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"Em 2022, vamos escolher entre a soberania nacional o Brasil colônia", diz Guilherme Estrella, o 'pai do pré-sal'

"Não vamos ter que fazer em 2022 uma escolha entre um país mais capitalista e de outro lado mais socialista. O que vamos ter que resolver em 22 é entre um país soberano ou uma colônia", disse o geólogo em entrevista à revista Focus

Guilherme Estrella, ex-diretor de exploração e produção da Petrobrás (Foto: Tomaz Silva - Agência Brasil)
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Pedro Camarão e Alberto Cantalice, publicado originalmente na revista Focus - A Petrobrás não cumpre mais o papel de uma empresa estatal, essa é a opinião do geólogo Guilherme Estrella que era diretor de exploração da Petrobrás e coordenou os trabalhos para a descoberta das reservas de petróleo do pré-sal. “A empresa hoje está de costas para o país”, critica Estrella de forma veemente. O ex-diretor que ingressou na estatal em 1965, considera o desmonte da Petrobrás um ataque à soberania nacional porque afeta diretamente o setor energético do país. Os altos preços que assustam os brasileiros são resultado da total desorganização do setor implementada desde o Golpe de 2016. Essa agenda privatista já era praticada antes dos governos do Partido dos Trabalhadores e foi interrompida em 2003 com a chegada de Lula à presidência da República. 

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Atualmente, a Petrobrás voltou a ser uma empresa gerida por fundos de investimentos e que atende, exclusivamente, aos interesses de seus acionistas, explica Guilherme Estrella. Ele argumenta que a agenda privatista foi implementada através do golpe, da fraude eleitoral e desrespeitando a Constituição Federal, por isso, é possível reverter o mal que está sendo feito, embora não seja fácil, admite. A seguir leia a entrevista:

Vivemos um momento em que o país está assustado com os preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. Grande parte da população certamente não compreende o que gera essa situação. Então, qual é o motivo de o país estar nessa situação, é resultado da forma como a Petrobrás passou a ser administrada? 

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Primeiro, gostaria de agradecer a oportunidade da Fundação Perseu Abramo para expor minhas considerações. Bom, é o seguinte: nenhuma surpresa. O país está assustado, realmente, você tem razão. Mas nenhuma surpresa. Esse é o projeto de país deste governo e não só dele. Esse é o projeto de país que vinha sendo implantado com o Fernando Henrique, aliás, vinha de antes, desde o Consenso de Washington. Então, começa com o Collor, tem o FHC, a Petrobrás só não foi privatizada porque teve um problema no Senado e foi interrompido pelos nossos governos. Por causa disso veio a descoberta do pré-sal, veio a autossuficiência com a Bacia de Campos e o Brasil consegue, afinal – e é um dos países mais ricos do mundo em recursos naturais – garantir o abastecimento de energia. Até então, o país não tinha energia garantida para o século XXI para termos um projeto de nação desenvolvida e soberana. O poder mundial, concentrado nos EUA através do capitalismo neoliberal, mantinha o Brasil nessa situação sempre dependente de energia principalmente. E a descoberta do pré-sal foi a base para termos um projeto de país soberano. E logo depois começam as pressões. Quatro, cinco meses depois os EUA reativam a 4ª frota no Atlântico Sul. E, depois, vimos com as denúncias feitas por jornalistas e tudo o mais que eles começaram a nos espionar. A C.I.A. espionando as atividades da Petrobrás e da presidente da República.

Veio o golpe de 2016 e se instalou um governo que representava esses interesses antibrasileiros. E fraudaram as eleições de 2018 prendendo o Lula sem provas, completamente inocente. Na Ditadura, os caras cassavam e tiravam os direitos políticos. Mas no lawfaire, o Departamento de Estado dos EUA junto com a Justiça brasileira, com os procuradores disseram “não, prende esse cara”. A eleição de 2018 foi fraudada por isso. Aí implantam o projeto deles e qual era? Desnacionalização da economia, abertura total do mercado brasileiro... com relação ao petróleo, o primeiro ato do Temer foi desonerar a importação. Quer dizer, matou o projeto de conteúdo nacional. 

