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Pedro Maciel

Advogado, sócio da Maciel Neto Advocacia, autor de “Reflexões sobre o estudo do Direito”, Ed. Komedi, 2007

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O golpe e seu método devastador

O Poder Judiciário, antes apêndice dos poderes representativos, hoje ocupa um lugar privilegiado no processo decisório da maioria dos países democráticos ocidentais, algumas vezes alterando a própria vontade popular das urnas e outras interferindo na construção e execução de políticas públicas

stf (Foto: Pedro Maciel)
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INTRODUÇÃO.

O Golpe de Estado no Brasil seguiu um caminho inédito. Esse caminho, ou método, instrumentalizou a judicialização da Política, avançou para a politização do Poder Judiciário, cujos membros ao lado de outros do Ministério Público cuidaram de criminalizar a política e os políticos, contando com o apoio da mídia, a qual se incumbiu de transformar fatos e atos processuais em espetáculos midiáticos, tão ao gosto da cultura do consumo instantâneo, tudo para justificar e dar aparência de legalidade e esconder o ardil.

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É sobre isso que quero escrever. 

SOBRE JURISDIÇÃO.

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A palavra JURISDIÇÃO, que tem sua origem na composição das expressões jus, júris (direito) e dictio, dictionis (ação de dizer), teria surgido da necessidade jurídica de se impedir que a prática temerária da autodefesa, por parte de indivíduos que se vissem envolvidos em um conflito, levasse a sociedade à desordem oriunda da inevitável parcialidade da justiça feita com as próprias mãos. 

Por isso o Estado chamando para si o dever de manter harmônico e estável o equilíbrio da sociedade em substituição às partes, incumbiu-se da tarefa de administrar a justiça [1], isto é, de dar a cada um o que é seu, garantindo, por meio do devido processo legal [2], uma solução imparcial e ponderada, de caráter imperativo, aos conflitos interindividuais.  

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Reconhecendo a necessidade de um provimento desinteressado e imparcial, o Estado, mesmo sendo o titular do direito de dizer o Direito e detentor da pretensão punitiva, autolimitou seu poder repressivo atribuindo aos chamados órgãos jurisdicionais a função de buscar a pacificação de contendas, impondo, soberanamente, a norma que, por força do ordenamento jurídico vigente, deverá regular o caso concreto, assim, por intermédio do Poder Judiciário, busca-se, utilizando-se do processo, investigar qual dos litigantes tem razão, aplicando, ao final, a lei ao caso litigioso, está ai o conceito de jurisdição, ou no mínimo uma forma singela de compreendê-la.  

Alguns doutrinadores importantes a definem jurisdição como sendo uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. 

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Em outras palavras, seria através do exercício da função jurisdicional, o que busca o Estado é fazer com que se atinjam, em cada caso concreto, os objetivos das normas de direito substancial. 

A Jurisdição, que nasceu da necessidade jurídica de se impedir que a prática temerária da autodefesa, por parte de indivíduos que se vissem envolvida em um conflito, o que poderia levar a sociedade à desordem oriunda da inevitável parcialidade da justiça feita com as próprias mãos, pode estar a viver um momento singular, pois há quem afirme [3] que a partir da transição política no Brasil, com o fim da ditadura militar e com o advento da nova constituição aumentou a presença do Poder Judiciário, seus rituais e dos seus agentes no cotidiano da sociedade brasileira, com reflexões na própria democracia.  

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A PARTIR DA JUDICIALIZAÇÃO.

É exatamente sobre esse aumento crescente da presença do Poder Judiciário em questões sociais, abandonando progressivamente o cânon que lhe vinha de décadas de positivismo político kelseniano que passo a refletir. Sobre a jurisdição em tempos de ativismo judicial e de judicialização da política e convido o generoso leitor a acompanhar criticamente as opiniões e dúvidas que o texto apresentará.  

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É inegável que no exercício necessário da jurisdição a visibilidade do Poder Judiciário tem aumentado enormemente nas últimas duas décadas, mas esse aumento de visibilidade e até de protagonismo vem acompanhado de dúvidas sobre o quanto o chamado ativismo [4] é válido, legitimo e elemento positivo para o fortalecimento da democracia e para o amadurecimento das instituições, afinal tudo que é demais não é bom.  

