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Paulo Calmon Nogueira da Gama

Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio

6 artigos

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Entre abutres e marrecos

A grande mídia brasileira, em seu papel inconfesso de testa-de-ferro do mercado, minimiza ou esconde o que não lhe interessa mostrar

Tony Garcia volta ao local onde grampeou Moro (Foto: Eduardo Matysiak)
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Há exatos 10 anos, estrelado por Jake Brokeback Mountain Gyllenhaal, “O Abutre” (Nightcrawler) estreou no circuito cinematográfico.

Esse imperdível romance ficcional mergulha no submundo da reportagem policial sensacionalista de Los Angeles (ou das nossas tardes de TV aberta).

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A falta de escrúpulos dos canais sanguinolentos para obtenção de um ou dois pontos extras de audiência é levada ao extremo pelo protagonista. Numa escalada amoral, o freelancer Louis Bloom (Gyllenhaal) chega ao ponto de construir, ele próprio, cenas reais de eventos criminais e acidentes espetaculosos. Como é ele mesmo quem prepara e contrata esses eventos, sempre chega aos locais, câmara em punho, no ápice de seu crepitar, o que lhe garante imagens e reportagens únicas. E, claro, algum prestígio e muita grana na venda dos “furos” às redes de televisão.

O principal mérito do filme, sem dúvida, é o de retratar a forma pela qual a grande mídia interfere no cotidiano das pessoas e manipula o senso coletivo.  No período retratado, Los Angeles tinha seus índices de criminalidade em significativa queda, uma calmaria na segurança pública, se comparada a um passado recente. Como a calmaria não era boa para os negócios, os representantes dessa mídia (concorrentes no varejo, mas sempre “trocando figurinhas”) cuidavam de descolar a versão da realidade, a fim de incutir na população uma sensação de insegurança artificialmente desproporcional. 

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A ficção de Loius Bloom “criador de fatos trágicos” é fichinha se comparada à realidade da imprensa corporativa nacional.  

Assim como Bloom, a grande mídia corporativa brasileira também contrata seu pessoal para criar seus próprios fatos, inclusive juízes, promotores, policiais e agentes fazendários, como se viu nos lavajatismos da vida. 

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Um “nada” jurídico, repetido à exaustão com imagens de tubulações despejando dinheiro, transforma-se no “maior escândalo de corrupção de todos os tempos”. 

A fórmula simbiótica de retroalimentação é manjada: a notícia é plantada, dá azo à investigação, que gera novas notícias, e assim sucessivamente.

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Fenômeno parecido se dá, mas com sinal trocado, no expediente “passapanista”, o famoso “abafa”. 

A grande mídia brasileira, em seu papel inconfesso de testa-de-ferro do mercado, minimiza ou esconde o que não lhe interessa mostrar. É a forma mais cínica de desinformação, um “abutrismo de contemplação”. 

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O último grande exemplo eloquente da rapinagem midiática, no modo passapanismo, é o que envolve o empresário e ex-deputado paranaense Tony Garcia. 

Esse personagem, revelando ter agido espuriamente infiltrado para objetivos, digamos, meta-processuais, do afamado ex-juiz, traz denúncias gravíssimas, um enredo recheado de chantagens e abusos, em período ainda anterior à Lavajato.

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Toda trama foi exposta detalhadamente pelo jornalista Joaquim de Carvalho, na série de reportagens e podcasts que vem apresentando no portal Brasil247, desde julho de 2023, inclusive com entrevista do denunciante.

Decorridos mais de 6 meses, a mídia tradicional, à exceção de notinhas isoladas, vinha ignorando solenemente essa que se insinua como uma das maiores tramoias judiciais de todos os tempos (e que, não por acaso, interliga-se ao escândalo lavajatista).  Fosse do interesse do mercado, do objeto de desejo dos neoliberais, a treta teria sido amplamente eviscerada, mereceria inserções diárias nos telejornais, com direito a gráficos e animações, reprodução de áudios, entrevistas dos envolvidos e analise de especialistas. Mas a grande mídia seguia impávida, sob o som dos grilos.

Até que a nova chefia da Procuradoria-Geral da República requereu e o STF deferiu que os fatos fossem realmente investigados. Sob o risco da desmoralização completa e da perda – ainda maior – de espaço para a mídia alternativa, a imprensa corporativa nacional viu-se obrigada a, enfim, cumprir o papel de... imprensa!  Pragmática, tirou a blindagem do ex-parceiro (dublê de fonte e instrumento), recolheu a peneira e deixou que o sol banhasse as denúncias. Entre o apego ao restinho de credibilidade e a lealdade à “bananeira-que-já-deu-cacho”, que se afogue o pato (ou marreco).

(*) Paulo Calmon Nogueira da Gama – Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio, membro da AJD

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