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Paulo Kliass

Paulo Kliass é doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal

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Paulo Guedes e as reservas internacionais

(Foto: José Cruz/Agência Brasil))
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A gravidade da crise internacional provocada pela emergência da pandemia do covid 19 ganha ares de uma quase unanimidade. Até mesmo dirigentes políticos da extrema direita no cenário internacional, como Donald Trump dos Estados Unidos e Boris Jonhson da Inglaterra, mudaram de estratégia e passaram a reconhecer a necessidade de conferir a essa crise o tratamento grave que ela merece.

Além da incorporação da narrativa oferecida pelos especialistas em saúde e medicina epidemiológica, os conservadores da cena global foram obrigados a transformar suas visões a respeito da importância do Estado e das políticas públicas para que haja sucesso na luta que a Humanidade trava em situações como a que vivemos atualmente.

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Em termos concretos, isso significou que a doença provocada pelo novo coronavírus deixou de ser apresentada como apenas mais uma “gripezinha” e as orientações da Organização Mundial da Saúde e demais autoridades no assunto passaram a ser seguidas pelos governos nacionais. Por outro lado, a profundidade da crise veio a requerer também uma mudança na abordagem das alternativas de política econômica. A necessidade de se manter o ritmo da economia minimamente ativo implicou a busca de estratégias opostas ao que sempre pregou o conservadorismo neoliberal.

O Estado foi chamado de novo à cena principal. Sim, aquele ente tão detestado pelas elites financeiras globais passou a ser requisitado para que os recursos necessários ao combate contra a pandemia estivessem à disposição de todos - empresas e cidadãos. No jargão do “economês”, o keynesianismo voltou à baila como o único mecanismo capaz de segurar a demanda agregada e evitar que o desastre seja ainda maior do que está sendo e ainda será.

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Neste momento, quase todos os formuladores do próprios establishment deram-se conta de que os gastos públicos são essenciais para salvar vidas e para minimizar os efeitos drásticos que os diversos níveis de isolamento e confinamento certamente provocarão na economia em escala internacional.

No entanto, neste triste país chamado Brasil, infelizmente as coisas não aconteceram dessa maneira. Bolsonaro segue acompanhado apenas de líderes de países como Turcomenistão, Bielorússia e Nicarágua nessa sua tentativa genocida de negar as evidências da realidade e da própria ciência. Ao se colocar contra as estratégias recomendadas por 11 em cada 10 especialistas em saúde pública no mundo, bem como contra as sugestões de seu próprio Ministro da Saúde, o presidente apenas agrava as consequências futuras da crise - em termos de vidas que deixarão de ser salvas e dos obstáculos antepostos à própria recuperação da economia no futuro.

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Essa intenção equivocada de (não) enfrentamento da pandemia encontra eco e acolhimento junto ao seu superministro da Economia. Esse negacionismo criminoso do chefe soa como música aos ouvidos do homem do financismo implantado com super poderes no seio da Esplanada dos Ministérios. Isso é tudo o que o aprendiz de feiticeiro gostaria de receber como orientação. Afinal, se tudo não passa de uma bobagem superdimensionada pela imprensa, o governo não tem mesmo muito com o que se preocupar. A doença vai passar logo, logo. E ponto final.

Na verdade, trata-se de uma aplicação trágica da fábula do equilíbrio das livres forças de oferta e demanda para o contexto da pandemia. O governo não precisa fazer nada, pois o tempo dará conta de resolver essa dificuldade momentânea. “Os mais fortes sobreviverão e os mais fracos perecerão. Uma pena! Mas essa é a triste lei natural das coisas”. Uma loucura! Não foram poucos os tecnocratas a se saírem com cálculos econômicos e financeiros, tentando demonstrar que o custo de salvar vidas seria muito maior do que deixar a coisa rolar leve e solta.

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Mas a realidade muitas vezes grita mais alto e também por nossas terras uma parte das elites e da fração das classes dominantes perceberam o exagero de tal postura. Bolsonaro e sua equipe se veem cada vez mais isolados em termos políticos. Na negociação com parlamentares, com governadores e com prefeitos soam cada vez mais fortes os clamores por liberação de recursos. O governo vai sendo obrigado a ceder, como ocorreu com os valores da ajuda emergencial. Paulo Guedes chegou com o teto limite “inegociável” de R$ 200 e depois o Congresso aprovou R$ 600 para os cidadãos e cidadãs sem acesso aos mecanismos do mercado de trabalho formal.

