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Wilson Ramos Filho

Jurista, professor e escritor

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Dividendos

Constitui absurdo a isenção tributária dos empresários. Todos pagam Imposto de Renda, menos os empregadores. Aliás, no Brasil, quem paga impostos são apenas os trabalhadores e os consumidores

A previdência dos militares e o 'sacrifício' de Paulo Guedes (Foto: S…RGIO CASTRO)
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Exercitando minha antológica capacidade em ampliar o número de desafetos a cada vez que emito opinião arrisco apoiar a tributação de dividendos dos cotistas de pessoas jurídicas proposta pelo Guedes. Por outras motivações, mas a apoio.

Constitui absurdo a isenção tributária dos empresários. Todos pagam Imposto de Renda, menos os empregadores. Aliás, no Brasil, quem paga impostos são apenas os trabalhadores e os consumidores.

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Apesar dos empresários reclamarem da “carga tributária” as empresas não pagam impostos. Não estou falando de sonegação. Não pagam nenhum imposto porque embutem os impostos nos preços dos seus produtos e serviços. Quem os paga, portanto, são os consumidores!

Teoricamente o preço de um produto ou serviço seria - simplificando - composto pelos custos de produção somados à margem de lucro. No Brasil é diferente. Os preços aqui são estabelecidos pelo quanto os consumidores estão dispostos a pagar, razão pela qual muitas “margens de lucro”, entre nós, são verdadeiramente obscenas, umas mais, outras menos. Mas com frequência os empresários apenas repassam o valor dos impostos aos preços que praticam. E ficam brabos na hora de recolher os tributos (que já foram embutidos nos preços) por quererem ampliar ainda mais seus lucros e rendimentos.

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Os donos das empresas não pagam I.R. sobre as retiradas que fazem. Na real, o nome do tributo está errado. Deveria se chamar de imposto sobre o salário, pois os valores que recebem como sócios nos negócios, estão - desde o governo FHC - isentos de Imposto de Renda e nisso os governos progressistas desde então não ousaram mexer.

Guedes, o superministro do Bozo, agora promete tributar os dividendos, oferecendo como contrapartida “desonerar a folha de pagamentos”. Parece estranho, um neoliberal propondo imposto, “coisa de esquerdista”. Não é. O governo percebeu que precisa de dinheiro e que não haverá a prometida “recuperação econômica” com a compressão dos salários. E vem para cima dos pequenos empresários e dos prestadores de serviços.

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Seja como for, o valor dos impostos que vierem a incidir sobre os lucros e dividendos, serão - nas grandes e médias empresas - em boa parte repassados para os preços de seus produtos ou serviços. Os maiores prejudicados serão os “empreendedores” que, para diminuir os valores que deveriam recolher de impostos, emitem notas fiscais. Aludo, principalmente, aos “trabalhadores PJ” que se alegram de pagar apenas entre 6% e 16,5% sobre o que recebem pelo seu trabalho (escapando do IR que pode chegar a 27,5% e do INSS sobre a remuneração real). Aprovada a medida, pagarão Imposto de Renda.

Particularmente um segmento social será bastante prejudicado. Refiro-me aos escritórios de advocacia, às clínicas médicas e odontológicas, e às demais empresas de consultoria e de prestação de serviços. Salvo exceções estatisticamente irrelevantes seus donos não pagam IR sobre suas retiradas mensais, trimestrais ou anuais em suas empresas, muitas delas individuais. Terão que pagar. No caso específico dos escritórios de advocacia o impacto poderá ser vultoso pois teriam enormes dificuldades em repassar o encargo à clientela. Essa era a grande reclamação dos médicos, dentistas e advogados em relação à CPMF, cobrada em suas contas bancárias, e que não permitia que fossem empurradas aos seus clientes. Hoje não pagam, terão que pagar, o IR sobre os dividendos e não ficarão, suponho, muito satisfeitos.

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Não se diga que poderão “compensar” os valores que recolherão de IR com a redução dos encargos incidentes sobre suas folhas de pagamento, como promete o Ministro. Não sei como os escritórios estão organizados agora, parei de advogar há mais de cinco anos e a advocacia mudou muito desde então. No tempo em que advogava nem todos os escritórios de advocacia cumpriam integralmente a legislação trabalhista em relação aos advogados contratados que na prática compunham mais de 70% de suas folhas de pagamento. Muito embora contratassem advogados sob subordinação e salários fixos mensais, colocavam tais empregados como “associados”, com percentuais ínfimos, em torno de um ou dois por cento, para contornar a legislação. Remuneravam os advogados contratados (quase sempre com a conivência destes “para pagarem menos impostos e para recolher INSS apenas sobre o pró-labore”) como se fosse “distribuição de dividendos” ainda que em valores fixos mensais. Provavelmente isso já não ocorre, coisa de um passado do qual não poderíamos nos orgulhar, e não apenas nos escritórios de advocacia, também em outras empresas prestadoras de serviço.

Pois bem, se aprovada a proposta do Guedes, as empresas teriam que recolher o IR sobre os lucros e dividendos pagos aos seus sócios reais e que precisarão administrar o descontentamento dos “sócios fictícios”, dos empregados que recebem salários disfarçados como “associados” ou como pejotas. No passado havia escritórios que sequer pagavam o “piso ético” indicado pela OAB (pouco mais de quatro mil reais mensais, dependendo de cada Estado). Remuneravam seus associados com menos da metade daquele valor corporativamente sugerido. O mesmo ocorre hoje em clínicas, em diversas atividades ligadas à administração de empresas e em agências de jornalismo e de publicidade. Esse enorme contingente de precarizados, proletarizados, não vai gostar da incidência de IR que reduza ainda mais seus míseros rendimentos. Muito provavelmente os tomadores de seus serviços teriam que assumir esse custo. O mesmo poderá ocorrer em outros setores da economia que, segundo estatísticas recentes, vêm substituído empregados formais por “trabalhadores PJ”.

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Que fundamentos, inclusive como empresário, me levam a apoiar a tributação dos lucros e dividendos das empresas, inclusive dos escritórios de advocacia, das clínicas de saúde, das agências, das consultorias e similares?

Manifesto meu apoio à incidência de IR sobre os lucros dos empresários, correndo os riscos da incompreensão, por duas razões principais:(1) por coerência, não faz sentido a classe trabalhadora pagar o IR e os empregadores, os sócios das empresas, ficarem isentos deste tributo; e (2) porque acredito que certos setores sociais só adquirem consciência quando sentem no bolso as consequências de suas desastrosas opções políticas e eleitorais.

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A imensa maioria dos advogados, médicos, dentistas, publicitários, jornalistas, consultores de empresas, etc, que compõe a classe média na iniciativa privada apoiou o Golpe de 2016 e suas consequências (limitação nos gastos e políticas públicas para os pobres, reformas trabalhistas e previdenciária, privatizações), aplaudiu e aplaude a LavaJato e o Estado de Exceção, e votou no Bozo. Tais setores médios da sociedade só começarão a perceber a dimensão da sua irresponsabilidade quando se virem prejudicados. Até agora os grandes afetados pelo neoliberalismo como maneira de existir em sociedade foram os que vendem sua força-de-trabalho mediante vínculo de emprego, formalizado ou não, embora a médio e longo prazos atingirá a todos. A reação da sociedade, por mais difícil que seja admitirmos, carece ainda de que as maldades neoliberais atinjam também a classe média, os que não sendo tão mal-remunerados se sentem partícipes da elite. Desejo sinceramente que esta parcela da pequena-burguesia colha os dividendos de suas opções ideológicas. E se arrependa.

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