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Chico D’Angelo

Médico, ex-diretor do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro e deputado federal (PDT-RJ)

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O ódio será nossa herança?

A divulgação de exames e de comentários desrespeitosos sobre qualquer paciente e a manifestação de regozijo com a dor de familiares demonstram uma total incapacidade ética para o exercício da medicina, mas sinalizam um quadro ainda mais preocupante. Que sociedade propicia, estimula e acolhe iniciativas como essas? 

Doctor with stethoscope in a hospital (Foto: Chico D’Angelo)
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Vivemos tempos de ódio. Nas sociedades contemporâneas, esse sentimento vil e mesquinho se tornou instrumental, uma forma cada vez mais banal de expressar um ponto de vista, afirmar uma opinião ou mesmo um pretenso humor. As redes sociais acham-se tomadas pelos chamados "odiadores", que encontram acolhida e relativo sucesso com suas manifestações. Se esse comportamento se expande de forma tão generalizada em nosso meio, é natural esperar que em todas as classes sociais e em todas as profissões haja um contingente cada vez maior de pessoas que o adotam. Na medicina, por exemplo, certo? Errado.

Há vinte e seis séculos, a medicina ocidental nasceu com a premissa de que as causas de saúde e doença poderiam ser compreendidas a partir de fenômenos naturais, mas fortemente amparada por um juramento que diferenciava este grupo de pessoas da sociedade grega de então. Em seu compromisso radical com a vida e a dignidade do paciente – a despeito de certas práticas legitimadas - os primeiros médicos se comprometeram a guardar respeito pelo ser humano e apenas atuar em seu benefício. Desde então, muitas vezes não curamos, mas cuidamos com solidariedade e compaixão, em um esforço para dar dignidade à vida.

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A divulgação de exames e de comentários desrespeitosos sobre qualquer paciente e a manifestação de regozijo com a dor de familiares demonstram uma total incapacidade ética para o exercício da medicina, mas sinalizam um quadro ainda mais preocupante. Que sociedade propicia, estimula e acolhe iniciativas como essas? Criou-se no Brasil um ambiente de ódio e intolerância, no qual a apologia à morte dos diferentes e o deboche com o sofrimento alheio perderam a condição de exceção ou de ação anônima. Não se trata apenas da iniciativa isolada de indivíduos despreparados para a profissão que escolheram exercer. Precisamos fazer uma reflexão para compreender se, mais do que apenas se omitir, nossas instituições não incentivam manifestações desse tipo. Por exemplo, submeter cidadãos brasileiros considerados suspeitos a exposições vexatórias é um modo eficiente de disseminar intolerância e discriminação, de criar um caldo de cultura em que as ações citadas encontram condições propícias para se desenvolver.

Cabe às faculdades de medicina atribuir à ética médica um espaço central em seus currículos. As direções das unidades de saúde devem desenvolver estratégias de humanização e zelar por um ambiente em que a dignidade humana seja inviolável. De imediato, as ocorrências em contrário devem ser comunicadas aos respectivos Conselhos Regionais, para que adotem medidas exemplares, de modo a inibir situações futuras. Mais que isso, impõe-se a todos nós, cidadãos brasileiros, decidir que tipo de sociedade desejamos construir, que legado deixaremos para nossos descendentes. Se não nos comprometermos com o exercício de relações mais solidárias e humanas, as gerações futuras encontrarão uma nação devastada pelo preconceito e pela intolerância. O ódio será nossa herança?⁠

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