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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor de “Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil”. https://noticiariocomentado.com/

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Querem culpar o advogado pela lentidão da Justiça

Brasil iniciou com a Constituição de 1988 uma discussão que ainda não terminou

Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF) (Foto: Fachada do palácio do Supremo Tribunal Federal (STF))
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A Justiça brasileira é lenta, diz o mantra, a despeito de o Supremo Tribunal Federal às vezes acelerar a coisa, abusando de decisões monocráticas. Os argumentos a favor da prática, reiterados agora pelo presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, são até aceitáveis: há casos - como os crimes relacionados com o 8 de Janeiro - que não podem esperar a liturgia colegiada. Mas, com isso, confirma-se a regra: o trâmite regular no SFT é tão lento que se faz necessário driblar sua colegialidade.

A demora dos processos judiciais em geral, algo lamentavelmente normalizado, possui razões várias. Uma das mais alegadas é um suposto excesso de recursos apresentados por defensores. Os advogados, portanto, ao defenderem seus clientes utilizando os meios previstos pela lei, seriam corresponsáveis pela morosidade da Justiça. Dois argumentos bem simples de pronto derrubam essa tese. Primeiro, o de que a apresentação de recursos cumpre obrigatoriamente prazos exíguos. Segundo, o de que em boa parte das vezes, talvez na maioria delas, a solução rápida do litígio é o que mais interessa ao defensor.

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Ataques retóricos a procedimentos legais da defesa costumam classificar de chicaneiros os advogados que apresentam recursos aparentemente protelatórios. Protelar, contudo, não é necessariamente ilegítimo - se é protelatório, deve assim ser declarado. Recursos, portanto, demoram porque não são julgados, não por culpa da defesa ou da parte contrária. Se os defensores da tese de que os recursos protelatórios constituem prática chicaneira conseguirem fazê-la prevalecer, o que se terá será o cerceamento da defesa.

O Judiciário brasileiro conta com mais de 400 mil funcionários, dos quais aproximadamente 18 mil são magistrados. Segundo o CNJ, há no país cerca de 8 magistrados para cada 100 mil habitantes, enquanto na média dos países europeus a proporção é de 17,4 para cada 100 mil. Temos poucos juízes, portanto? Pode ser, mas aumentar esse número não garantirá a solução do problema da morosidade.

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Especialistas atribuem a lentidão da Justiça à ineficiência pura, a qual pode ser percebida na simples demora em julgar e em decisões mal fundamentadas, decisões genéricas, decisões que não estabelecem uma regra, tribunais que não querem aceitar orientações de tribunais superiores e que também não estabelecem um fundamento para tanto. Além disso, talvez não exista um conhecimento de gestão dentro dos gabinetes para gerir equipes e processos de produção. Se não existir investimento em inteligência de gestão do Judiciário, pode-se triplicar o pessoal e o que se obterá serão somente custos não reversíveis em benefícios. Estar-se-ia, dessa forma, acomodando o juiz que não trabalha e que deixou sua vara explodir de tantos processos acumulados.

Para muitos analistas, a manutenção do STF como última instância recursal deveria ser revista. Os próprios ministros são a causa do acúmulo de processos. O diagnóstico de sobrecarga do Supremo é antigo, e os processos na corte voltaram a se acumular em 2023.  Acrescente-se a falta de vontade dos ministros de utilizarem mecanismos que restrinjam a chegada de processos à casa. Exemplo: pode ou não pode habeas corpus contra ato de relator do STJ? Não pode, salvo exceções. Que exceções? O Supremo não fixa regras claras de procedimentos e incentiva os advogados a recorrerem a ele.

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O fato de os ministros agirem como 11 ilhas dá sentido ao fato de as partes desejarem levar o caso ao Supremo, porque podem dar sorte e cair com um relator que as favoreça. Foi a grande quantidade de partidos que levou à judicialização da política? Não. É o próprio comportamento do STF que incentiva que se vá àquela corte.

O Brasil iniciou com a Constituição de 1988 uma discussão que ainda não terminou, justamente a respeito do ingresso dos cidadãos na Justiça quando lesados. Abriu-se a porta de entrada. Ainda não se resolveu, contudo, como providenciar de modo célere a saída dessas pessoas da Justiça. A enxurrada de novos litigantes criou um gargalo para desaguar as ações, o que causou uma morosidade processual maior ainda. É preciso retirar muitos litígios do sistema judicial, repassando algumas questões para a solução amigável de conflitos, como a mediação e a conciliação. Para isso há um longo trabalho de mudança de mentalidade a ser feito.

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O que nos disse Lenio Streck há alguns anos permanece atual e oportuno: “Os brasileiros habituaram-se a correr para a Santa Trindade da Justiça – Polícia Judiciária, Ministério Público e Defensoria Pública. Cão latiu? Faz B.O. Não que pagar o segundo ponto da NET? Corre na Defensoria. Não quer pagar o estacionamento do shopping? Corre para o MP. Ora, o que o Estado tem a ver com isso? Não quer pagar o estacionamento, vai de ônibus. Não quer pagar a NET? Acampe em frente à NET. Só não use recursos públicos caros como a Defensoria ou o Ministério Público”.

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