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Sergey Karaganov: a doutrina Putin e a nova política de relações exteriores da Rússia

"O confronto de Moscou com a OTAN é só o começo", explica um dos principais conselheiros de política externa do Kremlin

Lavrov e Putin (Foto: REUTERS)
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Por Sergey Karaganov *, presidente honorário do Conselho Russo de Política de Relações Exteriores e Defesa, supervisor acadêmico da Escola de Economia Internacional e Relações Exteriores da Escola Superior de Economia (HSE) em Moscou (tradução de Rubens Turkienicz) – Parece que a Rússia entrou numa nova era da sua política de relações exteriores – podemos chamá-la de uma “destruição construtiva” do modelo prévio de relações com o Ocidente. Partes desta nova maneira de pensar foram vistas ao longo dos últimos 15 anos – começando com o famoso discurso de Vladimir Putin em Munique, em 2007 – porém muito disso só agora está tornando-se claro. Ao mesmo tempo, esforços imprecisos para integrar-se no sistema ocidental ao mesmo tempo que mantêm uma atitude obstinadamente defensiva, permanecem sendo a tendência geral na política e na retórica russa.

A destruição construtiva não é agressiva. A Rússia alega que não irá atacar nem explodir ninguém. Ela simplesmente não precisa fazê-lo. O mundo exterior provê cada vez mais à Rússia as oportunidades geopolíticas para o seu desenvolvimento a médio-prazo assim como é. Com uma grande exceção: a expansão da OTAN e a inclusão formal ou informal da Ucrânia nesta representa um risco à segurança do país que Moscou simplesmente não aceitará.

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Por ora, o Ocidente está a caminho de uma decadência lenta, porém inevitável, tanto em termos internos quanto de relações exteriores, e até econômicas. E essa é precisamente a razão pela qual o Ocidente começou esta nova Guerra Fria após quase quinhentos anos de dominação na política mundial, na economia e na cultura. Principalmente após a sua vitória decisiva dos anos de 1990 até meados dos anos de 2000. Eu creio [1] que o mais provável é que o Ocidente perca e deixe de ser o líder global, tornando-se um parceiro mais razoável. E, antes que seja tarde: a Rússia precisará equilibrar as suas relações com uma China amigável, porém mais poderosa.

Atualmente, o Ocidente tenta desesperadamente defender-se disso com uma retórica agressiva; trata de consolidar-se, usando os seus últimos trunfos para reverter esta tendência. Um destes trunfos é tentar usar a Ucrânia para causar danos ou neutralizar a Rússia. É importante evitar que estas tentativas convulsivas de transformar o conflito na Ucrânia num impasse total, e de contrapor-se às atuais políticas dos EUA e da OTAN – estas são contraprodutivas e perigosas, porém são relativamente pouco exigentes para os seus iniciadores. Ainda deveremos convencer o Ocidente que isto apenas causa danos a eles próprios.

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Outro trunfo é que o papel dominante do Ocidente no atual sistema Euro-Atlântico de segurança foi estabelecido numa época na qual a Rússia encontrava-se seriamente enfraquecida após a Guerra Fria. Há méritos em desmanchar este sistema, basicamente ao recusar em tomar parte e jogar segundo as suas regras obsoletas – as quais são inerentemente desvantajosas para nós. Para a Rússia, o caminho ocidental deve tornar-se secundário à sua diplomacia Eurasiana. Manter relações construtivas com os países da parte ocidental do continente pode facilitar a integração da Rússia na Grande Eurásia. No entanto, o antigo sistema obstrui o caminho e, portanto, deve ser desmantelado.

O próximo passo crítico para a criação de um novo sistema (além de desmantelar o antigo) é 'unificar o território'. Isto faz-se necessário para Moscou, isto não é um capricho.

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Seria bom se tivéssemos mais tempo para fazer isso. Mas a História mostra que, desde o colapso da URSS há 30 anos, poucas nações pós-soviéticas conseguiram tornar-se realmente independentes. E algumas delas provavelmente nunca chegarão a isso, por várias razões. Este é um tema para análises futuras. Neste momento, só posso assinalar o óbvio: a maioria das elites locais não tem a experiência histórica, nem cultural, da construção de um estado. Estas nunca foram capazes de tornar-se o cerne da nação – jamais tiveram tempo suficiente para fazê-lo. Quando o espaço intelectual e cultural compartilhado (na URSS) desapareceu, isso afetou mais os pequenos países. As novas oportunidades para construir laços com o Ocidente revelaram-se não ser substitutos. Aqueles que se encontraram no comando de tais nações venderam os seus países para benefício deles próprios, porque não existe uma ideia nacional pela qual lutar.

A maioria destes países seguirão o exemplo dos estados bálticos, aceitando controles externos, ou continuarão a mover-se descontroladamente em espirais descendentes – o quê, em alguns casos, pode ser extremamente perigoso.

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A questão é: como 'unificar' as nações de maneiras mais eficientes e benéficas para a Rússia, considerando as experiências czaristas e soviéticas – quando a esfera de influência foi estendida além de quaisquer limites razoáveis e, depois, mantidas unidas por conta dos povos russos?