Se na antiguidade o direito confundia-se com regras de moral, religião e convivência, quando não se podia perceber nitidamente quaisquer subdivisões das normas sociais, entre as quais estava o Direito, gradativamente foram-se isolando as normas jurídicas e, exclusivamente com elas, construíram-se os sistemas jurídicos positivos. 

O Professor ARRUDA ALVIM [5] afirma que antes dessa evolução, por estarem amalgamadas as normas do ordenamento jurídico com outras regras sociais, também a posição do Juiz era confusa, tanto que nos primórdios das sociedades a autoridade jurisdicional não era exercida por uma pessoa que tivesse exclusivamente essa função. 

Juntamente com a função exclusiva de dizer o direito, através da qual se busca a aplicação imparcial da lei, os juízes, ou a função jurisdicional exercida, passaram a ser protegidos com garantias de ordem pessoal e funcional que asseguram a liberdade do juiz [6] e a segurança da própria sociedade.

Mas essas garantias que, em minha opinião, retiram legitimidade do ativismo e da judicialização, pois as garantias constitucionais dos magistrados existem e são necessárias para que o Poder Judiciário possa cumprir as funções constitucionais, aí se justifica a (i) vitaliciedade, a (ii) inamovibilidade e a (iii) irredutibilidade de vencimentos, e não para o crescente envolvimento com questões sociais e políticas.  

Essas garantias asseguram a independência funcional do magistrado, sobretudo, em relação ao Poder Executivo, tanto que a advertência de Pedro Lessa, feita em 1915, permanece atual: "Importa garantir o Poder Judiciário, defendendo-o da pressão, das usurpações e da influência dos outros poderes políticos. Para isso é mister organizar de tal modo a magistratura, que, em vez de ficar dependente do Poder Executivo, constitua ela um freio a esse poder" [7].  

As garantias constitucionais dos juízes - a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos – são garantias da própria sociedade e devem ser consideradas cláusulas pétreas, não podendo ser alteradas por meio de emenda constitucional. Estão, portanto, subtraídas da área de incidência do poder reformador e tendo os magistrados tais garantias não é razoável que possam valer-se delas para interferir nas políticas públicas e na vontade popular. 

Portanto as garantias fundamentais da magistratura são validas no contexto da tripartição dos poderes, que nada mais significa do que a tripartição de funções, um critério orgânico representativo da impenetrabilidade de um poder no outro, assegurando-se a plenitude e a pureza do exercício de cada função [8]. 

Se na antiguidade o fundamento da ordem jurídica e da própria realização da Justiça era o rei [9] modernamente o fundamento sobre o qual se assenta o Direito reside na vontade do povo, assim a justiça deve ser feita em nome da república, governada por leis elaboradas por mandatários do povo, eleitos para isso. O processo eleitoral é elemento político fundamental. 

Por isso tudo a expansão do Poder Judiciário tem-se tornado uma das principais questões em debate na teoria política contemporânea em todo o mundo ocidental. O Poder Judiciário, antes apêndice dos poderes representativos, hoje ocupa um lugar privilegiado no processo decisório da maioria dos países democráticos ocidentais, algumas vezes alterando a própria vontade popular das urnas e outras interferindo na construção e execução de políticas públicas [10]. 

 

Muito se debate sobre o tema, o ativismo ou a judicialização vem despertando interesse de pesquisadores [11] nos campos da ciência política, das ciências sociais e da ciência do Direito. 

 

Mas o que e do que trata a Judicialização? 

 

Bem, quando me refiro a judicialização estou a falar sobre o fenômeno de expansão do Poder Judiciário na vida política do país, um fato que a rigor não é novo, pois desde há muito tempo muitos países ocidentais e democráticos passaram a adotar o Tribunal Constitucional como mecanismo de controle dos demais poderes [12], ou noutras palavras passou a haver um sistema que obriga que o Poder Executivo a negociar seu plano de ação política com o Parlamento e a preocupar-se em não infringir a constituição. 

 

O ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou que no Brasil assiste a uma espécie de "judicialização" da política, e deu como exemplo o fato de a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (STF) haverem regulado o sistema partidário e eleitoral. Para ele, a inércia do Legislativo está abrindo espaço cada vez maior para a regulação através Judiciário, o que ameaça o equilíbrio entre os Poderes. "Há hoje no Brasil uma radicalização da estatização da política em função dos poderes que o Judiciário tem avocado para si. E essa é a mais complexa e difícil questão de ser resolvida, por uma questão muito simples: quando o Poder Judiciário supre a omissão dos outros poderes ou altera decisões e a execução de políticas públicas a sociedade e o cidadão individualmente não têm instância para recorrer." [13]. 

