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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Celso Amorim relata impressões sobre sua viagem à Ucrânia

'Em meio a um delicado conflito que divide grandes potências o Itamaraty tem mantido equilíbrio em suas posições na ONU', escreve a colunista Denise Assis

Volodymyr Zelensky (à esq.) e Celso Amorim (Foto: Reuters)
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No dia 5 de maio, quando o avião presidencial pousou em Londres, às 11h, levando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua comitiva, um dos integrantes tinha uma missão a mais, além de acompanhá-lo à cerimônia de coroação do rei Carlos III. O Assessor Especial da Presidência e ex-chanceler, Celso Amorim, levava na bagagem a incumbência de esticar a viagem até Kiev, capital da Ucrânia, onde se encontraria com o presidente do país, Volodymyr Zelensky. 

Em meados de abril ele havia se reunido com Vladimir Putin, em Moscou, num encontro no qual discutiram a relação bilateral de Brasil e Rússia e possíveis negociações para encerrar a guerra da Ucrânia, conforme revelou o assessor, uma semana depois, à CNN Brasil. A Ucrânia foi invadida em fevereiro de 2022 pela Rússia e passou a receber doações de armamentos dos Estados Unidos e de nações europeias para sua defesa. 

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Foi o bastante para que a mídia nacional esperneasse e apontasse o gesto como um posicionamento pró Rússia, no conflito. A implicância se agravou bastante, quando dias depois de Amorim se avistar com Putin, o Brasil recebeu a visita do ministro das Relações Exteriores daquele país, Sergei Lavrov. Instado pelo quadro que se desenhou, Lula então incumbiu Celso Amorim da viagem até a Ucrânia.

Pressionado por grandes potências, a decisão de Lula de enviar Amorim a Kiev foi vista como uma forma de tentar reequilibrar a posição do Brasil no conflito. O país tem defendido a reunião de países neutros em busca da abertura de diálogo que resulte num acordo que pelo menos interrompa a guerra - um cessar fogo -, algo considerado bastante difícil por especialistas.

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Uma de suas tarefas em Londres foi acompanhar o presidente Lula na conversa com o primeiro-ministro, britânico, Rishi Sunak, que se desenrolou por mais de uma hora. “Um encontro importante. Foi o maior que ele teve com um chefe de Estado, em torno de temas tais como as questões da Amazônia e do próprio conflito ucraniano, mas sem descer a muitos detalhes, pois a Inglaterra tem posição bem definida sobre o assunto. “E a saída deles da União Europeia, as relações bilaterais e o comércio entre os países. Foi uma conversa bem objetiva”, resume.

Terminados os salamaleques a Carlos III, já devidamente coroado, Amorim deixou Londres rumo a Paris, onde embarcaria em um avião da FAB, porque não existe voo direto até a fronteira com a Ucrânia, para se lançar à delicada tarefa de visitar um país em pleno conflito armado. A opção por Paris foi também para encurtar o trajeto. A ideia era que ele chegasse à França num dia e embarcasse no outro. Porém, apesar do clima ameno para os padrões Londrinos, a viagem à Inglaterra resultou em uma inflamação no ouvido que o reteve por mais um dia.

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Passado o incômodo, Amorim voou até próximo à fronteira da Polônia, onde um carro da embaixada do Brasil o aguardava para um trajeto de mais uma hora e meia, até a estação onde tomaria um trem. Uma visão o impactou: na fronteira, posicionados voltados para o Leste, uma fileira considerável de mísseis “Patriot” e todo o aparato de lançamento “em quantidade apreciável”. (O MIM-104 Patriot é um sistema de míssil superfície-ar (SAM) de defesa antiaérea, tendo como sendo o seu principal utilizador o Exército dos Estados Unidos e países aliados). “Qual era o alcance, eu não sei”. 

As expectativas sobre o encontro eram bem modestas. “Traga indícios de soluções”, recomendou a ele, o presidente Lula, antes do embarque.

