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Brasil

Pesquisador sobre direita conservadora não vê motivo para pânico em alta de popularidade de Bolsonaro

Para Jorge Chaloub, professor da UFJF, há muito por acontecer até que Bolsonaro possa dizer que é senhor da região Nordeste, de onde, agora, (depois de chamá-los de “paraíbas”), não tira o pé

(Foto: Reuters | Divulgação)
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Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia 

No melhor estilo “populista” – embora neste conceito caibam muito mais ideias do que a simplificação feita aqui -, Bolsonaro confiscou em público o projeto “big bang” do ministro Paulo Guedes. O que estava para ser anunciado como um estrondo foi reduzido a um “traque”, daqueles que o autor sai de fininho, antes que o resultado seja catastrófico. Ainda assim, o governo não conseguiu conter os efeitos colaterais. A bolsa despencou, o dólar subiu e o “mercado” ficou nervoso, antevendo o que certamente virá. Uma investida em verbas a qualquer custo e, receiam eles, a quebra do teto de gastos.

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Bolsonaro que sempre discursou contra a reeleição, não quer nem ouvir falar na possibilidade de não ser reconduzido ao cargo. Cheio de si, com um pequeno aumento de popularidade, não hesitou em reduzir publicamente o seu “Posto Ipiranga”, a “Poste Ipiranga”, transformando o que antes era chamado de super ministro, num pau mandado. Guedes recebeu a incumbência de melhorar o teor do programa “Renda Brasil”, um arremedo de Bolsa Família. Ao contrário do programa do PT, que além da ajuda financeira era porta de entrada para atendimentos nas políticas sociais, o de Guedes surrupia direitos adquiridos na luta, pelos trabalhadores, como o abono salarial.

Enquanto isto, a direita adestrada – leia-se FHC – procura “amiguinhos” para com ele descer para o playground e formar uma “frente amarela” contra Bolsonaro, desde que a pauta seja dele, óbvio. Nem a frente sai, nem tampouco Bolsonaro consegue organizar a zona que está o seu governo. Com debandadas, brigas e os militares quietos, assoviando e olhando para o alto, para não perderem os carguinhos, a ópera bufa segue, no Planalto. E, ainda assim, pesquisas apontam um verdadeiro fenômeno. Bolsonaro adquire mais uns pontinhos na aceitação popular, mesmo com quase 120 mil mortes no currículo. Para o professor de Ciências Políticas, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Jorge Chaloub, pesquisador da direita conservadora e entrevistado pelo 247, ainda é cedo para pânico. Há muito por acontecer até que Bolsonaro possa dizer que é senhor da região Nordeste, de onde, agora, (depois de chamá-los de “paraíbas”), não tira o pé.

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– 247 – O que contribui, neste momento, para esta elevação na aceitação a Bolsonaro?

– Jorge Chaloub – Esse crescimento apareceu na pesquisa Datafolha, mas nem sei se dá para colocar isto assim… Observando a pesquisa, eu acho que sem dúvida isto passa pelo auxílio emergencial sugerido pela oposição e implementado por Bolsonaro. Mas é necessário observar isto de maneira mais complexa e ampla. O Bolsonaro já tem uma série de outros apoios do universo pentecostal, militar e do empresariado, que são bases importantes da sua popularidade. E mesmo quando você olha os dados da pesquisa Datafolha com calma, a verdade é que o aumento em relação a quem recebe os 600,00 é um aumento que existe, mas não é, digamos, completamente desproporcional.

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– JC – O fato dele ter reduzido durante um tempo a fala mais agressiva resultou em que pessoas, antes com resistência a ele por esta agressividade –, e temos pesquisas na Ciência Política que diz que falas muito agressivas geram resistência numa parte da população –, acharam que ele tinha melhorado e passaram a avaliar melhor o governo. Só que tem dados na pesquisa Datafolha, preocupantes para ele. Parte significativa da população (41%), diz não confiar no Bolsonaro. Apenas 36% dizem que confiam. Esse dado é importante porque momentos como o da pandemia, costumam gerar um aumento de popularidade. É hora de você conseguir a unidade nacional. Na Itália, mesmo com aquele início, o primeiro-ministro teve aumento de popularidade. O Bolsonaro tinha a chance de aumentar essa popularidade e não concretizou isto. Momento de crise são propícios para os governantes gerarem união nacional. Para começar, a pesquisa formula mal a pergunta em relação à pandemia.

– 247 – Qual a falha na pergunta?

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– Quando você pergunta se a “culpa” é do Bolsonaro, sobretudo para quem não é um opositor renhido dele, gera estranheza, porque a pandemia existe. E ele é culpado pela maneira como lidou com a pandemia, mas não pela pandemia. A pergunta da pesquisa leva a pessoa avaliar se ele é culpado pela pandemia e aí vão ter aqueles que vão dizer que a culpa é dos chineses, sei lá de quem mais…

–  247 – Mas você acha que há uma intenção, nisto?

