 (189 milhões de dólares norte-americanos) quando, segundo estudos do INEEP, o valor base seria de U$ 279.000.000 (279 milhões de dólares norte-americanos). A refinaria de Manaus é um complexo de renda e emprego relevante, estrategicamente localizada no coração da Amazônia onde cumpria a missão de integrar aquela região ao Brasil para não entregar como diziam os militares de outrora. Agora em mãos privadas poderá deixar de abastecer a região com derivados que não lhe interesse comerciar. Provavelmente, irá vender derivados por preços superiores àqueles resultantes da injustificável PPI, praticada pela Petrobrás, como já acontece na Bahia com a sua refinaria entregue ao fundo Mubadala.

Subsidiárias foram criadas para a finalidade específica de driblar a obrigação de autorização legislativa para privatizar a holding, Petrobrás. E privatizaram subsidiárias e ativos com sofreguidão, na bacia das almas, como diria o intimorato Barbosa Lima Sobrinho, também homenageado com o batismo de uma UTE em Seropédica, aliás laureada com premiação ambiental pela restauração da vegetação em seu entorno. Essa iniciativa foi capitaneada pelo auditor Marcos Gratacós, gerente geral da UTE Barbosa Lima Sobrinho, ele próprio um exemplo vivo de resiliência, porquanto havendo sido demitido da Braspetro, durante o governo Collor, prestou novo concurso para a Petrobrás. Não se tem notícia de uma avalanche de alienações subavaliadas nessa velocidade e nessa intensidade, como se tem feito, sem licitação, sem aprovação prévia do poder legislativo e, pasmem, sem sequer aprovação dos acionistas. Tais desinvestimentos se iniciaram ainda na gestão de Aldemir Bendine, cognominado mui justamente de Vendine pelos empregados. A voracidade dos entreguistas com as vendas em fatias da Petrobrás, sempre abaixo do preço de mercado, não chegam sequer ao órgão máximo da própria Petrobrás que é sua a Assembleia Geral, como em qualquer sociedade anônima. Esse peculiar modus operandis se iniciou na gestão de Castello Branco e perdura até hoje. É como se a gestão, capturada por uma mão invisível, tivesse um cheque em branco para alienar bens da sociedade sem que os próprios sócios, reunidos em Assembleia Geral, tomassem conhecimento das avaliações com base em Laudos de Auditores Independentes e, então, os examinassem criteriosamente para ulterior deliberação pela alienação, ou não, pois pertence ao órgão máximo da sociedade tal competência decisória, não aos bucaneiros de passagem pela diretoria. Esta subtração do poder decisório da instância máxima da sociedade, que é a Assembleia Geral, como determina a legislação societária, é mais uma jabuticaba que floresce nos campos da heterodoxia que preside todo essas vendas de ativos e subsidiárias.

O ex-presidente Pedro Parente, durante o governoTemer, chegou a vender o campo de Carcará, no pré-sal, para a Statoil norueguesa, hoje denominada Equinor, em cuja alienação se fixou o preço do barril de petróleo de Carcará pelo equivalente a uma lata de refrigerante. Os balanços da estatal norueguesa evidenciam os upsides (vantagens) advindos daquela aquisição do campo de Carcará por essa curiosa métrica adotada por Pedro Parente. Aquele CEO defendeu a necessidade de uma tal venda a preço vil com a necessidade de redução da dívida da Petrobrás para que, após a redução, se pudesse obter novos financiamentos a taxas de juros mais convenientes. Esse argumento se revelou falacioso pois as menores taxas de captação de dívida pela Petrobrás, até hoje registrada, foi de 4,3% ao ano, em 2013, durante o governo Dilma Rousseff. Sob a égide do mesmo governo Dilma Rousseff, houve o lançamento de dívida para resgate em 100 anos, os Century Bonds, exatamente em 2015, no auge do linchamento midiático a que Petrobrás foi submetida. Naquele mesmo ano de 2015, a Petrobrás recebeu 3 premiações Offshore Technology Conference OTC, em Houston, o prêmio Nobel da indústria petrolífera, justamente pelo desenvolvimento das tecnologias necessárias à exploração do pré-sal em águas ultra profundas. Também foi em 2015 que a Petrobrás superou a Exxon Mobil em geração de caixa livre, condição que lhe permitiria honrar a dívida contraída sem nenhuma necessidade do açodamento verificado nesta avalanche de desinvestimentos que mais se assemelham ao fenômeno metabólico do catabolismo ou destruição da massa muscular.

