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Fernando Horta

Fernando Horta é historiador

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Ahhh, o Discord

O nome midiático do PL 2630 deveria ser “PL do tiro no pé”

(Foto: Reprodução)
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Assim que saiu a notícia de que havia um pedido de urgência para votação do chamado “PL das fakenews” eu me preocupei. Tendo lido o texto original proposto em 2020 pelo senador Alessandro Vieira (na época firme parte da base bolsonarista) eu sabia que o texto era ruim. Com a urgência do Lira, a sociedade estava sendo cutucada a iniciar uma discussão sem sequer o texto final, que só foi apresentado pelo deputado Orlando Silva na noite de sexta feira última. O texto apresentado pelo deputado é muito melhor do que o proposto pelo senador, mas não é nem um pouco “bom” e nem atinge o objetivo que diz atingir: acabar com as fakenews e regular as bigtechs.

Assim que saiu o texto final passei a expressar minha posição de indignação com o PL 2630. Afirmo que a lei tem um design errado, que é “voltada para trás”, que já nasce antiga e obsoleta, que não vai conter as fakenews e que, como resultado do amadorismo, vai destruir o ecossistema digital progressista no Brasil.

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Imediatamente as hordas de canceladores digitais passaram e me atacar. Direcionados pela grande mídia (quem diria!) essa gente comprou a fakenews de que o projeto “acabaria com as fakenews” e que era “para proteger as crianças da violência. A grande imprensa criava (por mecanismos conhecidos) a histeria que juntava o medo da experiência recente de ataques às escolas, com as experiências criminosas de Jair Bolsonaro nas redes em 2018, 2020 e 2022. Tática sórdida e bem conhecida. Milhares de pessoas que acham que conhecem violência, fascismo e mundo digital por “estarem nas redes”, passaram a responder às ordens da mídia monopolista (sem se darem conta!) e deixaram em algum lugar perdida a sua capacidade crítica.

No domingo, a rede Globo fez extensa matéria sobre o aplicativo Discord. Um aplicativo criado em 2015, que é majoritariamente utilizado pela comunidade “gamer” tendo mais de 63% dos seus usuários sendo jovens do sexo masculino. Pessoas que têm acesso aos videogames caros (como xbox e playstations) e que estão nas cidades. A globo mostrou a onda de violência que opera dentro dessas plataformas, dando ênfase a vídeos de ataques a animais e tudo mais.

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Horrorizados, pais, mães, brasileiros e brasileiras de toda sorte passaram e engrossar a ideia de que “a PL 2630 é ainda mais necessária”. Recebi mensagens ameaçadoras me acusando de coisas que não posso escrever aqui e apontando para a reportagem: “Como você pode ser contra a PL depois dever esta reportagem, seu canalha?” me escreveu uma pessoa.

Pois bem ...

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O Discord tem cerca de 100 milhões de contas registradas no Brasil, mas apenas um total (em março) de cerca de 2,9 milhões de usuários mensais. Isso significa que a plataforma NÃO SERÁ afetada pelo PL 2630 que em seu texto deixa claro que só se propõe a regulamentar as plataformas com mais de 10 milhões de usuários/mês.

Claro que as pessoas que me atacam, e as que estão “horrorizadas” com o Discord nada entendem efetivamente de violência, linguagem, fascismo, escolas ou mundo digital. Especialmente tudo junto.

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“É só incluir o Discord”, me escreveu uma pessoa colérica e incapaz de compreender o que estava acontecendo.

Na realidade, depois de quase 4 anos de discussões, tendo sido ouvido mais de 50 “especialistas” no tema, a pérola de regulação digital do parlamento brasileiro simplesmente não conseguiu mapear em que tipos de aplicativos a violência contra jovens e contra às escolas operam (e o Discord é plataforma básica de quem conhece o tema) e também não conseguiu perceber que a tão defendida lei, pelos seus próprios termos, NÃO AGIA sobre uma das plataformas mais problemáticas das redes. Ou seja, a lei já nasce inefetiva, ineficaz, antiquada e obsoleta. Tudo, aliás, que eu vinha dizendo.

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E não é só isso. A vergonha de um projeto de lei ter sido “estudado” e pensado por 4 anos, e não ter conseguido o mínimo que era de mapear os problemas e os modelos de plataformas do Brasil deveria ser suficiente para que não se seguisse nessa urgência com um assunto tão sério. E olha que o Discord foi criado em 2015, o PL que será votado em 2023, não conseguiu chegar à tecnologia do ano de 2015 ...

As hordas de lacradores da esquerda, direcionadas pelas “mãos invisíveis” da grande mídia, em vez de reconhecer o fracasso completo da tentativa, perceber que os diversos críticos (alguns inclusive tendo participado das audiências públicas e pontuado lá as oposições) estão contra uma lei que simplesmente não faz o que diz fazer, preferem seguir atacando, ofendendo, ameaçando, e – nisso – igualam-se à direita nos comportamentos digitais.

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Todos os que participaram dessa pantomina deveriam se envergonhar depois da reportagem da rede Globo. Advogado, jornalistas, doutores de toda sorte que só sabem falar a lei da proibição, da pena e da multa deveriam calçar as sandálias da humildade e reconhecer, diante da empiria do seu fracasso, que o projeto de lei 2630 é um grande fracasso já de início.

Regular as redes é diferente de regular as bigtechs.

O mundo material não deve ser modelo para ação no mundo digital.

Violência no mundo digital se liga à violência nas escolas e ao fascismo e tudo isso são questões com necessidade de conhecimentos transdisciplinares e não apenas boa vontade.

O Brasil precisa se inserir no mundo da Era Digital pela porta da frente, e não por punições, leis, interditos e tudo um bolo de fel que desta vez é destilado e alimentado pela esquerda.

É preciso regular as bigtechs? Sim.

É preciso combater a desinformação na era digital? Sim.

É preciso proteger a democracia dos ataques da era digital? Sim.

É preciso proteger o ambiente social e psicológico da nossa juventude? Sim.

Contudo, o PL 2630 não faz nada disso. O que ele faz é entregar novamente para as grandes empresas monopolistas de mídia a possibilidade de controlar as narrativas políticas, econômicas e sociais no país e prejudicar o ecossistema digital progressista que já é pequeno e frágil.

Em 2024, quando nossas fragilidades na comunicação digital se tornarem impossíveis de serem escondidas pelo discurso militante, e quando precisarmos dos canais de esquerda atuantes nas redes não venham perguntar, assombrados, “por que a esquerda não cresce nas redes?” Já respondo agora: não cresce porque não conhece as redes e não tem humildade suficiente para reconhecer que não conhece.

O nome midiático do PL 2630 deveria ser “PL do tiro no pé”.

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