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Jean Menezes de Aguiar

Advogado, professor da pós-graduação da FGV, jornalista e músico profissional

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O presidente e o ‘difícil’ art. 18 da Constituição

A autonomia de estados e municípios, sem ingerência de presidente nenhum é um verdadeiro tormento para muitos. Principalmente para aqueles que veem a vida em obediências a hierarquias, ordens e comandos autoritários

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A Constituição da República, artigo 18 tem a seguinte redação: ‘Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição’. 

Há, entretanto, quem ‘queira’ que o Supremo Tribunal Federal tenha, há pouco tempo, ‘sentenciado’ que o presidente da República não pode se intrometer em estados e municípios, e não compreende muito bem o que pode estar escrito no citado artigo constitucional. Para esses aí, é apenas o caso de ‘estudar’, conceito meio fora de moda em épocas de filminhos de Youtube. 

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A autonomia de estados e municípios, sem ingerência de presidente nenhum é um verdadeiro tormento para muitos. Principalmente para aqueles que veem a vida em obediências a hierarquias, ordens e comandos autoritários. Aí, como é que o prefeito não vai obedecer ao governador e o governador não vai obedecer ao presidente? Que infâmia, ou subversão, será esta? Mentes retilíneas assim costumam não produzir genialidades e encantamentos para a humanidade. Nem se invoque Bertold Brecht com sua poesia ‘Ordem, hoje em dia, encontra-se, em geral, onde não há nada. É um sintoma de deficiência.” 

O fato é que a autonomia a estados e municípios é concedida pela Constituição da República, e interpretada pelo Direito. Aliás, a autonomia é traço ordinário a todas as Federações da atualidade. 

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Leu-se na Folha de São Paulo de 23.3.2021 que o presidente advertiu governadores com o uso do Exército relativamente aos estados que tiverem decretos de fechamento para combate à pandemia. Advertia ou, tecnicamente, ameaçava? Pois é, cabem digressões jurídicas aí. 

Ameaça é conduta criminal, prevista no Código Penal, artigo 147 e, no caso concreto, razoavelmente identificável como delito, segundo noções do próprio tipo penal. Se não, veja-se, numa rápida análise do crime sob a ‘vontade’ externada do presidente. 

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Há pessoas determinadas, na fala personalista presidencial, no caso três governadores de estados, a quem a ameaça, ou a ‘conjectura’ foi dirigida, sabendo-se que o crime é de forma livre, inclusive por meio simbólico, conforme o próprio texto legal, estando o contexto ilícito eficacial – possível convocação do Exército- na esfera competencial de fato do autor.  

Veem-se os quatros elementos configuradores da ameaça: constrangimento ilegal; mal injusto ou falta de justa causa da ameaça; gravidade e idoneidade. O antigo jurista Bento de Faria ensina que ‘todo ato ou fato intimidativo pode constituir a ameaça’. 

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A fala do presidente também não se confunde, propriamente, com o crime de constrangimento ilegal, artigo 146, já que tem por finalidade, precisamente, a intimidação. 

O bem jurídico tutelado é a liberdade pessoal de autodeterminação, no caso o governador ser tolhido de agir livremente conforme ‘sua’ autonomia constitucional. 

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O crime, ainda que tenha como figura ativa um agente do Estado – o presidente-, também não se confunde com o delito de abuso de autoridade, porque a finalidade aqui é tão somente intimidativa. 

A ameaça também não consubstancia exercício regular de direito, porque a invocação de uso das Forças Armadas para combater autonomia constitucional de entes federativos é absolutamente inconstitucional, além de logicamente esdrúxula.

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Por outro lado, o ‘inocente’ crime de ameaça produz um paradoxo formidável e fortíssimo: se, para um criminalista puro ou em sua prática, acaba, o crime, não causando a prisão de ninguém, porque é delito de menor potencialidade ofensiva, quando manejado sobre figura expoente da política, principalmente uma que busque se descolar de manias e modos autoritários, um chefe de Poder, é, situação simplesmente devastadora em termos de imagem. O crime de ameaça ajuda a sedimentar uma nódoa de autoritarismo e de violência social na imagem que verdadeiramente mancha o ofensor, coisa que todo e qualquer governante da atualidade se presume não quer. 

A conjectura de possível crime de ameaça numa situação assim pode ser ou não ser um mero exercício teorético do Direito; pode não existir como processo penal de um agora, e pode ser apenas um grão em todo o contexto. Só o futuro dirá. O caso é que não é de toda esdrúxula a hipótese de que governantes danosos sejam efetivamente chamados à vária responsabilização, e aí somar-se-ão os vários grãos de um passado trágico e sombrio, minimamente um que vitimou, até agora, 300 mil pessoas.

 

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