Justamente para viabilizar a produção no pré-sal, a 300 km da costa e a mais de 7 km de profundidade, é que foi contraída a dívida. Essa dívida era perfeitamente compatível com magnitude das reservas de óleo e gás detidas pela Petrobrás e a permanência dessas reservas e dos demais ativos geradores de caixa em mãos da Petrobrás. Ao contrário do que alardeiam os seus detratores, era uma dívida meritória sem a qual não se construiriam os navios e plataformas que levaram a Petrobrás a bater o seu recorde mensal de produção no pré-sal, em janeiro de 2022, com 2,06 milhões de barris de óleo equivalente por dia boed; e recorde trimestral, 2,03 milhões de boed. Esse volume representou 72% da produção total da Petrobras, naquele trimestre, originando lucros exponenciais de 44,561 bilhões de reais em, apenas, 3 meses. Se as gestões atuais seguirem, de modo temerário, vendendo refinarias, reservas de óleo e gás, bem como as suas subsidiárias abaixo do preço de mercado, chegará o momento em que a Petrobrás ficará somente com a dívida e esta, aí sim, se tornará impagável por menor que ela seja ela. Portanto, a redução da dívida na velocidade e proporção em que foi feita se tornou contraproducente. Pedro Parente determinou antecipação de pagamentos a vários bancos, inclusive com o pagamento de ágio para que os bancos aceitassem o chamado pré-pagamento. Isso nos revela que o interesse dos credores da Petrobrás é ter um fluxo constante e, absolutamente, confiável como são os resultantes dos pagamentos feitos nos financiamentos contraídos pela Petrobrás pois o que mais apavora os banqueiros é não ter aplicação rentável e segura como são os financiamentos para os campos do pré-sal.  Os custos de extração da Petrobrás no pré-sal só não são menores do que os da Saudi Aramco, onde se procura água e acha petróleo no deserto. Esta redução constante de custos e prazos se dá graças à tecnologia incremental na construção de poços continuamente aprimorada pela Petrobrás.

A histeria persecutória da Lava Jato, insuflada pela Globo, Estadão e outros órgãos de imprensa, em cobertura enviesada e acrítica, criou um senso comum de que a Petrobrás inteira se havia tornado um valha couto de celerados quando, na verdade, ela foi vítima de um cartel de empreiteiras do setor privado, tão endeusado pela mídia hegemônica, e alguns maus dirigentes que fizeram carreira gerencial longeva, segundo os critérios de governança corporativa, encastelando-se em posições chave de articulação com fornecedores e agentes políticos. Hipocrisia e seletividade da república de Curitiba vem à tona quando Delcídio do Amaral disse que, no governo Fernando Henrique Cardoso, houve vários casos de irregularidades na Petrobrás “muito semelhantes” aos apurados na Operação Lava Jato. Porém, foi solenemente ignorado pelos investigadores. Essa afirmação está na delação homologada no Supremo Tribunal Federal. Delcídio, que foi diretor na estatal de 1999 a 2001, ainda no governo tucano, disse que ilegalidades em contratações da Petrobrás não são novidade e aconteciam há muito tempo. O delator disse que o presidente da Petrobrás na maior parte do governo tucano, Joel Rennó, tinha apoio político que nenhum outro teve ao longo da história na estatal. As acusações dele relativas àquela época tem foco em uma empresa chamada Marítima, do empresário German Efromovich. O ex-senador disse que a Marítima era uma pequena empresa no início dos anos 1990, mas, em um curto espaço de tempo, teve um crescimento vertiginoso e passou a fornecer sondas e plataformas para a Petrobrás, referindo-se às encomendas das plataformas P-36, P-37 e P-40 e da série de sondas de perfuração conhecida como Ametistas. Segundo o ex-senador, as três plataformas custaram pelo menos US$ 270 milhões a mais do que o previsto inicialmente e tiveram atrasos injustificados na construção. Ele detalhou o caso da plataforma P-36, que teve seu custo aumentado em US$ 100 milhões depois de seguidos atrasos. Na P-37, disse Delcídio do Amaral, a Marítima venceu concorrência, “sem maiores explicações”, após ter sua proposta inicialmente  desclassificada e depois reabilitada sem base no regramento da licitação.

A P-36 naufragou na Bacia de Campos em 2001, após explosão em um compartimento de rejeitos, deixando 11 mortos. No caso da série de sondas de perfuração denominadas Ametistas, Delcídio diz que a Marítima foi a única empresa a concordar com os prazos de construção propostos pela Petrobras, depois que todos os outros concorrentes se negaram a atender esse prazo exíguo por evidentes limitações técnicas, segundo o estado da arte. Apesar disso as obras atrasaram e, em 1999, já sob a gestão Henri Philippe Reichstul, a Petrobras cancelou as encomendas. O processo gerou uma disputa bilionária entre a Marítima e a estatal, com processos nas cortes de Londres e Nova York.