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Nós somos a 10ª economia do mundo, fomos a 6ª, mas no que diz respeito ao consumo de energia per capta estamos lá no 50º lugar, se não for mais. O povo brasileiro não consume energia e consumo de energia é referência de qualidade de vida. Isso porque nós temos uma país também absolutamente injusto na distribuição de renda. Resultado: o mercado brasileiro tem um potencial de crescimento de consumo energético imenso. Esse é o “filé mignon” dos interesses internacionais para investirem no Brasil. Aí, tratando da Petrobrás, como é que o “camarada” vai comprar uma refinaria? Ele diz o seguinte, “eu preciso ter garantia de vender os meus produtos refinados em Mataripe no mercado brasileiro a preços internacionais, se tiver preços controlados pelo governo eu não vou investir”, isso é o que os fundos financeiros internacionais alegam. Eles dizem também que “eu também participo de produção em outros países e para competir no mercado brasileiro e usar o meu petróleo, eu tenho que pagar também o preço de importação, não é só o valor do petróleo internacional, e eu quero compensar o meu preço de importação. Quero produzir na refinaria aqui com o meu petróleo que vem lá de outro país”. Porque eles também são donos da Petrobrás. Tudo isso está dentro do script desse projeto de país completamente submisso aos interesses antibrasileiros dos grandes fundos financeiros internacional. Quem manda no Brasil hoje, meu amigo, é o pessoal das Ilhas Cayman. Não precisa procurar muito. Então, o PPI, o Preço do Petróleo Importado é indispensável para eles venderem as nossas refinarias. 

Para que possa ficar bem claro para os leitores, gostaria que o senhor explicasse a diferença dessa realidade da Petrobrás que o senhor descreveu para a empresa estatal sob os governos Lula e Dilma. Porque a Petrobrás tinha outra função, não é? 

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Eu, inclusive, fui criticado. Disseram que eu estou muito pessimista. Eu disse, “meus amigos, a Petrobrás acabou. A Petrobrás como empresa estatal brasileira acabou”. Empresa estatal é o que nós praticávamos nos governos Lula e Dilma. Era uma empresa presente em todo o país, que se preocupava primeiramente com o abastecimento nacional de combustíveis. Depois a gente ía fazer as contas. Mas o brasileiro lá de Benjamin Constant que está no Rio Solimões, na fronteira com a Colômbia, aquele cidadão brasileiro era proprietário da Petrobrás, uma empresa estatal. Ele pagava pelo combustível dele o mesmo que uma pessoa aqui no Rio de Janeiro, ao lado da refinaria. Então, esse era o compromisso da Petrobrás. E não é só isso. A Petrobrás estava integrada à sociedade, integrada às comunidades onde ela trabalhava. Veja o caso da refinaria de Urucu, no Amazonas. Está lá há 30 anos e não tem um problema ambiental, tínhamos lá um projeto com a Universidade Federal do Amazonas. Com a nossa atividade produzíamos a criação de pequenas empresas, dava emprego ao cidadão, pagava impostos. Isso é que era uma empresa estatal e ela não existe mais. A empresa hoje é de um fundo de investimento que chamam de “Black Rock” que quer ganhar dinheiro. Fundo de investimento é pior do que banco porque quer ganhar o máximo com menor risco, no menos prazo de tempo e com menor número de empregos gerados, com trabalho precarizado. 

A Petrobrás hoje está de costas para o Brasil. Ela não tem mais nenhum compromisso com o cidadão brasileiro. Nenhum. Um monte de discussão sobre o aumento dos preços e a Petrobrás vai lá e aumenta tudo de novo e o presidente da República vem dizer “não, isso é coisa da Petrobrás. Eu não tenho nada a ver com isso”. É que ele não está lidando com uma empresa estatal, ele está tratando com um fundo de investimento gerindo uma riqueza brasileira, descoberta por brasileiros. É uma empresa contra o Brasil que pertence a grupos financeiros internacionais. 

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O senhor citou o governo Lula e nos governos do PT a Petrobrás teve um papel de destaque não só por ter aumentado a produção de petróleo diminuindo os gastos com compras internacionais, como também foi um veículo impulsionador da indústria naval e do processo de industrialização nacional. Claramente, está posto que há dois projetos de nação. Um quer transformar o país num “fazendão” com as empresas geridas pelo capital internacional e o capital nacional entorno do agronegócio. Isso é muito diferente do que se queria no governo Lula, no qual o objetivo era colocar o Brasil no rumo do desenvolvimento com indústria e serviço. Essa conspiração que levou à derrubada da Dilma e à prisão do Lula, iniciada pela Lava Jato, você não acha que pode ser um vetor cujo centro fosse a canibalização da empresa? E fragilizando a principal empresa nacional, se fragilizaria as políticas desenvolvimentistas colocando o Brasil novamente como uma economia subalterna do império? 

