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Gustavo Santos

Doutor em economia pela UFRJ e analista do BNDES

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Democracia, juros e um novo modelo de desenvolvimento

O atual Presidente brasileiro talvez seja o último que poderá liderar aqui uma saída semelhante ao New Deal e, assim, preservar o atual regime democrático

(Foto: Fotos: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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É o momento de adotar, democraticamente, um novo modelo de desenvolvimento, antes que ocorra uma grave crise econômica, social e política. Nesse caso, há risco que as mudanças necessárias sejam impostas por vias autoritárias.  

Uma crise econômica, política e ideológica global está surgindo no horizonte. A crise econômica será decorrente da ressaca da pandemia e da inevitável escalada da guerra da Ucrânia, somadas ao crescente protecionismo decorrente da política de desacoplamento da China.  

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Esses processos vão continuar intensificando o processo inflacionário global pelo aumento dos preços da energia, alimentos e insumos industriais.  

A inflação crescente vai afetar a legitimidade dos governos em todo mundo, especialmente depois que as políticas de combate à inflação, que se utilizam do aumento dos juros, afetarem os mercados financeiros e o investimento, levando a crescente desemprego.  

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Isso virá combinado com crescente falta de legitimidade do liberalismo mesmo em seus tradicionais bastiões. O descontentamento aumentará, governantes continuarão sendo trocados, veremos mais protestos sociais e um crescente apoio a políticos radicais ou contrários ao sistema, normalmente de extrema direita.  

Essa descrição acima é muito parecida com o que aconteceu nos anos 1930 e 1940. Todos conhecemos as consequências disso. A democracia sobreviveu em muitos poucos países na década de 1930.

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Em nenhum deles o liberalismo mais radical prevaleceu, com as parciais exceções da França e da Inglaterra, que tinham imensos impérios coloniais cujos recursos naturais e humanos poderiam lhes ajudar a adiar as mudanças necessárias.  

Nessa época, Estados Unidos e Suécia inovaram, respectivamente, com o New Deal e o Estado de Bem-Estar.  Mantiveram a democracia e a maioria dos elementos do liberalismo/capitalismo por meio de um novo pacto social que oferecesse aos trabalhadores uma “utopia” ou perspectiva de vida alternativa aos oferecidos pelo socialismo e pelo fascismo.  

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Essa “utopia” ou perspectiva de vida alternativa significou mais direitos sociais, emprego, melhores salários e condições financeiras para viabilizar a aquisição pelos trabalhadores de uma bela residência em bairros revitalizados que lhes davam satisfação em morar.  

Foi um sucesso. Nos EUA, durou 50 anos, na Suécia e na maior parte da Europa, que lhe copiou, durou até pouco tempo atrás. Mas as principais conquistas se mantém até hoje.  

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Essa pode ser a opção do Brasil. Caso contrário, poderemos cair em soluções mais parecidas com as da Itália, Alemanha ou outras que emergiram naquela época em todo o mundo.  

O atual Presidente brasileiro talvez seja o último que poderá liderar aqui uma saída semelhante ao New Deal e, assim, preservar o atual regime democrático.

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O maior desafio a ser superado para alcançar essa saída é convencimento do setor bancário a embarcar em um novo modelo de Desenvolvimento, porque o atual, baseado nos juros e spreads mais altos do mundo, e que já dura 40 anos, produz um lucro substantivo e seguro.  

Porém, as atuais taxas de juros tornam inviável o desenvolvimento. Juros permanentemente altos levam a valorização cambial, déficit externo e depois a crises cambiais.  

Tudo isso leva a redução dos investimentos produtivos e habitacionais, baixo crescimento da produtividade, do emprego e da arrecadação de impostos. Consequentemente os gastos com saúde, educação e segurança pública. A consequência é o que a gente lamenta todos os dias, dezenas de milhões de brasileiros vivendo em favelas, na pobreza e suscetíveis à violência urbana.

Muito economistas do mercado financeiro acreditam que a única medida necessária para dar estabilidade a esse sistema é de natureza contábil, por meio da manutenção de um elevado superávit primário ou algum critério semelhante de contenção das despesas públicas de forma a compensar os elevados gastos com juros.  