Outro celébre delator, o ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveró afirmou que havia propina em negócios da Petrobras e de uma de suas subsidiárias, a BR Distribuidora desde o governo FHC. Um dos negócios descritos por Cerveró é a compra de uma petrolífera argentina pela Petrobras no final de 2002, final do governo FHC, quando se comprou a Perez Compac. Cerveró disse que o negócio teria rendido US$ 100 milhões em propina para o PSDB, paga pelo vendedor Gregório Perez Compac. Segundo o ex-diretor, a Petrobras pagou US$ 2 bilhões, sendo US$ 1 bi em ativos e US$ 1 bi em dívidas (a Perez Compac quebrou em função da crise argentina de 2001/2002, conforme relatou o delator). Cerveró asseverou que a petrolífera argentina foi adquirida, com dívida equivalente aos seus próprios ativos o que tornava nulo o seu valor de mercado. Uma circunstância que chamou a atenção de todos foi o fato da compra ter sido fechada, açodadamente, no final de um governo que não fez seu sucessor, porquanto Luiz Inácio Lula da Silva já houvesse sido eleito quando a aquisição da Perez Compac se consumou. Muitas outras peripécias estão documentadas embora algumas outras não. Oportuno lembrar o artigo de Ricardo Semler, na Folha de São Paulo, “Tá se roubando é pouco”, quando ele compara os percentuais de 1 a 3 por cento imputados pela Lava Jato com o período em fora fornecedor da Petrobrás, cujos percentuais seriam de 10 a 20 por cento, como aliás morreu dizendo Paulo Francis lá em Nova York. Principalmente, aquelas que remontam ao tempo da ditadura militar, descritas no livro Estranhas Catedrais de Pedro Henrique Pedreira de Campos, vencedor do prêmio Jabuti 2015. Oportuno lembrar que um dos presidentes da Petrobrás, ao tempo da ditadura, antigo contador do grupo Cotia, Sigeaki Ueki, é apontado por outro delator da Lava Jato, o ex-presidente do PP, Pedro Corrêa, como destinatário de propinas desde 1974. Sigeaki Ueki hoje é fazendeiro e banqueiro no Texas tendo sido, também ministro das Minas e Energia no período ditatorial.

Outro delator da Lava Jato, o lobista Jorge Luz, que tinha vaga de garagem na sede da Petrobrás, confessa haver iniciado sua atividade de “lobista” no governo do general João Batista Figueiredo, primeiramente no Banco Nacional da Habitação e depois em outras estatais, mas nada disso vinha ao caso como asseverou Sérgio Moro, até porque não se poderia melindrar aliados.  

A Lava Jato apontou um desvio de 6,194 bilhões de reais, reconhecido no balanço da Petrobrás, durante o período de 2004 a 2014. Sucede que, neste mesmo período, a Petrobrás faturou mais de 2,4 trilhões de reais, ou seja, a  propina causadora de sobrepreço equivaleria a um percentual de 0,25, o que tornava os desvios insuscetíveis de detecção. O fato é que um percentual de 0,25% de desvios sobre o faturamente era imperceptível para quaisquer sistemas de controle interno ou compliance, como está em voga dizer. Tal percentual de 0,25 % é considerado imaterial, segundo as regras contábeis internacionais. Tanto assim que os auditores externos internacionais, as chamadas big four (Deloitte, KPMG, PWC, Ernst & Young) jamais puderam detectá-lo. Como as delações da Lava Jato mencionavam um percentual de 1% até 3% de superfaturamento nos contratos com as empreiteiras investigados na operação Lava Jato, a Petrobrás fixou o valor de 6,194 bilhões de reais em perdas decorrentes de um cálculo linear para determinar quanto seria 3% de todos aqueles 27 contratos firmados com o cartel de empreiteiras, segundo o delator Paulo Roberto Costa. O desvio de 6,194 bilhões de reais imputado pela Lava Jato e reconhecido pela Petrobrás, em seu balanço patrimonial referente ao ano de 2014, contribuiu para o prejuízo líquido de 21,6 bilhões mas não foi preponderante para contrabalançar um incremento de 11% da receita líquida de R$ 337,260 bilhões em 2014, ante R$ 304.890 bilhões em 2013, evidenciando a pujança da geração de caixa da Petrobrás e, também, que o propalado prejuízo total era meramente contábil e a Petrobrás jamais estivera quebrada como alardeavam seus detratores.

Aos 6,194 bilhões atribuídos à corrupção se somaram 44,345 bilhões de reavaliação de ativos (impairment) decorrentes, sobretudo, da queda abrupta do preço internacional do óleo que chegara ao pico de 147 dólares o barril em 2014 e despencou até abaixo de 27 dólares, a partir de 2015, afetando todas as empresas de petróleo do mundo indistintamente. O prejuízo de 44 bilhões, de natureza meramente contábil, se deveu ao impairment draconiano feito às instâncias da Price Waterhouse que ameaçava não assinar o balanço da Petrobrás, o que precipitaria o vencimento antecipado de toda a dívida contraída, inclusive os bonds perpétuos com resgate previstos para 100 anos. O vencimento antecipado de toda a dívida se daria por força dos financial covenants (garantias contratuais de proteção aos credores). A Price Waterhouse, sabedora disto, botou a faca no pescoço da Petrobrás. Interessante notar que, à essa mesma época, a China adiantou 10 bilhões de doláres à Petrobrás para receber o pagamento em óleo, o chamado loan for oil, como já havia feito e continua fazendo com a PDVSA da Venezuela.

Fazer o impairment, ou Teste de Recuperabilidade de Ativos, é uma obrigação legal que ocorre anualmente, por ocasião das Demonstrações Financeiras Auditadas que, no entanto, tem sido usado por muitas empresas como uma estratégia de preservação do caixa, pois esse Teste de Recuperabilidade de Ativos permite manipulação dos resultados a partir de adoção de premissas futuras que podem se realizar, ou não, como, por exemplo: qual seria o preço do óleo ? dos juros, do gás ? do câmbio? e quejandos, ao longo de toda a vida útil do ativo submetido ao impairment, ou Teste de Recuperabilidade de Ativos. É algo que mais se assemelha a um exercício de futurologia, permitindo calibrar as premissas para chegar ao resultado que se queira alcançar. 