 

O efeito imediato da inércia dos demais poderes é a efetiva participação do Poder Judiciário nos processos decisórios de natureza Política, o que parece a principio muito positivo, pois - apesar da assimetria entre os poderes - o Judiciário ocupa função estratégica no controle dos demais [14] e teria independência e imparcialidade necessárias. 

 

No Brasil o Supremo Tribunal Federal tem as prerrogativas de controle de constitucionalidade, a partir de 1.988, de duas formas: normativa e analítica. 

 

A normativa trata da chamada supremacia da constituição sobre decisões parlamentares majoritárias e abre o debate sobre os dilemas da evolução do constitucionalismo sobre o modelo tradicional. 

 

A idéia deste trabalho é refletirmos sobre a Jurisdição no contexto de ativismo e da Judicialização da Política e sobre os seus efeitos na própria ação de dizer o Direito, especialmente se pensarmos que uma democracia só é possível em um país regido por leis e não por juízes, prefeitos, governadores, parlamentares ou pelo seu presidente. 

 

E quem afirma que diante de uma lei ruim um juiz poderia chegar a um resultado melhor ou mais justo digo que ele pode estar a negar o sistema democrático, e essa não é uma opinião isolada, o ministro da Suprema Corte dos Estados Unidos, Antonin Scalia, em palestra no seminário Direito e Desenvolvimento entre Brasil e EUA, realizado pela FGV Direito Rio, no Tribunal de Justiça fluminense afirmou exatamente isso [15]. 

 

Aliás, para ele a função do juiz é ser fiel ao que o povo decidiu. E o que o povo decidiu estaria refletido nas leis e na Constituição do país. Se há leis ruins as decisões dos juízes serão ruins, daí a importância do processo eleitoral e a necessidade de a sociedade civil atuar politicamente junto ao parlamento e aos parlamentares. O Ministro Scalia afirma ainda que quem defende uma posição diferente estaria, na realidade, defendendo a criação de uma espécie de “aristocracia de juízes”. 

 

Algo parecido com o que aconteceu na URSS após a revolução de 1.917 onde a burocracia tornou-se a casta dirigente pelo fato de se encontrar sempre pronta a cerrar os olhos perante os mais grosseiros erros dos seus chefes em política geral se, em contrapartida, estes lhe forem absolutamente fiéis na defesa dos seus privilégios [16], ignorando a participação popular. Não há dúvidas sobre o fato de que a revolução russa de 1.917 foi o maior acontecimento da história no século XX, pois o capitalismo, sua lógica, seus principais operadores e seus estafetas foram abalados com a possibilidade de novos sistemas, econômico e político, serem implantados em todo o mundo, com a participação direta da classe trabalhadora, mas falhou por terem os burocratas afastados do centro da decisão a própria sociedade. 

 

A Rússia, depois a URSS, deveria ter sido um Estado operário [17] saído de uma revolução campesina e proletária, que aboliu o regime capitalista e instaurou formas de propriedade coletiva e planificação da economia, mas perdeu-se na burocratização do poder, um processo que comprometeu a legitimidade institucional, esse é o risco do fenômeno da Judicialização da Política no Brasil, sua politização e o comprometimento da legitimidade institucional da própria jurisdição, pois há o risco de a sociedade civil, das ações cidadãs serem substituídas por um dos poderes, no caso o Poder Judiciário. 

 

Mas voltemos ao ministro da suprema corte dos EUA. Ele explicou que há uma tendência forte nos Estados Unidos em crer que um juiz deve fazer o bem e não, necessariamente, aplicar a lei, isso vem do próprio sistema do common law em que, durante um longo tempo, eram os juízes que faziam a lei. Infelizmente, diz ele, os alunos de Direito estudam, hoje, principalmente casos da common law dos séculos passados. A imagem que os alunos têm é do grande juiz que pode dar a melhor resposta, afirma o ministro Scalia [18], mas as coisas mudaram, pois a democracia deve ser considerada e respeitada, por isso, segundo ele, os juízes já não são e não podem ser mais os redatores da lei, a lei emerge da o processo democrático, da sociedade civil e da independência dos poderes, pois a jurisdição deve refletir e emergir da realidade social da sociedade mesma, a ação de dizer o direito não tem legitimidade em havendo distanciamento da realidade social, pois o distanciamento retiraria da prestação jurisdicional o necessário sentido comunicativo, afinal as normas não existem validamente fora da realidade social e do processo democrático. 

