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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Lula aponta cilada na frente da direita limpinha

"Lula, o grande articulador político, sabe do que fala", afirma Denise Assis, do Jornalistas pela Democracia, após o ex-presidente dizer a Renato Rovai que não tem como formar frente ampla "por direitos" com quem tira direitos. "Esta Frente é a que apunhala pelas costas. É da natureza deles", diz ela

(Foto: Felipe L. Gonçalves/Brasil247)
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Por Denise Assis, do Jornalistas pela Democracia - Em entrevista ao editor da Revista Fórum, Renato Rovai, o ex-presidente Lula disse que não tem como formar frente ampla “por direitos” com quem tira direitos. “O PT não vai aceitar isso. Não dá para formar uma frente ampla por direitos com quem tira direitos, com quem fez o impeachment”. Afirmou, ainda, que as reticências do PT com relação à frente nunca foi o “Lula Livre”.

O cenário – guardadas todas as devidas proporções - tem alguma semelhança com um outro setembro, o de 1967 (há 52 anos, portanto), em que o país havia mergulhado, três anos depois do golpe que derrubara João Goulart com a ajuda dos americanos do cargo de presidente da República, em que o Brasil vivia um momento muito delicado.

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Ali os militares começavam a desenhar o “milagre econômico” (que atingiu o auge entre 1968 e 1973, abatido pela crise do petróleo). Tal quadro apontava para um apoio aos ditadores, por parte da sociedade, enquanto movimentos de resistência começavam a pipocar, com ações de impacto. Neste mesmo mês, o presidente do Partido Comunista, Luiz Carlos Prestes, havia expulsado Carlos Marighella de suas fileiras, por ter, em um ato de desobediência ao centralismo, ido a Cuba, em agosto, participar do Congresso de criação da Organização Latino-Americana de Solidariedade (OLAS). 

A organização, composta por diversos movimentos revolucionários da Ásia, da África e da América Latina, pretendia ampliar a luta contra o imperialismo norte americano e expandir a revolução cubana à toda América Latina. Posição totalmente descartada pelo PC, que condenava a luta armada. Tal gesto impulsionou mais rapidamente Marighella para seus planos de ações armadas.

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No alto-Comando militar, à frente do governo, a discussão era em torno da criação da pena de morte regulamentada por decreto-lei, já assinado pelos ministros militares, e que previa a morte por fuzilamento, (podendo ser comutada apenas pelo presidente da República), leia-se, o ditador da vez, para os adeptos de tais ações.

Diante desse quadro, as alas progressistas se reuniram para constituir uma Frente Ampla, para se opor ao arbítrio e devolver o país à normalidade democrática. Na liderança dessa Frente, costurada na casa do então Editor da Civilização Brasileira, Enio Silveira, faziam parte Leonel Brizola – cunhado de Jango – e Carlos Lacerda. É bom lembrar que Lacerda foi um dos nomes civis de maior peso na arquitetura do golpe, pois estava cotado para assumir o poder, não tivesse o general/ditador Castelo Branco prorrogado o seu mandato, abrindo caminho para a continuidade dos militares à frente do governo. 

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Não só isto. Foi Carlos Lacerda quem, brandindo uma metralhadora na varanda do palácio Guanabara, de onde era governador, comemorou a chegada dos tanques vindos da Rua Paissandu, trazendo a bordo os irmãos Etchegoyen (Leo e Ciro) e declarou a “revolução” vitoriosa. Vamos combinar, ato difícil de digerir, para quem amargava o exílio em decorrência de tudo isto. 

Num gesto de desprendimento, não sem relutância, João Goulart mirou as terras brasileiras de sua casa, no Uruguai e, por fim, após insistentes pedidos de Juscelino, deixou de lado o ressentimento e recebeu Carlos Lacerda para uma conversa. Aceitou pacificar o coração, em nome do Brasil. Em seguida, escreveu (supõem-se, ao amigo e confidente, José Gomes Talarico), com quem correspondia frequentemente, a carta que hoje repousa nos arquivos da Fundação Getúlio Vargas (FGV):

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“Recebi hoje, em minha residência, o ex-governador da Guanabara, o Sr. Carlos Lacerda, que veio procurar-me para debater comigo assuntos ligados com a Frente Ampla.