Se o resultado do impairment levar a um prejuízo no Balanço Patrimonial Auditado, a empresa se exime de distribuir os dividendos mínimos legais, que é de 25% se o Estatuto da sociedade não dispuser em menor proporção, a teor do artigo 202, parágrafo segundo da lei 6.404/76, a Lei das Sociedades Anônimas. Neste dispositivo legal está a chave para coibir futuras distribuições de dividendos abusivas como a ocorrida na Petrobrás, em 2022, quando se distribuiu 101 bilhões sobre um lucro de 106 bilhões de reais, evidenciado a captura da empresa pelos acionistas minoritários e contratando o seu encolhimento, senão a morte da empresa no médio prazo. Além de configurar um sequestro pelos agentes de mercado do formidável constructo social que é a Petrobrás para, apenas, especular com suas ações sem que dessas compras e vendas de ações no mercado secundário da Bolsa de Valores resulte algum ingresso de receita para a Petrobrás que só aufere ganho quando emite novas ações mediante aumento de capital como o de 2010, o maior da história do capitalismo na Bolsa de Valores de São Paulo.

A Price Waterhouse exigiu que a Petrobrás mudasse drasticamente a metodologia, adotada antes de 2014, para fazer impairment ,sobremaneira, a taxa de desconto historicamente praticada e, também, a avaliação de cada ativo isoladamente, o que antes se fazia englobando o parque de refino com suas 13 refinarias; o parque termoelétrico com todas as suas usinas termoéletricas e não cada um destes ativos isoladamente, quebrando as sinergias alcançadas entre ativos similares que sempre foram uma vantagem da Petrobrás. Para que se tenha uma percepção mais clara das possibilidades de manipulação do teste de impairment, transcrevemos a seguir elucidativa matéria do INEEP/UFRJ:

“O teste de impairment é uma ferramenta contábil utilizada pelas empresas para avaliarem se os valores dos ativos (ou um conjunto deles) registrados em sua contabilidade podem ser recuperados em sua vida útil, de acordo com as suposições adotadas sobre os parâmetros econômicos (preço do petróleo, taxa de câmbio, reservas, etc.), relevantes no futuro. A Petrobras, entre os anos de 2010 e 2013, realizou testes de impairments, sendo que nesse período o valor máximo alcançado foi de R$ 1,2 bilhões em 2013. A partir de 2014, esta conta começou a ganhar destaque, não por coincidência, ano em que iniciaram as disputas e ataques da Operação lava-jato que dificultaram a publicação dos resultados dos balanços contábeis do 3º e 4º trimestre. Quando o balanço da Petrobras de 2014 foi publicado, chamou atenção a cifra de R$ 44,5 bilhões em impairments. Em 2015 e 2016, a empresa também apresentou impairments elevados, da ordem de R$ 47,6 bilhões e de R$ 20,3 bilhões, respectivamente. Nesses três anos a perda contábil acumulada foi de R$ 112,4 bilhões, valor 18 vezes maior que as baixas apresentadas pela empresa fruto da corrupção (R$ 6,2 bilhões). A disparidade entre os valores contabilizados com impairments entre 2010-2013 e 2014-2016; o fato de nenhuma outra empresa do setor ter registrado uma elevação tão expressiva dos seus impairments; e o grau de subjetividade (e a falta de transparência) das premissas utilizadas para realização dos testes de impairment colocam em xeque a magnitude da depreciação dos ativos da Petrobrás. É evidente que a queda no preço do barril de petróleo, as mudanças na taxa de câmbio e as revisões das reservas de petróleo e gás são elementos para adoção dos testes de impairment. A questão que está posta é a magnitude das perdas contábeis adotada pela Petrobras entre 2014 e 2016. Pesquisas empíricas[1] evidenciam que, além dos fatores econômicos, os impairments no setor de petróleo e gás também são determinados por decisões discricionárias dos gestores associadas às estratégias de gerenciamento de resultados (earnings management) – quando um administrador adota uma política contábil para atingir determinados fins. Nesse sentido, a questão dos impairments vai muito além da adoção de um critério objetivo contábil. Há um interesse gerencial/político por parte da atual administração da Petrobras em separar (inflando os impairments) o desempenho da empresa em dois momentos, antes e pós setembro de 2016. A divulgação do novo plano de negócios e gestão, assim como a decisão de apresentar grandes baixas em impairments no 3º trimestre de 2016, fazem parte desta estratégia. Outro questionamento diz respeito às escolhas dos ativos para realização dos testes impairment adotadas pela Petrobras nos últimos 3 anos. Além de alguns ativos na área de refino, destacam-se a depreciação dos ativos no segmento de exploração e produção (E&P). Neste segmento foram contabilizadas perdas, nos 3 anos, de R$ 52,1 bilhões em impairments. Como justificativa a empresa argumentou que essas baixas derivam de revisão de preços do petróleo no mercado internacional, em queda nos anos de 2014 e 2015, assim como revisões geológicas de reservatórios de alguns campos, reduzindo assim as reservas e impactando nos fluxos de caixa dos projetos. O primeiro argumento faz sentido, em parte, pois realmente vivenciamos uma forte queda no preço do barril de petróleo, de US$ 100,00 em setembro de 2014 para US$ 30,00 em janeiro de 2016, justificando as perdas em 2014 e 2015. Porém, em 2016, o preço do barril passou de US$ 30,00 em janeiro para US$ 50,00 em setembro, o que demonstra que as perdas contábeis com os impairments foram infladas. Em relação às revisões das reservas de petróleo e gás, não fica claro nos documentos da empresa quais os parâmetros utilizados para essa redução, além do que há uma omissão de informações referentes às premissas escolhidas, tais como: produtividade esperada em cada poço e as taxas de recuperação destes. Isso demonstra falta de transparência na metodologia do cálculo dos impairments. Nessa linha dois casos de testes de impairments realizados pela Petrobras causam estranheza: campo de Papa-Terra com baixa de R$ 9 bilhões; e campo de Frade com baixa de R$ 1 bilhão. Nestes reservatórios a Petrobras possui parceria com a petroleira americana Chevron. Ao consultar os balanços dessa empresa, não há nenhum impairments sobre esses dois campos [2]. Os contínuos processos de reavaliação (impairment) dos preços dos ativos realizados pela gestão da Petrobras, principalmente no segmento de E&P, também parecem ter como objetivo a depreciação de seu valor (além dos fatores econômicos) a fim de atrair investidores estrangeiros para aquisição de tais ativos. Nos últimos anos, as condições para as vendas de ativos no setor de óleo e gás tornaram-se muito difíceis, seja pela redução dos investimentos que todas as petroleiras estão fazendo, ou pela aversão aos riscos destas empresas neste momento de baixa no preço do barril. Além desta tentativa de atender aos interesses do mercado externo, o processo de contínuos e volumosos testes de impairment evidencia uma visão de curto prazo, imediatista na atual direção da Petrobrás, tendo como objetivo central a redução acelerada de sua alavancagem por meio da venda de ativos estratégicos (que poderiam gerar fluxo de caixa futuro) com valores mais baixos. Assim, fica claro o descompromisso da atual gestão com os desafios de longo prazo, deteriorando o papel central que a Petrobrás tem como ferramenta do desenvolvimento nacional. Referências: [1] Ver SANTOS, O. & SANTOS, A. & SILVA, P. Reconhecimento de perdas para redução ao valor recuperável de ativos: impairment em ativos de exploração e produção de petróleo. BBR. Brazilian Business Review (English Edition. Online), v. 8, p. 66-91, 2011. [2] O campo de Papa-Terra é operado pela Petrobrás e tem a parceria da Chevron em 37,5%. No caso do Campo de Frade, a Chevron é a operadora e a Petrobrás possui 30% do campo.    #CloviomarPereira”

