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Marcos Coimbra

Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi

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Democracia sem povo

"Estamos com dez meses de um governo calamitoso, chefiado por um delinquente que comete desatinos e irregularidades diariamente, e que adotou politicas que contrariam os interesses e pontos de vista da maioria", escreve o sociólogo Marcos Coimbra, presidente do Vox Populi. "Em países democráticos normais, a cada passo de um governo desse tipo teríamos pesquisas para retratar a reação da sociedade ao que diz e faz. Aqui, não"

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Alguém se lembra de quantas pesquisas nacionais de opinião foram publicadas em outubro? E nos últimos três meses? E do início do ano para cá?

Com alguma boa vontade, chegamos a um número próximo a dez pesquisas tecnicamente defensáveis desde janeiro, léguas abaixo do padrão internacional e aquém daquilo que o tamanho e a complexidade do País justificaria.

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Nos Estados Unidos, apenas em outubro, foram publicadas 85 pesquisas de âmbito nacional a respeito de Trump. Se excluirmos os resultados de tracking polls, restam 41 pesquisas convencionais, como as que fazemos no Brasil. Os principais veículos de comunicação encomendaram oito, em uma média de duas por semana. Sete universidades promoveram as suas, assim como fundações privadas e consultorias. Empresas tradicionais de pesquisa realizaram várias.   

São tantas pesquisas que os analistas americanos quase só raciocinam com os chamados “agregadores de pesquisas”, sistemas que calculam, de maneira até sofisticada, o resultado de conjuntos de levantamentos. Hoje, passam de meia dúzia, o que criou um mercado novo: desenvolver metodologias para agregar agregadores.  

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Longe da exuberância americana, em outubro, no Reino Unido, foram seis pesquisas nacionais, considerando apenas as convencionais. Na França, oito. Na Espanha, 25 (há eleição por lá na semana que vem). Este ano, saindo dos países europeus maiores, foram publicadas, por exemplo, 16 pesquisas na Lituânia e dez na Letônia. Na América Latina, a imprensa mexicana divulgou, ao longo de 2019, os resultados de 48 pesquisas, de tracking ou não. Em todos os lugares, qualquer uma delas foi considerada suficientemente correta para ser integrada em um agregador respeitável.  

O Brasil destoa do resto do mundo. Aqui, as pesquisas são infrequentes e limitadas, a maioria patrocinada por empresas e entidades empresariais, com evidente  interesse na promoção de suas agendas. Fora dos períodos eleitorais, a imprensa nacional e parte dos veículos regionais trabalha com um único instituto, tratado como se fosse uma espécie de oráculo, em um modelo inteiramente anacrônico. As pesquisas de opinião, algo intrínseco às democracias contemporâneas, são tão infrequentes no Brasil quanto em lugares onde as preferências da maioria não contam.    

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A razão é simples e decorre do caráter epidérmico da democracia brasileira: pesquisar a opinião das pessoas tem como premissa a ideia de que a opinião delas é importante e é preciso conhecê-la. Quando, ao contrário, o que elas pensam é irrelevante, por que perder tempo as consultando?   

A elite brasileira costuma achar que é democrata, mas não gosta de povo e não respeita sua opinião. O que ela quer é apenas um sistema politico que lhe permita olhar-se no espelho e não se ver como um ou uma gorila. Nada além de um verniz de civilização.   

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Não estamos falando, é claro, daqueles que não estão nem aí para se assumir  demofóbicos. São tão comuns entre nós quanto a jabuticaba e infectam o aparelho estatal, em especial as Forças Armadas e o sistema de Justiça. Quem não é capaz de citar um general, juiz, promotor ou ministro do Supremo que se acha intérprete da vontade nacional e acredita haver recebido a missão de guiar a coletividade?  

A ojeriza ao povo não se limita aos abertamente autoritários. No Brasil, a regra, entre as “pessoas de bem”, os “estudados” e “modernos”, na classe média e entre os ricos, é gostar do povo desde que fique em seu lugar, não tenha a veleidade de ser igual, não aspire ao poder e não meta o bedelho onde não foi chamado.  

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A sociopatia brasileira típica é a mania de superioridade dos que têm em relação aos que nada ou muito pouco têm, fruto de uma cultura que trata as diferenças entre as pessoas como decorrência de algum desígnio divino. Falta pouco para que nos vejamos como constituindo castas. Cada um no seu lugar.  

Estamos com dez meses de um governo calamitoso, chefiado por um delinquente que comete desatinos e irregularidades diariamente, e que adotou politicas que contrariam os interesses e pontos de vista da maioria. Em países democráticos normais, a cada passo de um governo desse tipo teríamos pesquisas para retratar a reação da sociedade ao que diz e faz. Aqui, não.    

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O silêncio das pesquisas é bom para aqueles que estão satisfeitos com Bolsonaro e o status quo.  O que não se compreende é a falta de iniciativa de quem não o aprova. Não é somente através de manifestações de rua que se mostra a opinião da maioria, até porque é irrealista esperar que as pessoas se mantenham em estado de mobilização permanente. Dispomos de menos pesquisas do que é desejável, que exponham com clareza a distância que existe entre o verdadeiro Brasil e a contrafação bolsonarista.  

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