Ao perceber que não tem mesmo como evitar a elevação dos gastos em um contexto como esse, o “old Chicago boy” passa a olhar com preocupação para seus dogmas da ortodoxia monetarista. Afinal, ele sempre esteve com um olho voltado para o sacrossanto equilíbrio fiscal, a ser alcançado a qualquer custo. E agora percebeu que, mais uma vez, pelo segundo ano consecutivo, o orçamento coordenado por sua equipe será deficitário.

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Ocorre que, para fazer face a essa circunstância, Paulo Guedes ameaça lançar mão de mais uma estratégia criminosa. Ele sabe que o Tesouro Nacional conta com recursos sobrantes de R$ 1,3 trilhão em sua Conta Única junto ao Banco Central. Ele sabe também que pode lançar mão de mecanismos de endividamento para fazer face às necessidades emergenciais das despesas associadas ao combate ao covid 19.

Mas o problema é que ele tem o gene do financismo das elites em seu DNA. Assim como demorou semanas para fazer chegar à ponta a “fortuna” de R$ 600 aos mais necessitados, ele liberou imediatamente mais de um trilhão de reais para os bancos e demais instituições financeiras não sofrerem muito - oh, coitadinhos! - durante a crise. 

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Assim ao invés de lançar mão dos mecanismo conhecidos da política fiscal, ele vem com o ideia fantasmagórica de vender as nossas reservas internacionais para obter recursos para fazer face à crise. Trata-se de mais uma maracutaia desnecessária e que por objetivo apenas reduzir a capacidade de soberania do Brasil em um cenário internacional de crise bastante grave e muita incerteza. Na verdade, a equipe de Guedes já vem implementando essa política criminosa há um bom tempo.

Ao longo da última década, o bom desempenho exportador do Brasil permitiu a acumulação de saldos positivos de reservas internacionais em dólares e outros ativos em moeda estrangeira. Trata-se de uma garantia que o país pode contar para atravessar momentos de maior turbulência no setor externo, como vivemos agora. Em janeiro de 2003, esse valor era de US$ 39 bilhões. Em 2007 chega a US$ 100 bi. Em 2008 sobe para US$ 200 bi. Em 2011 atinge a marca de US$ 300 bi. É verdade que esse movimento foi fruto da cena favorável no setor externo, mas também da intenção de evitar que esses recursos saíssem de nossas contas.

Em agosto de 2019, o estoque de nossas reservas apresentadas pelo Banco Central era de US$ 390 bi. E aí a orientação de Paulo Guedes foi de utilizar as mesmas para conter as ameaças especulativas no mercado da taxa de câmbio. Como sempre atuou do outro lado do balcão, na condição de banqueiro operador do mercado financeiro, ele sabia muito bem o que seus ex colegas de balcão desejavam.

Pois o que se viu uma escandalosa redução de nossas reservas. Em poucos meses elas foram reduzidas para os atuais US$ 340 bi. Ou seja, 50 bilhões de dólares foram literalmente reduzidos a pó em operações nada transparentes levadas a cabo pelo Banco Central em um mercado super seleto, onde só atuam os grandes conglomerados. Assim, orremos o risco de voltar aos níveis existentes em 2010.

Não bastasse essas perdas com as especulações no mercado cambial, agora Guedes reafirma por todos os cantos que pretende continuar vendendo, em ritmo mais acelerado, as reservas internacionais para fazer face às necessidades de gastos do governo.

O Brasil não precisa dessa operação para conseguir recursos para reduzir os estragos da crise da pandemia. A intenção de Guedes apenas expõe com todo a evidência seu despreparo para o cargo e sua absoluta falta de preocupação e responsabilidade com o futuro de nosso país. A cada encruzilhada que encontra à sua frente, sua opção é por atender aos interesses da banca e de destruir a economia nacional. 

Um Brasil sem reservas internacionais teria muito menos de condições de soberania para enfrentar as dificuldades atuais. Cabe às forças democráticas e ao Congresso Nacional impedir mais esse crime contra nossa soberania.

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