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Gustavo Felicíssimo

Escritor e Editor da Mondrongo, autor de alguns livros de prosa e poesia, entre os mais recentes estão Carta a Rubem Braga (Crônicas, 2018) e Oratório das Águas (Poesia, 2019)

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Nova evocação do Recife

Recife! 

Não aquela das torres gêmeas no Cais de Santa Rita 

mas o Cais de Santa Rita

       o Mercado de São José 

       o Mercado das Flores

Recife do Marco Zero, da Torre Malakoff e da Praça do Arsenal

onde Fatinha começou a frevar de sombrinha na mão

e se encantou por Alceu cantando Anunciação 

Tu vens, tu vens

Eu já escuto os teus sinais

Eu quero o Recife dos mangues 

o Recife do Manguebeat, dos Caranguejos com cérebro

Eu quero o Recife de Josué de Castro 

que um dia quebrou o meu crânio quando disse: 

metade da humanidade não come; 

e a outra não dorme, com medo da que não come. 

Eu não quero o Recife da fome 

Eu quero o Recife solidário, não o Recife solitário 

Eu quero o Recife do Ocupe Estelita 

Eu quero o Recife que encontro na nostalgia de Urariano Mota 

mas não quero crer, embora não possa, no assassinato de Soledad Barrett 

Recife e sua mania de grandeza 

Recife do Capibaribe encontrando o Beberibe para formarem o mar 

Recife da maior avenida em linha reta do Brasil 

da Sinagoga mais antiga das Américas

e do primeiro observatório astronômico também

Recife de Vicente Yáñez Pinzón 

que chegou ao Brasil muito antes de Cabral 

Recife de Alberto da Cunha Melo 

que não era do Recife, mas de Jaboatão 

Recife de Gilberto Freyre e Pena Filho

Recife, irmã sanguínea de Olinda, onde existem os Quatro Cantos 

onde está edificado e resistente o glorioso Bar do Peneira 

Recife, enfim, onde não nasceu o meu avô 

onde a rua da Aurora continua a se chamar rua da Aurora 

onde tudo continua, Poeta, impregnado de eternidade

Bahia, 13 de julho de 2020

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.