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Ribamar Fonseca

Jornalista e escritor

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Indiferente à saúde do povo, Bolsonaro desafia Congresso e STF

"Graças ao coronavirus, que está assombrando o mundo, os bolsonaristas encontraram uma justificativa para o fiasco da manifestação de domingo em algumas cidades, o que, no entanto, não significa que Bolsonaro desistiu do seu projeto ditatorial", escreve o colunista Ribamar Fonseca

(Foto: Reuters | Câmara dos Deputados)
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“Deus limitou a inteligência mas não limitou a burrice”. A frase, atribuída a Winston Churchill, primeiro ministro britânico durante a II Guerra Mundial, retrata bem os defensores do fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Desde quando o fechamento daqueles dois poderes resolve os problemas nacionais? Quem foi o imbecil que inventou isso? Esse pessoal é burro mesmo ou está cego pelo ódio, porque o  fechamento do Legislativo e do Judiciário implicaria naturalmente no dilaceramento da Constituição, no fim das garantias individuais e das liberdades, incluindo a liberdade de expressão, no fim da democracia. A sua consequência imediata será a implantação de uma ditadura. Sabemos todos que o Parlamento é recheado de puxa-sacos, fascistas, entreguistas, mercenários e traidores da Pátria, mas também existem patriotas, nacionalistas, brasileiros preocupados com o futuro do país, defensores dos interesses da população. Todos foram eleitos pelo povo, são seus legítimos representantes, embora nem todos defendam seus interesses, mas  bem ou mal cumprem sua missão constitucional, fiscalizando o Executivo e contendo os seus excessos. Fechar o Congresso é uma burrice sem tamanho, que nos levará de volta aos anos de trevas. 

Para uma visão mais clara das consequências desastrosas bastam duas  perguntas: a quem interessa o fechamento do Parlamento e do Supremo Tribunal Federal? Quem se beneficiaria com isso? Óbvio que o Executivo, o Presidente da República, Bolsonaro, que enfeixaria todos os poderes e faria o que bem entendesse, segundo seus interesses e humores, e ninguém poderia questioná-lo. Por essa razão ele apoiou publicamente a manifestação de rua convocada para o último dia 15, sob o olhar acovardado dos presidentes do Congresso e da Suprema Corte que, surpreendentemente, mesmo achincalhados ainda buscam um diálogo com o capitão. Talvez não estejam acreditando na disposição dele em tornar-se ditador, embora o seu projeto autoritário esteja em pleno andamento, inclusive com a possível bênção de Donald Trump, com quem Bolsonaro se reuniu inesperadamente no final da semana passada. A desculpa oficial de um acordo militar não convence muito, pois isso não exigiria a presença dos dois presidentes, bastando os chanceleres e os ministros da Defesa. Afinal, o capitão sabe que para dar um golpe precisa do apoio e do reconhecimento dos Estados Unidos para que seja reconhecido pelo resto do mundo. 

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Na verdade, tudo isso é muito estranho. As pessoas que hoje defendem o fechamento do Congresso e do STF, com a consequente instalação de uma ditadura no Brasil, são as mesmas que condenam a suposta ditadura de Maduro na Venezuela. Ao mesmo tempo em que tramam uma possível ação militar contra a Venezuela, “para implantar a democracia”, tramam a instalação de um regime de exceção aqui. Trump quer lançar os brasileiros numa guerra contra os venezuelanos, preservando os americanos, porque sabe que os vizinhos estão bem  preparados para defender-se com armas e tecnologia dos seus aliados russos. Dificil acreditar, no entanto, que os nossos militares, apesar do silêncio comprometedor, entrariam nessa aventura, até porque não temos nada a ver com os problemas internos daquele país, que devem ser solucionados pelos próprios venezuelanos. Na verdade, a Trump não interessa se na Venezuela existe ditadura ou democracia, pois o que ele quer mesmo é o petróleo daquele país. Ao contrário do Brasil, onde o governo submisso de Bolsonaro lhe permitiu colocar as duas mãos em nosso petróleo, na Venezuela Maduro não lhe deu a mesma abertura. Por isso quer derrubá-lo, a exemplo do que fez com Dilma Roussef pelos mesmos motivos.

