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Tarso Genro

Advogado, político filiado ao Partido dos Trabalhadores, foi governador do Rio Grande do Sul, prefeito de Porto Alegre, ministro da Justiça, ministro da Educação e ministro das Relações Institucionais do Brasil

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No caminho de Weimar sem vergonha

Enquanto dois ministros do Supremo travam aquele tipo de discussão, bandos de delinquentes organizados atacam "perfomances" artísticas, impedem conferências de professores renomados e invadem salas de aula onde se debatem grandes acontecimentos históricos

Luis Roberto Barroso e Gilmar Mendes (Foto: Tarso Genro)
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Sem entrar no mérito das vaidades ofendidas e das características psicológicas dos dois ministros do Supremo Tribunal Federal – Gilmar e Barroso –, o forte e explosivo diálogo que eles travaram no STF, na semana que findou, revelou à sociedade brasileira e mundial a profundidade da nossa crise institucional e os efeitos de decadência do golpe sobre o nosso contrato político, processo ao qual o STF acedeu com indiferença dogmática, como se fosse o Tribunal de uma república de papel. Para que possamos refletir sobre o futuro da República, não importa que o espetáculo tenha sido degradante, mas sim que ele é simbólico (e real), para ressignificar a luta política no país e nos ajudar a buscar novos rumos.

Ambos os ministros são juristas de primeira linha no cenário nacional, têm obras importantes publicadas, são respeitados no estrangeiro e compartilham – na academia e nas instituições de inteligência jurídica aqui no país e fora dele – dos grandes debates que as elites de todas as tintas, promovem sobre a questão democrática, sobre o futuro do Direito e sobre os efeitos da globalização sobre o Estados Nacionais. Mas, no diálogo entre eles, os verdadeiros argumentos do confronto ficaram escondidos nas entrelinhas dos xingamentos pessoais explícitos e nas alusões agressivas passíveis de interpretação.

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O que devemos nos perguntar, os que não temos influência direta na solução da nossa crise por dentro do Supremo, todavia, não é quem "ganhou" o debate ou quem nós gostaríamos que saísse mais, ou menos, enfraquecido da pugna. Mas, sim, qual a importância que ela teve para superarmos nossa dramática situação política, que se assemelha mais aos dias da crise da República de Weimar e menos à situação do pré-golpe de 64. Na primeira, disputava-se a possibilidade, ou não, do crescimento do nazi-fascismo; na segunda, a inclusão plena do Estado brasileiro no sistema da Guerra Fria, com o fechamento do sistema democrático-representativo, enquanto os americanos defendiam os "valores" do ocidentalismo na Guerra do Vietnã.

Enquanto dois ministros do Supremo travam aquele tipo de discussão, bandos de delinquentes organizados atacam "perfomances" artísticas, impedem conferências de professores renomados e invadem salas de aula onde se debatem grandes acontecimentos históricos. Semeiam intolerância, chamam à violência, agridem defensores de direitos humanos e desrespeitam, de todas as formas, pessoas de condição ou orientação sexual que dizem desprezar. O debate no Supremo não tem uma relação direta com isso, mas demonstra que a possibilidade da retomada da Política, como mediação, para a normalização da nossa vida democrática, está passando longe das nossas instituições formais, elas mesmas empobrecidas pela indiferença dos seus protagonistas principais.

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Menos que festejar este dissenso, embrutecido pelo não reconhecimento respeitoso das diferenças de opinião, entre os próprios contendores, creio que devemos alertá-los que a movimentação fascista, que emerge dos porões da crise econômica e moral do país, pode ser letal para o nosso futuro democrático. E que, mesmo com todas as mazelas, dissensos, limites e impropriedades do Supremo, nos últimos tempos, mesmo que alguns partidos recuperem, ou melhorem – segundo alguns – seus padrões de autenticidade na representação política, se o Supremo – que é composto por mulheres e homens do Direito – não repactuar um clima de respeito e tolerância, entre os seus integrantes, ao invés dele ser o homologador de uma saída democrática, ele poderá tornar-se o coveiro da democracia, no curto espaço que nos separa das eleições presidenciais de 2018.

Na apresentação que faz do excelente "Fuga do Direito" (Ed. Saraiva – Direito FGV – José Rodrigo Rodriguez – 2009), Marcos Nobre ressalta a importância de interpor o debate sobre o Direito (na sua dimensão de "teoria crítica") para abordar os graves dilemas políticos contemporâneos, mencionando a centralidade "da natureza peculiar da tensão entre direito e sociedade, que caracteriza a forma social brasileira". E adverte que a caminhada "pela República de Weimar, rumo ao desastre da década de 1930, não é nem de longe um desvio". Lembra, a partir daí, a elaboração do autor do livro, "que os movimentos de emancipação de hoje têm de refazer a sua relação com o Direito."(pg.XVII).

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Refazer as relações dos movimentos emancipatórios com o Direito é colocar, na centralidade do período pré-Weimar, que vivemos, a questão democrática, pervertida pela perda da força normativa da Constituição, face às exigências do golpismo e do reformismo neoliberal em curso. Mas, este "refazer", só será possível se for precedido de uma reconstrução da respeitabilidade do Supremo perante si mesmo e perante a sociedade. E esta reconstrução poderia começar com uma nova relação do Supremo com os fundamentos jurídico-políticos das suas decisões, bem longe da disputa entre personalidades com brilho, em cuja consciência sem autocrítica o Direito fenece. Ou desaparece.

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