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Tânia Maria de Oliveira

Secretária-Executiva Adjunta Secretaria-Geral da Presidência da República

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O decreto de indulto: qual o jogo de Bolsonaro?

Importa que essa situação seja resolvida rapidamente, sobretudo para não crescer e virar ensaio para o que Bolsonaro pode fazer diante do TSE

(Foto: daniel silveira bolosnaro)
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Jair Bolsonaro segue testando as instituições e instigando a polarização política. Causou perplexidade e suscitou intenso debate público ao conceder indulto ao deputado Daniel Silveira menos de 24 horas após ele ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal a oito anos e nove meses de reclusão e multa pelo cometimento de crimes contra o Estado Democrático de Direito.

Embora evidente que o ato é político e tenha intuito de desafiar mais uma vez o Supremo Tribunal Federal, de manter agitada sua base radicalizada, criar fato para se colocar em evidência quando aparece em segundo lugar nas pesquisas para reeleição, além de desviar atenção da terrível situação econômica do país e das denúncias de corrupção sobre seu governo, aos juristas cabe analisar as questões formais e legais do ato, seus pressupostos e limites, inclusive para tentar prever quais os possíveis cenários futuros.

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Em primeiro lugar é preciso reconhecer que existe previsão constitucional para que o Presidente da República conceda, independente de pedido, indulto a condenados, bem como que o ato é discricionário, não necessita ser submetido a qualquer instância, o administrador avalia a conveniência e oportunidade para praticar o ato.

O indulto possui previsão no Brasil desde a Constituição do Império em 1824. Atualmente é estabelecido no artigo 84, XII, da CF/88, com a limitação expressa do artigo 5o, XLIII que lista como crimes insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos.

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Por outro lado, atos administrativos, sejam discricionários ou vinculados, possuem requisitos e pressupostos a cumprir, de forma e conteúdo, para que sejam considerados juridicamente perfeitos, não passíveis de nulidades. São os elementos constitutivos dos atos.  

O que precisamos, portanto, é verificar se o Decreto de Bolsonaro cumpre os requisitos legais de um ato administrativo válido e regular. 

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Vejamos.

Uma decisão judicial tem efeito após transitar em julgado, quando não mais cabem dela recursos, tendo sido publicada. 

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Ao julgamento realizado na quarta-feira (20) no plenário do STF podem ser interpostos recursos internos, como embargos de declaração. Significa que o ato presidencial pretendeu anular um julgamento em andamento, uma ação penal em curso, o que se mostra completamente irregular.

Por outro lado, a discricionariedade de um ato administrativo não o torna isento de suas obrigações para com os princípios que o regem. Todo ato administrativo deve ter uma finalidade que atenda ao interesse público e deve ser praticado de forma impessoal.

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Os limites constitucionais do indulto derivam direta e precisamente do princípio constitucional da separação e da harmonia dos poderes. Em termos objetivos não existe uma “carta branca” para que o chefe do Poder Executivo anule decisões judiciais, sob pena de ferir o próprio núcleo das competências e da independência que rege o sistema de freios e contrapesos.

No exercício da função penal o Poder Judiciário é o encarregado de aplicar a lei ao caso concreto e assim produzir os efeitos esperados do Direito Penal: punir quem cometeu o crime, fazê-lo reparar o dano, inibir práticas semelhantes pelo condenado e por outrem, reabilitar o infrator perante a sociedade. 

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Bolsonaro utilizou o instituto da graça ao deputado Daniel Silveira como uma instância recursal ou revisora, apontando no Decreto sua divergência com o mérito da ação penal julgada procedente por 10 dos 11 ministros do STF. Valeu-se de um instituto constitucional, que possui fundamento humanista ou para corrigir eventual iniquidade da sentença pelo excessivo rigor da norma penal, para beneficiar um aliado político, cometendo evidente desvio de finalidade do ato. 

Defender o Decreto de Bolsonaro como legítimo corresponderia a conferir à discricionariedade valor absoluto, conduzindo ao arbítrio e tirania. 

E o que acontece agora? 

Travou-se um debate sobre o que podem fazer os poderes diante da situação dada e se o Supremo Tribunal Federal possui legitimidade para analisar o decreto de Bolsonaro.

A resposta é afirmativa.

Essa competência, que é excepcional, decorre justamente da possibilidade de haver descumprimento de regramentos constitucionais. Desse modo, como nos demais atos administrativos discricionários,  pode existir um controle judicial para aferir se os motivos correspondem aos fundamentos fáticos e jurídicos do ato, se a finalidade perseguida é legal, se há  coerência lógica da decisão discricionária com os fatos. 

Quando ausente a coerência, o indulto estará viciado por infringência ao ordenamento jurídico constitucional e, mais especificamente, ao princípio da proibição da arbitrariedade dos poderes públicos que impede o extrapolamento dos limites razoáveis da discricionariedade. 

Anular o decreto de Bolsonaro é um imperativo constitucional que se impõe à Suprema Corte que, a propósito, já foi provocada e ao que tudo indica, receberá uma enxurrada de demandas sobre o tema. 

Importa que essa situação seja resolvida rapidamente, sobretudo para não crescer e virar ensaio para o que Bolsonaro pode fazer diante do TSE e do resultado eleitoral. 

Alguns apostam que é blefe, que ele não tem força nem condições de concluir um golpe. Pode até ser. Acontece que quando o preço é a democracia é melhor não pagar pra ver ou podemos perder os olhos.

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