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Cássio Vilela Prado

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Lula com Lacan: um significante da esperança...

Não há local algum no Brasil atual pós-verdade/Moro/Globo que seja possível escapar, diuturnamente, do significante Lula e os seus mais variados significados políticos, sociais, culturais e afetivos, produzindo um "sujeito positivo alienado no eixo sintagmático" da Linguística saussuriana até o "sujeito vertical negativo do inconsciente" da Psicanálise lacaniana

Não há local algum no Brasil atual pós-verdade/Moro/Globo que seja possível escapar, diuturnamente, do significante Lula e os seus mais variados significados políticos, sociais, culturais e afetivos, produzindo um "sujeito positivo alienado no eixo sintagmático" da Linguística saussuriana até o "sujeito vertical negativo do inconsciente" da Psicanálise lacaniana (Foto: Cássio Vilela Prado)
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Não há local algum no Brasil atual pós-verdade/Moro/Globo que seja possível escapar, diuturnamente, do significante Lula e os seus mais variados significados políticos, sociais, culturais e afetivos, produzindo um “sujeito positivo alienado no eixo sintagmático” da Linguística saussuriana até o “sujeito vertical negativo do inconsciente” da Psicanálise lacaniana.

(...) um signo só existe no momento de seu emprego ou por meio de um sujeito falante que o emprega. Para Saussure, é um erro acreditar que existam categorias ideais antes do signo: eles são “acidentes”, só existem no momento em que são empregados. A cada momento, ao falar, um sujeito comete um “acidente”. Isso resulta num sistema cuja complexidade impede qualquer definição simplista do que seria o signo que se faz no momento do corte, e este corte não está no passado, mas é realizado a todo o momento em que um signo é empregado por um sujeito falante, pois os signos não estão delimitados de antemão, mas é a atenção e o hábito de um sujeito falante que delimitam os signos no momento em que os empregam. (...) (Cunha, 2010, p. 113)[1].

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Embora fosse atribuído erroneamente a Ferdinand Saussure (1857-1913) que o signo linguístico era um sistema arbitrário e hermético, uma união inseparável entre significante (som da palavra) e significado (conceito), visto em suas primeiras aulas do Curso de Linguística Geral (CLG – Entre 1907 e 1910, Saussure ministrou três cursos sobre linguística na Universidade de Genebra), o que se percebeu posteriormente foi uma constante preocupação do professor linguista em sustentar esse “fechamento” da Linguística enquanto um campo objetal desprovido do sujeito paradigmático negativo, abrindo sábia e paulatinamente “brechas” (conforme citação acima) em seu rigoroso sistema linguístico inicial, haja vista a dificuldade inerente em sustentar a “verdade fechada” desse sistema, talvez apenas para erigir a Linguística a uma nova Ciência. Assim, em Saussure, a “Linguística não teoriza sobre o sujeito”[2], entretanto:

(...) Apesar da Linguística não teorizar sobre o sujeito, as diferentes teorias sobre a língua supõem diferentes perspectivas sobre o sujeito e, consequentemente, sobre a relação entre língua e sujeito. Por exemplo, podemos lembrar as teorizações de Émile Benveniste, que olhou de uma forma específica para a relação entre língua e sujeito. Segundo o teórico, a língua não é simplesmente um instrumento que o homem utiliza para comunicação, mas “é na linguagem e pela linguagem que o homem se constitui como sujeito” (BENVENISTE, 1988, p. 286, grifo do autor). A língua só é possível pelo fato de haver alguém que se coloca como sujeito, e ao mesmo tempo, o homem só é sujeito porque existe uma língua que o constitui como tal. (...). (Cunha, 2010, p. 7).[3]

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Saussure, contudo, em face aos “ataques” de outros linguistas às suas proposições, utilizou-se de metáforas e metonímias para lançar o seu “balão ao ar” na esperança de reavê-lo na terra:

O signo, soma, sema, etc. Só se pode, verdadeiramente, dominar o signo, segui-lo como um balão no ar, com certeza de reavê-lo, depois de entender completamente a sua natureza, natureza dupla que não consiste nem no envoltório e também não no espírito, no ar hidrogênio que insufla e que nada valeria sem o envoltório. O balão é o sema e o envoltório o soma, mas isso está longe da concepção que diz que o envoltório é o signo, e o hidrogênio a significação, sendo que o balão, por sua vez, nada é. Ele é tudo para o aerosteiro, assim como o sema é tudo para o linguista (SAUSSURE, 2002, p. 102-103)[4].