Deixemos para outro dia a discussão sobre a 'unificação' que a História nos força a fazer. Desta vez, focalizamos na necessidade objetiva de tomar uma decisão difícil e de adotar uma política de 'destruição construtiva'.

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Os marcos que ultrapassamos

Atualmente, vemos o início da quarta era da política de relações exteriores da Rússia. A primeira começou no final dos anos 1980 e foi uma época de fraquezas e delusões. A nação havia perdido a vontade de lutar, as pessoas queriam acreditar na democracia e que o Ocidente viria salvá-los [2]. Isso tudo terminou em 1999, após as primeiras ondas de expansão da OTAN – vistas pela Rússia como uma punhalada nas costas – quando o Ocidente desmantelou o que restava da Iugoslávia. A Rússia começou, então, a levantar-se dos seus joelhos e a reconstruir-se, ao mesmo tempo que aparentava ser amigável e humilde. Ao renunciar ao Tratado de ABM (controle de armas nucleares), os EUA assinalaram a sua intenção de retomar a sua dominação estratégica – de modo que a ainda alquebrada Rússia tomou uma decisão fatídica de desenvolver sistemas de armas para desafiar as aspirações estadunidenses. O discurso de Munique, a guerra da Geórgia e a reforma do exército foram conduzidas no meio de uma crise econômica global que prenunciava o fim do imperialismo globalista liberal do Ocidente (um termo cunhado por Richard Sakwa, um proeminente especialista em relações internacionais) que assinalou uma nova meta para as relações exteriores da Rússia para tornar-se novamente uma líder do poder global que pode defender a sua soberania e os seus interesses. Isto foi seguido pelos eventos na Criméia, na Síria, o crescimento militar e o bloqueio da interferência ocidental nos assuntos internos da Rússia – exterminando do serviço público aqueles funcionários que faziam parcerias com o Ocidente às expensas da sua pátria, incluindo o uso magistral da reação ocidental a estes desenvolvimentos. À medida que as tensões continuavam a aumentar, mirando o Ocidente e se mantendo lá ativos, torna-se cada vez mais menos lucrativo.

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A incrível ascensão da China e tornando-se aliados de-facto com Beijing começando nos anos de 2010, a virada para o Oriente e a crise multidimensional que envolveu o Ocidente, levaram à uma grande mudança no equilíbrio político e geoeconômico que favoreceu a Rússia. Isto foi especialmente marcado na Europa. Há apenas uma década, a União Europeia (UE) via a Rússia como sendo o subúrbio atrasado e fraco do continente, tentando competir com as grandes potências. Agora, a UE tenta desesperadamente agarrar-se à independência geopolítica e geoeconômica que está escapando entre os seus dedos.

O período de 'retorno à grandeza' terminou entre 2017 e 2018. Depois disso, a Rússia atingiu um platô. As pessoas (eu incluso) estavam frustradas, temendo que a Rússia iria mais uma vez “arrebatar uma derrota da boca da vitória”. Mas isto revelou-se ser outro período de construção, principalmente em termos de capacidade de defesa.

A Rússia avançou, assegurando-se que, para a nova década, ela ficará relativamente invulnerável estrategicamente e capaz de “dominar num cenário de escalada” no caso de conflitos nas regiões dentro da sua esfera de interesses.

O ultimato que a Rússia deu aos EUA e à OTAN no final de 2021, exigindo que estes parassem de desenvolver infraestruturas militares nas cercanias das fronteiras russas e de expandir-se para o leste, marcaram o início da 'destruição construtiva'. A meta não é simplesmente de parar com a sinalização – apesar da inércia realmente perigosa do avanço geoestratégico do Ocidente – mas também de começar a estabelecer o alicerce para um novo tipo de relações entre e Rússia e o Ocidente, diferente daquilo que aceitamos nos anos de 1990.

A capacidade militar russa, o retorno do senso de correção moral, as lições aprendidas dos erros passados, e a aliança próxima com a China poderiam significar que o Ocidente – que escolheu o papel de adversário – começará a ser razoável, mesmo que não seja o tempo todo. Depois, em uma década ou menos, desta vez será construído um novo sistema de segurança e cooperação internacional que incluirá a Eurásia Maior que basear-se-á nos princípios da ONU e da lei internacional – e não das 'regras' unilaterais que o Ocidente tem tentado impor ao mundo nas décadas recentes.

Corrigindo erros

Antes de ir adiante, permitam-me dizer que eu tenho a diplomacia russa em alta estima – esta tem sido absolutamente brilhante nos últimos 25 anos. Moscou foi subestimada, porém mesmo assim conseguiu desempenhar bem seu papel. Primeiro, não deixou que o Ocidente 'acabasse com ela'. A Rússia manteve o seu status formal de um grande país, retendo a sua condição de membro permanente do Conselho de Segurança da ONU e mantendo os seus arsenais nucleares. Depois, ela gradualmente melhorou o seu status global ao aproveitar-se das fraquezas dos seus rivais e as forças dos seus parceiros. Construir uma forte amizade com a China foi uma conquista maior. A Rússia tem algumas vantagens geopolíticas que a União Soviética não tinha. A não ser, obviamente, que ela retorne às aspirações de tornar-se uma superpotência global – o que acabou arruinando a URSS.

