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Miguel Paiva

Miguel Paiva é chargista e jornalista, criador de vários personagens e hoje faz parte do coletivo Jornalistas Pela Democracia

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Consumo suicida

"Que sociedade viramos nesse caminhar suicida que inauguramos na pandemia? Porque será que as pessoas tem essa ânsia de voltar ao normal? Porque o normal ilude, dá a sensação de que somos vencedores", escreve Miguel Paiva

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O que se constata nesses tempos é que somos uma sociedade de consumo. Pobre, mas de consumo. Consumo pobre, talvez, ou somente uma sociedade com a ideia de que liberdade é poder consumir. Essas filas de pessoas aflitas para entrarem nos shoppings depois da flexibilização ( nome sofisticado para condenação ) retrata bem isso. 

Fico aqui pensando nesses tempos de liberdade total de pensamento, o que querem elas fazer nos shoppings abertos? Já que não têm tanto dinheiro assim, talvez queiram ter a ilusão de que o mal passou. Tudo voltou ao normal. Posso circular novamente. Ou talvez experimentar a sensação, também ilusória, de que podem gastar novamente. Gastar virou símbolo de liberdade. Enquanto não me proibirem de consumir sou uma pessoa livre. Não importa se tenho dinheiro ou não. Gasto aquilo que tenho e o resto que se dane. Posso até me contaminar nesse impulso louco de liberação, mas vou me contaminar exercendo esse direito. 

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É um pouco o que prega Bolsonaro e seus asseclas confundindo a cabeça das pessoas sobre o que é liberdade. Existem certas conquistas da democracia que não podem ser derrubadas. Faz parte da constituição. Inclusive respeitar a constituição faz parte da constituição. Mas eles acham que liberdade de expressão é poder pregar a queda da constituição. Não pode. Isso ameaça a democracia do mesmo jeito que qualquer manifestação nazista no mundo é proibido porque justamente o nazismo vai contra a livre manifestação. Basta ler um livro de história inclusive aqueles fascículos da Editora Abril que eram vendidos em banca.

Mas voltando à nossa sociedade e a sua livre manifestação do desejo de consumir constatamos um erro na origem. Essa sociedade neoliberal forma pessoas que não são capazes de viver de modo mais digno. Ela forma pessoas que sonham em ser aquilo que jamais serão. A própria sociedade neoliberal se estrutura nessa pirâmide em que os mais pobres sustentam os mais ricos. Os mais pobres, segundo os mais ricos, devem voltar logo ao trabalho, aos shoppings e ao consumo. Podem até morrer, mas nós os  mais ricos precisamos desse mecanismo para sermos cada dia mais ricos. Nos protegemos melhor do vírus, temos mais dinheiro e mais leitos hospitalares por isso podemos manter o trabalho pra que vocês nos sustentem e possam circular nos shoppings populares e nos transportes públicos, se sentindo de novo vivos até o momento em que vão morrer. Desse jeito, muita gente vai morrer, mas que diferença faz para os que tem mais dinheiro? Nenhuma, ou melhor, toda a diferença. Menos gente, a divisão fica melhor, sobra mais dinheiro.

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Que sociedade viramos nesse caminhar suicida que inauguramos na pandemia? Porque será que as pessoas tem essa ânsia de voltar ao normal? Porque o normal ilude, dá a sensação de que somos vencedores. Conseguimos vencer a pandemia e vamos conseguir vencer as dificuldades da vida? Voltar a circular nos shoppings ou nas praias passa essa ilusão. Queremos viver, claro. É justo. Mas queremos viver a vida real, onde ao trabalho é um direito e a qualidade de vida uma conquista. Fingir que estou bem não resolve. Precisamos de mais tempo. De mais governo que saiba não só dar o exemplo como as condições para que essa sociedade possa esperar em casa. 

Um estado mais forte é fundamental mas um estado forte não é o que anda armado pelas ruas. É o que dá conforto e segurança ao cidadão para quando o dia chegar poder realmente sair as ruas para ser feliz e não se enganar comprando uma camiseta falsa por um preço exorbitante para dar de presente e assim ter a sensação de voltou a viver. Isso é morrer sendo enganado. Mas não se deixem enganar.

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