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Regina de Aquino

Professora titular aposentada do DMAT-CCE-UFES

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Vai passar...

Nesse momento eu me apego as pessoas que conheço, à música e aos sábios. Assim, agora, depois que o desconhecido se revela, só consigo pensar, que Vai passar…

Ex-presidente Lula, durante ato pela democracia com intelectuais e artistas.Foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula (Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula)
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Há alguns dias Chico fez 75 anos. Ainda me lembro do artigo da Danuza ao comemorar os 70 anos de Chico escrevendo “qualquer mulher troca dois de 35 por um Chico de 70”. Isso ainda vale, que Carol o diga! Conheci Chico Buarque no começo da década de 70, eles faziam shows pelo país, veiculando música e voz naquele tempos de ditadura. Eu era uma menina, vivendo numa cidade pequena, que tinha uma base militar...Eu me lembro que os dias tinham ficado silenciosos, ao passar dos anos, as pessoas não paravam nas ruas para conversar, as festas eram dentro de Clubes e até a esperada Festa da Padroeira da cidade ficou comprometida, certa vez... imagine o que era isso para uma cidade pequena! 

Chico e sua trupe se hospedaram por alguns dias na cidade, chegaram no dia anterior a tarde, visitaram o teatro aonde seria o show, foi um frenesi na moçada, todos correndo `a praça principal aonde se localizavam cinema, clube e leiteria, para saber se “ele” já estava lá. Será que ele vem, mesmo?! Vão deixar ele cantar? … No dia seguinte ao show, Chico foi ao Clube jogar uma pelada com sua trupe e a gente local. Tão menina tive o prazer de ver bem de perto aqueles lindos olhos verdes[1]!  

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O show foi estupendo! No final do espetáculo Chico perfilou a trupe no palco, voltados para nós, todos com braços cruzados nas costas, deu um passo a frente, solenemente, discursou : “Ainda nos falta uma música em nosso programa, mas, infelizmente, fomos impedidos de cantá-la. No entanto, ninguém impede o povo de cantar”. Retornou ao lado dos seus colegas músicos, ao mesmo tempo em que a plateia do teatro se punha em pé e iniciava o canto “Apesar de você, amanhã há de ser outro dia...”. Era governo Médici. Na primeira fileira, sentado sério e hirto estava o coronel responsável por acompanhar aquele show. Sim, o exército acompanhava todos os eventos e ações culturais para controlar a subversão, segundo diziam.  

Foi um momento libertador. Podiam prender Chico se ele insistisse em cantar, mas como iriam prender as 500 pessoas que lotavam o teatro do cinema??! Desde então, acompanhei a vida e obra do Chico, nossas lutas de povo e as suas lutas pessoais... me entristeci quando ele deixou de fazer shows, o trauma por conta do atentado no Rio Centro, chorei quando ele e Marieta se separaram, vibrei quando ele voltou a cena e lá estava eu, mais uma vez, e penso que ele e Carol formam uma dupla e tanto.  

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A gente pode dizer que conhece o Chico, suas convicções e contradições.  

Com Lula foi semelhante. A primeira vez que o vi foi num comício na Cinelândia, no Rio de Janeiro, pelas diretas. Foi o dia em que ouvi, também, Sobral Pinto. Aplaudia tão entusiasmada esse operário contando sobre os direitos do trabalhador, que as pessoas a volta perguntaram se eu já o conhecia “Não, mas conheço suas ideias!” Morava lá, no Rio, fazendo o mestrado, era o início dos anos 80. A gente ficava sabendo das novidades pelas pessoas, os anúncios impressos em mimeógrafo e entregues em mãos nas ruas ou colados nos postes e por alguns poucos folhetins e jornais, três ou quatro. Não havia internet, celular, redes sociais. Tudo passava pela censura mas o folego dos militares estava no fim e a resistência aumentava paulatinamente, configurada pela reocupação dos espaços públicos e manifestação política nesses espaços.  

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Acompanhei todos os atos pelas diretas no Rio, e chorei quando cheguei em casa depois do evento da Candelária, em que as 6 pistas e calçadas da Presidente Vargas estavam lotadas de gente, da Igreja até o viaduto quase chegando nos Correios. Alguns conhecidos contavam que o jogo estava marcado, que as diretas não viriam, não adiantava lutar por isso… As diretas não vieram. Mas, a mobilização política nos levou a eleger uma constituinte progressista e moderna o suficiente para estabelecer o início de um regime democrático no país pautado pela criação do Estado de Bem-estar social. Incrível, não?  