Hoje, a Petrobrás se viabiliza pelas reservas que, ainda, não lhes foram retiradas e pelos mais de 2,2 milhões de barris diários de petróleo produzidos no pré-sal (óleo leve e de maior valor) da Bacia de Santos contra 730 mil barris nos pós-sal da Bacia de Campos, produzindo óleo pesado de menor valor. Os da Bacia de Campos em grande parte já são campos declinantes em sua produção pois datam das décadas de 1980 e 1990, descobertas propiciadas pelo monopólio constitucional do petróleo então vigente. O custo de extração da Petrobrás são de 8 dólares, nos pós sal da bacia de Campos e de, apenas, 3,5 dólares no pré-sal da bacia de Santos, sem considerar as participações governamentais (royalties, participações especiais e toda a carga tributária), acrescidas dos custos logísticos e de afretamento, segundo dados divulgados pela própria Petrobrás. Se hoje o barril de petróleo chega ao nível de 130 doláres, é razoável supor que haja um espaço razoável para abrasileirar o preço dos derivados, pois a eficiência da Petrobrás deve beneficiar toda a nação e não só aos acionistas. 

Lembremos que, Pedro Parente, como muitos outros céticos declaravam que essa história de pré-sal era um feitiche de petistas. Igualmente, os próceres da mídia comercial, Miriam Leitão e Sardenberg à testa, os quais disseram, primeiramente, que o pré sal não existia e, depois de contrariados pelas evidências empíricas, passaram a dizer que a Petrobrás não teria capacidade de explorar e produzir o petróleo do pré-sal, porquanto estivesse excessivamente endividada. Essas falas são uma rematada estultícia pois os verdadeiros investidores disputam os papéis de dívida emitidos pela Petrobrás que tem na própria produção de óleo uma garantia sólida e rentável, para cada ativo isoladamente ao qual é atribuído um CNPJ específico, como é ínsito ao conceito de Project Finance, ou financiamento de projetos, que tem base nos fluxos de caixa projetados para aquele específico empreendimento e não nos balanços patrimoniais dos seus patrocinadores, quer dizer da empresa inteira que toma o financiamento garantido no próprio empreendimento. Parece que essas Cassandras da mídia hegemônica, ou amestrada como diria Hélio Fernandes, se deixaram contaminar pela visão dos especuladores de curto prazo que ficam fazendo day trade, em um quarto escuro, alienados da economia real. A verdade pura e simples é que se uma empresa tem resevas de óleo, o capital financeiro faz fila para aportar os recursos necessários.

