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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Pulsões de vida e morte na terra de Lula e Bolsonaro

Bolsonaro é um sintoma de nossa pulsão de morte e superá-lo na esfera pública implica em superar também nossos traumas internos

(Foto: Lula e Bosonaro)

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"Nós precisamos saber lidar com o fascismo que carregamos dentro de nós" (Michel Foucault)

A contemporaneidade segue nos impondo desafios que escapam às ferramentas teóricas de turno. É desta impossibilidade que se constitui a condição humana e a condição prática para a produção de subjetividades.   

Pensar o movimento que nos empurra para a constatação chocante de que temos, por exemplo, um fascismo estrutural e uma violência atávica circulando na corrente sanguíneo-simbólica do sujeito é a árdua tarefa política posta pela contemporaneidade.  

Um dos intelectuais brasileiros mais referenciados, que faz dessas reflexões o empuxo epistemológico que lhe transcende o campo mesmo das formulações teóricas - extrapolando para o político -, atende pelo nome de Joel Birman, psiquiatra, psicoterapeuta e professor titular na UFRJ. 

Além da forte atuação no debate público e teórico sobre psicanálise, política e sociedade, Birman tem fortes ligações conceituais e práticas com movimentos sociais, sindicais e de classe.  

As questões centrais do presente momento da sociedade brasileira, atravessada pelo trauma da pandemia e pela catástrofe do governo Bolsonaro, são por ele colocadas frequentemente na mesa psicanalítica das formulações. 

Nascido em Vitória, Espírito Santo, e descendente de imigrantes judeus romenos, Birman costuma fundamentar suas reflexões públicas com os pilares da psicanálise freudiana, o que permite o aprofundamento dos conceitos e da argumentação por leitores/espectadores não especialistas.  

Birman diz, por exemplo, - remetendo a Freud -, que as conexões entre o período de mal-estar gerado pela disseminação da cultura neoliberal (em que o indivíduo é instado a ser “empresário de si mesmo”) e o atual colapso mundial causado pela pandemia estão diretamente interligadas com a construção da subjetividade contemporânea.  

Para ele, o século XXI começa agora.  

E da melancolia provocada pelo desamparo e pelo medo da morte, Birman vê surgirem indícios de novas formas de organização social e uma reorientação do papel do Estado, com a primazia da vida sobre a economia. Para novos traumas, teríamos, portanto, novos diagnósticos. 

No bojo desta discussão sobre prognósticos históricos, no entanto, Birman atenta para premissas básicas da psicanálise. Para ele, a condição humana fundamental é uma condição de uma certa inconsistência ontológica. Somos animais imaturos para sobreviver com as nossas próprias pernas e, portanto, nossa organização biológica é débil. Nasce daí, a mediação e a presença do outro.  

Precisamos ser cuidados pelo outro (aquilo que chamaríamos de ‘mãe’ ou ‘função materna’) para nos tornarmos aptos e viáveis para a vida.  

Ainda segundo Birman, Freud diz que nós precisamos construir um psiquismo para sermos viáveis do ponto de vista biológico, que o aparelho psíquico tem que funcionar para que nós não morramos - e isto não é uma metáfora.  

Temos de ser organizados simbolicamente para que a nossa vida biológica seja viável.  

A modernidade, no entanto, nos trouxe a angústia, e uma experiência caótica, catastrófica, que faz o sujeito voltar ao desamparo fundamental.  

Segundo Birman, além da regulação psíquica realizada pela Lei do Princípio do Prazer que promove o circuito do desejo existe um além do Princípio do Prazer que é um movimento dentro da subjetividade marcado por uma tentativa de se desfazer da própria organização psíquica, de tal forma que os fatos de violência e crueldade se tornam patentes (a Primeira Guerra Mundial, que legou a Freud o conceito de neuroses traumáticas). Eis, portanto, a constatação da pulsão de morte (ao lado de uma pulsão de vida).  

[Qualquer semelhança com Bolsonaro e Lula não é mera coincidência - nota deste autor]. 

Para Birman, além da pulsão de vida, em que existe uma ligação entre pulsão, objeto e satisfação, existe uma outra pulsão que desfaz essas ligações. Essas pulsões podem dar possibilidade para a produção da dor e essas pulsões, quando voltadas para nós mesmos, produzem uma experiência de nos fazer sofrer (masoquismo). Quando nós expulsamos isso para fora de nós mesmos, para que não soframos, nós fazemos sofrer o outro (sadismo).  

Existiria, a rigor, uma violência praticada pelo sujeito que atende a uma forma de afirmação da vida que pode se transformar ou não numa experiência de destruição do outro.  

Ainda como um retrato da nossa condição de sujeitos atravessados pelo simbólico, há, segundo Birman, um fenômeno fatal que nos empurrar para contradições cíclicas: a racionalidade cresce às expensas da nossa sensorialidade. Ou seja, o império do racional esmaga a sensibilidade que nos torna humanos, não sem caracterizar, também, a experiência mesma de ser humano (que desencadeia ciclos de vida e morte).

Quem é Joel Birman?  

Joel Birman é psiquiatra e psicoterapeuta, professor titular na UFRJ, professor aposentado no Instituto de Medicina Social da UERJ, doutor em Filosofia pela USP e pós-doutor pela Université Paris VII, vencedor por três vezes do Prêmio Jabuti. Ele é o entrevistado deste domingo, 8 de maio, da edição especial da Live do Conde, apresentada pelo linguista Gustavo Conde, às 21h, na TV 247. 

Assista a entrevista com Joel Birman: 


 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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