No entanto, não devemos esquecer-nos dos erros que cometemos, de modo que não os repitamos. Foram a nossa preguiça, fraqueza e inércia burocrática que ajudaram a criar e manter flutuando o sistema injusto e instável da segurança europeia que temos atualmente.

A muito belissimamente bem escrita Carta de Paris por uma Nova Europa, que foi assinada em 1990, tem uma declaração sobre liberdade de associação – diz que os países podem escolher os seus aliados, algo que teria sido impossível sob a Declaração de Helsinki de 1975. Desde quando o Pacto de Varsóvia estava no final do seu tanque de combustível naquele ponto, aquela cláusula significava que a OTAN ficaria livre para expandir-se. Este é o documento ao qual todos se referem, mesmo na Rússia. No entanto, em 1990, a OTAN poderia pelo menos ser considerada como uma organização de “defesa”. Desde então, a aliança e a maioria dos seus membros lançaram uma quantidade de campanhas militares agressivas – contra o que restou da Iugoslávia, bem como no Irã e na Líbia. Após uma conversa de coração-a-coração com Lech Walesa em 1993, Boris Yeltsin assinou um documento que declarava que a Rússia “compreendia o plano da Polônia de juntar-se à OTAN”. Quando Andrey Kozyrev, ministro das relações exteriores da Rússia naquele tempo, soube sobre a expansão da OTAN em 1994, ele começou um processo de barganha em nome da Rússia sem consultar o presidente. O outro lado entendeu isso como um sinal de que a Rússia concordava com o conceito geral, já que estava negociando-o em termos aceitáveis. Em 1995, Moscou pisou no freio, mas já era tarde demais – a represa explodiu e carregou com ela quaisquer restrições sobre os esforços de expansão do Ocidente.

Estando economicamente enfraquecida e completamente dependente do Ocidente, em 1997, a Rússia assinou com a OTAN o Ato Fundador sobre Relações Mútuas, Cooperação e Segurança (Founding Act on Mutual Relations, Cooperation and Security). Moscou conseguiu fazer passar algumas concessões do Ocidente – como a promessa de não posicionar grandes unidades militares nos novos estados-membros. A OTAN tem violado consistentemente esta obrigação. Outro acordo era o de manter estes territórios livres de armas nucleares. De qualquer maneira, os EUA não querem isso, porque estavam tentando quanto mais possível distanciar-se de um potencial conflito nuclear na Europa (apesar dos desejos dos seus aliados), já que isso indubitavelmente causaria um ataque nuclear contra os EUA. Na verdade, o documento legitimou a expansão da OTAN.

Houve outros erros – não tão grandes, porém, de qualquer maneira, extremamente dolorosos. A Rússia participou no programa de Parceria pela Paz – cujo único propósito era o de fazer parecer que a OTAN estava preparada para escutar Moscou; porém, na verdade, a aliança estava usando o projeto para justificar a sua existência e levar adiante a expansão. Outro frustrante passo em falso foi o envolvimento do Conselho OTAN-Rússia após a agressão à Iugoslávia. Faltava desesperadamente qualquer substância aos tópicos discutidos naquele nível – estes deveriam centrar-se na questão realmente significativa: restringir a expansão da aliança e a montagem da sua infraestrutura militar perto das fronteiras russas. Tristemente, estas questões jamais foram incluídas na pauta. O Conselho continuou a operar mesmo depois que a maioria dos membros da OTAN iniciaram a guerra no Iraque e, depois, na Líbia, em 2011.

É um infortúnio que nós jamais tivemos a coragem de dizer abertamente que a OTAN se havia tornado um agressor que cometeu numerosos crimes de guerra. Isto teria sido uma verdade óbvia para vários círculos políticos europeus – como na Finlândia e na Suécia, por exemplo, onde alguns estão considerando as vantagens de entrar na OTAN. E todos os outros, neste sentido, com o seu mantra de que a OTAN seja uma aliança de defesa e dissuasão que precisa ser consolidada mais ainda, de modo a poder contrapor-se a inimigos imaginários.

Eu entendo que aqueles, no Ocidente, que estão acostumados ao sistema existente que permite aos EUA comprar a obediência dos seus sócios menores – e não somente em termos de apoio militar – enquanto estes aliados conseguem economizar em despesas de segurança ao venderem parte das suas soberanias. Porém, o que ganhamos com este sistema? Principalmente agora, quando se torna óbvio que o mesmo gera e intensifica o confronto nas nossas fronteiras ocidentais e no mundo todo.

A OTAN alimenta-se de conflitos forçados e, quanto mais a organização siga existindo, tanto pior esta confrontação será.

O bloco também é uma ameaça aos seus próprios membros. Conquanto provoque confrontos, esta na realidade não garante proteção. Não é verdade que o Artigo 5 do Tratado do Atlântico Norte garanta proteção coletiva caso um aliado seja atacado. Este artigo não diz que isto seja garantido automaticamente. Tenho familiaridade com a história do bloco e as discussões nos EUA concernentes ao seu estabelecimento. Tenho como fato que os EUA jamais usaram armas atômicas para “proteger” os seus aliados caso haja conflitos com um estado nuclear.