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– JC – Eu não diria isto, porque a relação do Bolsonaro com a Folha é, digamos, ambígua. Eles apoiam a pauta econômica, mas têm uma crítica forte ao comportamento dele. Estão, como é bem ambígua esta relação, eu nem diria que foi proposital, mas me parece que esta coisa da culpa, não é que invalida, mas nos obriga a botar uma dúvida na pesquisa. Para uma pessoa que não é muito politizada, se você pergunta: a culpa da pandemia é do Bolsonaro? A pessoa pode responder: olha, a pandemia existe, na Itália morreram não sei quantas mil pessoas. E o Bolsonaro não governa lá. A pergunta mais adequada, para mim, seria: ele lidou bem com a pandemia? Ele poderia ter reduzido o número de mortes? Talvez o resultado fosse diferente.

– 247- É. Poderia ser: ele tomou providências responsáveis, com relação à pandemia?

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– JC – Então acho que tem que ponderar muito isto. Agora, apoio ao governo Bolsonaro… Na verdade tem muitos elementos a serem considerados também. O Bolsonaro não é um presidente em segundo ano de mandato. Atualmente ele tem a segunda pior avaliação da história. Só o (Fernando) Collor tinha uma avaliação pior que a dele. Enfim, as pessoas têm uma ideia de que ele representa uma alternância de poder. Então, também não é simples você chegar e dizer que tem que tirá-lo de qualquer maneira. Tem uma série de questões aí que sugerem cautela ao ler esta pesquisa. O ponto fundamental é só levar em conta que, sim, inegavelmente os R$ 600,00 vão beneficiar a popularidade dele. Agora, não dá para dizer que são só os R$ 600,00.

– 247 – E quais os outros aspectos que poderiam ter contribuído para esse aumento?

– JC – Sem dúvida o Bolsonaro tem uma base de apoio que passa por um conservadorismo moral que ele representa por ideias de família, de ordem. Muita gente apoia o Bolsonaro por um discurso de Segurança Pública… Ele tem um apoio das forças de segurança, de modo geral, muito significativo… E tem um amplo apoio dentro das igrejas pentecostais. Sem contar o apoio entre os conservadores da Igreja Católica… Enfim, ele tem uma estrutura aí que não abandonou o bolsonarismo.

– 247 – Esta estrutura é bastante fiel, não parece? Esta que forma os 30%?

– JC – Olha eu nem sei se são 30% mesmo. Eu acho que tem variações aí, mas eu acho que é uma estrutura que não se resume agora ao Nordeste e aos R$ 600,00. Ora, ele melhorou agora, quando apareceu na pesquisa Datafolha. Este é o primeiro ponto. O segundo ponto é que, sim, a parcela dos R$ 600,00 aprova ele mais que a média, mas também não é aquela coisa de dizer: este é um movimento que justifica tudo. Eu acho que o Bolsonaro continua tendo bases fortes, mas não houve uma mudança significativa.

– 247- O Sul continua firme, dando apoio…

– É, o Sul. E ali a base dele é bastante diversa, também. Não existe um perfil único de eleitor bolsonarista.

– 247- No segmento jovem, pela pesquisa, ele não tem o índice de rejeição que a gente esperava. Qual a visão que você tem disto?

– JC – Inegavelmente você teve uma ampliação dos discursos de direita nesta parcela jovem. A juventude também é uma parcela bastante heterogênea. Você tem o jovem que é pentecostal, por exemplo, e você tem o que não vai justificar pelo aspecto religioso. Existem grupos de jovens onde este discurso tem penetração. Eles têm aquela ideia de que é preciso surgir um partido novo, e por aí vai. Este eleitorado existe e vai se vincular ao Bolsonaro. A gente tem aquela ideia de que a juventude é um terreno propício para a esquerda, nesse mundo de ampliação pelas redes sociais. Ela não é mais, mas eu também não sei se no momento anterior a gente poderia falar isto também com tanta certeza.

– 247 – Eu vi o vídeo de um jovem, visivelmente da classe média alta, dizendo que o PT não detém a hegemonia do discurso político e não dá espaço para que haja o contraditório, por isto ele fecha com o Bolsonaro. Como você vê esse discurso? É este o eleitor jovem do Bolsonaro?

– JC – Eu acho que este discurso ante sistema, a ideia de que a esquerda é hegemônica, é um discurso forte, presente, e é uma das forças do Bolsonarismo. É um discurso presente na juventude. Como tem também o jovem de periferia alinhado com o discurso dele. Esse jovem também vai falar em liberalismo, em capitalismo, pregando o fim do estado, ou a sua redução máxima. Este segmento existe e eu acho que, em certa medida, pelo fato de o PT no poder ter sido uma longa experiência, isto permitiu que se construísse o discurso de que o PT e o poder são o sistema.