Interessente notar que na gestão do general Joaquim Silva e Luna se deliberou pela construção do segundo trem de refino de Abreu e Lima, o que revela não ser aquele projeto destituído de racionalidade como se alardeou por muito tempo. Realmente, é muito mais sensato despender 1,3 bilhão de doláres, como passou a constar do Plano Estratégico 2040 e Plano de Negócios e Gestão 2019-2023, que também deve ser usado no primeiro trem, para a conclusão da unidade de redução de emissões atmosféricas (SNOX), e a ampliação do processamento em projetos para atender mercado de Diesel S-10, do que pagar dezenas de vezes mais em importação de derivados dos Estados Unidos. A refinaria Abreu e Lima foi uma das obras afetadas pela Lava Jato com a supressão do seu segundo trem de refino, reduzindo a capacidade dos 260 mil barris originalmente projetados para apenas 130 mil barris. 

Dezenas de outras obras foram paralisadas por interferência da Lava Jato, que pressionou a Petrobrás a bloquear os pagamentos de faturas, correspondentes às etapas de obras já concluídas, levando as empreiteiras à insolvência sem que houvessem sido declaradas inidôneas no devido processo, na forma do artigo 87, parágrafo terceiro, da Lei de Licitações que estabelecia a competência para impor essa sanção administrativa ao ministro de estado ao qual a Petrobrás se encontra vinculada e jungida ao poder de supervisão ministerial. Jamais essa competência poderia ser usurpada pela Lava Jato que compeliu a Petrobrás à prática de um inusitado bloqueio cautelar, totalmente à margem da lei. 

Das 4 refinarias em construção, durante os governos petistas, só a pequena Clara Camarão foi concluída (aliás já vendida a preço vil) e a Abreu e Lima (crucial parq o refino de diesel) concluído pela metade. Algumas obras com quase 90 por cento de conclusão foram abruptamente paralisadas como foi o caso da UFN3, a Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados de Três Lagoas, com grave prejuízo para o Brasil que é dependente de importações, sobretudo da Rússia e Bielorússia, regiões hoje atingidas por embargos sancionatórios e dificuldades logísticas, por força do conflito na Ucrânia. Pedro Parente chegou a fechar a Fábrica de Fertilizantes de Aruacária, que poderia socorrer as vítimas da Covid 19 ao ser reconvertida para a produção de oxigênio. Fechou essa e outras Fábricas de Fertilizantes no Nordeste por não encontrar compradores, segundo ele que já teve passagem por concorrentes da Petrobrás no setor de fertilizantes, como a Bunge e Cargill. Setor em que a Petrobrás ingressou por decisão do presidente Ernesto Geisel, visando dar suporte à expansão da fronteira agrícola brasileira para o cerrado e outras regiões que não eram interessantes para as multinacionais do ramo atuantes àquela época no Brasil.

Tornando ao tema da Lava Jato, lembremo-nos que, ainda em 2012, muito antes da eclosão da midiática operação, a presidente Dilma Rousseff defenestrou da diretoria da Petrobrás, os famigerados Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró cuja delação menciona familiares de Serra e FHC, e, também, Pedro Barusco, que confessou receber propina desde 1997, embora isso não viesse ao caso para Sérgio Moro pois não se poderia melindrar um aliado. Todos aqueles personagens foram guindados à diretoria executiva da Petrobrás, em estrita observância ao plano de sucessão gerencial e da alta administração, vigente desde FHC, quando já detinham experiência de diretoria em subsidiárias ou no topo da carreira gerencial da própria holding. Aqueles gestores, capturados por interesses espúrios desde longa data, como bem depois se revelaria por autoridades suíças e norte-americanas, foram todos eles exonerados por iniciativa de Dilma Roussef, antes mesmo, da eclosão da operação Lava Jato que é de 2014, e contaria com o auxílio luxuoso de todo o aparato de espionagem dos EUA, tal como seria denunciado por Eduard Snowden. A espionagem revelada por Snowden se deu contra Dilma Roussef e, também, Angela Merkel, chancelar da Alemanha (provavelmente com foco no gasoduto Nord Stream) e, sobretudo espionagem industrial sobre a Petrobrás, bem como suporte técnico ao lawfare contra Lula da Silva. Tais fatos são reconhecidos publicamente por membros do próprio Departamento de Justiça dos EUA, o DOJ, em evento público no qual celebram o fato de haverem atuado ilegal e clandestinamente em conjunto com a Lava Jato. Fruto destas articulações, de um juiz suspeito e incompetente, como hoje reconhece o STF e a própria ONU, impediu-se a candidatura de Lula em 2018, quando era favorito no pleito presidencial, abrindo o caminho para eleição de um governo, antinacional e antipopular, comprometido com a privatização e destruição do estado de bem estar social que aprofundaria e aceleraria o desmonte da Petrobrás, essa alavanca poderosa que, se aplicada ao ponto de apoio correto, materializado no pré sal sob o regime de partilha originalmente delineado no governo Lula, permitiria ao Brasil mover o mundo, parafraseando Arquimedes. 

