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Marconi Moura de Lima

Professor, escritor. Graduado em Letras pela Universidade de Brasília (UnB) e Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. Leciona no curso de Agroecologia na Universidade Estadual de Goiás (UEG), e teima discutir questões de um novo arranjo civilizatório brasileiro.

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Como a pandemia da COVID-19 salvou o SUS

Todos sabemos que há décadas, a infra (e super)estrutura do capital força o lobby no Congresso para o Brasil retornar ao sistema do antigo INAMPS [1], ou fazer algo pior e acabar com o SUS sem nada oferecer à população

Bolsonaro e Mandetta participam de entrevista coletiva em Brasília (Foto: REUTERS/Adriano Machado)
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Por irônico que possa parecer, o coronavírus “salvou” o nosso Sistema Único de Saúde. Aí você me perguntará: “como?”. Vamos refletir sobre os fatos históricos. Todos sabemos que há décadas, a infra (e super)estrutura do capital força o lobby no Congresso Nacional para, na melhor das hipóteses (não sei para quem é melhor), o Brasil retornar ao sistema do antigo INAMPS [1], ou fazer algo pior e acabar com o SUS sem nada oferecer à população.

Bem rudimentarmente, explico que o INAMPS era o sistema de saúde para os trabalhadores com carteira assinada (que pagavam parte do acesso à estrutura sanitária) e outros segurados. Isto é, os pobres, desempregados e os que não tivessem como contribuir de forma alguma, dependiam basicamente da filantropia e da sorte para não morrerem sem assistência à saúde.

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Foi pela revolução do SUS que a saúde passou a ser universal, isto é, para todos, sem discriminação. E quem paga é o orçamento geral dos entes federados, isto é, não tem contribuição voluntária, nem cobrança adicional. Parte dos nossos impostos, obrigatoriamente, vai para um Sistema que deve cuidar da saúde da população em qualquer canto do Brasil e para qualquer necessidade que se relacione à vida e à qualidade de vida (saúde integral).  Entretanto, ao criar um sistema assim, os bilionários da saúde privada perderam algum dinheiro. Sejam donos de hospitais conveniados com o poder público, ou as operadoras de planos de saúde, parte de seu lucro tornou-se democratizado com o Governo (nas três esferas) gerenciando e ofertando conexões de saúde.

Ora, onde já se viu empresário perder dinheiro (mesmo que seja pouco, muito, tanto faz), e eles simplesmente cruzarem os braços?

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Pois bem! Vários deputados e senadores são eleitos em todos os tempos patrocinados pelos planos, concessionárias e grandes redes de saúde. Entre os quais, três nomes [2] são fundamentais para que você acompanhe uma linha do tempo e adicione à sua luta atual a qualidade dessa compreensão, sob pena de retornarmos ao “tempo das cavernas” em termos da lógica de saúde pública. Senão, vejamos: Deputado Eduardo Cunha, que foi inclusive um dos mais poderosos presidentes da Câmara dos Deputados em todos os tempos; Deputado Luiz Henrique Mandetta, este que recentemente virou “herói” (a falta de memória faz isso conosco) com suas falas durante o enfrentamento do coronavírus quando Ministro da Saúde; e Deputado Jair Messias Bolsonaro, embora este tenha atuado para o fim do SUS não tanto com projetos (que eu lembre ele nem projeto tinha nos 30 anos que ficou na Câmara), mas com votações; e agora com seu poder de caneta como Presidente da República. [3] Entendamos um pouco estes três marcos (temporais e discursivos) para a dura resistência do Sistema Único de Saúde. Em 2014, o então deputado Cunha apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC nº 451/2014) em que, linhas gerais, revogava a existência do SUS e obrigava que o acesso à saúde fosse por meio de planos, entretanto, apenas para quem tivesse carteira assinada e outras categorias especiais, como trabalhadores rurais. Na prática, isso não serviria de forma alguma para boa parte dos moradores de uma favela, por exemplo, ou de alguma cidade pequena no rincão do Brasil. Apenas poucos (face que no Brasil há milhões de pessoas autônomas, na informalidade, ou desempregadas) poderiam ser atendidos pelos hospitais. Na prática dois: isso era apenas para alimentar as burras de dinheiro dos já podres de ricos que “vendem” saúde.[4] Quanto ao ex-deputado, Luiz Mandetta, não irei me ater aos detalhes, mas deixo a vocês um texto que fiz para o Brasil 247 e que explica melhor o histórico deste contra o SUS [5]. Vale constar aqui muito brevemente três fatos em Mandetta: i) em 2013 lutou com poucos deputados contra o Programa Mais Médico, que pretendia levar estes profissionais aos confins do Brasil, locais onde era impossível ter médico; ii) em 2016 foi aprovada a Emenda Constitucional nº 95, que acabou com os recursos do SUS (e outras políticas), e Mandetta não apenas votou como defendeu a chamada PEC do Teto de Gastos; e iii) em 2019, logo que assumiu o Ministério da Saúde, Mandetta passou a defender que o SUS cobrasse taxas por certos tipos de serviços a certos tipos de indivíduos, o que contraria o Constituição Federal e os princípios deste Sistema. Referente à Bolsonaro, este foi eleito Presidente do Brasil com o financiamento – também – dos empresários da saúde. Ademais, seus discursos e atuações na Câmara Federal sempre foram na mesma linha do seu ex-ministro Mandetta, votando tudo sobre/contra o SUS.

