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Lelê Teles

Jornalista, publicitário e roteirista

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Sobre as cinzas de Marcelo Déda

Lutou o bom combate, lutou pelos mais humildes, engrandeceu o menor estado do Brasil e honrou, como poucos, as bandeiras históricas do PT

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Não morre um canalha.

Nunca se vê em uma lápide: "já foi tarde. Em vida, era arrogante e soberbo. Devia Deus e o mundo, traía a mulher, sonegava impostos e já bateu na cara da mãe. Não havia uma viv'alma em seu velório".

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As lápides, todos o sabemos, são como os obituários de jornais, derramam-se sempre nas mesmas frases falsas, fingidas, prontas e lisonjeiras: "bom pai, bom filho, esposo fiel e amantíssimo".

Pensava nisso dentro do belo Palácio Olimpio Campos, em Aracaju, durante o velório do governador Marcelo Déda. Houve discurso de despedida. Lá estavam os presidentes Lula e Dilma, ministros, prefeitos e ex-prefeitos, gente de toda cepa.

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Tanta lágrima.

Marcel Mauss, no maravilhoso A Expressão Obrigatória dos Sentimentos, dizia que diante de um caixão é preciso chorar. Mas que esse choro coletivo que vemos nos funerais, são provocados artificialmente por convenções criadas pela sociedade. Por isso, trata-se de um choro ensaiado. Um choro teatral, para ser mais preciso. Falta, nesses ritos coletivos, ainda segundo o antropólogo francês, qualquer caráter de expressão individual.

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Em um velório, somos todos carpideiras.

Foi pensando nisso, e banhado em lágrimas, que percebi a grandeza do homem que estava sendo velado naquele momento. Marcel Mauss ficaria desconcertado diante de tamanha autenticidade. O rito era coletivo, mas dava para perceber na multidão que subia as escadas para ver, pela última vez, o corpo do governador, que cada um trazia a sua própria dor.

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Antes ainda, no trajeto entre o aeroporto e o centro da cidade, os cidadãos, na beira das avenidas, nas varandas dos edifícios, nas janelas dos carros, fizeram a mais linda homenagem a um homem público.

Tudo improvisado, espontâneo, instintivo.

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Marcelo Déda era um semeador de sorrisos, ele mesmo fez questão de ressaltar, pouco antes de sua morte, que plantava amor para colher sorrisos.

Talvez por isso mesmo, o símbolo de seu governo era um coração vermelho vestido com a bandeira de Sergipe. Em toda obra que realizava no estado, e ninguém o fez mais que ele em tão pouco tempo, deixava como marco um coração.

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Déda plantou corações em cada município sergipano, como prova de amor pelo povo.

Quando esse povo o elegeu governador, no primeiro turno, em 2006, Déda rompeu com séculos de mandos e desmandos das oligarquias. Mas, republicano, governou com todos e para todos. Foi um homem agregador, moderador de conflitos e magnânimo, embora fosse muito bom de briga.

No seu velório estavam políticos da situação e da oposição, gente pobre, remediada e rica. O prefeito da cidade, do DEM, derrotado por Déda em 2006, decretou luto oficial de uma semana e colocou no novo viaduto, a obra mais importante que está realizando agora, o nome de Marcelo Déda.

Durante os funerais, políticos da oposição davam entrevistas ressaltando as qualidades do governador, todos exprimiam uma sincera admiração pela forma republicana como governou.

No Brasil inteiro, políticos importantes e dos mais diversos matizes emitiram notas demonstrando a mesma sincera admiração. Eduardo Campos disse que Déda foi o maior nome de sua geração.

Conheci Déda em 2009, quando saí de Brasília, contratado por uma grande agência de publicidade, para atender a conta do Governo de Sergipe. Na ocasião, criei e escrevi dez filmes, estrelados pelo ator Marcos Palmeira, para a campanha de balanço realizada pela agência. Na apresentação da campanha, no Palácio de Veraneio, coube a mim ler os filmes e eu o fiz de forma apressada.

O governador disse que não gostou e pontuou o que gostaria que constasse nos filmes. Mas está tudo aí, governador, eu disse. Talvez eu não tenha me feito compreender. Posso ler novamente. E ele, roteirista e amante da Super 8, disse, leia. E eu os li. Com pausa e a entonação correta. Ele se ergueu, bateu forte na minha coxa direita e disse: você tem razão, bichão, tá tudo aí.

Déda gostava das coisas feitas corretamente. Gostava de sentir segurança nas pessoas que trabalhavam com ele, por isso se cercou tanto de velhos amigos notáveis e extremamente leais, competentes e compromissados.

Lutou o bom combate, lutou pelos mais humildes, engrandeceu o menor estado do Brasil e honrou, como poucos, as bandeiras históricas do PT.

Por isso, sua passagem foi marcada por lágrimas autênticas e sentimentos verdadeiros. Gilvan Fontes, o âncora de um dos mais importantes telejornais sergipanos, sisudo e experiente, com 50 anos de jornalismo, não conseguiu esconder a voz embargada no editorial do adeus. Cada vez que fazia pausa para respirar, o telespectador engolia com ele as lágrimas salgadas que tentava conter.

Em pé diante do marido morto, com as pernas bambas, em suas palavras de despedida, na frente de importantes autoridades, a primeira-dama Eliane Aquino, indagou a Deus, a maior de todas as autoridades: "Por que, meu Deus, com tanta gente ruim na face da terra, o senhor quer tirar Marcelo Déda".

Para mim, essa é a maior das injustiças, não morre um canalha! 

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