É isso mesmo. Perfeito. Eu colocaria um adendo que é fundamental, o BRICS. Quer dizer, um país desse que é um dos mais ricos do mundo, com indústria, soberano, com energia – porque a grande sacada do governo Lula foi a política de conteúdo nacional. Quando nós entramos, fomos à Angra dos Reis porque tinha um estaleiro lá e para entrar tinha um matagal com portão de ferro, tivemos que bater palma e vinha um cara com uns cachorros. Os estaleiros eram isso. Durante o nosso governo eram 8 mi empregados, por causa do conteúdo nacional. Tinha gente que dizia, “não, construir no Brasil sai mais caro”. Tem que sair mais caro mesmo, meu amigo. A indústria naval estava fechada há 20 anos. Eu visitava pessoalmente os estaleiros de Cingapura e Dubai e eles usam mão de obra escrava e a construção naval é 25% a 30% de custo de mão de obra. Então, construir navio e plataformas no Brasil é mais caro, sim. E aí eu volto aos BRICS, um país como o Brasil, se desenvolvendo como estava, se junta com China, Rússia, Índia, isso pintou o sinal vermelho em Washington e no grande capital internacional. Decidiram passar o trator e mandaram prender o Lula. Essa interferência foi absolutamente ultrajante. Os juízes e procuradores saíam do Brasil e íam para o Departamento de Justiça dos EUA para receber ordens para fazer o que fizeram. 

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Quem rompeu a democracia brasileira e rasgou a Constituição foram eles. Essa é uma realidade que nós temos que enfrentar. 

O senhor falou que a Lava Jato destruiu o desenvolvimento da indústria e da engenharia nacional, mas o que vem depois disso, mais recente, também é muito tenebroso. A privatização da BR Distribuidora, a desorganização completa do setor de óleo e gás. Gostaria que o senhor falasse um pouco sobre isso porque esse desmonte afeta o país diretamente. 

Meu amigo, está tudo dentro do script. Esses gasodutos que foram vendidos agora, fomos nós que construímos, companheiro. O GASENE [Gasoduto da Integração Sudeste-Nordeste], fomos nós que construímos. Os gasodutos troncos no Brasil inteiro, inclusive o Coari-Manaus, 650km em plena floresta amazônica, fomos nós que construímos. Foram os brasileiros da Petrobrás, a Petrobrás como ferramenta de governo, cumprindo política de Estado. 

No governo FHC, a Petrobrás tinha sido transformada em um conjunto de unidades e negócios. Nossos gerentes de unidades eram negociantes, homens de negócios. Eles gerenciavam unidades de negócios de que tinham que dar lucro. A primeira coisa que fizemos foi o seguinte: “acabou esse negócio. Nós somos um sistema”. E transformamos a Petrobrás numa empresa integrada de energia, mas isso é porque era outra ótica, a antiliberal. Uma ótica em que se gerencia sistemicamente com a missão de servir a população. O que está acontecendo hoje é ideológico. Manda esquartejar e todos os ativos vão ter que dar lucro. Perdeu o caráter estatal e transformou a empresa em algo que não é nem mais um conglomerado porque já são outros fundos financeiros que gerenciam os gasodutos, as refinarias que foram vendidas. E venderam os campos terrestres e vão vender os campos marítimos porque o pré-sal e o mercado do Sudeste brasileiros são o “filé mignon” de negócios. O pré-sal está produzindo gigantescamente e a menos de US$ 20/barril e vende o petróleo a US$ 75/barril no mercado. E vende ao preço internacional mais o preço de importação porque se não tiver ninguém compra a refinaria de Mataripe. E eles querem se livrar de Mataripe também. Cada poço do pré-sal produz 20 mil barris por dia e os custos operacionais são de US$ 6/dia. É o interesse dos fundos financeiros. É o melhor negócio do mundo. Agora, eles antecipam dividendos. E eles vendem a BR Distribuidora porque eles não querem compromisso com o cidadão brasileiro que mora em algum lugar longe. 