Sabe o povo brasileiro que sempre me manifestei favoravelmente à sua constituição, tendo em vista a necessidade de lutar organicamente pela restauração das liberdades democráticas e pela emancipação nacional.

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A dinamização desse grande movimento, - verdadeira Frente Ampla – (ilegível) do povo, integrada por patriotas de todas as camadas sociais, organizações e correntes políticas, - é a tarefa que, juntos, precisamos realizar, com lealdade e coragem cívica, mobilizando nossas energias e concentrando-as sem desfalecimentos, para reconduzir o país ao caminho democrático.

É preciso que se transforme, corajosa e democraticamente, a estrutura de instituições arcaicas que não mais atendem aos anseios de desenvolvimento do país, e que somente servem para manter a espoliação das riquezas nacionais pelos grupos externos e internos, que sangram e exploram o trabalho do nosso povo.

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Ninguém tem o direito de suprimir, pela mistificação, pela usurpação total do poder civil, ou pelo ódio, as esperanças do país de solucionar pacificamente, os grandes problemas do nosso tempo.

Penso que devemos esgotar todos os recursos ao nosso alcance na busca de soluções pacíficas para a crise brasileira, sem cultivar ressentimentos pessoais nem propósitos revanchistas.

A frente ampla deve ser o instrumento capaz de atender com esse sentido, e responsavelmente, ao anseio popular pela restauração das liberdades públicas e individuais; pela participação de todos os brasileiros na formação dos órgãos de poder e na definição dos princípios constitucionais que regerão a vida nacional; pela retomada dos esforços para formular e pôr em execução as reformas de base; pela reconquista, pelo Brasil, da direção dos órgãos de controle do seu destino.

Só na plenitude do regime democrático poderá o povo, especialmente os trabalhadores, hoje com sua voz sufocada, lutar pelos imortais princípios de sacrifício da vida, o sacrifício do Presidente Vargas.

Estou movido exclusivamente pela preocupação com o futuro do meu país. Não segui qualquer outro compromisso que não o de continuar emprestando meu apoio e colaboração à luta pela redemocratização do Brasil.

Naquela hora, havíamos perdido o direito ao voto, a liberdade e perdíamos vidas, já dizimadas na tortura. Hoje, se formos estabelecer parâmetro, perdemos de forma oblíqua direitos, vidas (nos confrontos na Amazônia, por terras no Norte, e mortes misteriosas de nomes ligados à Lava-Jato, nos centros urbanos), e o país, vendido que está sendo, aos pedaços. 

Não há caminhos definidos, apenas uma indignação geral e muita vontade de resistir, com linhas de ação sendo desenhadas. Eis que, neste cenário, quando o governo perde apoio a olhos vistos, e abre-se uma brecha para algum avanço das forças progressistas, surge em São Paulo, sob a batuta da turma do “centro-esquerda”, o que quer que isto signifique neste momento, com a ideia de uma: Frente Ampla!

Com a condição de que se abandone a palavra de ordem: “Lula Livre” e se esqueça que a grande liderança política brasileira mofa na cadeia, em consequência dos atos praticados pelos organizadores da “festa” para a qual estão convidando os golpeados.

Muda tudo. Certos de que o excesso de carga sobre uma pauta liberal e de direita os jogou no colo do fascismo que ora dirige o país, os liberais de sempre, os derrotadíssimos e quase esmagados na eleição de 2018, entram na costureira e pedem uma reforma no guarda-roupa. A fórmula é esperta. Mandam para a TV o formulador de políticas econômicas, que com cara compungida recita – certamente com ordem do “mercado” – um discurso muito próximo da esquerda: “pela redução das desigualdades”. 

Com um desafinado canto de sereias, tentam atrair o principal partido de esquerda para o seu leito. Certamente já prevendo a recusa, para assim ter o recibo de radicalização escancarado para a sociedade. Desta forma, limpinhos e cheirosos, sairão por aí consolidando a ideia de que, num país “polarizado” (esta é a palavra da vez, outra vez), a solução está com eles, os limpinhos, cheirosos e chiques. Lula, o grande articulador político, sabe do que fala. Esta Frente é a que apunhala pelas costas. É da natureza deles.

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