 

Vou tentar compartilhar com o leitor a idéia de que a JUDICIALIZAÇÃO DA POLITICA, fenômeno sócio-político, compromete a ação de dizer o Direito – Jurisdição enfraquece e desequilibra as instituições, assim como a relação entre os poderes, a própria democracia e muito especialmente o poder de articulação e influência da SOCIEDADE CIVIL no processo decisório institucional. 

 

Podemos entender sociedade civil como um campo de ação humana, de interação social influenciada pela economia, subordinada a um Estado, e que tem por características a pluralidade, publicidade e privacidade. A sociedade civil representa a ação legitima de contestação social, é o campo onde a sociedade associa-se em redes e essas redes constituem um campo de luta e uma arena onde se forjam alianças, identidades coletivas e valores éticos que buscam influenciar o Estado na elaboração e execução de políticas públicas, sempre através da participação popular, seu elemento legitimador. 

 

A Judicialização da Política, na minha maneira de ver, se contrapõe às ações e práticas necessárias e típicas da sociedade civil, pois na Judicialização a participação popular, as ações políticas, o debate, a busca de solução negociada dos conflitos é substituída por métodos tipicamente judiciais em disputas cuja natureza originária é tipicamente política. 

É verdade que poder-se-ia justificar a ampliação da atuação dos tribunais, pela via do poder de revisão judicial de ações legislativas e executivas e sem a participação efetiva da sociedade civil, em razão da constitucionalização de direitos e dos mecanismos de checks and balences, também porque passaram a fazer parte das estruturas do Poder Executivo e do Poder Legislativo mecanismos e procedimentos tipicamente judiciais (Tribunais de Contas e Comissões Parlamentares de Inquérito, por exemplo) e porque as transformações constitucionais pós-88 permitiram um maior protagonismo do Poder Judiciário, talvez em virtude da amplicação dos instrumentos de proteção judicial colocados à disposição de minorias parlamentares, governos, associações civis e profissionais. 

 

O problema está no excesso e no sistema hibrido de controle de constitucionalidade. 

 

No Brasil convivem os controles difuso e concentrado de constitucionalidade, e seria essa convivência que teria possibilitado o fenômeno da judicialização da política e o enfraquecimento da sociedade civil. 

 

O que vemos são ONG’s, associações e mesmo entidades como a OAB e a ABI substituírem a participação popular, a militância e a interlocução necessária e produtiva com os Poderes Legislativos e Executivo pela imediata transformação de todas as questões em demandas judiciais, o que na prática afasta a sociedade do centro do debate e das decisões. 

 

O Ministro do STF - Superior Tribunal Federal Gilmar Mendes afirma que esse fenômeno não encontra paradigma desconhecido nas democracias maduras, chega-se ao absurdo de minorias derrotadas majoritariamente na arena política buscarem na Justiça revogar ou desqualificar as decisões da maioria [19]. Acredito que esse fenômeno compromete a jurisdição e conflita com a Democracia. 

 

O Professor Rogério Bastos Arantes afirma que os impactos dessa expansão são indesejáveis, pois dentre outras coisas aumenta a incerteza do valor das decisões políticas, acrescento: a sociedade passa a ver a arena política como um campo de segunda categoria, afinal a excessiva judicialização da política passa a idéia equivocada de que a sociedade civil é incapaz de defender seus interesses organizadamente e que as instituições políticas não seriam confiáveis. 

 

Vejo na substituição do movimento e envolvimento necessário da sociedade civil pela excessiva Judicialização como vitória indesejada de uma visão elitista que não estimula a participação popular nem a construção de estruturas capazes de transformar democraticamente a realidade através do debate e da ação política, e acaba por eternizar a idéia de que a sociedade precisa ser tutelada e que o Poder Judiciário, cuja estrutura é devota muito mais da meritocracia [20] do que da democracia seria o caminho a verdade e a vida [21].