Graças ao coronavirus, que está assombrando o mundo, os bolsonaristas encontraram uma justificativa para o fiasco da manifestação de domingo em algumas cidades, o que, no entanto, não significa que Bolsonaro desistiu do seu projeto ditatorial. Na realidade, indiferente aos riscos do coronavirus, ele continuou incentivando seus seguidores para comparecerem às manifestações, inclusive participando do ato em Brasilia e divulgando um vídeo feito pelo deputado delegado Eder Mauro sobre o movimento em Belém, organizado por ele, onde as pessoas sairam às ruas mesmo debaixo de chuva. Dá pena ver pessoas, muitas idosas, enroladas em bandeiras e pulando, imbecilizadas, certamente imaginando que estavam defendendo o país, arriscando-se a contrair e a disseminar o coronavirus. São irresponsáveis sob todos os aspectos, assim como o próprio Bolsonaro, que não se importou com os riscos à saúde dos seus seguidores, comportando-se na contra-mão do resto do mundo, que está preocupado com a pandemia do coronavirus. Ele prossegue dando curso ao seu projeto ditatorial e ignorando a morte do seu ex-companheiro Gustavo Bebiano, um dos responsáveis por sua eleição, que foi descartado logo no inicio do governo. Bebiano, aliás, que temia ser assassinado,  em entrevista à Jovem Pan poucos dias antes de morrer,  fez um alerta para os planos  do capitão: “Não tenho bola de cristal, não sei o que vai acontecer. Mas temo por uma ruptura institucional”. Só não vê quem não quer ou está cego de ódio. 

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Tem-se a impressão, pelo seu comportamento passivo, que os chefes dos outros dois poderes não estão levando muito a sério as ameaças do capitão ou, então, estão com tanto medo que ficaram paralisados, não conseguindo mover-se para reagir às agressões do próprio presidente da República. O fato, porém, é que fechar o Congresso é um velho sonho de Bolsonaro, conforme revela a jornalista Thais Oyama no livro “Tormenta”. Segundo seu relato, numa entrevista à Band em 1999, ao ser perguntado se fecharia o Parlamento caso eleito Presidente, o capitão respondeu sem titubear: “Não há a menor dúvida. Daria golpe no mesmo dia. Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da população ia fazer festa e bater palmas. O Congresso hoje em dia não serve para nada. Só vota o que o presidente quer. Se ele é a pessoa que decide, que manda, que tripudia em cima do Congresso, então dê logo o golpe, parte logo pra ditadura”. Ele não deu o golpe no mesmo dia da posse, conforme disse que faria, mas vem trabalhando nesse sentido desde que ocupou o palácio do Planalto. Detalhe: na época da declaração Bolsonaro estava em seu terceiro mandato de deputado federal e ainda assim, pelo visto, não tinha o menor apreço pelo poder que integrava e muito menos pela democracia. E ele está provando agora que nesses vinte anos não mudou nada,  conservando a mesma visão estreita daquele tempo e a mesma ambição.

Não foi por acaso que ele se cercou de generais no Palácio do Planalto. Esperto, ele criou uma espécie de guarda pretoriana para garanti-lo no poder, ao mesmo tempo em que comprometeu os militares, mais precisamente o Exército, com o seu governo. O Clube Militar, por exemplo, que abriga a oficialidade superior da ativa e reserva, já manifestou publicamente o seu apoio às manifestações pelo fechamento do Congresso e STF, mas os comandantes das Forças Armadas tem se mantido em silêncio, o que em princípio pode significar cautela ou discordância com os rumos dos acontecimentos. De qualquer modo, ninguém sabe até quando os militares vão continuar lhe dando suporte, mas depois de ter humilhado alguns generais e diante da reação cada dia mais dura da grande imprensa, conforme é possível perceber pelos editoriais, vai ficar muito difícil a sua permanência no governo, apesar da truculência da sua milícia virtual. Além de acusado de negligência em relação à saúde do país, o que pode agravar a epidemia de coronavirus, Bolsonaro está a cada dia mais exposto às acusações de ligações com as milícias, cujas investigações avançam no Rio, apesar dos seus esforços para paralisá-las. Parece que é só uma questão de tempo para descobrirem alguns elos. 

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