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Paulo Moreira Leite

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Desigualdade é grande ameaça na luta contra covid-19

"Após uma década de ataques destinados a enfraquecer a saúde pública, país enfrenta o apogeu da covid-19", escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

(Foto: Reuters | Secom)
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Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Há quatro dias, o médico Dráuzio Varella sublinhou o impacto da desigualdade social brasileira na luta contra o novo coronavírus.

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"Eu acho que nós vamos ter um número muito grande de mortes, vamos ter um impacto na economia enorme, uma duração prolongada," disse ele, em entrevista à BBC News Brasil (20/4/2020).  "Agora nós  vamos pagar o preço por essa desigualdade social com a qual nós convivemos por décadas e décadas, aceitando como uma coisa praticamente natural. Agora vem a conta a pagar". 

A advertência é  pertinente. Se a pandemia do coronavírus representa uma tragédia universal,  que atinge nações de PIB gigantesco, a má distribuição de renda do Brasil -- segunda nação mais desigual do planeta -- constitui um fator decisivo para dificuldades suplementares enfrentadas pelo país, num quadro desastroso também na Itália, na Espanha e nos Estados Unidos.  

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"Mais 5,4 milhões na miséria" anunciou o Globo (20/4/2020), com base num estudo do Banco Mundial sobre novos sacrifício que serão impostos às parcelas menos protegidas da população brasileira. O risco é esse. Basta regular um vários ditos populares sobre a fome ( "saco vazio não para de pé") para avaliar o significado de carências e desigualdades.

Forçado a enfrentar uma recessão projetada em 5% negativos, um peso terrível mesmo em condições normais, imagine-se o que acontece num país cujo governo transformou o conceito "gripezinha" em principal linha de ação -- conceito cuja única utilidade é tentar banalizar um sofrimento imenso e terrível.   

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Se o covid-19 tem produzido tragédias de envergadura colossal mesmo em países com uma rede hospitalar de primeira linha e um serviço médico de ponta, não é difícil enxergar o que pode acontecer em nosso  país, onde a epidemia, ainda está longe daquele momento que os estudiosos definem como apogeu e que eliminou 407 vidas humanas nas últimas 24 horas.

Em abril-maio de 2020, mesmo uma conquista parcial como a parcela de 600 reais aos trabalhadores informais, que triplicou a miserável proposta original da equipe econômica, já começa a ser questionada pelos donos do cofre.  

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"Sem recurso, governo desiste de antecipar segunda parcela dos R$ 600", revelou o UOL (22/04/2020), referindo-se a um reforço importante na renda de 32 milhões de trabalhadores do piso mais baixo -- sem carteira assinada. Surgiu outra dificuldade, porém.

Declarando-se surpreso com o imenso número de brasileiros e brasileiras que se cadastraram para receber o benefício, o governo decidiu fazer uma revisão sobre um conjunto de 12 milhões de pedidos -- argumento que tanto pode servir para apurar pedidos sem justificativa como mera desculpa para aliviar o caixa de qualquer maneira, contornando pagamentos inteiramente legítimos, com base no mau costume de fazer austeridade nas costas de quem não pode se defender.  

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O tratamento dos assalariados com registro em carteira segue o mesmo caminho. A Medida Provisória 936  valeu-se de vários artifícios para reforçar perdas dos trabalhadores nos acordos de redução da jornada de trabalho com a redução dos salários, revela uma Nota Técnica do DIEESE, de 3 de abril.

A comparação entre as perdas sofridas por trabalhadores brasileiros e os assalariados de 15 países europeus, que também tiveram redução de ganhos na maioria dos casos, já mostra uma diferença gigantesca.

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Em 11 países europeus, foi possível preservar pelo menos 70% dos ganhos anteriores, sendo que em quatro deles os acordos asseguram 100% da renda anterior. Em  Portugal, os trabalhadores mais sacrificados conservam 66.6% dos salários.  Entre os países europeus estudados, nenhum trazia perdas tão grandes como aquelas reservadas aos assalariados brasileiros.

No Brasil, as perdas se elevam a partir do salário mínimo. O salário de R$ 2500,00, considerado o salário médio do país, sofre uma perda de um quarto do valor.  Nas camadas mais altas, os melhores salários conservam um terço de seu valor -- 34%, para ser exato.

Numa medida de caráter técnico que produziu um efeito social perverso, a equipe econômica empregou os parâmetros do seguro-desemprego para definir as compensações dos assalariados, produzindo resultados previsivelmente desvantajosos aos trabalhadores. 

No plano das políticas públicas, que atingem o conjunto da sociedade, a ampliação da desigualdade se fez através de dois atos de guerra contra os direitos dos trabalhadores, acentuando "a desigualdade com a qual convivemos por décadas e décadas", como disse Drauzio Varella.

Em dezembro de 2007, o Senado derrubou a CPMF, tributo sobre transações bancárias que assegurava R$ 20 bilhões anuais ao SUS. Uma década depois, quando um esforço de negociação no Congresso permitia recuperar em parte os recursos perdidos na batalha da CPMF, o Congresso aproveitou o Teto de Gastos para mudar o jogo mais uma vez. O argumento de que era preciso adequar-se o orçamento a limitação constitucional serviu de pretexto para a retirada de 20 bilhões originalmente destinados ao SUS.

Planejado dessa forma, tendo a saúde pública como alvo permanente é difícil imaginar que a investida contra nosso sistema de saúde pública tivesse outro resultado.

Alguma dúvida?

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