 

A "judicialização da política" é fato consolidado e hoje convivemos com a "politização do judiciário", o que é uma tragédia, pois sob o pretexto de combater a corrupção, a lei e a constituição têm sido ignoradas e algumas vezes o Judiciário tem ingressado na esfera de ação própria da política, fazendo valer de fato valores próprios de grupos em disputa na arena política e não os valores gerais que dizem garantir, subvertendo autoritariamente as regras do procedimento democrático a titulo de cumpri-las.

Não se pode esquecer os casos de Honduras e do Paraguai, lá chegou-se à dramática situação de ruptura institucional com a democracia pela via da jurisdição ou com o seu consentimento explicito e com o apoio da mídia. Isso pode ocorrer no Brasil?

Essas são as reflexões de hoje. Tenho escrito reiteradamente que tudo isso faz parte de um encadeamento de fatos quais, na minha maneira de ver, são os responsáveis por uma inflexão conservadora e sombria e podemos estar testemunhando a construção de uma ruptura institucional, um golpe, que possui metodologia e encadeamento curiosos:

(a)   a Judicialização da Política;

(b)  a Politização do Poder Judiciário;

(c)   a espetacularização (midiatização) do que foi judicializado e, por fim e

(d)  criminalização da Política, dos políticos e dos partidos políticos, tudo para justificar o golpe.

A sociedade tem de refletir sobre isso e reagir a qualquer tentativa de golpe, pois estamos no século 21, nossas instituições são fortes e uma ruptura institucional seria trágica para a nação.

 

CONCLUSÃO.

Bem, confio mais nas pessoas, no movimento dialético da sociedade do que nas estruturas de viés aristocrático. Creio que trabalho e difundo adequadamente a critica e a reflexão necessária do risco da defesa simplista da "legalidade", do "Estado de direito", e do mito da "aplicação imparcial das leis" pelo Poder Judiciário, o faço porque acredito desde os tempos do Pátio dos Leões na PUC Campinas, que o centro de gravidade do desenvolvimento jurídico não está propriamente na legislação, na ciência do direito ou na jurisprudência, mas na sociedade mesma, nos movimentos dialéticos que apenas ela produz.

Há na sociedade — entre a ação humana e as estruturas sociais — uma tensão contínua, pois na ação humana a diversidade se contrapõe a unidade das estruturas sociais.

O mito a ser combatido, portanto, é o de que em sendo as estruturas e instituições artefatos humanas caberia ao apenas Direito harmonizar a tensão entre ação humana e estruturas sociais, assim como compatibilizar diversidade e unidade, mas o Direito e a Justiça sem o movimento necessário da sociedade são incapazes de equilibrar a tensão. Tanto isso é verdade que podemos afirmar que as estruturas e instituições transformam-se continuamente e em tempos de grandes tensões temos de impedir retrocessos.

As transformações ocorrem ou através de rupturas institucionais ou pelas reformas. Não somos apenas o que representamos na estrutura econômica, nem que as estruturas sociais são limitadores da ação humana ou que simplesmente as estruturas se reproduzem.

Acredito que há um importante espaço de atuação para o Direito e para os estudantes de Direito, mas que é válido e legitimo apenas através da ação cidadã, através da sociedade e não nos "palácios da justiça", nas cortes, nos gabinetes da aristocrática magistratura ou na academia. Esses espaços devem refletir a sociedade, não tentar domesticá-la.

Tanto é verdadeira essa afirmação que há fatos a exemplificá-la: a ação humana pode transformar as estruturas quando não reconhece a legitimidade das próprias estruturas de poder, pois a sociedade é um conjunto de relações sociais ou de ações sociais e o exercício da nossa condição de cidadãos ocorre através do diálogo, trata-se do exercício comunicativo da liberdade.

E a democracia se revela um espaço aberto à disputa política e moral sobre as leis, interpretações e decisões.

Apenas "na democracia que se pode disputar o sentido político que atravessa necessariamente o sistema judiciário, na medida em que é praticado por pessoas”.

Afirmar isso significa compreender a ordem jurídica como produto da ação humana e naco como algo divino.