Eu vi o Paulo Guedes dizer essa semana que seria necessário vender a Petrobrás porque daqui a 30 anos ela estará obsoleta e não valera mais nada. Esse é um discurso que ouviamos desde a época da Peotrobráx do FHC. Aí vem o Guedes dizer que é a favor da privatização, depois vem o João Doria dizer a mesma coisa. Ou seja, a extrema-direita e a direita “limpinha” liberal também defendendo a privatização. Nós, do campo progressista, somos radicalmente contra. Na perspectiva de um governo progressista, qual modelo você acha que devemos aplicar para recuperar o controle da Petrobrás? É aumentar o capital da empresa com investimento do governo federal para retomar a maioria das ações e mudar a dinâmica da empresa, já que ela é vital para a nossa política de desenvolvimento e de geração de emprego e renda? 

Essa é uma pergunta central. Primeiro, quero fazer um prolegômeno aí. Quem disse que queria vender a Petrobrás foi o Guedes e onde que ele disse isso? Foi em Nova York. Ele estava lá junto dos donos dele. E um dia depois, devem ter dito para o presidente da República dizer a mesma coisa senão iria pegar mal. O que o Guedes, o Bolsonaro e o Dória falaram é a “voz do dono”. O PSDB está na mesma. Mas aí vem a pergunta crucial. Nós fomos vítimas de um golpe, de um rompimento político-institucional no Brasil. Então, temos que partir do princípio de que tudo isso foi feito de uma forma irregular, dentro dessa ruptura e num atentado contra a soberania brasileira. Nós temos que ganhar o governo, temos que eleger também um Congresso que seja voltado a esse nosso alerta de que o Brasil se transformou numa colônia do grande capital financeiro internacional e daí começarmos a trabalhar como vamos recuperar isso. Porque tem o seguinte, nós não vimos ainda tudo o que vai acontecer até dezembro de 2022. Temos que aceitar a defender a recuperação da Petrobrás como uma empresa estatal, em todo o Brasil. Para isso, precisamos – e não sou eu que estou dizendo, não. O Lula, no discurso em São Bernardo do Campo quando ele saiu da prisão, aliás, uma coisa abjeta o que fizeram com o Lula. Quem que vai pagar por um homem preso por mais de 500 dias? Quem vai pagar por esse crime? Lá, o Lula disse, “estejam atentos aos que compraram os ativos da Petrobrás porque nós vamos recuperar isso”. 

Então, esse é o nosso papel. Nossa proposta tem que ser clara para que o cidadão possa votar sabendo no que está votando. E a mensagem é essa, “reverteremos tudo o que esse governo está fazendo porque é um governo ilegítimo, produto de uma fraude eleitoral e de um crime judicial”. Aí tem gente que diz que isso seria ruptura. Não é ruptura. Eu tenho a Constituição [ele exibe um pequeno exemplar da Constituição Federal], não sou advogado, mas a Constituição tem que ser entendida por um cidadão comum, não é? E está lá: no item 1 do Artigo 1º: soberania nacional. Energia é matéria de soberania nacional. Eu estava no Iraque, era gerente de exploração em Bagdá, e nós descobrimos um campo enorme. O governo iraquiano nos chamou, disse que nós éramos amigos e tal, mas que tínhamos descoberto um campo muito grande que eles tomariam de volta porque é estratégico para o Iraque. Disseram que não tinham chamado uma empresa estrangeira para fazer a descoberta que tínhamos feito. Eles falaram, “avisem ao pessoal no Rio de Janeiro que vamos conversar, mas não sobre a nossa decisão, e, sim, sobre como vamos cumprir essa decisão”. Então, petróleo é energia, é soberania nacional. Em 2003, o EUA invade o Iraque por causa de Majnoon [maior campo de petróleo do iraquiano]. Ou seja, o capital financeiro internacional invadiu o Iraque em 2003 por causa da Petrobrás. E eles vieram dar o golpe no Brasil também por causa da Petrobrás. 