A redução dos gastos públicos só torna a questão social, econômica e política mais instável e a crise mais próxima. Entretanto, o medo de mexer em “time que está ganhando” pode estar levando o setor financeiro não ver a tempestade chegando.  

Diferentemente das crises dos últimos 30 anos, a próxima, mais cedo ou mais tarde, poderá levar à queda do regime político. Depois de sete anos de experiência liberal radical malsucedida e de desmoralização dos três Poderes, a Nova República tem como uma das últimas fontes de legitimidade esperança depositada no Presidente Lula e na social-democracia por 40% do eleitorado que ainda acredita neles.

Mesmo se a crise internacional não acontece neste ano, o que é improvável, a crise política ainda será muito provável no Brasil em razão dos juros muito altos, baixo crescimento e da radical oposição antissistema.  

Nesse contexto, qualquer crise econômica mal resolvida pode levar a um enfraquecimento do Governo e da democracia, iniciando um ciclo vicioso de perda de liderança, novas crises e risco de novas tentativas de golpe. Já vimos esse filme.

Em uma crise severa, a pouca legitimidade da Nova República perante a oposição, pode rapidamente se espalhar para os 40% de apoiadores do governo, caso haja forte frustração de suas expectativas.  

O colapso do regime certamente não será bom para os liberais, que passaram 30 anos emendando a Constituição. O contexto internacional induzirá regras e práticas menos favoráveis às teses liberais, se houver uma nova reforma constitucional ou algo mais extremo

Muitos acreditam que repetir qualquer variação do modelo liberal radical irá trazer, no máximo, os mesmos resultados que temos tido desde 2015. Nesse contexto, qualquer candidatura a solução autoritária à direita ou à esquerda será menos favorável aos interesses financeiros do que qualquer solução democrática.  

Cabe lembrar que mesmo os EUA estão adotando políticas econômicas mais intervencionistas e mais trabalhistas, porque suas elites estão percebendo as semelhanças que o momento tem com as décadas de 1930 e 1940, quando o modelo capitalista liberal estava duplamente ameaçado, pelo fascismo e pelo socialismo.  

Como naquela época, os regimes mais autoritários estão tendo bons resultados econômicos, sociais e tecnológicos e o modelo liberal está perdendo legitimidade e poder em todo planeta.  

Se até as elites do Ocidente rico já estão mais sensíveis à insatisfação social, as nossas deveriam estar preocupadas, pois sua legitimidade é ainda menor.  

As pessoas frustradas e ressentidas por dificuldades econômicas buscarão encontrar um culpado, que será provavelmente o regime político que elegeu o atual governo.  

Isso tende a acontecer por parte de opositores e apoiadores do atual governo, afinal não são poucos os abusos que levaram à desmoralização das instituições.

Sabe-se que um regime político não pode ser trocado por vias institucionais, e isso explica por que tanta gente acampou por tanto tempo nos quartéis até o momento em que decidiram depredar os três Poderes da República.

Dessa forma, a única saída para legitimar o atual regime político e as instituições que o governam é mudar o modelo de desenvolvimento para um que traga maiores resultados econômicos e sociais e afaste os riscos de radicalização política e conflito civil.  

No Brasil atual, o primeiro passo para um Novo Pacto Social com a participação inclusive do setor financeiro é manter as taxas de juros reais de curto prazo em níveis civilizados, dentro do padrão internacional, porque esse é principal fator de dissenso entre as elites e grupos políticos e porque os juros afetam toda economia, criando muitos outros dissensos.  

A partir daí, superada essa parte mais difícil no acordo, poderíamos chegar mais facilmente a novos consensos em cada um dos principais temas nacionais necessários para iniciar um novo processo de desenvolvimento.  

Dessa forma, a situação é favorável ao Pacto Social em torno dos juros civilizados proposto pelo empresário Rubens Menin e analisado no primeiro artigo da série. Afinal, no resto do mundo, os bancos ganham muito dinheiro e defendem que as taxas de juros reais de curto prazo sejam baixas. Por que aqui seria diferente?

Em um próximo artigo sugeriremos uma solução econômica para atingir rapidamente um consenso social com apoio do setor financeiro para alcançar esse objetivo, preservando nossa democracia.

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