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Ricardo Almeida

Consultor em Gestão de Projetos TIC e ativista do movimento Fronteras Culturales

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Bacurau, Coringa e os Equatorianos

A reação das plateias e os comentários sobre os filmes nas redes sociais revelam que estamos vivos e que queremos encontrar forças para lutar e resistir. Mas ainda existe um hiato entre a ficção dos filmes e a realidade do Brasil atual: nossos sonhos ainda não se transformaram em gestos capazes de transformar a dura realidade local, regional e nacional

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Pensando bem, os filmes Bacurau e Coringa expressam desejos reprimidos que podem estar no inconsciente coletivo de uma comunidade. Às vezes, eles se manifestam como um tipo de histeria individual e coletiva, revelam os sentimentos de impotência e/ou expõem um tipo de crueldade existente nas comunidades que não possuem organizações fortes e nem uma consciência histórica sobre elas mesmas. 

Em Bacurau, a comunidade se organiza em legítima defesa e se alia aos milicianos (que são tratados como heróis) para combater os invasores, enquanto que no Coringa uma mente perturbada reage ao sistema agressivo e opressor, e acaba despertando a brutalidade que estava latente na sociedade caótica e desigual. A revolta contra os opressores está presente em ambos os filmes, mas em apenas um deles o sentimento de vingança se realiza por completo. No entanto, para o grande público, ambos funcionam como um tipo de catarse individual em que o desejo reprimido se realiza por méritos dos personagens que resolvem fazer justiça com as próprias mãos.

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Considerando a aprovação de ambos os filmes pelo público, são desejos que podem se transformar tanto em sonhos como em pesadelos (alguém ainda se lembra dos Anonymous nas manifestações de 2013?), pois ambos possuem uma capacidade de fantasiar a realidade brasileira atual. São sentimentos que habitam o inconsciente coletivo de uma sociedade que está pouco organizada e que, por isso mesmo, acabam revelando os seus instintos mais primitivos. Portanto, as reações do público não revelam apenas alguns sentimentos imaginados, mas desejos reprimidos reais e simbólicos da crueldade que convive entre nós. 

É importante destacar que certas imagens e palavras desses filmes encontram na estupidez humana aquilo que costumamos criticar em outras pessoas. A plateia já não se importa com a moral, com a ética e nem mesmo se foram os milicianos que realizaram a vingança imaginada… Para muita gente, mais importante é fantasiar que estamos destruindo os nossos inimigos de plantão, pois ainda se sentem impotentes ao não se colocarem como alternativa real de poder.

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Enquanto isso, no Equador, acontecimentos reais e maravilhosos superam a ficção: as comunidades organizadas (a maioria de povos indígenas) estão realizando marchas em várias regiões do país, sendo que os maiores protestos ocorrem em Quito, na capital. Há enfrentamentos com a polícia e o exército, e os grupos de manifestantes vão se avolumando aos poucos, rumo a uma paralisação geral. Algumas instalações petroleiras já estão sob o controle dos manifestantes e as vias de acesso foram bloqueadas impedindo a saída dos caminhões-tanque das petroleiras. Com essa interrupção da produção e da distribuição, os capitalistas perceberam que haverá um enorme prejuízo e, como sempre acontece, resolveram negociar antes que percam os anéis e também os dedos. 

Como o presidente Lenin Moreno decidiu seguir a cartilha neoliberal do FMI, acabar com as políticas sociais do governo Rafael Correa, defender a intervenção militar na Venezuela, a entrega de uma base aérea para uso da inteligência norte-americana e retirar o país da Unasul (a sede da organização está no Equador) e da OPEP, as organizações sindicais, camponesas, indígenas e populares se unificaram em uma grande onda nacional de protestos contra o fim dos subsídios aos combustíveis e a flexibilização dos contratos de trabalho. 

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Lá, há tempos a sociedade se organizou debaixo para cima e, através dos mitos e dos saberes populares, não ficou esperando por um milagre e/ou depositou a sua esperança nos outros. É importante lembrar que essas comunidades do Equador, organizadas e mobilizadas, não praticam atos isolados e, em função disso, já destituíram três presidentes. Aqui no Brasil, uma presidenta honesta foi destituída, o maior líder popular da história do país está preso (apenas com base em convicções), o país está sendo vendido a preço de bananas e os direitos do povo foram violados, sem a necessária resistência democrática e popular. No entanto, apesar dessa situação, começaram a ocorrer milagres no Brasil: as revelações do The Intercept Brasil mudaram o rumo da nossa história e alguns personagens parecem que irão sair das telas dos cinemas e dos becos para organizar as nossas comunidades pela base.

A reação das plateias e os comentários sobre os filmes nas redes sociais revelam que estamos vivos e que queremos encontrar forças para lutar e resistir. Mas ainda existe um hiato entre a ficção dos filmes e a realidade do Brasil atual: nossos sonhos ainda não se transformaram em gestos capazes de transformar a dura realidade local, regional e nacional. Para mudá-las, precisamos “bacuralizar” as nossas comunidades em legítima defesa... Como uma criança diz no filme, quem vive com a sua comunidade é reconhecido como gente.

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