A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE – Organization for Security and Cooperation in Europe) está desatualizada [obsoleta?]. Esta é dominada pela OTAN e a UE – as quais usam a organização para prolongar confrontos e impor os valores e padrões políticos do Ocidente sobre todos os outros. Afortunadamente, esta política está tornando-se cada vez menos eficaz. Em meados dos anos de 2010, tive a oportunidade de trabalhar com o Painel de Pessoas Eminentes da OSCE (que nome!) - o qual deveria elaborar um novo mandato para a organização. Se, antes disso, eu tivesse minhas dúvidas sobre a eficácia da OSCE, aquela experiência me convenceu que esta é uma instituição extremamente destrutiva. Esta é uma organização antiquada, com a missão de preservar coisas que são obsoletas. Nos anos de 1990, a mesma serviu como instrumento para sepultar quaisquer tentativas feitas pela Rússia de criar um sistema europeu comum de segurança; nos anos de 2000, o chamado Processo Corfu atolou a nova iniciativa de segurança da Rússia.

Praticamente todas as instituições da ONU foram espremidas para fora do continente – incluindo a Comissão Econômica para a Europa, o seu Conselho de Direitos Humanos e o Conselho de Segurança. Anteriormente, a OSCE era considerada como uma organização útil que promoveria o sistema e os princípios da ONU num subcontinente-chave. Isso não ocorreu.

Quanto à OTAN, fica muito claro o que devemos fazer. Precisamos enfraquecer [minar?] a legitimidade moral e política do bloco e recusar-nos a fazer qualquer parceria – já que a contra-produtividade desta é óbvia. Apenas os militares devem continuar a comunicar-se, porém como um canal auxiliar que suplementaria o diálogo com o Departamento de Defesa dos EUA e os ministérios de defesa das principais nações europeias. Ao final das contas, não é Bruxelas que toma as decisões estrategicamente importantes.

A mesma política poderia ser adotada no que tange à OSCE. Sim, existe uma diferença, porque, apesar de ser uma organização destrutiva, esta jamais iniciou quaisquer guerras, desestabilizações ou matanças. Portanto, precisamos manter a um mínimo o nosso envolvimento neste formato. Alguns dizem que este é o único contexto que permite que o ministro das relações exteriores da Rússia possa ver as suas contrapartes. Isso não é verdade. A ONU pode oferecer um contexto ainda melhor para isso. Em qualquer caso, as conversações bilaterais são muito mais eficazes, porque é mais fácil ao bloco sequestrar a agenda quando há uma multidão. Enviar observadores e mantenedores da paz através da ONU também faria muito mais sentido.

O formato limitado deste artigo não me permite aprofundar em políticas específicas sobre cada organização europeia – como o Conselho da Europa, por exemplo. Porém, eu devo definir o princípio geral da seguinte maneira – faremos parcerias onde vejamos benefícios para nós mesmos e, caso contrário, manteremos a nossa distância.

Trinta anos sob o atual sistema das instituições europeias provam que continuar com as mesmas seria prejudicial. A Rússia não se beneficia de maneira alguma da disposição europeia de gerar e expandir confrontações, nem de postular ameaças militares ao subcontinente e ao mundo inteiro. No passado, podíamos sonhar que a Europa nos ajudaria a reforçar a segurança, bem como a modernização política e econômica. Em lugar disso, eles estão debilitando a segurança; então, para quê criaríamos o sistema político disfuncional e deteriorado do Ocidente? Será que realmente precisamos destes novos valores que eles adotaram?

Teremos que limitar a expansão ao recusar-nos a cooperar com um sistema em erosão. Temos a esperança de que, ao tomarmos uma posição firme e deixarmos os nossos vizinhos de civilização do Ocidente aos seus próprios cuidados, na verdade os estamos ajudando. Obviamente, teremos que ser espertos em excluir-nos da equação e estarmos seguros de minimizar os danos colaterais que o sistema decadente inevitavelmente causará. Mas mantê-lo na sua forma atual é simplesmente perigoso.

Políticas para a Rússia do amanhã

À medida que a ordem global existente continue a esfarelar-se, parece que o caminho mais prudente para a Rússia seria o de manter-se fora desta o quanto possível – tomar abrigo dentro das paredes da sua 'fortaleza neo isolacionista' e tratar dos assuntos internos. Porém, desta vez, a História exige que ajamos. Muitas das minhas sugestões concernentes à abordagem de relações exteriores as quais chamei tentativamente de 'destruição construtiva' emergem naturalmente da análise apresentada acima.

Não há necessidade de interferir ou tentar influenciar a dinâmica interna do Ocidente, cujas elites estão suficientemente desesperadas para começar uma nova guerra fria contra a Rússia. Em lugar disso, o que deveríamos fazer é usar vários instrumentos de política de relações exteriores – incluindo os meios militares – para estabelecer certas linhas vermelhas. Neste ínterim, à medida que o sistema ocidental continua a seguir na direção da degradação moral, política e econômica, as potências não-ocidentais (tendo a Rússia como um player maior) inevitavelmente verão as suas posições geopolíticas, geoeconômicas e geoecológicas fortalecerem-se.