O GOLPE DE ESTADO, apresentado à opinião publica como um Processo legal e abençoado pelo STF é exemplo de que não se pode simplesmente defender a legalidade como se estivesse em questão assentir ao que diz o sistema jurídico, como se este fosse um sistema impessoal que se revelasse a origem e o fundamento da verdade e do justo, a verdade e a justiça está de fato na sociedade, em todo movimento social, afinal sabemos que "as conquistas sociais sedimentadas na forma jurídica são resultado de disputas que envolvem racionalidades distintas, que envolvem força política, que envolvem posição explícita a respeito do sentido progressista que tais demandas representam, considerando a vida concreta das pessoas.”.

Por que é Golpe de Estado?

O que se impõe à sociedade e à Presidente Dilma Rousseff é um GOLPE DE ESTADO, pois o golpe de estado é "ato realizado por órgãos do próprio Estado”, no caso presente temos que parcela irresponsável da oposição, aliada ao criminoso Presidente da Câmara dos Deputados e ao vice-presidente da Republica tentam caracterizar como crime de responsabilidade ato que nenhuma lei tipifica como tal; e esses setores contam com diligente concurso de parcela importante da imprensa.

Importante registrar que para o jornalista norte-americano Glenn Greenwald do The Intercept, "a fraude que está sendo levada a cabo aqui é tão barulhenta quanto devastadora. Mas é o mesmo padrão que vem sendo repetidamente observado ao redor do mundo, particularmente na América Latina, quando uma pequena elite trava uma guerra, em seu próprio interesse e proteção, contra os fundamentos da democracia”
Norberto Bobbio afirma que nos Golpe de Estado modernos "... quem toma o poder são os titulares de um dos setores-chaves da burocracia estatal:..."; o golpe militar é o mais comum dos golpes de estado, mas não é o único.

Golpes de Estado como o de Honduras e o do Paraguai são exemplos recentes, mas que reafirmam que tradicionalmente é um método da direita para conquista do poder político inalcançável pelo voto para eles. Esse fato é inegável, tanto que a Corte de Direitos Humanos da OEA caracterizou a deposição do presidente de Honduras como um Golpe de Estado. A deposição do presidente de Honduras foi reconhecida como um golpe de estado e isso é incontroverso, tanto na OEA e quanto na ONU.

O caso do Paraguai, similar ao de Honduras e ao caso brasileiro, ainda não chegou à Corte, mas tramita na OEA e por certo será encaminhado à corte em breve.

Os fatos alegados no processo de impeachment de Dilma não caracterizam crime de responsabilidade e o Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, por isso as tais "pedaladas" não caracterizam "crimes de responsabilidade", esses são infrações político-administrativas suscetíveis de serem praticadas por determinados agentes políticos em razão dos cargos públicos que ocupam.

São infrações contra a ordem pública que acarretam graves sanções, não apenas para o agente que os comete, mas também para a vontade popular que legitimamente o investiu da condição de governante.

Para a configuração dos denominados "crimes de responsabilidade" é fundamental respeito ao princípio da legalidade, ou seja, uma lei tem que dizer que é crime e, no caso das "pedaladas" não há lei nesse sentido, não havendo lei é golpe e é um golpe contra Dilma, contra o Brasil e, fundamentalmente contra os benefícios sociais, pois com "sutilezas maiores ou menores, muitas vezes só percebidas por especialistas, estão falando em diminuir benefícios, ou cortar o tempo de permanência de quem faz parte do Bolsa Família", como bem alertou a Ministra Tereza Campello.

E para terminar este e preparar o próximo fica uma reflexão. Minha amiga Patrícia Patapoff escreveu, com sua costumeira precisão, que algumas pessoas costumam encher a boca ao falar do STF como uma se fosse uma corte acima do bem e do mal.

Não é verdade. O STF é um Poder da República e merece respeito e proteção, mas erra e está sob enorme pressão e no caso do impeachment de Dilma Rousseff não analisou e não analisará o mérito do processo de impeachment, até poderia numa ação declaratória dizer o óbvio, mas não o fará.

Por que não fará? Porque o STF foi esse órgão que avalizou o golpe militar de 1964, que autorizou a deportação da grávida Olga Benário Prestes, judia, comunista e mulher de Luiz Carlos prestes para a Alemanha nazista – que a executou em uma câmara de gás em Bernburg, no dia 23 de abril de 1942.

