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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

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Rodrigo Maia deixa claro que a esquerda não terá vez em seu bloco

Participar do grupo do Maia neste momento expõe a fragilidade das esquerdas e dos nacionalistas e legitima os defensores das políticas neoliberais

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Em entrevista dada à Folha de São Paulo no dia 28 de dezembro, o atual presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM/RJ), abriu o jogo. Mostrou que suas divergências com o governo Bolsonaro são de forma, não de conteúdo e repetiu a tática dos neolibs de invisibilizar a esquerda.Maia avaliou que o grupo de oito partidos (DEM, MDB, PSDB, PSL, PT, PC do B, PDT e PSB) que formaram um bloco para atuarem juntos na escolha do novo presidente da Câmara dos Deputados em fevereiro e derrotar a chapa encabeçada pelo deputado Arthur Lira (PP/AL), candidato de Bolsonaro, é um “ensaio” para a eleição presidencial de 2022 e um “‘um grande passo’ para diminuir as radicalizações no país”. É interessante notar que muitos daqueles que contribuíram para que a radicalização se instalasse no Brasil agora querem diminuí-la.O deputado lamenta ter levado Paulo Guedes a sério. Esta é uma mera questão de afinidade pessoal porque, mesmo sem levá-lo à sério, Maia contribuiu para a aprovação de todas as pautas antipopulares e entreguistas que o ministro enviou para o Congresso. Como o próprio Maia reconheceu, a Câmara votou e aprovou “tudo sem a gente [ele e Guedes] precisar ter um diálogo”. Imaginem, meus poucos leitores, o que teriam feitos juntos se tivesse rolado uma afinidade entre eles. Não teria sobrado pedra sobre pedra.

Mostrando que as divergências entre ele e o governo resumem-se ao nível de empatia, Maia lamentou que Bolsonaro não tenha enviado a Reforma Tributária para votação porque ela teria sido aprovada. Prossegue argumentando que mesmo sem ter uma base forte na Câmara, o governo teria apoio para aprovar “reformas que modernizem o Estado brasileiro”. Como as reformas defendidas tanto pelo governo quanto por Maia e sua base, ou seja, pelos neolibs, procuram desmontar o Estado e fragilizar a organização e o poder popular, a modernidade defendida por estes senhores nos levará diretamente ao século XIX.

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Respondendo à pergunta se ele acredita que a vitória do candidato indicado pelo seu bloco, o deputado federal Baleia Rossi (MDB/SP), fará com que os governistas obstruam os trabalhos na Câmara, Maia afirmou que não crê nesta hipótese “porque a base do governo acabou sendo usada pelo interesse do candidato do presidente Bolsonaro. Acabada a eleição, acabou essa disputa”. Mais uma vez ele deixa evidente e cristalino que as divergências com o governo não alcançam os conteúdos das propostas que são similares àquelas dos seus aliados. Ambos os grupos querem implementar políticas econômicas neoliberais, antipopulares e entreguistas.

Na resposta à pergunta seguinte, Maia volta a afirmar que o campo político do qual faz parte vota majoritariamente a favor da agenda econômica do governo. Ele repete isto diversas vezes ao longo da entrevista. Há discordâncias com o governo naquilo que concerne ao que ele define como pautas que geram conflito e ódio na sociedade, pautas que poderíamos classificar como morais e que são secundárias. No crucial, as pautas relacionadas ao neoliberalismo econômico, Maia e o governo estão de acordo.

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O PT colocou algumas ressalvas ao nome de Baleia Rossi, ligado a Michel Temer, como candidato do grupo dos oito partidos que opõem-se a Arthur Lira. Maia demonstrou estar pouco preocupado com estas ressalvas e que a maior representação partidária da Câmara, a do PT, pouco ou nada vai influenciar nas decisões deste grupo. Os quatro partidos que defendem a pauta neolib - DEM, MDB, PSDB, PSL - vão decidir entre eles e os outros partidos que adequem-se ao que for decidido. Prova disto é que Maia asseverou que o grupo não assumiu nenhum compromisso com as pautas populares defendidas pela esquerda e os setores nacionalistas de centro.

O deputado prossegue dizendo que a formação do bloco de oposição ao governo mostra que pode haver diálogo, que os partidos podem divergir, mas podem “construir consensos, construir projetos” de interesse da sociedade brasileira. O bloco pode reunir-se para discutir a democracia, os interesses do Brasil e reduzir os radicalismos na política brasileira. Se nada mudar até 2022 e se os interesses deste bloco continuarem a pautarem-se pelos temas da conjuntura atual, o projeto de democracia e consenso, que Maia chama de interesses do Brasil e que está sendo construído, diverge radicalmente dos interesses nacionais e populares, dos anseios dos trabalhadores e do povo brasileiro. Os erros estratégicos cometidos pelas esquerdas e pelos setores nacionalistas de centro ao longo dos últimos 14 anos colocaram os progressistas em uma posição política fortemente defensiva e fragilizada, não cabendo a eles muito mais do que estabelecer estratégias de redução de danos. Nesta aliança contra o fascismo e em defesa da democracia, cabe às esquerdas e aos nacionalistas de centro o mero papel de legitimadores das políticas neoliberais antipopulares e entreguistas. Nas próximas eleições, a direita neoliberal saberá utilizar fotografias e alianças políticas para tentar desacreditar os partidos e os políticos de oposição, como vêm fazendo desde as eleições de 2006.