Previsivelmente, os nossos parceiros ocidentais tentaram conter as demandas russas por garantias de segurança e tentarão também tirar vantagens do processo diplomático corrente para estender a vida útil das suas instituições. Não há necessidade de desistir do diálogo em assuntos de comércio, política, cultura, educação e saúde sempre que sejam úteis. Porém também devemos usar o tempo disponível para aumentar a pressão militar-política, psicológica e até técnica-militar – não tanto sobre a Ucrânia, cujo povo foi transformado em carne de canhão para uma nova guerra fria -, mas no coletivo do ocidente, a fim de forçá-lo a mudar a sua mentalidade e recuar das políticas que têm perseguido nas muitas décadas passadas. Não há o que temer sobre o aumento do confronto: vimos as tensões crescerem até quando a Rússia estava tentando apaziguar o mundo ocidental. O que devemos fazer é preparar-nos para um retrocesso ainda mais forte da parte do ocidente; também, a Rússia deve ter a capacidade de oferecer ao mundo uma alternativa de longo-prazo – um novo quadro político baseado na paz e na cooperação.

O Ocidente pode tentar intimidar-nos com sanções devastadoras – porém nós também somos capazes de dissuadir o Ocidente com a nossa própria ameaça de uma resposta assimétrica que mutile as economias ocidentais e perturbe sociedades inteiras.

Naturalmente, faz-se necessário relembrar de tempos em tempos aos nossos parceiros que há uma alternativa mutuamente benéfica a tudo isso.

Caso a Rússia realize políticas assertivas razoáveis (também internamente), ela superará com sucesso (e pacificamente) a mais recente onda de hostilidade ocidental. Como escrevi antes, temos uma boa possibilidade de vencer esta guerra fria.

O que também inspira otimismo na Rússia é o nosso próprio sucesso passado: mais de uma vez, conseguimos domar as ambições imperiais de potências estrangeiras – para o nosso próprio bem e pelo bem da humanidade como um todo. A Rússia foi capaz de transformar aspirantes a impérios em vizinhos dóceis e relativamente inofensivos. A Suécia após a batalha de Poltava; a França após Borodino; a Alemanha após Stalingrado e Berlim.

Podemos encontrar um slogan para a nova política russa com relação ao ocidente num verso de 'Os Scyntianos' de Alexander Blok – um poema brilhante que parece especialmente relevante atualmente: “Venham juntar-se a nós! Abandonem a guerra e os alarmes de guerra, / Pegue a mão da paz e da amizade. / 

Enquanto ainda há tempo, Camaradas, baixem as suas armas! / Unamo-nos na verdadeira fraternidade!”.

Enquanto tentamos curar as nossas relações com o Ocidente (mesmo que isso exija algum remédio amargo), devemos lembrar-nos que, enquanto sejam culturalmente próximos a nós, o tempo do mundo ocidental está esgotando-se – a verdade é que já está esgotando-se há duas décadas. O Ocidente segue adiante em modo de controle de danos, buscando cooperação sempre que possível. As perspectivas e desafios do nosso presente e do nosso futuro estão no Leste e no Sul. Adotar uma linha mais dura com as nações ocidentais não deve distrair a Rússia de manter o seu pivô em direção ao Leste. E nós já vimos este pivô diminuir de velocidade nos 2-3 anos passados, principalmente no que concerne ao desenvolvimento dos territórios para além das montanhas Urais.

Não devemos permitir que a Ucrânia se torne uma ameaça à segurança para a Rússia. Dito isto, seria contraproducente gastar demasiados recursos administrativos e políticos (sem falar nos econômicos) sobre isso. A Rússia deve aprender a lidar ativamente com esta situação volátil e mantê-la dentro dos seus limites. A maior parte da Ucrânia foi neutralizada pela sua própria elite antinacional, corrompida pelo Ocidente e infectada com o patógeno do nacionalismo militante.

Seria muito mais eficaz investir no Leste, no desenvolvimento da Sibéria. Ao criar condições de trabalho e moradia favoráveis, atrairemos não apenas cidadãos russos, mas também pessoas de outras partes do antigo Império Russo, incluindo os ucranianos – estes últimos têm contribuído muito para o desenvolvimento da Sibéria.

Permitam-me reiterar um ponto dos meus outros artigos. Foi a incorporação da Sibéria sob o império de Ivan, o Terrível, que fez da Rússia uma grande potência – e não a ascensão da Ucrânia sob Aleksey Mikhaylovich, conhecido sob o apelido de 'o mais pacífico’. Já é tempo de pararmos de repetir que a afirmação insincera – e tão polonesa - de Zbigniew Brzezinski de que a Rússia não pode ser uma grande potência quando é sobrecarregada por uma Ucrânia cada vez mais pesada – uma entidade política criada por Lenin, a qual foi expandida para o oeste sob Stalin.

