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Pedro Cláudio Cunca Bocayuva

Professor do PPDH do NEPP-DH/UFRJ

31 artigos

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Hegemonia e radicalização da democracia

As questões e temas da ecologia social, mental e ambiental, por sua vez servem para pensarmos os sujeitos coletivos da nova política de esquerda, para fazer frente a este "momento populista" ou interregno do tipo de uma crise orgânica

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Para Chantal Mouffe a construção de um novo bloco histórico depende de uma estratégia populista de esquerda, com uma formação prático-discursiva; que resgate o liberalismo político e defenda a democracia representativa. Essa nova estratégia de esquerda deve ser realizada através de práticas de construção e mobilização para formar uma vontade coletiva, com base em uma "cadeia de equivalências", ou seja, como articulação de lutas numa direção igualitária que sirva de contraponto ao populismo de direita na cena histórica de crise global do neoliberalismo.

A construção de um "povo" mobilizado por afetos e demandas deve se materializar em formação de discurso que dispute o senso comum e canalize a rebelião antissistema, que promovam lideranças capazes de disputar a crise de legitimidade, de representação e do Estado. Ao contrário da diluição ou da rendição aos valores hegemônicos do discurso da via única do mercado, a democracia depende da relação de forças que precisa ser gerada por processos de formação de maioria, desde uma vontade política que afirme a necessidade do resgate e da radicalização da democracia. 

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Uma nova formação hegemônica deve articular o social, o ambiental e os afetos. Precisamos combinar um sentido afirmativo para a estratégia de modo a disputar a explosão do descontentamento gerado pelos efeitos trágicos da espoliação promovida pela globalização neoliberal, superando o essencialismo determinista, o voluntarismo e caminho da conciliação da “terceira via” cuja matriz está esgotada. Desta forma, opondo-se também a uma pura fragmentação corporativa e ao voluntarismo político da extrema esquerda.

Chantal Mouffe coloca em seu livro, sobre o left populism a necessidade do resgate de um modo de fazer política, de um horizonte criativo para formas de ação que se aproximam do reformismo revolucionário de Jean Jaurés, demarcando com o trabalhismo de Anthony Blair e reivindicando as novas formações políticas e discursos, como o do Podemos na Espanha, o do Syriza na Grécia, o de Jeremy Corbyn na Grã-Bretanha, e o da esquerda portuguesa com a sua “Geringonça”, assim como, de Bernie Sanders nos EUA. Estas referências são expressões da capacidade de disputar a hegemonia sobre a crise das políticas neoliberais, fazendo frente contra o populismo de direita nas suas diversas formas.

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Instigante, a reflexão de Chantal Mouffe e Ernesto Laclau vem marcando uma polêmica importante diante das outras alternativas como as estratégias de autonomia e revolução molecular e de guerra de posição com um reformismo forte. A extraordinária clareza da exposição da proposta de "por um populismo de esquerda" está voltada para a radicalização da democracia. Ela consegue avançar na problematização da necessidade do antagonismo, da pluralidade e da construção de discurso, através da criação da vontade via articulação das “cadeias de equivalência” entre temas e lutas traduzidas na formação do novo bloco.

A composição de subjetividades coletivas por estas identificações é fator mobilizador de energias, afetos e desejos para uma vontade de participação e mudança. Este reformismo forte depende da costura das questões que formam as subjetividades coletivas. As identificações da estratégia da esquerda no “momento populista" serão amarradas pelos significantes mais potentes, que terão a força ético-política para se traduzir em vontade de poder, em condições para governar a partir do restabelecimento da centralidade da questão social e das novas lutas na disputa agnóstica, na esfera pública resgatada como condição de realização de transformações dentro da ordem política liberal-democrática.

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Neste quadro cabe lembrar o reformismo forte de Palmiro Togliatti, de Pietro Ingrao e de Enrico Berlinguer, com suas variações, ou seja, resgatar a reflexão gramsciana sobre a democracia como processo, que tem sua síntese expressa no reformismo revolucionário, através do pensamento político de Carlos Nelson Coutinho. Este intelectual brasileiro deixou um legado que ajuda no debate com Chantal  Mouffe e Ernesto Laclau. Tanto pela visão distinta na análise de situação como pela noção de “democracia progressiva” e do Estado Integral

As divergências entre os projetos de esquerda de tipo insurrecional extraparlamentar, ou de tipo socialdemocrata de consenso institucional com a proposta de estratégia populista, é que esta última combina elementos de esquerda de tipo social liberal com uma componente anticapitalista, uma face plural e aberta com uma radicalidade democrática que se destaca neste novo discurso político. Mouffe insiste na importância decisiva dos problemas da subjetividade a partir da psicanálise, que deve ser debatida e integrada nos esquemas teóricos. 

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Mouffe e Laclau combinam uma leitura importante de Jacques Lacan, com o tema do “real" da sutura pelo “significante flutuante”, com as velhas questões do social-liberalismo e das regras do jogo colocadas por Norberto Bobbio. Podemos dizer que ao lado das questões tradicionais do sujeito político na construção da hegemonia e na estratégia socialista, via a centralidade da pluralidade de sujeitos da política e suas identificações ou centralidade do social, temos de avançar na interrogação sobre o espaço cotidiano e a revolução urbana. Temos de incluir as reflexões e práticas sobre a indústria cultural e a sociedade do espetáculo, sobre as questões da sexualidade, de gênero e do racismo desde um novo questionamento que precisa ser combinado com a centralidade das periferias, com as questões do corpo e da subjetividade. As questões e temas da ecologia social, mental e ambiental, por sua vez servem para pensarmos os sujeitos coletivos da nova política de esquerda, para fazer frente a este "momento populista" ou interregno do tipo de uma crise orgânica.

Os desafios do projeto do reformismo-revolucionário, na chave da reforma intelectual e moral, fazem com que o pensamento de Gramsci seja uma referência destacada na definição do horizonte de construção política. Ler e debater sobre a "Razão Populista", de Ernesto Laclau, e "Por um populismo de esquerda”, de Chantal Mouffe, é um bom início, principalmente para quem pretende buscar uma alternativa para os impasses da crise da revolução passiva, que ganhou os contornos de uma crise financeira e ambiental global neste quadro agravado pela dominação necropolítica em que vivemos.

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