Encontrei Lula muitas vezes, na década de 90. Lula anda pelo país há muito tempo, e nos visitava com frequência na universidade. Eu o encontrei várias vezes na ADUSP, sentado na mesa de reuniões, perguntando e se informando sobre a estrutura acadêmica, física e financeira da universidade, a vida pessoal, profissional e laboral dos docentes. Ele queria saber tudo de tudo, curioso, perguntava sem parar. Em outras vezes, eu o encontrei com estudantes, pelo campus, no vão da FFLCH, numa conversa simples, sobre como era a vida deles, os problemas, as dificuldades, os sonhos. Minha mãe, professora da escola fundamental no estado, tem também muitas histórias dessas conversas nos sindicatos, assembleias, escolas. 

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A eleição de Lula no final de 2002 foi um momento libertador. Um grupo suficientemente grande de brasileiros, vencia o preconceito e decidia que um trabalhador saberia realizar seus sonhos e ideais. E assim foi. O país cresceu economicamente, tomou posse de sua soberania, enfrentou a miséria e a pobreza, e foram atendidas todas as pautas da educação, repito todas as pautas da educação. Lula nos ouviu, a cada um de nós, professores e estudantes e pôs em prática tudo o que pedimos.  

Deixado o governo, continuei a acompanhar Lula. Chorei quando dona Marisa morreu, me indignei com sua prisão, lhe enviei cartas, me senti amparada com a manifestação de Francisco, o papa, e vibrei muito com a denuncia jornalística de tudo que sabíamos ser verdade mas não tínhamos como comprovar [2]. Mesmo quem não conversou com Lula, sentada a mesa para um cafezinho ou na arquibancada da assembleia, na hora do lanche, acompanha a vida de Lula e conhece alguém que já conversou com ele.  

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A gente conhece Lula, suas convicções e contradições.  

No passado nos empenhamos na luta contra o autorismo e a supressão dos direitos civis. Hoje, somos aviltados cotidianamente numa luta indigna contra a mediocridade, a mentira e a vilania representadas, mais expressivamente, por duas figuras desconhecidas.  

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A primeira figura desconhecida, A gente pode dizer que conhece pouco suas convicções e contradições. Esse aí declarou, que se dedicaria a destruição de tudo, ou seja, a destruição de nossos sonhos concretizados em políticas públicas idealizadas, elaboradas e postas em prática por uma massa enorme de educadores e estudantes de várias gerações. Essa primeira figura desconhecida, eu acuso, cometeu furto de confiança contra seus eleitores, que entregaram a ele, seus sonhos, seus projetos, suas esperanças. Ele fez tudo isso virar fumaça densa na bruma rala que o governante anterior causou.  

A segunda figura desconhecida, chegou do nada. Ninguém sabia quem era, nunca visto. A gente podia dizer que não conhecia suas convicções e contradições. Tinha gente que pensava conhecer suas convicções. Agora, toda a gente já sabe quais são suas contradições. Quem não sabe, basta interceptar.  

E no fim do dia, cá com meus botões me pergunto que será do povo brasileiro, diante desses seres estranhos, essas figuras desconhecidas, que teimam em dirigir o país para um caminho que não queremos trilhar? Numa direção em que só há fogo e escombros? Numa destruição que parece sem retorno??!  

Nesse momento eu me apego as pessoas que conheço, à música e aos sábios. Assim, agora, depois que o desconhecido se revela, só consigo pensar, que Vai passar… a ala dos barões famintos, o bloco dos napoleões retintos, os pigmeus de bulevar e até o estandarte do sanatório geral.  

E termino com as sábias palavras de Paulo Freire, revividas há pouco, por educadores “ Enquanto eu luto, sou movido pela esperança; e se eu lutar com esperança, posso esperar” [3] .  

Referências:

[1] http://chicobuarque.com.br/critica/crit_cidade_overdes.htm

[2] https://www.brasil247.com/brasil/delacao-fabricada-de-leo-pinheiro-foi-o-unico-argumento-usado-para-condenar-lula 

[3] https://www.brasil247.com/brasil/trabalhadores-na-educacao-farao-greve-nacional-em-13-de-agosto

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