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Pepe Escobar

Pepe Escobar é jornalista e correspondente de várias publicações internacionais

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Um pouco menos de conversa, um pouco mais de ação

Então, Sergey Lavrov e Tony Blinken se reuniram por quase duas horas no Harpa Concert Hall, em Reykjavik, nos bastidores da sessão ministerial do Conselho Ártico. Gélido? Nem tanto

Blinken e Lavrov (Foto: Reuters)
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Por Pepe Escobar, para o Asia Times 

Tradução de Patricia Zimbres, para o 247

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Então, Sergey Lavrov e Tony Blinken se reuniram por quase duas horas no Harpa Concert Hall, em Reykjavik, nos bastidores da sessão ministerial do Conselho Ártico.

Gélido? Nem tanto. Mesmo que o encontro não tenha sido um retorno ao divertidíssimo festival da era Reagan-Gorbachev, nos saudosos dias da Guerra Fria. Afinal, havia um navio de guerra da OTAN estacionado bem em frente às janelas do Harpa Hall – como um objeto cenográfico em algum campeão de bilheteria da Marvel.

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Blinken, que se auto-descreve como "guitarrista amador", pode até ter se deixado levar pelos encantos do fantástico A Little Less Conversation, sucesso de Elvis em 1968.
Bem, pelo menos houve alguma conversa. Quanto ao "um pouco mais de ação", como cantava Elvis, resta conferir.  É um bom sinal que eles tenham se dirigido um ao outro como "Sergey" e "Tony". Blinken chegou a ensaiar um "spasiba".

Comecemos com Lavrov – que rotineiramente habita o Valhala da diplomacia, ao contrário do funcionário burocrático mediano que é Blinken. 

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Concordamos em dar continuidade a nossas ações conjuntas, que vêm se desenvolvendo de forma bastante exitosa com relação aos conflitos regionais nos quais  os interesses da Rússia e dos Estados Unidos coincidem. Por exemplo, o problema nuclear da Península Coreana e a restauração  do Plano de Ação Conjunto Global sobre o programa nuclear iraniano. Há também o Afeganistão, onde a troika ampliada consistindo de Rússia, China Estados Unidos e Paquistão vem atuando de forma intensa. Discutimos formas de, no presente estágio, tornarmos mais efetivas nossas ações conjuntas. 

Foi, portanto, uma "conversa muito útil" (Lavrov, novamente) sobre questões nas quais há consenso (a restauração do acordo nuclear iraniano); não há consenso (o Afeganistão); e há consenso muito parcial (Coreia do Norte).
Mais que útil, a conversa foi de fato "construtiva". Novamente Lavrov: "Há consenso quanto à necessidade de superar a situação insalubre que se desenvolveu entre Moscou e Washington em anos anteriores".

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Lavrov deixou muito claro que o atual estágio é meramente "propositivo", tendo como objetivo "dar início a um diálogo que leve em conta a totalidade dos aspectos e dos fatores que afetam a estabilidade estratégica: nucleares, não-nucleares, ofensivos, defensivos. Não vi qualquer rejeição desse conceito, mas ele ainda têm que ser desenvolvido pelos especialistas". 

Quer dizer, Blinken não o rejeitou. O diabo é saber como os "especialistas" irão "desenvolvê-lo".

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Essas insuportáveis "leis da diplomacia" 

É bastante útil comparar o que eles disseram um ao outro - pelo menos segundo as informações que vazaram. 

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Lavrov insistiu em que as discussões devem ser "honestas, factuais e mutuamente respeitosas". A mais importante das áreas de cooperação é a "estabilidade estratégica". Ele invocou em especial as "leis da diplomacia" - algo que, nos últimos tempos, não vem agradando muito ao Hegêmona: eles "pedem reciprocidade, em especial quando se trata de responder a algum tipo de ação inamistosa". Fica implícita a disposição de Moscou a resolver problemas "herdados de governos anteriores dos Estados Unidos".

Blinken disse que os Estados Unidos querem uma relação previsível e estável: "Pensamos que se os líderes da Rússia e dos Estados Unidos conseguirem trabalhar juntos de forma cooperativa, o mundo poderá ser um lugar mais seguro e mais protegido". As áreas onde os interesses se "intersectam e sobrepõem" incluem o combate à covid-19 e as mudanças climáticas, além do Irã, Afeganistão e Coreia do Norte. 

A "agressão russa", entretanto não poderia ser simplesmente jogada no Oceano Ártico: "Se a Rússia agir de forma agressiva contra nós, contra nossos parceiros ou  nossos aliados, nós responderemos... não para fins de escalada nem para buscar conflito, mas para defender nossos interesses". 

Então, os "especialistas" terão um dia divertidíssimo - aliás, dias, semanas e meses - tentando entender quais tipos de "agressão russa" atacam "nossos interesses".

Nas atuais circunstâncias, tudo indica que a cúpula bilateral Putin-Biden, a ser realizada no mês que vem em uma "capital diplomática europeia" - segundo boatos que circulam em Bruxelas - vá mesmo acontecer. Esperar que ela tenha lugar, por exemplo, em Nursultan – a capital diplomática da Eurásia - é ser um pouco otimista demais. 

Lavrov: "Iremos preparar propostas para nossos presidentes, tanto sobre essas questões [o trabalho das missões diplomáticas] quanto sobre os assuntos relacionados a nosso diálogo sobre estabilidade estratégica".

É muito esclarecedor levar em contra dois desdobramentos que ocorrem paralelamente a Reykjavik. 

O Departamento de Estado confirmou que irá suspender as sanções contra a empresa com sede na Suíça que supervisiona a construção do Nord Stream 2. E a SWIFT confirmou junto ao Banco Central da Rússia que tudo continuará como antes, e que Moscou não será excluída do sistema. 

Essas duas medidas podem ser vistas como gestos de boa-vontade antes da possível cúpula de junho. Depois disso, ninguém sabe.

Também é esclarecedor observar o que Lavrov e Blinken não discutiram: a diplomacia das vacinas. 

Sergey Naryshkin, diretor do Serviço de Inteligência Exterior da Rússia (SVR), vem declarando publicamente que o registro da vacina Sputnik V na União Europeia vem sendo protelado por "sinais vindos dos corredores do poder em Bruxelas - algo que confirmei semanas atrás junto a diplomatas relativamente independentes. A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) reitera que a vacina poderá ser registrada antes do final do mês. 

E há também os casos gritantes, como o do Brasil, alvo de tremendas pressões de Washington visando a evitar a aprovação da Sputnik V. A vacina russa foi registrada em 61 países, a imensa maioria deles do Sul Global.  

Suponhamos que a Guerra Fria 2.0, em tese, tenha sido temporariamente suspensa. Agora, portanto, é  hora de "um pouco mais de ação". Será que as coisas chegarão ao ponto de Sergey e Tony concordarem com "um pouco menos de briga, um pouco mais de entusiasmo" e dançarem ao ritmo de "all this aggravation ain't satisfactioning me" (toda essa chateação não está me satisfazendo)?

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