Ainda de acordo com a Constituição brasileira, o povo tem o direito reivindicar. O artigo 14 diz que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal mediante plebiscito, referendo e por iniciativa popular. Na minha modesta opinião, nossa mensagem tem que ser a seguinte: olha, nosso projeto de Brasil, além de retomar os investimentos para o desenvolvimento, vai praticar uma democracia crescentemente participativa, ouvindo a população brasileira. E ainda tem o artigo 219 da Constituição que aponta que tudo o que eles fizeram foi inconstitucional. O artigo diz que “o mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do país”. Isso está na Constituição. Esse mercado interno pertence a nós. Não se pode privatizar um oleoduto. Eu acho que não há outro jeito, senão nós não elegeremos um presidente da República em 2022. Nós elegeremos um governador-geral, um sucesso do Mendes Sá [administrador colonial português]. Quer dizer, o presidente da República irá governar uma colônia. 

Está na Constituição brasileira, eu não estou sonhando. Esse é o ponto de partida. Temos que recuperar a Petrobrás. Claro que eu não sou ingênuo. Na área de exploração e produção os campos acabam, mas para sair de uma área em que você produz petróleo é preciso preparar um programa de 4, 5 anos para fechar aquele campo. De forma que você não cause um impacto enorme, como está acontecendo hoje. O que estão fazendo não é o papel de uma empresa estatal. O compromisso da Petrobrás é com todas as localidades do país.

Como o senhor acha que o país estaria hoje se o modelo de partilha não tivesse sido desfeito? 

Essa é uma questão muito interessante porque às vezes é uma questão específica do setor petrolífero mundial, mas que o cidadão comum desconhece. É o seguinte, antes da descoberta do pré-sal e com a Bacia de Campos já em estado adiantado de exploração e produção – você tinha as outras bacias brasileiras e campos pequenos de exploração – então, você tinha o risco exploratório. Eram bacias grandes seja em terra ou na costa. Havia muito risco em toda a costa equatorial. Então, você tinha que criar atratividade aos investidores. Veja, eu não estou defendendo essa política, eu sou favorável ao monopólio estatal do petróleo. Só estou detalhando para responder. Bom, para atrair o investidor você tem que dizer para ele que se ele descobrir algo ao correr o risco, que o que ele encontrar será dele. Só que com o pré-sal, quando a gente descobre um campo e depois descobre outro utilizando a pesquisa, não é sorte, então, descobrimos o caminho das pedras e o risco exploratório é zerado. A partir daí, não tem mais sentido manter o modelo de concessão que dava, ao investidor que assumiu o risco, a propriedade do petróleo. O modelo de partilha faz diferente, ele determina que o petróleo é de propriedade da União porque quase não há risco para encontrá-lo. É óbvio que o investidor tem que ser remunerado. Em termos bem gerais, essa remuneração vai vir da concorrência nas licitações. As empresas vão ganhar a atividade de produção de petróleo e vão receber remuneração da União que é a proprietária do petróleo. 

Mas tinha outra coisa, e essa é uma informação crucial: a Petrobrás teria que ser operadora única, com no mínimo 30%. E aí que realmente transforma a partilha de produção no Brasil em algo diferente de todos os outros países do mundo. Não é assim na Líbia e em outros locais porque esses países não tinham geocientífica, técnica e tecnológica para produzir o seu petróleo. Então, a operação não precisava ser com eles. O operador é quem resolve tudo na produção do campo que ele vai operar, ele sozinho ou consorciado. Então, era absolutamente indispensável que o governo colocasse a Petrobrás como operadora única porque essa era a ferramenta do governo para uma política de Estado de conteúdo nacional e, consequentemente, desenvolvimento industrial, científico e tecnológico. Por isso é que logo o José Serra junto com aquela moça da Chevron disse que a primeira coisa que fariam seria acabar com esse negócio de operadora única. Aí é que reside uma parcela importantíssima do lucro da empresa que vai operar porque ela vai se desenvolver tecnologicamente e ganhar muito em competitividade internacional no campo em que ela atua. Essa foi a vantagem da partilha de produção e tem muito mais. 

Colado a tudo isso tinha o fundo social. A lucratividade do pré-sal é muito grande e o objetivo era reservar, amarrar essa lucratividade para um projeto de desenvolvimento social também. A solução brasileira foi muito apropriada. E, para completar, com a Petrobrás como operadora única do pré-sal era necessário ter uma política de exploração e produção das bacias sedimentares brasileiras que atendesse a longo prazo as nossas necessidades energéticas. 