O caminho mais promissor para a Rússia está no desenvolvimento e fortalecimento dos laços com a China. Uma parceria com Beijing multiplicaria em muitas vezes o potencial de ambos os países. Caso o Ocidente siga com as suas políticas amargamente hostis, não será despropositado considerar uma aliança de defesa temporária com a China por cinco anos. Naturalmente, deve-se ter cuidado para não 'ficarmos tontos com o sucesso' no trajeto com a China, de modo a não retornarmos ao modelo medieval da China Império do Meio – a qual cresceu tornando seus vizinhos em vassalos. Devemos ajudar Beijing onde possamos evitar que ela sofra qualquer derrota, mesmo que momentânea, na nova guerra fria desencadeada pelo Ocidente. Tal derrota também nos enfraqueceria. Além disso, sabemos muito bem no que o Ocidente se transforma quando pensa que está vencendo. Foram necessárias algumas medidas severas para tratar a embriaguez dos EUA depois que este embriagou-se com o poder nos anos de 1990.

Fica claro que uma política orientada para o Leste não deve focalizar-se somente na China. Tanto o Leste quanto o Sul estão em ascensão na política, economia e cultura globais, o que se deve em parte pelo nosso debilitamento da superioridade militar do Ocidente – que é a fonte primária dos seus 500 anos de hegemonia.

Quando chegar o tempo para estabelecer um novo sistema europeu de segurança que substitua o perigosamente desatualizado sistema existente, isso deve ser feito dentro do quadro de um projeto para a Eurásia maior. Nada que valha a pena pode nascer do velho sistema euro-atlântico.

É auto-evidente que o sucesso requer o desenvolvimento e modernização do potencial econômico, tecnológico e científico do país – todos estes pilares de um poder militar do país, o qual segue sendo a espinha dorsal da soberania de segurança de qualquer país. A Rússia não pode ter sucesso sem melhorar a qualidade de vida para a maioria do seu povo; isso inclui a prosperidade abrangente, saúde, educação e o meio-ambiente.

A restrição das liberdades políticas, que é inevitável quando se confronta o Ocidente coletivo, de maneira alguma deve ser estendido à esfera intelectual. Isto é difícil, porém factível. Para a parte talentosa e de mentes criativas da população que está pronta a servir ao seu país, devemos preservar tanta liberdade intelectual quanto seja possível. O desenvolvimento científico feito através das 'sharashkas' em estilo soviético (laboratórios de pesquisa e desenvolvimento que operam dentro do sistema soviético de campos de trabalho) não é algo que funcionaria no mundo moderno. A liberdade engrandece os talentos do povo russo e a inventividade corre no nosso sangue. Mesmo nas relações exteriores, a liberdade das restrições ideológicas que desfrutamos nos oferece vantagens massivas comparadas com os nossos vizinhos de mentes mais fechadas. A História nos ensina que a brutal restrição da liberdade de pensamento imposta pelo regime comunista sobre o seu povo levou a União Soviética à ruína. Preservar a liberdade pessoal é uma condição essencial para o desenvolvimento de qualquer nação.

Se nós queremos crescer como sociedade e sermos vitoriosos, é absolutamente vital que desenvolvamos uma espinha dorsal espiritual – uma ideia nacional, uma ideologia que una e brilhe no caminho para a frente. É uma verdade fundamental que as grandes nações não podem ser realmente grandes sem tal ideia no seu cerne. Esta é uma parte da tragédia que ocorreu nos anos de 1970 e 1980. Espera-se que a resistência das elites dominantes ao avanço de uma nova ideologia, enraizada nas dores da era comunista, esteja começando a desvanecer. O discurso de Vladimir Putin no encontro anual do Clube de Discussões Valdai, em outubro de 2021, foi um poderoso sinal tranquilizador a este respeito.

Assim como o sempre crescente número de filósofos e autores russos, eu apresentei a minha própria visão sobre a 'ideia russa' [3]. (Peço desculpas por ter que fazer referência à minha própria publicação novamente – este é um lado inevitável de ter que ater-se ao formato).

Questões para o futuro

E agora, discutimos sobre um aspecto significativo, porém muito negligenciado, da nova política que precisa ser tratado. Precisamos repudiar e reformar a obsoleta e muitas vezes danosa base ideológica das nossas ciências sociais e da vida pública para que esta nova política seja implementada e, mais ainda, tenha sucesso.

Isto não significa que tenhamos que rejeitar novamente os avanços dos nossos predecessores na ciência política, na economia e nas relações exteriores. Os Bolcheviques tentaram jogar fora as ideias sociais da Rússia czarista – todos sabem como isso acabou. Rejeitamos o marxismo e estávamos felizes por isso. Agora, fartos de outros princípios, nos damos conta que fomos impacientes demais com isso. Marx, Engels e Lenin tinham ideias sólidas na teoria do imperialismo deles que poderíamos usar.

As ciências sociais que estudam maneiras que a vida pública e privada devem considerar para o contexto nacional [rever?], seja como for que queiram aparecer. Isso deriva da História nacional e, em última análise, visa ajudar as nações e/ou os seus governos e elites. A aplicação negligente de soluções válidas de um país para outro são infrutíferas e apenas criam abominações.

