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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor de “Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil”

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Imparcialidade jornalística não é dar voz a charlatães

Não se pode praticar o equilíbrio que norteia o jornalismo – ouvir “os dois lados” – quando numa ponta estão consensos globais e na outra, gritaria de charlatães

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Por Paulo Henrique Arantes

Parte da imprensa brasileira mostra-se despreparada para lidar com temas científicos com o rigor que a ciência exige. Não se pode praticar o equilíbrio que norteia o jornalismo – ouvir “os dois lados” – quando numa ponta estão consensos globais e na outra, gritaria de charlatães. O papel da mídia em tais casos é desmascarar os picaretas, não lhes dar voz.

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O “Estadão”, em sua edição do último domingo (18), reproduzida em seu portal na internet, estampou em manchete que “Tratamento precoce racha organizações e faz médicos irem ao Ministério Público contra o CFM”. No correr da matéria, enfatiza-se a divisão da classe médica entre aqueles que seguem o Conselho Federal de Medicina, para quem o médico tem total liberdade de prescrever, e os que cumprem a orientação da Associação Médica Brasileira (AMB), entidade que defende o banimento dos remédios que compõem o famigerado “kit covid”, como cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina. 

Os representantes do obscurantismo não merecem tanta condescendência. Apesar de a reportagem citar estudos que desacreditam o “kit covid”, o leitor pode ficar em dúvida.

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Peso similar às duas “opiniões” não se justifica, e por uma razão simples: a ineficácia de “tratamento precoce” contra a Covid-19 com quaisquer desses medicamentos está devidamente provada, bem como as graves consequências que seu uso pode acarretar. O CFM, por medo, corporativismo, incompetência ou politicagem, posiciona-se de modo oposto ao que assinalou a Organização Mundial de Saúde. Quem poderia adotar tal postura de confronto, por congregar as sociedades médico- científicas brasileiras, é a AMB. Em consonância com a OMS, a entidade condena o “kit”.

A medicina não tem dúvidas quando à impropriedade dessas drogas contra o coronavírus. A ineficácia delas está demonstrada por dezenas de estudos publicados nas mais importantes revistas científicas do mundo. Enquanto isso, o Brasil é ridicularizado no Parlamento francês por causa da cloroquina e o “Estadão” enfatiza o “racha” médico, como se os dois lados merecessem o mesmo respeito. Não merecem, pois um deles contribui com a morte por teimosia e ignorância.

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“Sem dúvida, há uma falsa polêmica. A ineficácia da cloroquina, entre outros remédios que estão sendo prescritos, já foi comprovadamente atestada por diversos estudos científicos. Não só a ineficácia como também o perigo que ela representa para pacientes que tenham, por exemplo, propensão a problemas cardíacos, além de outros efeitos colaterais muito danosos”, afirma Fernando Aith, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e especialista em Direito Sanitário.

“É triste ver como tudo se judicializa no Brasil, inclusive conflitos que não deveriam existir entre essas sociedades médicas, as quais deveriam estar à frente da busca das melhores soluções”, adverte Aith. 

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O professor lembra que o próprio médico francês Didier Raoult, “inventor” do uso da cloroquina contra Covid-19, veio a público para se desculpar pela bobagem cometida, reconhecendo a ineficácia do fármaco nos procedimentos em pacientes com a doença e sua indicação como tratamento preventivo.

Para piorar a sinuca em que se veem pessoas diagnosticadas com Covid-19, médicos obtusos contam com apoio de autoridades públicas. É o caso do prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), que além de distribuir “kits Covid” nas unidades municipais de saúde e recomendar sua prescrição, divulgou uma “pesquisa”, livre de qualquer critério científico, demonstrando falsamente que 99% dos pacientes contaminados por coronavírus que tomaram a bomba farmacológica curaram-se. O Ministério Público, é claro, já foi para cima do prefeito.

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Os médicos que trabalham na rede municipal de Sorocaba evitam dar entrevistas. Um deles, ouvido pelo Brasil 247 sob condição de anonimato, disse que muita gente chega ao hospital influenciada pela propaganda enganosa da Prefeitura e pede a prescrição do “kit Covid”. Porém, nos últimos dias, percebe-se que a mentira do prefeito Manga tem pernas curtas: os pacientes cada vez mais questionam os profissionais que prescrevem o kit falacioso.

Sorocaba, cidade paulista de quase 700 mil habitantes, vê seu principal jornal, o centenário “Cruzeiro do Sul”, bem como as retransmissoras locais da Globo e do SBT destacarem, a exemplo do “Estadão”, a “polêmica” em torno do “kit Covid”. Mais um caso da imprensa que, ingenuamente, ouve “os dois lados”, mesmo que um deles negue a ciência.

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Na verdade, esse comportamento da mídia é notado desde o início da pandemia. Em março de 2020, a “grande imprensa” repercutia falas do medieval Osmar Terra “explicando” a imunidade de rebanho, conceito rechaçado pela totalidade dos epidemiologistas, entre outras barbaridades. 

Há amplos estudos demonstrando a incorreção da mídia na abordagem dos temas científicos relacionados com a pandemia de covid-19, um deles publicado por especialistas brasileiros na prestigiosa revista Frontiers in Communication.

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