– 247 – Você acha então que eles consideram que votar contra o sistema é votar contra a esquerda?

– JC – A ideia de que a esquerda é o sistema, tirando o período da ditadura, vem desde o segundo governo Fernando Henrique. E, depois, quem passou mais tempo governando o país foi o PT. Então este discurso contra o sistema vai abrir uma brecha para que essa juventude que viu o PT governar, se identifique com esse discurso, muito bem armado do ponto de vista da divulgação política, quer seja pelas redes sociais, ou com a prevalência em certa mídia. Os colunistas incutem nesta juventude que votar no PT ou em um partido de esquerda é ser de direita. No período da ditadura, ou até o fim do governo Fernando Henrique, ser de esquerda era ser de oposição. Parte da direita soube vender esse discurso que tem penetração na juventude, de que você tem que tirar o PT, porque o PT é tudo o que está aí, e é preciso mudar.

– 247 – Olhando pelo lado da esquerda, como atrair essa juventude com um discurso eficiente, que conquiste a base jovem e a parcela de centro-direita?

– JC – Esta é a pergunta que vale um milhão. Não dá para pensar que só eleitoralmente dá para fazer isto. Você precisa ter um movimento de renovação de liderança, de movimentação de base, e por aí vai. Num curto prazo, eu vejo a esquerda com uma resistência forte por parte da sociedade. Porém, isto não é estável. Tem espaço para fazer política e tentar modificar isto. Eu não acho que isto vai se dar num curto prazo, também não acho que o poder desgastou a esquerda. Algumas dessas trajetórias vão se desgastar com o tempo e enfrentarão problemas. Só torço para que tenha eleição até lá.

– 247 – O Fernando Haddad, ex-candidato à presidência da República, pelo PT, disse em uma entrevista recente, ao 247, que os nossos teóricos envelheceram e que é preciso haver uma renovação nos discursos. Você concorda com isto?

– JC – Não sei. Eu acho que o que tem nos faltado não é, necessariamente, jovens intelectuais. Existe um certo fetiche da fórmula alquímica, mágica, do discurso. Não acho que é assim que funciona. Não acredito que seja o envelhecimento dos teóricos. Eu acho que houve uma certa burocratização da esquerda que se distanciou da sua base. Isto de fato existe. Houve uma certa acomodação no poder. Mas também é difícil você resistir, com tantas estruturas que operam contra. Não sei se a questão é só intelectual. Acho que passa por organização política, por um lado, e por outro tem também o tempo no mundo. Este mundo tem tendido mais para a direita. Enfim, os movimentos passam muito por aí. Não sei se é uma questão de ausência de repertório.

– 247 – Dá para analisar a mistura: pandemia, Bolsonaro, mais isolamento social? Qual foi o resultado disto?

– JC – É precipitado cravar o resultado disso. Acho que ainda é cedo para saber, porque a pandemia ainda está em curso. Ainda temos aí a perda de cerca de mil pessoas por dia e os que estão próximos delas tendem a ser afetados, certamente. Mas o esperado é que o modo como Bolsonaro lidou com a pandemia, que o custo disto para ele gerasse maior desgaste do que até agora gerou.

– 247 – Esse quadro gerou um imobilismo, necessariamente na esquerda…

– JC – Sim. Isto impediu que a esquerda, que acredita na ciência, que cumpre o isolamento, se movimentasse. Impediu movimentos importantes, como a ocupação das ruas, do mesmo modo que você teria se não existisse a pandemia.

– 247 – A esquerda não poderia ter tomado a iniciativa de, através das suas lideranças nas comunidades, ter se aproximado mais das suas bases durante a pandemia?

– JC – Convém tomar cuidado com isto, porque poderia soar oportunista. A verdade é que parte desta liderança das comunidades teria problema se a esquerda reivindicasse falar no lugar dela para fazer esta articulação. A gente pode diagnosticar que falta base, mas não sei se nós deveríamos pensar que fossem os partidos a organizar os trabalhos de auxílios nas comunidades. Até porque as lideranças nas comunidades são bastante fortes. O que a gente poderia questionar seria: os partidos deveriam ter sido mais presentes? Mais proativos? Mas que não é simples esta articulação, com certeza não é. Não é uma questão só de vontade. É mais complicado.

– 247 – Da mesma maneira que não é simples o Bolsonaro se deslocar para o Nordeste e achar que conquistou a região. Como você vê isto?

– Não é simples. Não é achar que dando os R$ 600,00, ou botando um chapéu de cangaceiro tudo estaria pronto. Não é pensar que as pessoas têm vínculos políticos estáticos, mas também achar que uma simples liberação de verbas já tomou o Nordeste… Temos que ter calma. Tem muita coisa para acontecer, ainda. Não dá para simplificar assim não. É evidente que um dinheiro como este modifica a maneira de pensar, mas não dá para cravar que chegou o dinheiro, mudou.

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