Precisamos começar a trabalhar na direção da independência intelectual depois que conseguirmos a segurança militar e a soberania política e econômica. No novo mundo, é compulsório alcançar-se o desenvolvimento e exercer influência. Que eu saiba, Mikhail Remizov, um proeminente cientista político russo, foi o primeiro a chamar isto de 'descolonização intelectual'.

Tendo despendido décadas à sombra do marxismo importado, estamos começando a fazer a transição para mais uma ideologia estrangeira da democracia liberal em economia e ciência política e, de um certo modo, até em política de relações exteriores e defesa. Esta fascinação não nos fez bem – perdemos terras, tecnologias e gente. Em meados dos anos de 2000, começamos a exercer a nossa soberania, porém tivemos que apoiar-nos nos nossos instintos, ao invés de princípios científicos e ideológicos claramente nacionalistas (novamente – não pode ser outra coisa).

Ainda não temos a coragem de reconhecer que a visão de mundo científica e ideológica que seguimos nos últimos 40-50 anos é obsoleta e/ou teve a intenção de servir a elites estrangeiras.

Para ilustrar este ponto, eis aqui algumas questões aleatoriamente retiradas da minha própria longa lista.

Começarei com questões existenciais, puramente filosóficas. O que vem primeiro nos seres humanos – o espírito ou a matéria? E, no sentido político mais mundano – o que impulsiona as pessoas e os estados no mundo moderno? Para os marxistas e liberais comuns, a resposta é a economia. Lembrem-se que, até recentemente, a declaração famosa de Bill Clinton de que “é a economia, estúpido” era considerada como um axioma. Porém, as pessoas buscam algo maior, quando a necessidade básica por comida é satisfeita - o amor pela sua família, a sua pátria, o desejo de ter dignidade nacional, liberdades pessoais, poder e fama. A hierarquia de necessidades tem sido bem conhecida por nós desde que Maslow apresentou a sua famosa pirâmide nos anos de 1940-50. No entanto, o capitalismo moderno o desvirtuou, forçando um consumo crescente – primeiramente, através das mídias tradicionais e, mais tarde, através das mais abrangentes redes digitais – para ricos e pobres, cada qual de acordo com a sua capacidade.

O que podemos fazer quando o capitalismo moderno, destituído de bases morais e religiosas, incita ao consumo ilimitado, rompendo com barreiras morais e geográficas, e entra em conflito com a natureza? Mais do que ninguém, nós russos entendemos que qualquer um que tente livrar-se dos empreendedores e dos capitalistas que são motivados pelo desejo de acumular riqueza, trará consequências desastrosas para a sociedade e para o meio-ambiente (o modelo socialista de economia não era exatamente amigável ao meio-ambiente).

O que faremos com os recentes valores de rejeitar a História, a nossa pátria, as questões de gênero e as crenças, bem como os agressivos movimentos LGBT e feministas? Eu respeito o direito de segui-los, porém penso que estes são pós-humanistas. Devemos tratá-los apenas como mais um estágio da evolução social? Não penso assim. Devemos tentar afastá-los, limitar a sua propagação, e esperar até que a sociedade ultrapasse esta epidemia moral? Ou será que devemos combatê-lo ativamente, liderando a maioria da humanidade que adere aos chamados valores “conservadores” - ou, para simplificar, os valores humanos normais? Devemos entrar na briga, fazendo crescer uma confrontação já perigosa com as elites ocidentais?

O desenvolvimento tecnológico e a crescente produtividade do trabalho ajudaram a alimentar a maioria das pessoas, porém o próprio mundo escorregou para a anarquia e muitos princípios-guia foram perdidos a nível mundial. Talvez as preocupações com a segurança predominam novamente sobre a economia. Os instrumentos militares e a vontade política podem estar liderando de agora em diante.

O que é a dissuasão militar no mundo moderno? Será uma ameaça causar dano à ativos nacionais e individuais, ou ativos estrangeiros e infraestrutura de informação as quais as atuais elites ocidentais são tão ligadas? O que será do mundo ocidental se a sua infraestrutura for derrubada?

É uma questão relacionada: Qual é a paridade estratégica sobre a qual falamos ainda hoje? Será alguma bobagem estrangeira absorvida pelos líderes soviéticos que sugaram o seu povo para dentro de uma exaustiva corrida armamentista devido ao seu complexo de inferioridade e à síndrome de 22 de junho de 1941? Parece que já estamos respondendo a esta pergunta, apesar de ainda estarmos despejando discursos sobre igualdade e medidas simétricas.

E o que é este controle armamentício que muitos acreditam ser instrumental? Será uma tentativa de restringir a cara corrida armamentista que beneficie a economia mais rica, a fim de limitar o risco de hostilidades, ou algo mais – uma ferramenta para legitimar a corrida, o desenvolvimento de armas e o processamento de programas desnecessários no seu oponente? Não há uma resposta óbvia para isso.

Mas, voltemos às questões mais existenciais.