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Perguntado se ele acha difícil formar uma chapa junto com a oposição para as eleições presidenciais de 2022, Maia reconhece que as grandes divergências concentram-se na pauta econômica, mas que acredita que parte deste bloco possa caminhar junto na disputa eleitoral. Parte deste bloco. Já podemos imaginar qual parte não caminhará junto. O deputado responde a esta dúvida na pergunta seguinte que indaga se João Dória ou Luciano Huck, qual dos dois representaria melhor o perfil de candidato agregador defendido por Maia. Sua resposta cita os candidatos/partidos mais afinados com o projeto neoliberal, bem como aqueles que não estão completamente afinados, mas que podem ser aceitos porque, na prática, atuam como linha auxiliar deste projeto. Além de Huck e Dória, o deputado cita ACM Neto (DEM), Ciro Gomes (PDT), Paulo Câmara (PSB). Colocando em prática a estratégia de invisibilização da esquerda utilizada pela direita neoliberal, Maia não citou nenhum dos maiores partidos de esquerda – PT, PSOL e PC do B – muito menos o nome do ex-presidente Lula ou de Fernando Haddad, que obteve 47.040.906 votos nas eleições presidenciais de 2018, nem de Flávio Dino, muito menos o nome de Guilherme Boulos ou de qualquer outro candidato de esquerda.

Maia não afirmou isto, mas podemos deduzir que em um eventual segundo turno em 2022 entre Bolsonaro e Ciro Gomes ou entre Bolsonaro e um candidato do PSB, os neoliberais veem o pedetista e o PSB como confiáveis, como linhas auxiliares aos seus projetos. Se, ao contrário, o candidato for de algum partido de esquerda crítico ao projeto neoliberal, os neoliberais estarão dispostos a, mais uma vez, realizar uma “escolha difícil” e apoiarem Bolsonaro.

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PC do B e PT não têm como justificar para suas bases a participação no bloco do Maia. Como partidos de esquerda já deveriam ter compreendido que o perigo não é Bolsonaro, mas é o neoliberalismo. Apoiar o candidato de Rodrigo Maia contra o fascismo, em defesa da democracia é uma tolice. As contradições do governo Bolsonaro enfraqueceram seu projeto totalitário. O fim do abono salarial, o aumento do desemprego, bem como outras resultantes da desastrosa política econômica do governo fragilizaram Bolsonaro. Em 2021 a insatisfação popular irá manifestar-se. Se a oposição não mobilizar o povo contra as contradições do neoliberalismo, esta insatisfação pode ser canalizada para governo que já demonstrou que comunica-se com o povo de maneira muito mais eficiente do que a oposição.

Agora é a hora da esquerda e dos setores nacionalistas de centro colocarem o dedo na ferida e mostrarem que tudo de ruim que acontece no Brasil atualmente é culpa da política neoliberal implementada pelo governo Bolsonaro. O próprio perfil fascista do governo é consequência da necessidade da burguesia neocolonial brasileira de aprovar reformas políticas e econômicas antipopulares e antinacionalistas que visam assegurar suas margens de lucro, com também os interesses do imperialismo no Brasil.

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Lançar um candidato próprio neste momento fortaleceria os partidos de esquerda e os ideais nacionais e populares. Na conjuntura atual, final de 2020 e início de 2021, setores importantes da burguesia neocolonial e algumas instituições da República – as grandes corporações de imprensa, o STF e a maior parte do Congresso Nacional – já posicionaram-se contra o projeto totalitário de Bolsonaro, conseguiram impor-lhe derrotas e o enfraqueceram. Se as esquerdas e os nacionalistas lançassem um candidato próprio, é provável que nenhum dos dois grupos que defendem o projeto neoliberal na Câmara conseguisse maioria absoluta (257 votos) e que houvesse um segundo turno na eleição do presidente desta casa. O peso dos votos da esquerda, derrotada no primeiro turno, daria a ela melhores condições para negociar seu apoio. Alguns poderão dizer que o grupo neoliberal aceitaria essas condições, mas não as implementariam. Mas o Rodrigo Maia já deixou bem claro que os setores neoliberais do grupo que coordena não estão propensos a aceitar as condições defendidas pelas esquerdas e pelos nacionalistas em troca de seu apoio. No que concerne a este tema, não mudaria nada as esquerdas e os nacionalistas apoiarem os neolibs no primeiro ou no segundo turno. O que mudaria é que as esquerdas e os nacionalistas teriam até fevereiro de 2021 para exporem e defenderem sua plataforma, oporem-se ao projeto neoliberal e levarem suas propostas políticas até os trabalhadores brasileiros. Seria uma ótima oportunidade para enfatizar a diferença entre o projeto neoliberal – entreguista, antipopular e antinacionalista – e o projeto nacional-popular defendido pelos setores de esquerda e nacionalistas. O mesmo ocorreria se não houvesse segundo turno. Nos dois casos a esquerda e os nacionalistas de centro teriam um palanque para difundir seus princípios, desde que lançassem um candidato próprio. 

No frigir dos ovos, a esquerda e os nacionalistas e centro nada ganham apoiando o grupo de Rodrigo Maia. 

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Participar do grupo do Maia neste momento expõe a fragilidade das esquerdas e dos nacionalistas e legitima os defensores das políticas neoliberais.

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