Por essas e outras confio mais nas pessoas, no movimento dialético da sociedade do que nas estruturas de viés aristocrático.

 Fica a idéia para reflexão. 

 

 

 

[1] A Constituição Federal de 1988 no Título IV, que trata Da Organização dos Poderes, no Capítulo IV “Das Funções Essenciais à Justiça”, especialmente na Seção III, ao tratar da Advocacia e da Defensoria Pública afirma que: “Art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”.

 

[2] No Direito Inglês a garantia do devido processo legal surgiu no reinado de John, chamado de Sem-Terra, cujo reinado usurpou de seu irmão Ricardo Coração de Leão que morreu em virtude de um ferimento de flecha recebido em uma batalha. A literatura nos ensina que John "Sem-Terra", ao "assumir a coroa passou a exigir elevados tributos e fez outras imposições decorrentes de sua tirania, o que levou os barões a se insurgirem: Os desastres, cincas e arbitrariedades do novo governo teriam sido tão grandes, que a nação, sentindo-lhe os efeitos envilecedores, se indispôs, e por seus representantes tradicionais reagiu. Foram inúteis as obsecrações. A reação era instintiva, generalizada; e isso, por motivo de si mesmo explícito: tão anárquico fora o reinado de João, que se lhe atribuía outrora, como ainda nos nossos dias se repete, a decadência; postergou regras jurídicas sãs de governo; descurou dos interesses do reino; e, a atuar sobre tudo, desservindo a nobres e a humildes, ameaçava a desnervar a energia nacional, que se revoltou. Assim, em 15/06/1215 John foi obrigado a concordar apondo seu selo real, com os termos da declaração de direitos, que lhe foi apresentada pelos barões, a qual ficou conhecida como Magna Carta, ou Great Charter, da qual ainda existem preservados quatro exemplares originais. Por esse documento, o Rei John jurou respeitar os direitos, franquias e imunidades que ali foram outorgados, como salvaguarda das liberdade dos insurretos, entre eles a cláusula do devido processo legal (due process of law). Destaca-se que a Magna Carta (1215) evidenciou pela primeira vez, de modo inequívoco, que nenhuma pessoa, por mais poderosa que fosse, estaria acima da lei, ao assegurar, em seu § 39, com as alterações da Carta de 1225, com regra absoluta a ser observada, o devido processo legal (due process of law). “Nenhum homem livre será detido ou sujeito a prisão, ou privado dos seus direitos ou seus bens, ou declarado fora da lei, ou exilado, ou reduzido em seu status de qualquer outra forma, nem procederemos nem mandaremos proceder contra ele senão mediante um julgamento legal pelos seus pares ou pelo costume da terra". Portanto, pela primeira vez na história instituiu-se o devido processo legal que constitui a essência da liberdade individual em face da lei, ao afirmar que ninguém perderá a vida ou a liberdade, ou será despojado de seus direitos ou bens, salvo pelo julgamento de seu pares, de acordo com a lei da terra, conforme ensina SILVEIRA, Paulo Fernando. Devido processo legal – Due process of Law. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, cit. p. 15. 

 

[3] Maciel, Débora Alves e Koerder, Andrei, in “Sentidos da Judicialização da Política: Duas análises, Lua Nova No. 57 – 2002.

 

[4] O termo “ativismo judicial” foi usado pelo jornalista americano Arthur Schlesinger mencionou, pela primeira vez. 

[5] Manual de Direito Processual Civil, Vol. I, ed. RT, 2ª. Edição refundida, p. 76. 

[6] Garantias fundamentais da Magistratura. 

[7] LESSA, Pedro. Do Poder Judiciário . Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2003, p. 30. 

[8] ARRUDA ALVIM, in Manual de Direito Processual Civil, Vol. I, ed. RT, 2ª. Edição refundida, p. 77. 

[9] Mário Guimarães, O Juiz e a Função Jurisdicional, Rio, Forense, 1958, CAp I, n. 1, pp 19, citado por ARRUDA ALVIM no seu Manual de Direito Processual Civil, Vol. I, ed. RT, 2ª. Edição refundida, p. 77. 