Será que a democracia realmente é o pináculo do desenvolvimento político? Ou será apenas outra ferramenta que ajuda as elites a controlarem a sociedade, caso não estejamos falando sobre a democracia pura de Aristóteles (a qual também tem certas limitações)? Há muitas ferramentas que vêm e vão, à medida que a sociedade e as condições mudam. Às vezes, as abandonamos, só para trazê-las de volta quando é o tempo certo e há demanda externa e interna por estas. Não estou defendendo o autoritarismo sem limites, nem a monarquia. Penso que já passamos dos limites com a centralização – especialmente ao nível de governos municipais. Porém, se esta é apenas uma ferramenta, não deveríamos parar de fingir que buscamos a democracia e sejamos diretos – queremos as liberdades pessoais, uma sociedade próspera, segurança e dignidade nacional? Porém, como justificamos o poder para as pessoas?

Será que o estado está realmente predestinado a morrer – como os marxistas e os globalistas liberais acreditam, à medida em que estes últimos sonharam com alianças entre corporações transnacionais, ONGs internacionais (ambas têm passado por nacionalizações e privatizações) e corpos políticos supranacionais? Veremos por quanto tempo a UE poderá sobreviver na sua atual forma. Notem que eu não quero dizer que não há razões para unir esforços nacionais pelo bem maior – como eliminar caras barreiras alfandegárias, ou introduzir políticas ambientais conjuntas. Ou será melhor focalizar no desenvolvimento do nosso próprio estado e apoiar os vizinhos, ao mesmo tempo que descartamos os problemas globais criados por outros? Será que estes não nos perturbarão se agirmos desta maneira?

Qual é o papel da terra e dos territórios? Serão ativos em diminuição, uma carga – como era acreditado recentemente pelos cientistas políticos? Ou serão estes os maiores tesouros nacionais, especialmente em face da crise ambiental, das mudanças climáticas e o crescente déficit de água e comida em algumas regiões e a total falta destes em outras?

O que devemos fazer, então, com as centenas de milhares de paquistaneses, indianos, árabes e outros, cujas terras poderão ser inabitáveis dentro em breve? Será que devemos convidá-los agora – como os EUA e a Europa começaram a fazer nos anos de 1960 -, atraindo migrantes para reduzir o custo do trabalho local e enfraquecer os sindicatos? Ou será que devemos preparar-nos para defender os nossos territórios de ataques dos estrangeiros? 

Neste caso, devemos abandonar quaisquer esperanças de desenvolver a democracia – como demonstra a experiência de Israel com a sua população árabe.

Será que o desenvolvimento da robótica – que atualmente está num estado lamentável – ajudará a compensar a falta de força de trabalho e tornará estes territórios habitáveis novamente? Qual é o papel dos povos indígenas russos no nosso país, considerando que os números destes seguirão decrescendo? Dado que os russos têm sido, historicamente, um povo aberto, as perspectivas podem ser otimistas. Porém isto não está claro até agora.

Eu posso seguir adiante sem parar, especialmente no que concerne à economia. Estas questões precisam ser feitas e é vital encontrar-se respostas o quanto antes possível, a fim de crescer e chegar ao topo. A Rússia precisa de uma nova economia política – livre do marxismo e dos dogmas liberais, mas algo mais do que o pragmatismo corrente sobre o qual se baseia a nossa política de relações exteriores. Esta (nova política) deve incluir o idealismo progressista, uma nova ideologia russa que incorpore a nossa História e nossas tradições filosóficas. Isto faz eco às ideias propostas pelo acadêmico Pavel Tsygankov.

Creio que esta é a meta última de toda a nossa pesquisa sobre relações exteriores, ciência política, economia e filosofia. Esta é uma tarefa mais do que difícil. Poderemos continuar contribuindo para a nossa sociedade e o nosso país somente se quebrarmos os nossos velhos padrões de pensamento. Mas, para terminar numa nota otimista, aqui está um bem-humorado pensamento: Não é chegado o tempo de reconhecer que o tema dos nossos estudos – relações exteriores, políticas domésticas e a economia – é o resultado de um processo criativo envolvendo igualmente as massas e os líderes? Que reconhecer que é, de alguma maneira, uma arte? Em grande medida, isto desafia explicações e deriva da intuição e do talento. Assim que somos como especialistas em arte: Falamos sobre isto, identificamos tendências e ensinamos os artistas – as massas, os líderes – História, que é útil a eles. Muito amiúde, nos perdemos no pensamento teórico, inventando ideias divorciadas da realidade, ou distorcido, ao focalizarmos em fragmentos separados.

Às vezes fazemos História, sim: pense em Evgeny Primakov ou Henry Kissinger. Mas eu argumentaria que eles não se importavam com as abordagens a esta História da arte que eles representavam. Eles nutriam-se do seu conhecimento, experiência pessoal, princípios morais e intuição. Eu gosto da ideia de que sejamos um tipo de especialistas em arte e creio que isso pode fazer com que a assustadora tarefa de revisar dogmas seja um pouco mais fácil.

Este artigo foi publicado originalmente no jornal 'Russia in Global Affairs e republicado no website RT (https://www.rt.com/russia/550271-putin-doctrine-foreign-policy/)

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