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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Excesso de ‘estrategismo’ produziu imobilismo inédito nos segmentos progressistas

O editor do 247 e membro dos Jornalistas Pela Democracia adverte que houve uma leitura errada por parte do comentário político quando este comprou a tese da autocrítica dirigida ao PT; ele diz: "os estrategismos cansaram a 'ideia'. É hora de retomar a luta de sempre, baseada em fatos reais, em projetos reais e em enunciados reais. Só assim poder-se-á combater a overdose de fake news, factoides e artificialismos postulados por bolsonarismo e imprensa tradicional. Sempre foi assim"

Excesso de ‘estrategismo’ produziu imobilismo inédito nos segmentos progressistas
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Política não é só estratégia. Nesses últimos anos, nós temos sofrido uma overdose de 'estrategismo'. Todo mundo, de repente, passou a produzir fórmulas perfeitas que seriam a solução final para combater a onda histórica de fascismo, violência e golpismo.

Falou-se em “não responder” a Bolsonaro, para não lhe dar “ibope”. Falou-se em “usar mais agressividade retórica”. Falou-se em evitar a palavra “fascismo”. Falou-se em “trocar o candidato da esquerda”, em “fazer autocrítica”, em “usar mais o discurso anti-corrupção”, enfim, para resumir, falou-se em agir de maneira diferente do que se agia.

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É a síndrome do “não se mexe em time que está ganhando” na versão do pressuposto. Ou: “mexe-se em time que está perdendo”. Eu diria que é um gesto simplório demais para toda e qualquer conjuntura política. Porque eu poderia dizer: em time que está ganhando se mexe (para ampliar a vitória) e em time que está perdendo não se mexe (para permitir que os guerreiros em campo se superem e encontrem as brechas para o gol).

Eu poderia dizer também que usar a metáfora do futebol para a cena política é um grande saco. Haja falta de imaginação. Como não disse Tim Maia (mas poderia muito bem ter dito): futebol é futebol, política é política.

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Muita gente, apavorada com o crescimento do fascismo bolsonarista, formulou as mais esdrúxulas teses de comunicação aplicada de combate para aplacar as respectivas inércias próprias e comodismos imanentes. É também a lei do vaticínio: façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço (que é me comportar feito barata tonta).

O Brasil ficou todo ele meio burro. Compra-se fácil demais a tese tacanha da “autocrítica do outro” que, a rigor, sou eu (ou, sem querer ser chato em explicar tudo e já sendo: eu incorporo a visão que o outro tem de mim, anulando-me a mim mesmo, em um jogo infinito e infernal de simulacros).

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Mergulhar na estrutura da comunicação política em surto marqueteiro faz parte do jogo, mas não pode tomar conta da cena. Usar esse dispositivo da autocrítica perene em excesso vira uma espécie de competição para ver quem tem a melhor solução para o impasse, fazendo do próprio impasse uma necessidade a priori (para que eu continue formulando minhas teses ad hoc).

Política é intuição, é espontaneidade, é ímpeto.

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Política é deixar de fato que o sentimento coletivo - não intoxicado - se apodere de sua alma e te lance às ações concretas do discurso, do gesto e do punho.

Política, meus caros, a política real, que organiza a disputa civilizatória pelos sentidos, a gente sente. É um mundo real demais para ser customizado em receitas prontas e fórmulas mágicas.

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É esse gesto da espontaneidade política de que se ressente o Brasil, com o grande enunciador político preso justamente por fornecer linhas de ação eficientes no embate dos sentidos e das narrativas.

Lula é tão “subversivo” em sua ação retórica que nenhum elixir mágico de comunicação conseguiu lhe tirar o protagonismo absoluto: foi necessário prendê-lo para que os políticos à moda antiga, demagogos, hipócritas e oportunistas, voltassem a dar as cartas no arremedo de debate público que restou ao país devastado pela Lava Jato.

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E nem assim foi suficiente.

Porque Lula continua sendo o centro gravitacional da política, tal é o legado discursivo e operacional que ele deixou.

É absolutamente sem precedentes a situação de perseguição fracassada – parcialmente e criminalmente vitoriosa – sobre Lula. Ele simplesmente ficou mais forte politicamente depois de preso. Não se conseguiu mexer no seu patrimônio eleitoral, pelo contrário.

Lula liderou todas as pesquisas de intenção de voto durante todo o ano de 2018. Isso é se comunicar mal?

O erro crasso das tentativas de inventar a roda todo o santo dia no universo do comentário político foi não perceber quem, de fato, estava ganhando o jogo.

Acreditou-se que o poder judiciário, perseguidor, sucateado intelectualmente e apodrecido, era a realidade em si. Resta evidente a razão pela qual nenhumas das teses milagrosas de “especialistas” travestidos de colunistas não chegaram sequer a fazer cócegas no que se desenrolava no campo político – atravessado pelo justicialismo.

O problema, caras-pálidas, foi a perseguição da justiça. O enunciado político de Lula – mesmo preso – e do PT ‘estalavam’ de consistência, com a habitual eficiência retórica e técnica de sempre. Ou alguém perdeu as pesquisas em que o PT figurava como o partido mais popular do país, disparado?

A questão não foi de comunicação, foi de perseguição. É por isso que, do ponto de vista prático, a estratégia do poder judiciário aparelhado de prender Lula e mantê-lo preso a qualquer custo foi, à sua maneira (criminosa), eficiente. Confundiu meio mundo e lançou o país nessa pistolagem presente.

É preciso, portanto, fazer a autocrítica da autocrítica, e voltar à realidade dos fatos e dos gestos. Lula continua sendo o político mais influente do país e continuará onipresente em 2019. Quem tem um nome desses para chamar de seu?

Mais: com o PSDB destroçado e Ciro Gomes em descrédito comovente, o cenário político vai se reorganizar de maneira acelerada. É preciso voltar as atenções para esse jogo, não para a lambeção de ferida interminável.

Ademais, posso dizer sem hesitação: o PT sabe perfeitamente bem dar prosseguimento à sua política de comunicação, naturalmente bem elaborada (porque conectada com a realidade social do país). Ele se prepara para o embate político e para a volta obrigatória da política em ano não eleitoral.

Os estrategismos cansaram a “ideia”. É hora de retomar a luta de sempre, baseada em fatos reais, em projetos reais e em enunciados reais. Só assim poder-se-á combater a overdose de fake news, factoides e artificialismos postulados por bolsonarismo e imprensa tradicional. Sempre foi assim.

A espontaneidade de Lula, justamente, é o antídoto para essa maresia proposicional infame das autocríticas fajutas. Política se sente. E é hora de voltar a senti-la, com todo o coração.

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