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Inez Lemos

Psicanalista e autora de "Berro de Maria", ed. Quixote.

15 artigos

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Delírios em busca de sentido

Muita gente desavisada em busca de sentido para suas vidas topou a aventura

Manifestantes bolsonaristas dentro do Planalto - 08/01/2023 (Foto: Adriano Machado/REUTERS)
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 Diante dos atos de terrorismo em Brasília no domingo após a posse do presidente Lula, gostaria de registrar a necessidade de investigarmos o que orienta jovens - um grupo fora do cenário empresarial, agronegócio, políticos de extrema-direita, criminosos em causa própria defendendo negócios espúrios. Esses são causa perdida. Mas, e a jovem que entrou por fantasiar um rolê diferente, talvez a chance de arrumar um namorado, ter seu rosto divulgado? Muita gente desavisada em busca de sentido para suas vidas topou a aventura. 

 Como entender o amontoado social que grita por sentido? A massa é amorfa, buraco escuro em que precipita clamores por significação - algo que justifique a existência, um lugar a pertencer. Emerge de uma posição de anulados, negativos sociais, frustrados diante dos apelos da sociedade capitalista, culto à visibilidade, espetáculo -  disputa por fama, sucesso. Sem perspectiva, no vazio, aderem a projetos do grande Capital, manipuladores, verdadeira produção de dessubjetivação - indivíduos disponíveis a aderir apelos autoritários, fascistas, em total disjunção de si e da realidade. Vultos que precisam encontrar motivo ao afirmar sua existência. É impossível entender o cenário de delírios em frente aos quartéis sem se perguntar: quem produz o criminoso, fascista, a alienada, o jovem mimado, empresário perverso, corrupto, costas largas? Muitos pais estão inseridos na cultura de ganho fácil, levar vantagem na ilegalidade. A punição deve ocorrer, a lei ser cumprida, mas sem instaurar novas instâncias de produção de cidadãos que cultuam a  honestidade, solidariedade, respeito ao erário público, ficaremos enxugando gelo. Sabemos que o projeto político neoliberal, fascista, anula no sujeito a produção de desejo. O insatisfeito se apega às promessas de sentido, buscando-o fora de si, em instituições - religião, crenças, seitas. Se agarram em verdades que lhes chegam prontas, se apegam à alguma compensação exterior, fora de sua experiência de vida. O que possibilita negar a realidade para acreditar em uma sem fundamento. O fundamentalismo é uma produção de falsos fundamentos. Cria-se um mundo fake, paralelo, distorcendo a realidade, oferecendo simulacros de realidade - simulando um outro mundo, provocando fanatismo, obsessão em busca de uma saída vantajosa. Daí a pós-verdade, uma nova verdade, falsa, porém poderosa, convincente. Ao buscar um sentido "fora", ao se disponibilizar ao Outro, sem desejo próprio, atuamos como tercerizados, com a subjetividade cancelada, o que provoca infelicidade. Ao clamarem pelas "Forças Armadas", clamam por controle, por um Pai, denunciando o fracasso na função paterna, materna. Na verdade, temem ser jogados à própria sorte, à falta de limite. Anseiam por uma autoridade, um guia.Temem o comunismo, contudo, não suportam a liberdade, se oferecem à submissão. Ser livre é ser dono de seu destino. Acredito que parte da galera que depredou os três poderes, no fundo esteja clamando por socorro! Infelizes, sem causa própria, lançam palavras de ordem no vazio. Devem invejar o sujeito desejante, o que luta pelo desejo de criar, trabalhar por um objetivo maior. Geralmente invejam o campo progressista, sua riqueza simbólica, sua capacidade de produção de sentido - interesses e entusiasmo. Uma vida interessante provoca inveja. A massa que segue o líder da horda está na posição do invejoso, raivoso e violento por não conquistar um lugar criativo, que produza satisfação. A inveja é efeito da ausência de desejo, de vida pujante, determinação diante de projetos que justificam a existência, o que acaba bloqueando a circulação de afetos positivos e empobrecendo as relações. A educação que não inclui o outro, a alteridade, que não estimula o indivíduo a se entusiasmar por questões sociais, a olhar além de seu cercadinho, acaba por jogá-lo no limbo  em busca de laços sociais - total mendicância subjetiva, afetiva. Algo mais profundo subjaz à demanda por "intervenção das forças armadas". Talvez os avulsos, voluntários que foram pra debaixo de barracas estejam demandando reconhecimento, amor, objetivo de vida - necessidade de pertencer à uma comunidade, um grupo afetivo. Como lidar com as demandas, como incluir a massa sem rumo, desorientada, analfabeta política - gente marcada pelo ódio, maledicência, fake news? Muitos cresceram tendo apenas o dinheiro como ideal. Por mais absurdo e paradoxal que possa parecer, o melhor é tentar conquistá-los pro nosso lado, estabelecer uma forma de diálogo inserindo-os em outra loucura - a que deixa a alma elegante em festa. Festa pela boa conquista - vida, ética, estética. A ruptura interessa apenas ao fascismo, à extrema-direita. Lula há de pensar como lhes oferecer sentido, provocar desejo, sonhos que transcendam o mundo cibernético, uma realidade cheia de tesão. Inclusão com tesão. 

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