A Petrobrás não usa recursos públicos provenientes de impostos para se financiar. Toda a sua receita é auferida no competitivo mercado capitalista de petróleo. Recursos públicos são mera ficção jurídica na Petrobrás que é uma sociedade de economia mista com autonomia financeira em relação ao Tesouro Nacional, razão pela qual pode remunerar seus empregados sem observância do limite estabelecido no teto constitucional que é igual aos proventos de ministro do STF. Aliás, o fluxo de recursos financeiros é da Petrobrás para a União, que é a maior contribuinte de todos os impostos federais, estaduais e municipais. Além de royalties do petróleo de valor inestimável. Quando se fala dos milhões devolvidos pelos delatores, se esquece de ver o prejuízo bilionário causado pela Lava Jato à imagem da Petrobrás e, também, de diversas empresas brasileiras, como a Embraer, a Braskem por exemplo, devido à colaboração ilegal e clandestina da Lava Jato com outros países que, assim, se livraram de concorrentes brasileiros, notadamente os EUA, como no caso da Odebrecht que construiu o aeroporto de Miami. O exército brasileiro também substituiu a Odebrecht Defesa pela Elbitz israelense como fornecedora do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteira-SISFRON, concebido na Estratégia Nacional de Defesa, aprovada em 2008, pelo governo Lula da Silva. O Programa de Submarinos Nucleares-PROSUB, em parceria com a França e a Odebrecht Defesa, no estaleiro de Itaguaí também vem arrostando muitas vicissitudes para sobreviver, não tão vis como aquelas desencadeadas pela Lava Jato contra o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, o pai do desenvolvimento de tecnologias nucleares no Brasil, que foi lançado ao cárcere, já octogenário pelos abjetos métodos de lawfare (perseguição judicial movida por disputa político-econômica) da Lava Jato contra tudo que fosse nacional ou popular. Não por acaso, o general Nelson Werneck Sodré(1911-1999), ilustre historiador e autor de 56 livros, cunhou a frase: SÓ É NACIONAL O QUE É POPULAR.

Infelizmente, a Lava Jato se ocupou mais da politização das delações, sendo leniente com os delatores dúcteis aos seus propósitos de persecução seletiva e politização do judiciário em detrimento do devido processo legal e da preservação dos empregos destruídos no altar da hipocrisia e das empresas que são, ou eram um patrimônio nacional, com projeção mundial pela proficiência na execução de seus misteres. Não só obras na América Latina e África, com apoio do BNDES, conforme idealizou Geisel, criador do Proex do BNDES e do pragmatismo responsável que o levou a reatar relações com a República Popular da China e reconhecer os governos de Angola e Moçambique, antes da própria União Soviética, invocando a nossa identidade lusófona, mas, sobretudo, visando projetar a engenharia nacional nestes países e, a partir daí, no mundo inteiro. Não foi Lula da Silva quem inventou isso. Mas o governo do PT foi além do general Geisel e se aliou às maiores economias emergentes, no BRICS, com o seu banco de fomento mais poderoso do que o Banco Mundial. Esse arranjo formidável da política externa altiva e ativa de Lula e Celso Amorim se materializou em Fortaleza durante a gestão Dilma Rousseff. 

 

Por oportuno, um esclarecimento sobre a questão da refinaria de Pasadena merece especial atenção. Além daquela ter acesso, por força de contrato, ao Colonial Pipeline, que liga Pasadena à Nova York, havia óleo crú e insumos para refino estocados, quando da aquisição dos 50% das ações, e vendedor havia quitado débitos tributários trabalhistas e ambientais vultuosos. Todos estes haveres foram considerados pelo City Group e pela MacKinsey que auditaram a operação de compra e respectiva due diligence, sendo que ambas as instituições validaram a justeza do preço e sua compatibilidade com os preços praticados no mercado. Não houve sobrepreço naquela aquisição, apesar do TCU insistir em dizer que havia por pelo menos 3 razões: o preço total pago pela ASTRA para adquirir Pasadena do antigo dono, a Crown envolveu a assunção das dívidas acima mencionadas, um contrato de arrendamento da refinaria em uma parcela final de 42 milhões de dólares. Chegou-se, assim, ao valor total de, aproximadamente, 360 milhões de dólares. 

A Petrobrás comprou os 50% restantes por 720 milhões de dólares em 2006, com o mercado bastante aquecido, pois 2006 foi considerado o ano de ouro do refino, tendo havido 11 operações de compra e venda de refinarias no mundo. A métrica mundialmente aceita para definir o preço de uma refinaria é a relação dólar por barril. Naquele ano de 2006, o preço das11 aquisições variaram de 3,2 mil a 18,6 mil dólares por barril de destilação. A Petrobrás comprou Pasadena na faixa de 7,2 mil dólares por barril de destilação, abaixo da mediana dos preços praticados em 2016. É preciso lembrar que a segunda metade das ações teve seu preço final determinado por uma arbitragem internacional, pois o sócio privado que detinha os demais 50 % das ações se recusava a realizar as obras que a Petrobrás entendia necessárias. Tal desinteligência entre os sócios se resolveu mediante arbitragem por força da cláusula compromissória que é padrão em negociações deste jaez. A arbitragem foi desfavorável à Petrobrás que, ainda, tentou questionar o Laudo Arbitral em juízo nos Estados Unidos, porém sem sucesso, o que majorou ainda mais os restantes 50% das ações. 

