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Diálogos Conecta

Transformação tecnológica e perda da autoridade: como a extrema direita avança no mundo

O surgimento de movimentos ultraconservadores no mundo e o avanço tecnológico são os pontos em comum em diferentes países

Bolsonaristas em protesto no Rio de Janeiro contra a eleição presidencial pedem "intervenção federal" 02/11/2022 (Foto: REUTERS/Pilar Olivares)
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Por Marco Aurélio Gonçalves Ferreira - pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos (INCT-InEAC – www.ineac.uff.br)

Atualmente presenciamos o fenômeno da ascensão de uma vertente política conservadora em alguns países ocidentais. Exemplos recentes de países centrais da Europa - como o Reino Unido, a França e a Alemanha - e na América - países como o Brasil e os EUA - são indicativos da dimensão de que movimentos ultraconservadores ganharam proeminência no cenário político atual.

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A questão gira em torno da reflexão sobre quais são as condições precedentes que possibilitaram fecundar antigas ideias e expressões políticas conservadoras e reacionárias, algumas imaginadas como superadas, para que se atualizassem no panorama político e o porquê estas terem representatividade no espaço público mundial, tendo condições de disputarem com chances reais e às vezes com sucesso, as contendas eleitorais. 

O fato empiricamente verificável e coincidente é o surgimento de movimentos ultraconservadores no mundo e o avanço tecnológico, principalmente a popularização dos dispositivos de software e hardware e o papel que a rede mundial de computadores tem desempenhado, se situando como um dos mais destacados instrumentos de divulgação e propagação de informações e conhecimento. 

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A contemporaneidade está marcada pela tecnologia e atualmente faz parte da cultura. De acordo com a Organização das Nações Unidas, atualmente cerca de 4,1 bilhões de pessoas utilizam a rede mundial de computadores. O número de usuários corresponde a 53,6% da população de todo o mundo. De acordo com a ONU, atualmente 97% da população mundial têm acesso a um sinal de celular e 93% ao alcance de uma rede 3G, ou superior. A partir desse dado surge a importância de refletir como essa nova tecnologia afeta os sujeitos com grandes quantidades de informações e pensar como ela constrói processos de subjetivação. 

As manifestações nas ruas da primeira década dos anos 2000 foram uma reprodução, na vida concreta, de uma série de demandas que convergiam para um certo mal-estar pouco identificado, por vezes manifestado de forma difusa, obscura, incerta e contraditória, mas sempre refletido também no espaço virtual das redes sociais. Esse novo mal-estar é o que precede toda gama de transformações sociais que vão eclodir na polarização política a partir do fortalecimento da vertente ultraconservadora no Brasil e no Mundo, com pautas antagônicas aos direitos de minorias, de gênero e outros, marcando uma força de resistência às recentes conquistas realizadas no campo dos direitos humanos em relação aos segmentos minoritários. 

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No Brasil o atual discurso ultraconservador busca associar a religião, a família e a pátria; fato ligado ao tema da campanha presidencial de Jair Bolsonaro:  “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos.” Vale destacar que sobre os costumes o presidente Bolsonaro afirmou que o seu objetivo era fazer “o Brasil semelhante ao que o Brasil tinha 40 a 50 anos atrás”. Esses discursos denotam um saudosismo e conservação de aspectos e valores sociais representados, por esse grupo, como objetos atualmente desvalorizados. A potência do discurso da extrema direita funda-se na promessa do retorno dos antigos referenciais de autoridade considerados “perdidos”.

A apropriação política dos processos de subjetivação na contemporaneidade

Na era da informação surgem novos sujeitos de conhecimento que engendram novas formas de saber e poder. Décadas atrás as relações entre os sujeitos de conhecimento e outros sujeitos tradicionalmente se corporificavam na dimensão hierárquica, por conseguinte, se estabeleciam numa gramática constituída sob a perspectiva de uma sociedade com segmentos superpostos verticalmente. Nas relações contemporâneas os avanços tecnológicos, que possibilitam maior acesso à informação, têm produzido a horizontalização das relações sociais e familiares. Por consequência, há uma desconstrução do modelo social de estrutura vertical e de autoridade. Com efeito, não se mostra estranha a existência de reivindicações pela autoridade perdida, sendo canalizadas para escolhas políticas com propostas autoritárias.  

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A velocidade de transformação dos avanços tecnológicos mantém cada vez menos o saber nas mãos exclusiva dos sujeitos tradicionais de conhecimento, a exemplo: nos pais, professores e profissionais. Cada vez fez mais a informação é distribuída, consumida e dominada pelas gerações mais novas, embora o manejo dessas novas tecnologias seja uma necessidade coletiva. As novas tecnologias disponibilizam de forma ampla saberes que antes eram restritos a determinados sujeitos; saberes outrora acessíveis somente através de instituições específicas, com critérios seletivos de acesso e validação. A popularização do acesso às tecnologias de informação alteram as relações de saber e poder na medida que se estabelece como que um grande banco de informações e conhecimento, acessível a qualquer sujeito portador dos instrumentos tecnológicos.

Embora a tecnologia tenha alterado as relações de autoridade entre os indivíduos, não se pode afirmar que os sujeitos tradicionais de conhecimento perderam seu poder e autoridade por completo. Tal fato se dá em razão da manutenção da força dos vínculos institucionais e normativos que produzem efeitos nos demais sujeitos, uma vez preenchidos certos requisitos jurídicos ou cerimoniais. Assim, embora não seja mais exclusividade médica o conhecimento sobre o diagnóstico, manteve-se o poder médico para prescrever determinados medicamentos, o poder do professor para aprovar o estudante e a instituição certificar, o dos pais sobre os filhos para práticas de atos da vida civil, até antes da maioridade legal.

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O movimento conservador moderno reivindica formas agudas de intervenção e controle, na busca da restauração e conservação de um status quo ante de autoridade.  Portanto, a exemplo no Brasil, os discursos para suplantar a perda da autoridade e controle giram em torno da criação de escolas civil-militares, que são geridas pelas camadas subalternas da polícia militar, tendo como discurso diferencial das escolas comuns: “um apreço maior, uma formação maior da disciplina, dos valores cívicos". No âmbito familiar, o movimento conservador atual reafirma as relações verticais de hierarquia e autoridade entre pais e filhos e postulam posições contrárias às recentes demandas identitárias. Nesse sentido, não se mostra desconectado desse fenômeno o aumento da participação e ascensão de grupos religiosos no espaço político, que trazem em seu discurso a ideia de autoridade divina.

Os processos de subjetivação na atualidade decorrem das transformações na posição da autoridade em razão do surgimento de novos sujeitos de conhecimento que engendram novas formas de saber e poder. Esse processo de transformação social gera, em determinados sujeitos, uma insegurança e um desamparo que vai ser apropriado politicamente pela vertente da nova direita, com a promessa inexequível de retorno às tradicionais referências de autoridade. Nesse discurso, a culpabilização pela “perda da autoridade” no âmbito social e familiar vai ser atribuída às vertentes políticas progressistas que assimilam as transformações sociais como parte intrínseca da vida e da diversidade humana. 

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É necessária a reflexão sobre o processo de subjetivação produzido pelo desenvolvimento tecnológico, com o fim de nos darmos conta das transformações sociais e pensarmos estratégias de como acomodá-las às dimensões democráticas, afastando propostas autoritárias de restrição dos direitos e garantias fundamentais.

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