Agora, me lembrei que não respondi sobre essa fala do Guedes de que o petróleo vai acabar e se fala em transição energética. Pois bem, há um processo de aquecimento global que é geológico e vem de 1 milhão de anos atrás, mas não vou entrar nisso senão vou falar por umas três horas. Mas existe uma correspondência entre a 1ª revolução industrial e o aumento de CO² na atmosfera que produz o aquecimento global. Considerando que isso seja importante, o planeta precisa entrar num processo de transição energética porque a matriz energética mundial é 80% fóssil e 20% renovável. No Brasil, a nossa matriz energética é a mais bem equilibrada entre as grandes economias do mundo. Nós temos 55% fóssil e 45% renovável. É uma matriz energética civilizada, completamente equilibrada, mesmo com a nossa previsão de virmos a consumir 5 ou 6 barris de petróleo por dia. Esse crescimento do consumo energético vai abrir lugar também para as fontes alternativas. Ou seja, os 10 milhões de toneladas de petróleo é junto também com as fontes energéticas. Por isso que é importante a visão de longo prazo, com o desenvolvimento nacional sempre podemos equilibrar essa matriz. “Peraí”, companheiro. Quem tem que fazer transição energética agora são os grandes consumidores, EUA, China e Europa. Porque eles é que produzem uma matriz energética de 80% de origem fóssil e só 20% de origem renovável. Então, sem essa de que temos que ter cuidado ao produzir o pré-sal porque vamos poluir a atmosfera. A atmosfera já está poluída e foi o consumo de petróleo que fez a riqueza, o protagonismo e o hegemonismo dessas nações no mundo inteiro. O Brasil tem lugar para produzir pré-sal e, mais do que isso, temos uma perspectiva de longo prazo. 

Uma Petrobrás que não é forte, que não se envolve com o desenvolvimento da indústria nacional atrapalha até o avanço do país com relação a evolução de energias de fontes renováveis? 

Essa pergunta também é central. A Petrobrás integrada, como um sistema de produção de energia. Por causa da elevada lucratividade do petróleo do pré-sal e de outros campos brasileiros, porque no geral produzimos a um custo muito barato, podemos compensar a geração eólica, a geração fotovoltaica, a de biocombustíveis. O importante é que todo o sistema tivesse sustentabilidade econômica. Isoladamente, é difícil você compensar a baixa competitividade de uma energia eólica ou solar com a do pré-sal. Agora, se você gerir essa coisa sistemicamente, você pode manter os preços decentes para o desenvolvimento nacional e pode ter alguns elos que sejam deficitários, mas o conjunto todo é lucrativo. Então, se o eólico é caro, mas vamos desenvolver tecnologia e mantê-lo funcionando sustentado pelos lucros do pré-sal. Essa é uma abordagem que pode ser até acusada de primitiva, mas faz sentido. É aquela coisa, produzir é mais caro do que o petróleo importado, mas é mais negócio produzir no Brasil. Então, a gestão sistêmica com uma fonte muito lucrativa beneficia todo o sistema, todas as outras fontes e você investe para aumentar a competitividade das fontes alternativas. 

Você continua otimista com o Brasil? Você que já viveu outros períodos sombrios da história brasileira como o Golpe de 1964, você esperava que o Brasil pudesse entrar nessa espiral tão distópica como a que vivemos hoje? 

Essa questão também é crucial. Não vamos ter que fazer em 2022 uma escolha entre um país mais capitalista e de outro lado mais socialista. O que vamos ter que resolver em 22 é entre um país soberano ou uma colônia. Então, não possiblidade de dúvida. Essa convicção não é só minha e o povo brasileiro precisa se convencer disso. Não existem duas opções de escolha, existem duas situações que são mutuamente excludentes em relação à soberania nacional. Não há o que escolher. Ou você recupera o SUS, a Petrobrás, os direitos dos trabalhadores ou vamos para o Brasil colônia. Essas pessoas que estão aí e outras que se anunciam como alternativa, caso do João Doria, destruíram a soberania nacional. Esse país é nosso, não há o que escolher. Outro dia, fizeram um absurdo. O Luciano Huck falou que seria difícil escolher entre o Lula e o Bolsonaro. Isso é de um absurdo total, nem que se essa pessoa que eu citei tivesse alguma importância, e não tem. Não há o que escolher. Ou elegeremos um presidente da República ou um governador-geral. É isso. Não há nem o que pensar. 

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