O trabalho de Bolsonaro à frente do Palácio do Planalto e como chefe das políticas do País, entre as quais, a Saúde, seria (é) o desmonte do Sistema Único. Entretanto, de todos os azares que a humanidade (e o Brasil) teve com a pandemia da COVID-19, por incrível que pareça, a única benção foi a percepção cada vez maior da população (e de certos setores influentes da sociedade) é de que, sem o SUS, o Brasil nesse tempo do coronavírus teria ido ao extremo do colapso; que foi o SUS que realmente salvou milhões de vida (e salvaria tanto mais não fosse a sabotagem do Presidente e seus asseclas); que a organização, a universalização, a regionalização, a gratuidade e tudo mais deste revolucionário Sistema foi capaz de estancar uma sangria feita em represa rompida descendo a lama da COVID-19 ladeira abaixo e provocando uma tragédia inigualável no País.

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Em síntese, o SUS mostrou-se mais forte que Eduardo Cunha, que Luiz Mandetta, que Jair Bolsonaro, e continua a vencer seus desafetos afetados por dinheiro e lucro na libertinagem e ganância sem limites (éticos ou estéticos) dos donos de planos e de redes privadas de saúde. Seguiremos resistentes! O SUS vai salvar, em definitivo, o Brasil da COVID-19 (com a vacina e todos os demais meios)! E o SUS continuará a existir, pois é por sua estrutura que continuamos a existir.

E nossa única gratidão à pandemia é o fato dela ter testado o maior e mais importante Sistema de Saúde do mundo, provando sua vitória, contra tudo e todos que o boicotam. Viva o SUS!

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[1] Referente ao Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), autarquia federal que foi criada em 1977 pela Lei nº 6.439, recomendo a leitura de dois pequenos textos. 

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O primeiro, uma síntese histórica retirada do sítio da Fundação Getúlio Vargas, inclusive com a explicação do verbete:

http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/instituto-nacional-de-assistencia-medica-da-previdencia-social-inamps

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O segundo, uma síntese política e de mérito retirada do sítio do Senado Federal: 

https://www12.senado.leg.br/emdiscussao/edicoes/saude/contexto/antes-do-sus-saude-era-para-poucos

[2] Deixemos claro que são dezenas e dezenas de líderes políticos; de prefeitos-médicos e outros, a deputados federais que são eleitos para, entre outras coisas, lutarem contra o financiamento público da saúde. 

Cito no texto estes três nomes pela relevância simbólica de seus cargos e imaginários na população.

[3] Bolsonaro é tão inútil que não conseguiu ser autor sozinho de Projeto de Lei relevante, no entanto, ele foi coautor de uma iniciativa cruel sobre saúde: trata-se do PL 6055/2013, que pretende a revogação completa da lei 12.845, esta que trata do atendimento obrigatório a mulheres vítimas de violência sexual.

[4] Sugiro ainda a leitura de uma reportagem da revista Carta Capital em cuja síntese, esclareço, refere-se aos trabalhos e mobilizações do ex-deputado Eduardo Cunha para acabar com o SUS, todavia, também alude à proposta de CPI dos Planos de Saúde, apresentada pelo deputado Ivan Valente, e que não prosperou dado o poder de Cunha na Presidência da Câmara.

https://www.cartacapital.com.br/politica/o-sus-na-mira-de-eduardo-cunha-7587/

[5] Finalmente, quanto às implicações de caráter e das “lutas” do ex-deputado Henrique Mandetta, segue um texto meu sobre este assunto:

https://www.brasil247.com/blog/mandetta-o-heroi-vilao-que-nao-se-faz-necessario

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