[10] As políticas públicas podem ser definidas como conjuntos de disposições, medidas e procedimentos que traduzem a orientação política do Estado e regulam as atividades governamentais relacionadas às tarefas de interesse público. São também definidas como todas as ações de governo, divididas em atividades diretas de produção de serviços pelo próprio Estado e em atividades de regulação de outros agentes econômicos. Conf.: http://itd.bvs.br/itd-mod/public/scripts/php/page_show_introduction.php?lang=pt&menuId=2&subject=healthPolicies&search=($)*(introduction/(channel)) 

[11] Vide a obra: “A judicialização da política e das relações sociais no Brasil”, de Luiz Weneck Vianna e outros, ed. Revam, 1.999. 

 

[12] Moraes, A. “Jurisdição Constitucional e tribunais constitucionais”, São Paulo, ed. ATLAS. - 2000 

[13]http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,brasil-assiste-a-judicializacao-da-politica-diz-tarso,356648,0.htm 

[14] Lijphart, A. “As democracias contemporâneas”, Lisboa, ed. Gradiva, 1.989. 

[15] http://www.conjur.com.br/2009-mai-16/lei-forma-povo-expressa-vontade-antonin-scalia

[16] Leon Trotsky, in A Revolução Traída, p. 269, Edições Antídoto, Lisboa, PORTUGAL com Introdução de Pierre Frank e Traduzida por M. Carvalho e J. Fernandes. 

[17] Trotsky afirma em A REVOLUÇÃO TRAIDA que a URSS, devido a um concurso excepcional de circunstâncias como o isolamento internacional, refluxo da revolução no mundo, atraso econômico e cultural do país, etc., sofreu uma contra-revolução política que não atentou contra as novas relações de produção, estabelecidas pela Revolução de 1.917, mas roubou o poder político ao proletariado para transmiti-lo a uma burocracia, cujos interesses são distintos dos da classe trabalhadora e opostos. (conforme Pierre Frank na Introdução de A REVOLUÇÃO TRAIDA, Edições Antídoto, Lisboa, PORTUGAL com Introdução de Pierre Frank e Traduzida por M. Carvalho e J. Fernandes. 

 

[18] “É o que os juízes faziam no passado, mas não o que um juiz em uma democracia deve fazer.” Segundo Scalia, a democracia não funciona sem a palavra escrita. “Essa é a forma como o próprio povo expressa a sua vontade”, diz. A função do juiz, na opinião do ministro, não é determinar qual é a melhor resposta, mas dar eficácia às leis criadas pelo povo. Às vezes, constata o ministro, a resposta pode parecer boa, outras vezes não. Para Scalia, o trabalho do juiz não é chegar a uma sentença que lhe agrade, mas à solução decretada pelo povo através das leis., conformehttp://www.conjur.com.br/2009-mai-16/lei-forma-povo-expressa-vontade-antonin-scalia 

 

[19] Opinião do Ministro Gilmar Mendes, citada em “Sentidos da Judicialização da Política: Duas Análises”, Lua Nova No. 57, p. 117. 

[20] Meritocracia (do latim mereo, merecer, obter) é a forma de governo baseado no mérito. As posições hierárquicas são conquistadas, em tese, com base no merecimento, e há uma predominância de valores associados à educação e à competência. A meritocracia está associada, por exemplo, ao estado burocrático, sendo a forma pela qual os funcionários estatais são selecionados para seus postos de acordo com sua capacidade (através de concursos, por exemplo). (...). A palavra meritocracia provavelmente apareceu pela primeira vez no livro "Rise of the Meritocracy", de Michael Young (1958). No livro carregava ela um conteúdo negativo, pois a história tratava de uma sociedade futura na qual a posição social de uma pessoa era determinada pelo QI e esforço. Young utilizou a palavra mérito num sentido pejorativo, diferente do comum ou daquele usado pelos defensores da meritocracia. Para estes, mérito significa aproximadamente habilidade, inteligência e esforço. (Uma crítica comumente feita à meritocracia é a ausência de uma medida específica desses valores, e a arbitrariedade de sua escolha.) Os primeiros indícios de semelhante mecanismo remonta à Antiguidade, na China. Confúcio e Han Fei são dois pensadores que propuseram um sistema próximo ao meritocrático. Também podem ser citados Gengis Khan e Napoleão Bonaparte, cada qual utilizou no exército e na vida política de seus estados elementos da meritocracia.Fonte: http://dicionario.sensagent.com/meritocracia/pt-pt/ 

[21] João, XIV, 6

 

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