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Para Cunha:

Segundo as palavras do professor, a sua natureza não está nem na forma, nem na ideia. Aqui, o professor denomina o signo de sema e a forma, ou o significante, de soma, o que demonstra claramente a dificuldade de denominar o signo. A metáfora do balão no ar demonstra como o conceito de signo é escorregadio, ou difícil de apreender. O signo é um balão no ar, e este “por sua vez, nada é”. Para ele, mesmo ao dominar o signo, ou seja, ao compreender a sua natureza, o linguista só pode segui-lo como um aerosteiro segue um balão no ar, podendo reavê-lo apenas em terra, quando o balão deixa de ser. Como podemos seguir este balão no ar? (Cunha, 2010, p. 66).[5]

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Mas foi necessário surgir um Freud e um Lacan para iluminar o “dilema saussuriano”, engendrando o “sujeito do dizer” (“da intencionalidade de seu desejo velado”) na fala da dita “Linguística científica”, conforme já apontado por Émile Benveniste (1902-1976), contudo um “sujeito do inconsciente”, efeito dos significantes, implodindo assim o “balão de Saussure”:

(...) No lugar onde a língua saussuriana supõe um sujeito incapaz diante da língua, Lacan teoriza um sujeito que é efeito de linguagem; onde a língua saussuriana supõe um sujeito que atua nos mecanismos da língua mesmo sem saber que o faz, Lacan teoriza um sujeito do inconsciente que opera nas cadeias significantes engendrando significações inéditas a partir da articulação significante. (...)[6]

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Apropriando-se das Teorias da Linguagem, da Língua, da Fala e dos aspectos estruturais da Antropologia de Claude Lévi-Strauss(1908-2009), Lacan buscou fundamentar o sujeito do inconsciente freudiano, definindo-o em termos conceituais como “aquilo que um significante remete a Outro significante”, ou seja: “Nossa definição do significante (não existe outra) é: um significante é aquilo que representa o sujeito para outro significante (LACAN, 1998a, p. 833).”[7].

Nestes termos:

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A categoria de sujeito em Lacan não é definida pela via do positivo, o sujeito não é um ser encontrado na realidade, o homem ou o indivíduo, mas algo que se impõe ao trabalho psicanalítico e não decorre dele como construção empírica. Por isso, talvez, não poderíamos dizer que este é um conceito no sentido científico do termo, mas uma noção central para a Psicanálise. O sujeito, portanto, não “nasce”, nem mesmo se “desenvolve”, não é inato e nem é aprendido, mas ele se constitui a partir da linguagem. O sujeito que a Psicanálise opera advém do método freudiano de associações livres, que produz condições para a aparição do sujeito do inconsciente por meio da repetição e da transferência. Em outras palavras, a repetição e a transferência permitem a produção de formações do inconsciente, momentos de emergência do sujeito. Todas essas formações do inconsciente, atos falhos, lapsos, sonhos, sintomas, chistes, ou outros, são da ordem da linguagem e supõem um sujeito em operação no inconsciente. Este fato nos explica a importância da linguagem em Lacan e sua necessidade de buscar uma teoria adequada sobre a língua. (Cunha, 2010, p.12).[8]

E ainda, na trilha de Lacan, o significante não está atrelado ao significado sintagmático conceitual conforme queria Saussure, todavia, é o significado que se subordina ao significante, logo, Lacan faz uma inversão na barra do signo (significado/significante), antecipando o significante ao significado (significante/significado), haja vista não existir o “significante em si”, mas uma “cadeia de significante” (S1, S2, S3...), pois o sujeito é efeito da linguagem, portanto dos significantes, ele é “falado” ao falar:

Este é o efeito que a barra opera: o efeito de uma separação entre o significante e o significado, e por sua vez uma subordinação do significado perante o significante. A ênfase na barra indica que, não estando colados anteriormente, os significantes podem mudar de significado, deslizar, pois são vazios de significação prévia, não são preexistentes. Os significantes são engendradores de sentido, não contêm um significado em si, constituído antes que se fale, mas se definem como constituintes de sentido, como aqueles que podem significar, por isso são “significantes”, pois conferem significados ao que antes não tinha nenhum.

Desse modo, entendemos que o significado, longe de ser preexistente, é efeito da cadeia do significante. O fato de haver um “deslizamento incessante” indica que a significação não está, portanto, em nenhum elemento particular da cadeia. Podemos concluir que não há uma reciprocidade entre o significante e o significado para Lacan, apesar de que esta dualidade estará sempre presente. Sobre esta impossibilidade, Lacan afirma:

“[...] a barra saussuriana, que não pode representar nenhuma intuição de proporção, nem se traduzir como barra de fração, senão por um abuso delirante, mas sim, como o que é para Saussure, constituir uma borda real, isto é, a saltar do significante que flutua para o significado que flui (LACAN, 2002, p. 414)”.

