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Alvaro Penteado Crósta

Professor do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas

8 artigos

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Como o mundo vê o Brasil de hoje

O fato é que o Brasil, antes visto como um modelo no combate à fome e à miséria, é hoje tomado de assalto por um bando de tresloucados que batem no peito com orgulho ao se assumirem anti-ciência e negacionistas. O resultado foi que o Brasil, com menos de 3% da população mundial, já atingiu a vergonhosa marca de 13% do total mundial de mortes pelo vírus!

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A semana que se encerra alcançou um marco mundial inédito e digno de destaque: um bilhão de pessoas já foram vacinadas contra a Covid-19 – para ser mais preciso exatos 1,03 bilhão em 27/04/2021. Porém, o mais surpreendente ainda é que essa marca foi alcançada depois de apenas 4 meses do início da vacinação em escala mundial. A previsão é que o segundo bilhão de pessoas sejam vacinadas em um intervalo ainda menor de tempo.

Esse percentual equivale a cerca de 8% da população mundial que recebeu ao menos a primeira dose de uma das várias vacinas disponíveis. Embora surpreenda pela quantidade e pelo curto prazo em que ocorreu, esse percentual, segundo a OMS e os cientistas, é ainda muito reduzido, uma vez que para controlar a pandemia ele deveria chegar a 70-75%. Mais ainda, a distribuição da vacinação pelos países é bastante desigual, com alguns países desenvolvidos já tendo atingido essa meta e outros se aproximando rapidamente. Já nos países pobres e periféricos, os percentuais são ainda baixos, por volta de 9-10%.

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E o Brasil, como está nesse cenário da imunização contra a doença que já ceifou, até o último sábado, mais de 406 mil vidas? A resposta a essa pergunta, infelizmente, é bastante negativa para um país que tem, há décadas e graças aos SUS, um programa muito bem estruturado nacionalmente de imunizações. Conseguimos, até o momento, vacinar somente 14% da população com a primeira dose e reduzidos 7% com duas doses. Estamos, portanto, muito distantes da meta de 70-75% e é provável que só venhamos a atingi-la no primeiro semestre de 2022. Em termos comparativos, estamos em pé de igualdade com países muito mais pobres e acentuadamente menos desenvolvidos.

Nesta semana houve também um outro fato que merece destaque. As duas mais importantes revistas científicas do mundo, a inglesa Nature e a norte-americana Science, dedicaram matérias extensas à preocupante situação sanitária do Brasil. Não é coincidência que essas duas publicações de enorme prestígio e tradição olhem com muita inquietação para o país e publiquem, de forma independente, matérias cujos conteúdos é notadamente crítico à necro-política que vem sendo praticada pelo governo federal.

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A Nature destaca as ações anti-ciência do governo Bolsonaro dizendo, após ouvir cientistas brasileiros engajados na luta contra a Covid-19, que esse mesmo governo falhou miseravelmente em responder, com base na ciência, à crise sanitária. O epidemiologista Jesem Orellana, da Fiocruz de Manaus, declarou à revista que pelo menos metade das mortes seriam passíveis de prevenção e que a situação é um “desastre total”. A revista constatou ainda que, ao invés de priorizar os investimentos no combate à pandemia, o presidente Bolsonaro agiu no sentido de sabotar a ciência. Com isso, o estudo da variante P1 do vírus, surgida no Amazonas, ficou prejudicado, para citar apenas um exemplo. Segundo o virologista Maurício Nogueira da escola de medicina FAMERP, em São José do Rio Preto, “Nós não tivemos recursos para tentar entender os motivos da virulência das variantes, por falta de equipamentos e reagentes”. 

A Nature indica também que os cortes aos financiamentos de projetos científicos e das verbas para educação em geral já vinham acontecendo desde a posse de Bolsonaro em 2019, oferecendo ao vírus um campo fértil para se propagar. Natalia Pasternak, microbióloga e presidente do Instituto Questão de Ciência, declarou à revista que, apesar dos cortes sofridos pelos órgãos federais de financiamento à pesquisa, nenhum cientista brasileiro conseguiu antever a dimensão do desastre que está ocorrendo no país.

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Os péssimos exemplos dados pelo presidente da República foram um incentivo para que parte da população menosprezasse os perigos e riscos da doença, evitasse o uso de máscaras (algo que o mandatário continua fazendo questão de mostrar em público) e o distanciamento social. Este último, segundo ele próprio, é o principal culpado pela crise econômica, responsabilizando os governadores e prefeitos pela sua implantação que, pelo seu entendimento, é desnecessária. E para coroar seus esforços em prol do vírus, Bolsonaro advoga a charlatanice da “terapia precoce”, ao ponto de ter sua figura patética registrada em pose para os fotógrafos brandindo ameaçadoramente uma caixa de cloroquina em direção às assustadas emas que frequentam os gramados do Palácio da Alvorada. 

Já a revista Science destaca a preocupação mundial com o contágio de humanos por doenças que sequer são conhecidas. Na matéria, a revista relata o trabalho pioneiro de monitoramento dessas zoonoses, que vinha sendo realizado desde 2012 por professores e estudantes da Universidade Federal do Amazonas, em colaboração com a Fiocruz da Amazônia. Com auxílio de um financiamento da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional, no âmbito do programa PREDICT, foi montado um repositório genômico de materiais coletados a partir de animais. Esse trabalho se encontra paralisado em função da gravidade da crise sanitária em toda a região amazônica, e particularmente na cidade de Manaus, onde mais de 9 mil pessoas já perderam a vida para a Covid-19. Essas doenças podem, potencialmente, ser transmitidas por animais que são comuns na região amazônica, responsável por uma das maiores biodiversidades do planeta.

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Por outro lado, as políticas de devastação ambiental promovidas pelo presidente e seu ministro do meio-ambiente, aliadas à ocupação desordenada e predatória da região, contribuem para o contato entre os seres humanos e patógenos ainda desconhecidos da ciência, colocando em risco toda a humanidade, como mostrou a Covid-19. A expansão da própria cidade de Manaus, por exemplo, se dá às custas da floresta que a cerca, onde vivem muitas espécies potencialmente portadoras de zoonoses. Já há até mesmo a identificação por esse grupo de pesquisadores de um vírus que é fortíssimo candidato a um próximo surto pandêmico. Trata-se do vírus Mayaro, cujo vetor é um mosquito comum nas florestas da Amazônia, e que produz uma doença facilmente confundível com outras enfermidades graves, como a chikungunya e a dengue, para as quais ainda não existe vacina eficaz.

Até que o Brasil consiga atingir a meta de vacinação estabelecida como segura pela ciência, quantas vidas mais serão sacrificadas pelas ações pró-vírus, promovidas pelo governo de Bolsonaro? Essa é a questão que me é colocada por pessoas do mundo todo com as quais tenho contatos regulares, e para a qual, com um nó na garganta, não consigo achar resposta.

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O fato é que o Brasil, antes visto como um modelo no combate à fome e à miséria, é hoje tomado de assalto por um bando de tresloucados que batem no peito com orgulho ao se assumirem anti-ciência e negacionistas. O resultado foi que o Brasil, com menos de 3% da população mundial, já atingiu a vergonhosa marca de 13% do total mundial de mortes pelo vírus!

Que resposta dar a essa pergunta sobre um país cujos dirigentes, como seu próprio presidente da República e ministros, mostraram não nutrir pela vida dos brasileiros e brasileiras nenhuma consideração ou respeito? 

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