Meu amigo Borboletinha
Fiquei chocada ao observar que mesmo com a independência financeira feminina, ainda nos sujeitamos à vontade, ao desejo e à escolha do masculino
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Por Giselle Mathias
Há algum tempo tenho percebido que muitas mulheres ao se separarem recebem das amigas um pequeno presentinho, esse presentinho é um belo vibrador.
Acontece que o vibrador é mais do que um presente sexual, ele significa uma libertação para a mulher, mesmo que alguns tentem apenas pensar que é um consolo para a solidão feminina.
A mulher desde criança é programada culturalmente para não explorar sua sexualidade, desejos e prazeres individualmente, muitos vão dizer que isso mudou, mas é só uma questão pontual, a exceção no mundo feminino, ainda hoje a maior parte das mulheres é reprimida na busca do prazer individual, ainda nos vendem que o verdadeiro prazer está na relação com o outro, para as mulheres heterossexuais, que o prazer será proporcionado pelo homem, ou seja que dependemos do outro para existirmos enquanto ser.
Diante desse processo de exploração e pesquisa da própria sexualidade me deparei com uma entrevista da Professora Valeska Zanello, da UnB, que tem feito um vasto trabalho de pesquisa sobre a questão de gênero, com um foco nas relações interpessoais e como processamos o papel feminino e masculino em uma sociedade sexista como a brasileira – recomendo a todas as mulheres e aos homens que desejam verdadeiramente se desconstruir o machismo as lives da professora no youtube.
Passei a observar os comportamentos culturais descritos pela professora em mim, nos homens à minha volta e em mulheres próximas. Fiquei chocada ao observar que mesmo com a independência financeira feminina, ainda nos sujeitamos à vontade, ao desejo e à escolha do masculino.
É óbvio, pelo menos para mim, que enquanto não observarmos e conhecermos essa esfera do patriarcado não conseguiremos alterar essa submissão feminina, a qual foi tão naturalizada que não percebemos o quanto agimos dentro desse comportamento esperado da mulher, e, inclusive, incentivamos outras mulheres a continuar a reproduzi-lo.
A professora chama esse comportamento feminino de prateleira do amor, pois, resumidamente, estamos nessa prateleira aguardando sermos escolhidas por um homem, o qual nos proporcionará um valor nessa sociedade sexista, visto que o valor de uma mulher está em ser escolhida por um homem, e quanto mais ele estiver dentro do padrão de sucesso estabelecido por eles (sim, o valor do masculino é também estabelecido pelos próprios, e não pelas mulheres) maior a sensação de ser terá a mulher, pois o sentimento de existência dela está vinculado a escolha de um homem.
Sim, é muito difícil enxergar e reconhecer essa realidade brutal quando enquanto humanos desejamos crer que temos a possibilidade de escolha, e que não somos apenas um objeto, produto ou uma mercadoria, principalmente, no campo dos afetos.
Confesso, e aqui só darei meu depoimento, que tenho a todo momento tentado dizer que não estou nesse espaço, que comigo é diferente. Afinal, sou uma mulher independente, que virou as costas para uma relação abusiva, vem se construindo enquanto ser, que está na luta feminista e, totalmente, livre sexualmente para definir o que deseja, principalmente, comigo mesma.
Mas essa não é a realidade pura e íntegra, tenho que me policiar o tempo todo para não ocupar um espaço nessa prateleira, pois fui programada para estar nela, e mesmo que eu não deseje estar, sou vista como se lá estivesse.
Percebo que mesmo fugindo dessa formatação os homens que se aproximam agem como se lá eu estivesse, e por mais que eu demonstre e fale que não ocupo mais um lugar nessa prateleira, eles tentam me colocar nela.
Vejam! A questão não é o desejo de me relacionar ou não, mas o desejo ter um relacionamento em outro formato, no qual não haja a superioridade de um ser sobre o outro, mas a decisão de estarmos juntos, em que não haja a minha espera e disponibilidade enquanto mulher para ser escolhida por um homem, o qual com muitas artimanhas tentará exercer o poder de controle e dominação sobre o meu corpo e minha mente.
O que me levou a essa conclusão foi perceber a mim mesma, enquanto indivíduo. O que me ajudou foi meu amigo borboletinha (meu vibrador), pois poder me conhecer integralmente foi uma libertação corporal e de alma. Percebi minha humanidade e que não preciso do masculino para me dar um valor, me objetificar e me fazer existir, mesmo vivendo em uma sociedade sexista, pois apesar de tentarem, constantemente, me colocarem na prateleira, tento exercer a todo momento meu Direito de Existir com muita luta e resistência.
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