 Desse modo, a barra implica numa impossibilidade: é impossível ao sujeito saber tudo, assim como é impossível dizer toda a verdade, uma vez que não há um significado para cada significante. Porém, isso não quer dizer que, ao falar, o sujeito se fará sempre presente a partir dessa separação, mas que os significantes recalcados, ao emergirem na e pelas falhas da fala, estarão supondo o sujeito por eles representado.[9]

 

Com isto, o que se pretende aqui é destacar e inferir que o discurso social produzido e emanado do capitalista, via mídia e produções culturais – Antonio Gramsci (1891-1937) –, pretende atrelar de forma delirante e perversa, os sujeitos “supostamente falantes” a determinados “significados acabados e inabaláveis”, numa espécie de aprisionamento pelos “significantes sintéticos amorfos” proferidos pelo discurso do capitalista na versão “significados in-significantes” e excluídos da cadeia deslizante dos significantes...

Pode-se pensar, assim, que a proposta discursiva anacrônica capitalista para se manter enquanto poder e saber, utiliza-se de “significantes petrificados sem deslizamentos”, senão associados apenas a conceitos-significados como a verdade absoluta incontestável. Isso faz soberbamente bem o discurso do capitalista (do “mestre perverso”), conforme se vê em nossa sociedade de classes.

Operando assim, dentro de seu desejo ideológico, esse “discurso saussuriano do capitalista” consegue “imaginarizar a vida” como um grande “shopping biológico-comercial natural e universal” em conluio com o discurso metafísico delirante religioso, tendo como método de alienação dos sujeitos sociais e do desejo, a dessimbolização discursiva singular, tendo em vista a imposição do significado inconteste do que é a vida no planeta, segundo as suas intenções e manobras, impossibilitando aos sujeitos o deslizamento significante produtor simbólico de novas realidades vitais desejantes...

Neste sentido, o discurso do capitalista, “traficante-mor” dos objetos-fetiches da “felicidade”, incita e subsume os sujeitos à pulsão de morte, num labirinto de significado/significantes conceituais não-deslizantes, à moda, eminentemente, do primeiro Saussure, restando-lhes permanente o calvário da repetição sisifiana.

Não é sem motivo que no campo sociopolítico assistimos aos “papagaios falantes” retidos em determinados significantes mórbidos nos quais permanecem encostados, incapazes de avançar ou produzirem deslizamentos significantes psíquicos, pois os seus desejos singulares estão aprisionados ao desejo do Outro capitalista.

 Por outro lado, também pode ser visto a tentativa hercúlea de determinados sujeitos singulares mais esclarecidos de apontar possíveis direções que possam retirar “os papagaios falantes” de seus “labirintos” onde estão perdidos, muitas vezes já encostados por cansaço e esgotamento mental.

Não obstante, conforme dito, “tarefa hercúlea”, pois o discurso capitalista é circular e pulverizado, avassalador, um verdadeiro “tsunami de letras combinatórias intencionais destruidoras”.

Tomemos por exemplo o significante Lula, o mais proferido nos últimos tempos no Brasil, quer seja por simpatizantes ou antipatizantes: “Lula é ladrão”, “Lula preso”, “Lula é o chefe da quadrilha” ... Todos esses significantes, não deixam de ser apenas um significado conceitual pronto, sem sujeito, portanto não deslizável e estático. Não interessam provas, contraprovas, refutações, são conceitos depreciativos invioláveis, originalmente oriundos de uma pequena classe política e social elitizada, pois Lula representa, primeiramente, um ataque frontal a um grupo elitista de onde partiu a sua profanação, e, secundariamente, a uma claque não reflexiva – “os papagaios falantes reprodutores” (alienados na língua e na fala, portanto) –, condição sine qua non e primordial para reprodução da ideologia dominante elitista. Isto “os papagaios falantes” também cumprem soberbamente.

É preciso trazer à tona uma semiológica nacional menos saussuriana e mais lacaniana, independentemente da “Psicanálise de gabinete escolástica”, para tentar escandir a pulsão mortal onde se alocam os inocentes “papagaios falantes”, filhotes copulares do grande establishment capitalista silvestre.  

Desta feita, Lula é a esperança de abertura psíquica e social....

Neste sentido, Lula é Lacan! Lacan é a esperança do sujeito do desejo singular, radicalmente único, contudo deslizante e aberto às diferenças...



[1] CUNHA, Raquel Basílio – Língua e Sujeito: Um percurso entre Saussure e Lacan, Tese de doutorado, Universidade Federal da Paraíba, 2010, p.113.

http://livros01.livrosgratis.com.br/cp140235.pdf

[2] Idem, p. 7.

[3] Ibidem.

[4] Op. Cit., p. 102, 103.

[5] Idem, p. 66.

[6] Ibidem, p.

[7] LACAN, Jacques - O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da Psicanálise. Tradução de M.D. Magno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998b.

[8] CUNHA, Raquel Basílio – Língua e Sujeito: Um percurso entre Saussure e Lacan, Op. Cit., p. 12.

[9] Idem, p. 21.

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