Por fim, no ano de 2019, a refinaria de Pasadena foi vendida a Chevron por 566 milhões de dólares, proporcionando um significativo ganho cambial à Petrobrás que havia adquirido a refinaria com um real mais apreciado frente ao dólar norte americano. A lógica que presidiu a aquisição da refinaria de Pasadena era ganhar as margens de refino do óleo pesado do pós-sal que a Petrobrás exportava para os EUA para comprar óleo leve raro no Brasil e fazer um blend (mistura) com o nosso óleo mais pesado pós-sal para processar mais facilmente os derivados em nossas refinarias, originalmente projetadas para óleo leve, nas décadas de 60 e 70,  em sua maioria quando importávamos quase todo o óleo dos países árabes e não havíamos, ainda, descoberto a Bacia de Campos.

Quando surgiu o pré-sal com oléo leve, de excelente qualidade na Bacia de Santos, nem haveria mais necessidade de adaptar a refinaria de Pasadena para processar óleo pesado exportado da bacia de Campos e, nem tampouco, de importar o leve que agora temos no pré-sal da Bacia de Santos, em abundância. Portanto, a reforma da refinaria de Pasadena para processar óleo pesado que foi a causa do lítigio com a ASTRA também não era mais necessária. O que ASTRA não admitia era parar de faturar com o refino diário e aguardar, talvez por anos, pela conclusão da reforma para processar óleo pesado e, ainda, suportando as despesas daquela obra. Por isto, a ASTRA se retirou da sociedade exigindo a precificação das suas ações pela via arbitral. A Petrobrás foi ao Judiciário dos EUA contra o Laudo Arbitral que fixou um preço excessivo para as ações da ASTRA. Porém, na Class Action, semelhante à nossa ação civil pública, que os fundos abutres moveram contra ela com a acusação de que o balanço patrimonial da Petrobrás não refletia os desvios da Lava Jato, a Petrobrás aceitou pagar U$ 2,95 bilhões de dólares sem, ao menos existir uma sentença de primeiro grau. No mérito era razoável sustentar que nem os 4 Auditores Independentes que se revezam na auditagem das Demonstrações Financeiras da Petrobrás, as famosas big four, conseguiram vislumbrar algum vestígio dos desvios em cada ano de auditagem. Nem, tampouco, os órgãos de controle (TCU e CGU) detectaram o desvio de 6,194 bilhões de reais, ocorridos no período de 2004 a 2014com base em delações premiadas, o que foi reconhecido no balanço patrimonial de 2014 da Petrobrás. Sucede que, neste mesmo período de 2004 a 2014, a Petrobrás faturou mais de 2,4 trilhões de reais. Assim sendo, o sobrepreço, ou superfaturamento, equivaleria a um percentual de 0,25% sobre o faturamento em igual período, que tornava os desvios imperceptíveis para quaisquer sistemas de controle interno ou compliance, como está em voga dizer. Tal percentual de 0,25 % é considerado imaterial, segundo as regras contábeis internacionais. Tanto assim que os auditores externos internacionais, as chamadas big four (Deloitte, KPMG, PWC, Ernst & Young) foram incapazes de detectá-lo, o que as levou a assinar os balanços patrimoniais de 2004 até o ano de 2014, sem ressalvas neste particular.  

Digna de nota é a iniciativa inusual adotada pela Petrobrás, naquela class action que os detentores de ADRs nos EUA moveram contra ela sob o argumento de que o balanço patrimonial da Petrobrás não refletiria os desvios apontados pela Lava Jato. Tão logo instaurada aquela class action nos EUA, a Petrobrás, comandada por Pedro Parente não aguardou sequer a sentença de primeiro grau, quanto mais a teve veleidade de recorrer à segunda instância judicial como sói acontecer nas reclamações trabalhistas em que a Petrobás posterga o deslinde final de todas as maneiras, por décadas, o pagamento de seus empregados. A procrastinação por parte do Réu em todo tipo de ação judicial é o que de ordinário acontece no dia a dia forense, sendo uma conduta mais antiga do que a Sé de Braga, seja pelo esgotamento de todas as instâncias recursais, ou até mediante expedientes desleais conhecidos por chicana processual. A flagrante diferença na conduta processual, expedita no pagamento aos detentores de ADRs, sem esgotar as instâncias recursais e, de outro lado, extremamente morosa quando se trata de causas tributárias, ambientais, cíveis ou, mesmo, reclamações trabalhistas já transitadas em julgado até pelo TST, que são postergadas ad nauseam na fase de execução, é muito reveladora do grau de captura a que a Petrobrás se encontra submetida pelo mercado financeiro. Em linha, aliás, essa conduta marcada pelo temor reverencial ao mercado financeiro, com aquela vetusta resolução do CA da Petrobrás, da era FHC, que exigia dos indicados ao cargo de presidente da estatal, dentre outros predicados e requisitos para assunção, o notório reconhecimento perante o mercado financeiro.

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