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O chanceler define a viagem como “complexa”, que envolveu o deslocamento no avião da FAB até perto da fronteira com a Polônia, o trajeto de carro e a viagem de trem.

Era noite (20h) quando embarcou e os termômetros marcavam 12º, para alívio de Amorim, ainda se ressentindo do incômodo no ouvido. “Eu vestia apenas uma capa. Nem precisei do meu sobretudo”, sublinha. Ainda no trem, lembrou que estivera em Kiev somente uma vez, acompanhando o presidente Lula, mas apenas por três horas. Ainda assim, reteve boas recordações da capital ucraniana. 

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“Eu me lembro que daquela vez tomamos um café e dei uma olhada no entorno de onde a gente estava. Confesso que achei a cidade mais bonita do que eu imaginava”, revela. Sua lembrança era a de uma cidade com belos prédios, parecida com outras cidades eslavas: alegre, colorida, e tinha uma igreja, “que até eu revi agora, como único momento de distensão, digamos assim”, diverte-se. Amorim descreve “uma igreja ortodoxa, do ano mil, mais ou menos, de Santa Sofia. Ficava perto do palácio, mas vi tudo muito rápido, naquela viagem. Eu estava envolvido com as negociações do acordo nuclear do Irã, e tive de sair logo”, explica.

Já no trem, do tipo antigo, com cabine modesta, de cama estreita, mas confortável, 12h de viagem o esperavam. No trajeto, conseguiu dormir. A previsão de chegada era às 10h. Ao amanhecer buscou a paisagem e sinais da guerra. “Não vi nada demais. Apenas uma mata não muito densa, com uma casa aqui, outra ali, mas nenhum sinal evidente de bombardeio, ou vestígios desse tipo”, relata, fazendo a ressalva de que o seu trajeto não ficava na zona de guerra. “No lado Oeste da Ucrânia, pelo que eu saiba, houve um ataque”. O palco do conflito estava distante dali.

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Na estação, foi recebido pelo vice-ministro do Exterior na Ucrânia, Andriy Melnyk – agora designado o embaixador do país, no Brasil -, que o acompanhou até a nossa embaixada – um apartamento, residência do embaixador. Depois de se “refrescar”, como descreveu o ato de tomar banho e se aprontar, foi levado para o encontro, finalmente, próximo dali. “Não tenho muita noção se estava no Centro, mas imagino que sim, porque cheguei logo aos locais que precisava ir”. Tudo à volta estava intacto. Não havia um cenário de destruição, como se costuma fantasiar, em casos de guerra.

Em meio a esse delicado conflito que divide grandes potências o Itamaraty tem mantido equilíbrio em suas posições na ONU. O Brasil apoiou, por exemplo, duas resoluções das Nações Unidas contra a ação russa. A mais recente, de fevereiro, condenava a invasão territorial ucraniana e exigia a imediata retirada das tropas russas. 

O ponto positivo para Amorim é que até então “ninguém falava em paz, a não ser o Papa, que já havia se posicionado. Agora pelo menos há menções. Nós temos um grupo de países africanos, coordenados pela África do Sul que está indo aos dois países”. Ele lembrou que muitos poucos chefes de Estado fizeram esse movimento, o de mandar um representante conversar com os dois lados. “E o risco de um conflito mundial é real”, diz.

Quanto aos “indícios de soluções” solicitados por Lula, parecem ainda distantes, a julgar pelo que externou Zelensky, no Twitter, após o encontro com Amorim: "Discutimos a possibilidade de realizar o Encontro Ucrânia-América Latina. Espero continuar o diálogo com o presidente Lula e recebê-lo na Ucrânia", afirmou Zelenski.

Ainda de acordo com a publicação, o presidente ucraniano disse a Amorim que a única forma de impedir as agressões da Rússia contra o seu país seria por meio de um plano de paz formulado pela própria Ucrânia. (Está prometido um segundo capítulo do relato de Celso Amorim, ao 247, sobre a reunião com Zelensky. A depender de sua agenda).

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